Constitucional (resumo livro Daniel Sarmento) Flashcards

1
Q

O que se entende por atividade legislativa heterônoma?

A

Se dá quando o Poder Judiciário assume postura legislativa. Essa criação judicial do direito pode gerar diversas espécies de decisões:

  • sentença interpretativa de rechaço: a Corte adota a interpretação que se adequa à CF, repudiando qualquer outra que contrarie o texto constitucional.
  • sentença interpretativa de aceitação: a Corte anula decisão tomada pela magistratura comum, que adotou interpretações ofensivas à CF.
  • sentença manipuladora: a Corte não se limita a declarar a inconstitucionalidade das normas, mas, agindo como legislador positivo, modifica (manipula) diretamente o ordenamento jurídico, a pretexto de adequá-lo à CF. Essas sentenças manipuladoras são divididas em sentenças aditivas (a Corte diz que a norma é inconstitucional em razão do que ela omite, como no caso das decisões que permitem o aborto de feto anencéfalo, direito de greve dos servidores públicos, etc.) e sentenças substitutivas.
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2
Q

Quem são os principais autores responsáveis pela distinção entre princípios e regras?

A

Muitos autores atribuem a Alexy a originalidade da distinção entre regras e princípios. Entretanto, não se pode esquecer de importante ensaio publicado por Ronald Dworkin, em meados de 1967, sendo depois republicado como capítulo da obra “Levando os direitos a sério”, em 2002.

Os princípios passaram a ser vistos como um conceito de norma jurídica, passando essa a ser formada agora por duas espécies distintas: regras jurídicas e princípios jurídicos.

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3
Q

Por que se diz que os princípios, como espécies de normas jurídicas, também têm conteúdo deôntico?

A

Porque passaram a expressar um dever, estabelecendo obrigações, permissões ou proibições de conduta.

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4
Q

Canotilho, recorrendo a uma gama de autores (Larenz, Esses, Alexy, Dworkin, entre outros), apresenta uma síntese sobre os principais critérios diferenciadores entre as regras e os princípios. Quais são eles?

A

1) GRAU DE ABSTRAÇÃO: enquanto os princípios possuem grau de abstração elevado, as regras possuem abstração reduzida;
2) GRAU DE DETERMINABILIDADE NO CASO CONCRETO: os princípios, por serem vagos e imprecisos, carecem de mediações concretizadoras (do legislador ao juiz), enquanto que as regras são suscetíveis de aplicação direta;
3) CARÁTER DA FUNDAMENTABILIDADE: os princípios são normas de natureza estruturante e de papel fundamental no ordenamento jurídico (exemplo: princípio do estado de direito);
4) proximidade da ideia de direito: os princípios são ‘standarts’ juridicamente vinculantes radicados na exigência de justiça (segundo Dworkin); já as regras podem ser normas vinculativas com conteúdo meramente funcional;
5) natureza normogenética: os princípios são os fundamentos das regras, isto é, são normas que estão na base ou constituem a ratio de regras jurídicas, desempenhando por isso uma função normogenética fundamentante.

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5
Q

Quais são as teses fraca e forte para distinguir princípios das regras?

A

Alexy afirma que a distinção com base no grau de generalidade e abstração (em que os princípios seriam normas de um grau de generalidade e abstração mais alto que as regras), é uma tese fraca, eis que a distinção é meramente quantitativa, ou seja, de grau de abstração de cada espécie normativa.

Para Alexy, a tese forte da separação entre regras e princípios, também chamada de tese qualitativa, é aquela que toma o modo de aplicação de cada espécie de norma como critério distintivo suficiente da separação – ou seja, o modo como o conflito é resolvido. Assim, para a tese forte, a generalidade não é um critério adequado para distinguirmos as regras dos princípios, sendo incapaz de proporcionar uma diferenciação essencial. A distinção deve ocorrer pelo MODO DE APLICAÇÃO de cada espécie normativa, bem como na forma de proceder em caso de um conflito normativo.

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6
Q

Uma das diferenças entre regras e princípios é que as regras são aplicáveis na maneira do “tudo-ou-nada” (all-or-nothing)?

