Penal (crimes contra a administração pública - art. 312 a 359) Flashcards
Os crimes funcionais são classificados em dois grupos. Quais são eles?
→ crimes funcionais próprios/puros ou propriamente ditos: são aqueles em que a qualidade de funcionário público é elementar do crime, que se removida, a conduta se tornará atípica. Ou seja, faltando a qualidade de funcionário público, o fato é um indiferente penal, não se subsumindo a nenhum outro tipo penal. É o caso da prevaricação.
→ crimes funcionais mistos ou impropriamente ditos: são aqueles que se tirar a elementar funcionário, eles continuam existindo como figuras típicas, mas não mais como crimes funcionais. O crime deixa de ser funcional e é desclassificado para outro delito, de natureza diversa. É o caso do peculato-furto.
Os crimes funcionais estão sujeitos à extraterritorialidade incondicionada da nossa lei?
SIM - os crimes funcionais praticados por quem está a serviço da administração pública brasileira, mesmo que cometidos no exterior, serão alcançados pela lei brasileira, pouco importando se o agente foi absolvido ou já tenha cumprido sua pena.
Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro os crimes contra a administração pública, por quem está a seu serviço.
§ 1º - No caso acima, o agente é punido segundo a lei brasileira, ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro.
Quem são os funcionários por equiparação no código penal?
- aqueles que trabalham em entidades do terceiro setor ou em concessionária/permissionária.
Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal (entidades do terceiro setor, sem fins lucrativos, que atuam em colaboração com o Poder Público), e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade TÍPICA da Administração Pública (concessionárias ou permissionárias).
Com a figura do funcionário público por equiparação, pode-se concluir que o direito penal adotou um critério mais ampliativo do que aquele adotado pelo direito administrativo.
O legislador, ao conceituar funcionário público, criou uma INTERPRETAÇÃO AUTÊNTICA ou LEGISLATIVA. Assim, o art. 327 é uma norma penal interpretativa, pois esclarece o conteúdo e o significado de outras normas penais.
Tal equiparação não abrange, contudo, os funcionários atuantes em empresa contratada para prestar serviço atípico para a Administração Pública como, v.g., uma empresa contratada para funcionar num cerimonial de recepção a um chefe de governo estrangeiro.
O depositário judicial que vende os bens sob sua guarda comete o crime de peculato?
NÃO, pois o depositário judicial não é funcionário público.
Trata-se de uma pessoa que, embora exerça uma função no interesse público do processo judicial, é estranha aos quadros da justiça.
Não ocupa emprego público e nem função pública. É, na verdade, um auxiliar do juízo que fica com o encargo de cuidar de bem litigioso.
O advogado nomeado que faz as vezes da DPE onde a instituição ainda não está instalada é funcionário público para fins penais?
SIM.
O STJ vem decidindo que o advogado nomeado é funcionário público para fins penais, inclusive recebe dos cofres públicos.
Os titulares de cartório são considerados funcionários públicos para fins penais?
SIM. Os titulares de cartório são considerados servidores públicos para fins penais, pois recebem delegação do poder público para atuação na esfera cartorária.
Agora, os funcionários contratados livremente pelo tabelião não são considerados funcionários públicos.
Discute-se se o conceito de funcionário público POR EQUIPARAÇÃO destina-se somente aos casos em que a pessoa figura como sujeito ativo do crime contra a Administração, ou se também pode ser utilizado na situação em que o indivíduo figura como sujeito passivo do delito.
Sobre o tema, duas teorias se formaram. Quais são elas?
1) Teoria restritiva – a equiparação somente se dirige ao sujeito ativo do crime. Exemplo: ofender verbalmente um “funcionário público por equiparação” enseja o crime de injúria, e não o crime de desacato.
Essa é a posição majoritária na doutrina, que argumenta que o conceito de funcionário público não foi previsto na parte geral do Código Penal, mas no capítulo que versa sobre “os crimes praticados POR funcionários públicos contra a administração em geral”.
2) Teoria extensiva (ou ampliativa) – a equiparação do art. 327 se estende tanto ao sujeito ativo como ao sujeito passivo. Nesse sentido é a jurisprudência do STF: “o conceito de funcionário público é geral, que, inclusive, poderia estar na parte geral do CP”. Ou seja, ele usa o conceito de funcionário público quando ele for sujeito ativo ou passivo.