A

SIM. Assim, se a regra é válida, ela deve ser aplicada da maneira como preceitua, nem mais nem menos, conforme um procedimento de subsunção silogístico. Diante de um conflito de regras, Alexy afirma que apenas uma delas deve ser considerada válida, enquanto que a outra não somente não será considerada pela decisão, como deverá ser retirada do ordenamento jurídico, por ser considerada inválida, salvo se se tratar de cláusula de exceção.

Já os princípios não são razões determinantes para uma decisão, ou seja, não são mandamentos definitivos. Os princípios apresentam obrigações prima facie, na medida em que podem ser superadas em razão de outros princípios, ou seja, não são obrigações absolutas como as regras. Há uma diferença entre aquilo que é garantido (ou imposto) prima facie e aquilo que é garantido definitivamente. Pode-se dizer que há um longo caminho entre um e outro.

É por isso que Alexy afirma que, nos casos de colisões entre princípios, há uma DIMENSÃO DE PESO, exigindo para sua aplicação um mecanismo de proporcionalidade. Assim, os princípios seriam normas que obrigam que algo seja realizado na maior medida do possível, de acordo com as possibilidades fáticas e jurídicas do caso concreto. Assim, Alexy afirma que os princípios apresentam a natureza de mandamentos de otimização.

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7
Q

Qual a diferença entre princípios e postulados?

A

Para Ávila, os postulados não seriam normas, mas sim metanormas, “situam-se num segundo grau e estabelecem a estrutura de aplicação de outras normas, princípios e regras”, ou seja, os postulados não impõem a promoção de um fim, mas, em vez disso, estruturam a aplicação do dever de promover um fim, além disso, não prescrevem comportamentos, mas modos de raciocínio e de argumentação relativamente a normas que indiretamente prescrevem comportamentos. São exemplos de postulados a ponderação, a concordância prática e a proibição de excesso, bem como a igualdade, razoabilidade e proporcionalidade.

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8
Q

O que é a ideia de derrotabilidade das regras?

A

Atualmente muitos autores, entre eles Humberto Ávila, começam a reconhecer a ideia da derrotabilidade das regras (defeasibility), superando o modelo do ‘tudo ou nada’, defendido por Dworkin. Essa ideia de derrogabilidade vem sendo atribuída a Hart, em que o julgador insere uma exceção no interior da regra.

O termo “derrotabilidade” consiste na ideia segundo a qual a consequência da norma jurídica pode ser afastada, não aplicada, em razão da existência de um fato, interpretação ou circunstância com ela incompatível.

Ou seja, a derrotabilidade (ou superabilidade) de uma regra implica a não incidência de uma norma existente, válida e eficaz, ou seja, embora tenha percorrido todos os degraus da escada ponteana, não se sagra vitoriosa no caso que normatizou. Nisso se distingue do controle de constitucionalidade, afinal, enquanto a sindicância de constitucionalidade aquilata a validade das normas, a derrotabilidade trabalha com uma norma válida, mas episodicamente afastada em nome do que é (ou parece ser) justo.

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9
Q

Cada vez mais cortes nacionais e internacionais têm realizado comparações judiciais ao decidirem casos submetidos às suas respectivas jurisdições. Há três doutrinas que tratam a respeito do tema. Quais são elas?

A

1) invocação obrigatória de fonte estrangeira – os tribunais nacionais estão obrigados a usar o direito internacional ou estrangeiro no momento em que eles decidirem alguns tipos de casos.
2) invocação aconselhável de fonte estrangeira – não há nenhuma obrigação de o tribunal recorrer a fontes não domésticas, mas há certo consenso, recomendação ou indicação para a consulta a fontes externas como sendo o correto modo de um juiz ou tribunal proceder.
3) invocação voluntária de fonte estrangeira - mesmo não havendo no sistema jurídico interno qualquer norma obrigando ou recomendado a consulta a fontes estrangeiras ou internacionais, os tribunais, ainda assim, recorrem a elas, mesmo àquelas nas quais não houve qualquer inspiração por parte do legislativo ou constituinte nacional.

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10
Q

Quais são os argumentos contrários ao uso da comparação judicial entre fontes estrangeiras?

A

O relativismo cultural enfatiza que as normas constitucionais, especialmente as definidoras de direitos fundamentais, devem ser interpretadas de acordo com as circunstâncias nacionais particulares e com a história constitucional nacional de cada país, bem como com a cultura jurídica e com a história da nação. Assim, para o particularismo, a jurisprudência comparativa não oferece qualquer ajuda, precisamente por que ela vem de fora de um determinado sistema jurídico. Seu uso seria uma forma de imperialismo jurídico.

Tais ideias são frequentemente associadas a um tipo particular de NACIONALISMO JURÍDICO. Segundo os particularistas, as constituições representam a auto-constituição e a auto-expressão de comunidades particulares. Vistas desta maneira, as constituições representam um papel “expressivista”, revestindo a nação de identidade própria e auto-compreensão.

Um particularista de renome foi o juiz Antonin Scalia, segundo o qual “nós não devemos esquecer que é uma Constituição para os Estados Unidos da América que estamos julgando”.

Argumentos baseados na SOBERANIA POPULAR e na DEMOCRACIA também são invocados em nome de uma postura de resistência.

Há duas críticas quase universais à invocação voluntária do direito estrangeiro por tribunais e juízes nacionais:
1. a primeira delas diz respeito à ausência de metodologia ou de critérios a serem empregados - os tribunais e juízes escolhem os precedentes estrangeiros e internacionais mais adequados para apoiarem seus próprios pontos de vistas.

  1. a segunda crítica é a de que, mesmo nos casos em que os juízes e tribunais se esforçam em selecionar e invocam de boa-fé fontes estrangeiras em suas decisões, eles falham em identificar quais materiais comparativos são apropriados. Isso se dá devido ao fato de eles não compreenderem satisfatoriamente os contextos sociais e os sistemas jurídicos dos países dos quais os materiais comparativos são invocados, o que pode acarretar disfunções de alguma ordem no sistema doméstico.
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11
Q

Quais são os princípios de interpretação constitucional?

A

Ao lado dos métodos de interpretação, a doutrina estabelece alguns princípios específicos de interpretação e que podem ser assim esquematizados:

  1. princípio da unidade da constituição;
  2. princípio do efeito integrador;
  3. princípio da máxima efetividade;
  4. princípio da justeza ou da conformidade;
  5. princípio da harmonização ou da concordância prática;
  6. princípio da força normativa da constituição.
  7. princípio da interpretação conforme a constituição.
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12
Q

O que é o princípio da justeza ou da conformidade?

A

O STF, ao concretizar a norma constitucional, não poderá alterar a repartição das funções constitucionalmente estabelecidas pelo poder constituinte originário, chegando a um resultado que subverta ou perturbe o esquema organizatório-funcional constitucionalmente estabelecido. Exemplo: o Poder Judiciário não pode atuar como legislador positivo.

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13
Q

O que é o princípio da harmonização ou da concordância prática?

A

O aplicador das normas constitucionais, ao se deparar com situações de concorrência entre bens constitucionalmente protegidos (normalmente direitos fundamentais), deve adotar a solução que otimize a realização de todos eles, mas, ao mesmo tempo, não acarrete a negação de nenhum. Essa avaliação nunca é feita a priori, mas apenas no momento da aplicação do texto, quando se pode coordenar, ponderar e, ao final, conciliar os bens e valores constitucionais em conflito. A concordância prática há de ser encontrada em cada caso concreto, segundo os parâmetros oferecidos pelo princípio da proporcionalidade, buscando sempre que a medida de sacrifício de um dos bens em colisão, para a solução justa e proporcional do caso concreto, não exceda o estritamente necessário.

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14
Q

O que é o princípio da força normativa da Constituição?

A

Idealizado por Konrad Hesse, a constituição tem força ativa para alterar a realidade. Como decorrência dessa teoria, surge o princípio da força normativa da CF, para o qual, a partir dos valores sociais, o intérprete deve extrair a aplicabilidade e eficácia de todas as normas da CF, conferindo-lhes sentido prático.

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15
Q

O que é o princípio do efeito integrador?

A

A resolução dos problemas constitucionais deve dar prevalência aos pontos de vista que favoreçam a integração política e social.

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16
Q

O que é o princípio da máxima efetividade?

A

Também chamado de princípio da eficiência ou da interpretação efetiva, deve ser entendido no sentido de que à norma constitucional deve ser atribuído o sentido que lhe confira maior eficácia, maior aptidão para produzir os efeitos que lhe são próprios. Embora se trate de um princípio aplicável a toda norma constitucional, tem espaço de maior realce no campo das normas programáticas e dos direitos fundamentais (art. 5º, §1º da CF).