Nos crimes praticados por funcionários públicos, as penas serão aumentadas da terça parte em que situações?
Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.
§ 1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública.
§ 2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público.
obs.: o legislador se esqueceu das autarquias.
Será que prefeitos, governadores e presidente da República, quando autores de crimes funcionais, estão compreendidos na majorante de 1/3?
SIM.
O Supremo Tribunal Federal, por maioria, entendeu que sim.
Ou seja, para a jurisprudência, essa causa de aumento de pena se aplica para os agentes políticos detentores de mandatos eletivos.
§ 2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público.
Existe algum crime funcional que seja inafiançável?
NÃO, atualmente todos os crimes funcionais são afiançáveis.
Qual a principal diferença entre o rito especial dos crimes funcionais para os demais ritos?
O rito dos crimes de responsabilidade dos funcionários públicos prevê uma fase processual chamada de DEFESA PRELIMINAR - após o Ministério Público oferecer a denúncia, o juiz, antes de decidir se recebe ou não a peça acusatória, deverá NOTIFICAR o denunciado para que este apresente, no prazo de 15 dias, a sua defesa preliminar.
Art. 514. Nos crimes afiançáveis, estando a denúncia ou queixa em devida forma, o juiz mandará autuá-la e ordenará a NOTIFICAÇÃO do acusado, para responder POR ESCRITO em 15 dias.
Parágrafo único. Se não for conhecida a residência do acusado, ou este se achar fora da jurisdição do juiz, ser-lhe-á nomeado defensor, a quem caberá apresentar a resposta preliminar.
O corréu que não seja funcionário público tem direito à defesa preliminar?
NÃO.
Além disso, não basta que o denunciado seja funcionário público para ter direito à resposta preliminar. É necessário que ele esteja sendo acusado de um crime funcional próprio descrito nos arts. 312 a 326 do CP.
Se o funcionário público não ostentar mais essa qualidade quando a denúncia for oferecida terá direito à defesa preliminar?
NÃO.
Qual a consequência da não observância do rito especial dos crimes cometidos por funcionários públicos?
A inobservância do procedimento previsto no artigo 514 do Código de Processo Penal gera, tão-somente, nulidade relativa, que, além de dever ser arguida no momento oportuno, exige a demonstração do efetivo prejuízo daí decorrente.
Segundo o STJ, se a denúncia proposta contra o funcionário público por crime funcional típico foi embasada em um inquérito policial será necessária a observância da resposta preliminar?
NÃO.
Súmula 330-STJ: É desnecessária a resposta preliminar de que trata o artigo 514 do Código de Processo Penal, na ação penal instruída por inquérito policial.
Mas o STF possui julgados em sentido contrário a essa súmula, afirmando que “é indispensável a defesa prévia nas hipóteses do art. 514 do Código de Processo Penal, mesmo quando a denúncia é lastreada em inquérito policial”.
Aplica-se o rito dos funcionários no caso de o autor responder por outro crime em concurso com o crime funcional?
NÃO.
Quais são as quatro espécies de peculato previstas no artigo 312 do CP?
- peculato desvio
- peculato apropriação
- peculato furto
- peculato culposo
Quais as espécies do chamado peculato próprio?
As duas formas de peculato próprio são previstas no caput do artigo 312:
- peculato desvio - ocorre quando o funcionário dá uma finalidade distinta ao bem;
- peculato apropriação - se dá quando o agente está na posse do bem em razão da sua função pública e dele se apropria.
A energia elétrica pode ser objeto material do crime de peculato?
SIM, já que é equiparada a bem móvel.
Peculato de serviço é possível? Exemplo: desviar o servidor público de suas funções, para realizar afazeres particulares.
Não, só existe peculato de coisa. Então, não existe o crime na apropriação de mão-de-obra (só se a apropriação for de coisa, dinheiro ou bem móvel).
Exceção: se o peculato de serviço for praticado por Prefeito, estará caracterizada a tipicidade da conduta, prevista no Decreto-Lei n. 201.
O servidor público (ex: um Deputado Federal) que se utiliza do trabalho de outro servidor público (ex: assessor parlamentar) para lhe prestar serviços particulares pratica crime de peculato (art. 312 do CP)?