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17
Q

O que é o princípio da unidade da constituição?

A

O intérprete deve considerar a CF em sua globalidade e procurar harmonizar os espaços de tensão entre as normas constitucionais a concretizar.

Dessa forma, as normas constitucionais devem ser vistas não como normas isoladas, mas como preceitos integrados num sistema unitário de regras e princípios, que é instituído na e pela própria Constituição. Não se pode separar uma norma constitucional do conjunto em que ela se integra. Eros Grau: “não se interpreta o direito em tiras, aos pedaços”.

Uma das principais utilidades do princípio da unidade da Constituição é afastar a tese da hierarquia entre normas da CF (teoria das normas constitucionais inconstitucionais), o qual sugeria a existência de normas superiores e inferiores dentro do texto constitucional originário.

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18
Q

O que é o princípio da interpretação conforme a constituição?

A

Diante de normas plurissignificativas, deve-se preferir a exegese que mais se aproxime da Constituição, e, portanto, não seja contrária ao texto constitucional.

Só se admite a interpretação conforme a constituição se existir um espaço de decisão, e dentre as várias a que se chegar, deverá ser aplicada em conformidade com a CF. Por fim, não se aceita a interpretação conforme a CF quando, pelo processo de hermenêutica, se obtiver uma nova regra distinta daquela objetivada pelo legislador (o intérprete não pode atuar como legislador positivo).

Ademais, modernamente se tem dito que esse princípio consubstancia um mandado de otimização do querer constitucional, significando que, entre diversas exegeses igualmente compatíveis com a Constituição de uma mesma norma, deve-se escolher a que mais se orienta para a Constituição ou a que melhor corresponde às decisões do constituinte.

O âmbito de aplicação desse princípio é, frequentemente, o da interpretação das leis, mas também pode ser aplicado à interpretação de Emendas Constitucionais (também passíveis de controle de constitucionalidade)

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19
Q

Na República, o cidadão tem apenas direitos?

A

NÃO, além de direitos, têm deveres em relação à comunidade política. No republicanismo, o sistema de governo conta com cidadãos engajados que participam do governo junto com os políticos. Enfatiza-se a importância da esfera pública como local de troca de razões.

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20
Q

O republicanismo tem em comum com o comunitarismo a crítica à visão atomizada e individualista de sociedade própria ao liberalismo?

A

SIM. Porém, enquanto o foco do comunitarismo está no respeito às tradições e valores compartilhados, no republicanismo o foco está na participação do cidadão na coisa pública.

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21
Q

Cite uma das maiores bandeiras do republianismo moderno.

A

O republicanismo moderno dá grande ênfase à igualdade. Perante a res publica, todos devem ser tratados com igual respeito. Nesse sentido, uma das maiores bandeiras republicanas é o combate ao privilégio conferido aos governantes ou à elite.

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22
Q

A diferenciação entre procedimentalistas e substancialistas pode ser usada para discutir o papel da Constituição na sociedade, bem como para debater o espaço adequado da jurisdição constitucional?

A

SIM. Em relação ao papel da Constituição na sociedade, as teorias procedimentais sustentam que o papel da Constituição é definir as regras do jogo político, assegurando a sua natureza democrática. Isso inclui também a defesa de determinados direitos, que são tidos como pressupostos para o funcionamento da democracia, como as liberdades de expressão e de associação política.

O procedimentalismo defende que as decisões sobre temas controvertidos no campo moral, econômico, político etc., não devem estar contidas na Constituição, cabendo ao povo em cada momento deliberar sobre esses temas.

O principal fundamento desta posição é o princípio democrático, pois parte da premissa de que a constitucionalização de uma decisão, por importar na supressão do espaço de deliberação das maiorias políticas futuras, deve ser vista com muita cautela.

Já o substancialismo adota posição inversa, sustentando a legitimidade da adoção de decisões substantivas pelas constituições, sobretudo no que concerne aos direitos fundamentais. O neoconstitucionalismo e a teoria da constituição dirigente se situam claramente no campo do substancialismo, por conceberem papéis bastante ambiciosos para as constituições.

No campo da jurisdição constitucional, os procedimentalistas defendem um papel mais modesto do Judiciário, sustentando que ele deve adotar uma postura de autocontenção, a não ser quando esteja em jogo a defesa dos pressupostos de funcionamento da própria democracia. Já os substancialistas advogam um papel mais ativo para a jurisdição constitucional mesmo em casos que não envolvam os pressupostos da democracia.

Os dois principais autores do procedimentalismo na teoria constitucional são jurista norte-americano John Hart Ely e o filósofo alemão Jurgen Habermas.

Ely justifica uma atuação judicial mais enérgica apenas em duas situações:

(i) para manter abertos os “canais de participação política” e
(ii) para proteger minorias estigmatizadas, que são as eternas perdedoras no processo político majoritário. Atuando dessa forma, a jurisdição constitucional fortaleceria a democracia.

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23
Q

Como pode ser entendida a concepção procedimental formulada por Habermas?

A

Mais densa e sofisticada é a concepção procedimental formulada por Jürgen Habermas, que parte de pressupostos filosóficos complexos. Habermas busca conciliar, em sua filosofia política, as duas principais tradições do iluminismo: a tradição constitucionalista liberal inspirada em Kant, preocupada com a defesa das liberdades individuais e da autonomia privada do cidadão; e a tradição democrática, inspirada em Rousseau, voltada para a defesa da soberania popular e autonomia pública do cidadão. O seu projeto é o de construir um sistema em que autonomia pública e privada se complementem, sendo concebidas como “co-originárias”.

A justificação dos direitos fundamentais, pela teoria de Habermas, é PROCEDIMENTAL, e não metafísica. Os direitos fundamentais passam a ser compreendidos como CONDIÇÕES VIABILIZADORAS DA PARTICIPAÇÃO DOS CIDADÃOS NA FORMAÇÃO DO CONSENSO DEMOCRÁTICO.

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24
Q

Como Habermas identifica a democracia?

A

Na perspectiva habermasiana, a democracia não se identifica com o governo das maiorias. Ela não representa apenas uma forma de agregação de interesses individuais conflitantes, que permita a prevalência das posições que favoreçam ao maior número de pessoas. A democracia é deliberativa, baseada no diálogo social e nas interações travadas pelos cidadãos no espaço público.

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25
Q

O que racionaliza o processo decisório democrático de acordo com Habermas?

A

É o embate entre os argumentos e contra-argumentos no espaço público que racionaliza o processo decisório democrático. Na deliberação, os participantes podem expor os seus pontos de vista e criticar os argumentos alheios com liberdade e igualdade. Para um contexto propício a essa troca de argumentos, é preciso que sejam garantidas as a liberdade e a igualdade entre os sujeitos.

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26
Q

Qual o conceito de direitos fundamentais pela teoria procedimentalista?

A

A teoria procedimental formula o conceito de direitos fundamentais com base em argumentos centrados na própria noção de democracia: os direitos fundamentais são condições da democracia e devem, por isso, ser mantidos dentro de uma esfera de intangibilidade, a ser protegida pelo Poder Judiciário contra os abusos das maiorias eventuais.

Habermas, nessa linha, critica a visão da Constituição como “ordem de valores”, adotada pelo Tribunal Constitucional alemão, e aponta o caráter antidemocrático e paternalista da concepção daquele tribunal, que se compreende como guardião daqueles valores. Para Habermas, somente as condições processuais da gênese democrática das leis asseguram a legitimidade do direito.

Em que pese a grande sofisticação dessa linha da filosofia constitucional, ela se sujeita a algumas importantes objeções. Em primeiro lugar, o procedimentalismo não parece suficiente para assegurar garantia robusta aos direitos fundamentais extremamente importantes, que não sejam diretamente ligados à deliberação democrática, como a privacidade ou direito à saúde. Esses direitos, apesar de importantes, ficariam expostos à vontade das maiorias de ocasião.

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27
Q

O que é o pragmatismo na teoria constitucional?

A

Para os autores que defendem o pragmatismo, o principal critério para a correção de uma decisão judicial diz respeito às suas consequências. Isso não significa que o direito positivo seja irrelevante, até porque a estabilidade e a preservação das expectativas dos indivíduos e agentes econômicos importam. Deve-se fazer um cálculo de utilidade social, devendo o juiz se voltar muito mais para o futuro do que para o passado.