Situação 1. Servidor público que se utiliza da mão-de-obra de outro servidor público (normalmente seu subordinado) para, em determinados momentos, determinar que este preste serviços particulares a ele. Esta conduta não configura peculato nem qualquer outro crime.
Atenção: se o indivíduo que se utilizou do servidor público for Prefeito, ele cometerá o delito do art. 1º, II, do DL 201/67.
Situação 2. Servidor público que utiliza a Administração Pública para pagar o salário de empregado particular. Aqui o chefe contrata um indivíduo supostamente para ser servidor público (cargo comissionado), mas, na verdade, ele manda que a pessoa contratada preste exclusivamente serviços particulares ao seu superior. Esta conduta, em tese, configura peculato. Isso porque o dinheiro público está sendo desviado para o pagamento de um “servidor” que, formalmente está vinculado à Administração Pública, mas que, na prática, apenas executa serviços para outro servidor público no interesse particular deste último.
Segundo o que decidido pelo Supremo no Inq. 2.913 AgR, a nomeação de funcionário para o exercício de funções incompatíveis com o cargo em comissão ocupado tipifica o crime de peculato-desvio (CP, art. 312, “caput”).
Sem embargo, a “utilização dos serviços custeados pelo erário por funcionário público no seu interesse particular não é conduta típica de peculato (art. 312, do Código Penal), em razão do princípio da taxatividade (CF, art. 5º, XXXIX)”, conforme se decidiu no Inq. 3.776.
Observe a diferença: no primeiro caso (típico), o nomeado exerce atividades estritamente particulares e simplesmente é remunerado com recursos públicos pelo fato de ter sido indicado para ocupar cargo de provimento em comissão (“funcionário fantasma”, como coloquialmente se diz); no segundo caso (atípico), o agente vale-se de servidor público (a ele subordinado hierarquicamente, por óbvio) para realizar certos serviços no seu interesse particular, ou seja, o servidor público não deixa de realizar as suas atribuições pertinentes ao cargo ocupado, mas também presta serviços particulares (em horário de expediente, claro) para a autoridade nomeante.
Diversos servidores tinham empréstimos consignados cujos valores eram descontados da folha de pagamento. Assim, a obrigação do Município era a de reter mensalmente a quantia necessária ao pagamento do empréstimo e repassá-la ao banco mutuante. Ocorre que, em determinado mês, o Prefeito ordenou que fosse feita a retenção, mas que tais valores não fossem repassados à instituição e sim gastos com o pagamento de despesas do Município. Ao fazer isso, o Prefeito praticou algum crime? Qual?
Sim, o STF entendeu que o agente praticou peculato-desvio, delito previsto no art. 312 do CP, uma vez que o Município era mero depositário dos recursos, que não eram receita pública, e deu destinação diversa a essa quantia.
Para que o crime de peculato seja praticado, é preciso que o agente público esteja na posse da coisa?
SIM. Nas modalidades “apropriação” e “desvio” a posse do bem é imprescindível para a configuração do crime. Ou seja, o sujeito tem que estar com a coisa em seu poder.
A palavra “posse” deve ser interpretada em sentido amplo, abrangendo tanto a posse direta como a indireta, e ainda a mera detenção. Além disso, a posse tem que ser lícita.
No peculato desvio, o proveito pode ser material e também moral?
SIM.
Na hipótese do peculato desvio (ou malversação), o funcionário dá destinação diversa à coisa, em benefício próprio ou de outrem, podendo o proveito ser material ou moral.
A vantagem auferida não precisa ser necessariamente de natureza econômica. O que se exige é que o funcionário tenha a posse lícita do bem e que, depois, o desvie.
Para a consumação do crime de peculato desvio ou apropriação, é imprescindível que a conduta gere lucro efetivo ao agente? Em que momento se consuma o crime?
NÃO. Tanto no peculato desvio como no peculato apropriação, a caracterização do crime não reclama lucro efetivo por parte do agente, pouco importando se a vantagem visada é conseguida ou não.
- o peculato apropriação se consuma quando o agente passa se comporta como dono da coisa, sem ser.
- já o peculato desvio consuma-se quando se der à coisa destino diverso que se teria que ter.
Existe peculato de uso?
A resposta está umbilicalmente ligada à natureza da coisa apoderada (ou desviada) momentaneamente:
(i) tratando-se de coisa consumível, é possível o crime de peculato pelo uso do bem e ato de improbidade.
(ii) tratando-se de coisa não consumível (que não se consome com o uso, sendo possível devolvê-la ao seu estado original), o ato não será crime de peculato, mas será ato de improbidade.
(iii) agora, no caso do Prefeito Municipal existe crime, não importando se a coisa é consumível ou não consumível, configurando o art. 1º, inc. II, do Decreto-Lei n. 201/1967.
O que é o peculato impróprio?
É o peculato na modalidade furto, porque o funcionário público não tem a posse do bem.
Nesse caso, o agente se vale da facilidade que a condição de funcionário lhe proporciona e assim subtrai (ou concorre para que seja subtraída) coisa do ente público ou de particular sob custódia da administração.
É possível peculato de coisa particular?
SIM, desde que o bem particular esteja sob custódia da Administração Pública.
Para se caracterizar o crime, o sujeito tem que ser funcionário público, e deverá estar regularmente nomeado, e ter tomado posse no cargo público?
Sim.
→ Caso o sujeito não seja funcionário público, mas sim usurpador, o crime não será de peculato, podendo estar caracterizado outro delito (v.g., furto, apropriação, estelionato, etc).
→ caso o sujeito, embora nomeado, não tenha sido investido em suas funções, pois não tomou posse ou não prestou o devido compromisso, o crime será descaracterizado para estelionato, pois o sujeito é considerado “funcionário de fato”.
→ caso o sujeito tenha sido nomeado e sido investido em suas funções, mas a nomeação foi ilegal, o crime será de peculato, pois o agente é considerado funcionário público até a anulação de sua nomeação.
Diante das hipóteses previstas no decreto-lei 201, o prefeito não pode incidir em nenhuma modalidade de peculato?
Para os Prefeitos, não é possível a adequação típica do crime de peculato doloso em suas modalidades “peculato apropriação” e “peculato desvio”. Nessas hipóteses, incide a regra especial estatuída pelo art. 1º do Decreto-Lei n. 201/1967.
Entretanto, subsiste a possibilidade de incidência do “peculato furto” e “peculato culposo”, pois tais condutas não estão previstas no mencionado diploma.
Qual a pena do crime de peculato culposo?
DETENÇÃO de 3 meses a 1 ano.
Peculato culposo
§ 2º - Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem:
Pena - detenção, de três meses a um ano.
É o único crime funcional culposo.
Esse delito acontece quando o agente público concorre para o crime doloso de outra pessoa, infringindo seu dever de cuidado objetivo, criando condições favoráveis à prática de um crime pelo terceiro.
Essa outra pessoa pode ser um particular (extraneus) ou um outro funcionário público (intraneus).
Haverá o crime de peculato culposo se o agente público negligente concorre para a prática de delito não funcional, como, por exemplo, um furto?
A maioria da doutrina nega tal possibilidade. Para ela, só configura peculato culposo quando o crime praticado por outrem for um peculato doloso. Contudo, parte minoritária da doutrina entende possível, vez que a ação delituosa do servidor é idêntica e o dano à administração é exatamente o mesmo.
Cabe tentativa no crime de peculato culposo?
Não cabe tentativa de peculato culposo. Ele se consuma quando aperfeiçoado o crime praticado por outro. Assim, se o crime doloso ficar na fase da tentativa, não se aperfeiçoa o peculato culposo.
A reparação do dano no crime de peculato extingue a punibilidade?
Somente em relação ao crime de peculato culposo.
Peculato culposo
§ 2º - Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem:
Pena - detenção, de três meses a um ano.
§ 3º - No caso do parágrafo anterior, a reparação do dano, se anterior à sentença irrecorrível, extingue a punibilidade; se lhe é posterior, reduz de metade a pena imposta.
O que é o crime de peculato estelionato?
É o peculato mediante erro de outrem, previsto no artigo 313 do CP - consiste na captação indevida, por parte do funcionário público, de dinheiro ou outra utilidade mediante o aproveitamento ou a manutenção do erro alheio.
Todavia, a conduta mais se assemelha à figura da apropriação de coisa havida por erro, aqui qualificada pela condição funcional do sujeito ativo.
O erro do ofendido deve ser espontâneo, pois se foi provocado pelo agente público, o caso será de estelionato.
Não há necessidade de dolo no momento em que o funcionário público recebe a coisa, que deve existir no instante em que ele se apropria do bem – dolo superveniente.