Inclusive, as consequências advindas da decisão judicial não são apenas aquelas do caso analisado, mas também as sistêmicas. Por isso, se justifica que em determinadas áreas do Direito se mantenha o formalismo, pois se fosse permitido, em determinados domínios mais sensíveis, que os juízes decidissem cada caso de acordo com as suas avaliações consequencialistas de resultado, sem maior atenção às regras em vigor, os resultados gerais para a sociedade seriam danosos, em razão do aumento da insegurança.

Pode-se dizer que o pragmatismo jurídico é empirista, pois tende a atribuir mais importância aos dados da realidade do que às construções teóricas. Por isso, se aproxima mais das ciências empíricas, como Economia e Sociologia.

O pragmatismo rejeita as especulações filosóficas muito abstratas e desvinculadas da realidade concreta, como as da metafísica. Tem como características o antifundacionalismo, o contextualismo e o consequencialismo.

O antifundacionalismo é a rejeição da busca de qualquer fundamento último para as teorias e argumentos. O contextualismo enfatiza a importância do contexto histórico e das experiências humanas de cada sujeito nas investigações científicas ou discussões teóricas. Nesse sentido, o contextualismo se aproxima do relativismo. Já o consequencialismo preconiza que se priorizem sempre as soluções que produzam melhores resultados práticos.

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28
Q

O que são normas de segundo grau?

A

São postulados normativos que instituem critérios para aplicação de outras normas - metanormas.

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29
Q

Desde o surgimento das constituições escritas até o século XX, quais eram os métodos de interpretação da constituição?

A

Os mesmos do direito civil (método hermenêutico clássico) - partia-se da premissa que a Constituição, por ser uma espécie de lei, deveria ser interpretada por meio dos mesmos elementos tradicionais desenvolvidos por Savigny para a interpretação das leis em geral, quais sejam os elementos gramatical, sistemático, lógico e histórico.

Somente com o reconhecimento definitivo da normatividade das constituições após o fim da 2ª Guerra Mundial e a constatação da insuficiência dos métodos tradicionais para a resolução de questões complexas envolvendo a Constituição é que a doutrina alemã desenvolveu métodos específicos.

Peter Häberle sustenta a COMPARAÇÃO CONSTITUCIONAL como um quinto método de interpretação constitucional, além dos quatro desenvolvidos por Savigny. Para ele, a interpretação dos institutos se dá mediante comparação dos vários ordenamentos jurídicos, de modo a promover a abertura da sociedade para fora.

“Estado Constitucional Cooperativo é o Estado que justamente encontra a sua identidade também no Direito Internacional, no entrelaçamento das relações internacionais e supranacionais, na percepção da cooperação e responsabilidade internacional, assim como no campo da solidariedade. Ele corresponde, com isso, à necessidade internacional de políticas de paz” (HÄBERLE, 2007, p. 4).

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30
Q

O que é o método científico-espiritual de interpretação constitucional?

A

O método científico-espiritual, também conhecido como método valorativo ou sociológico, parte da premissa que a interpretação constitucional deve considerar o sistema de valores subjacentes à Constituição (método valorativo), assim como a importância desta no processo de integração comunitária (método integrativo).

A Constituição deve ser interpretada como um todo (“visão sistêmica”), sendo levados em consideração fatores extraconstitucionais, tais como a REALIDADE SOCIAL CAPTADA A PARTIR DO ESPÍRITO REINANTE NAQUELE MOMENTO (método sociológico).

Esse método entende a Constituição como um SISTEMA CULTURAL e de VALORES DE UM POVO (espírito do povo), cabendo à interpretação aproximar-se desses valores. Assim, a constituição adquire mais uma feição política do que jurídica. O texto não é um limite intransponível para o intérprete, pois a Constituição e a Sociedade (ou a realidade social) devem interagir, de maneira que os seus espíritos (ou valores) se mantenham compatíveis. A Constituição é um instrumento de integração política, social e econômica da sociedade.

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31
Q

O que é o método da tópica (tópico-problemático)?

A

Por meio desse método, parte-se de um problema concreto para a norma. Para a tópica “pura”, o sistema é apenas mais um topos a ser levado em conta na busca da decisão para o caso concreto. Toma a CF como um conjunto aberto de regras e princípios, dos quais o aplicador deve escolher aquele que seja mais adequado para a promoção de uma solução justa ao caso concreto que analisa. O foco, para o método, é o problema. O intérprete busca resolver o problema constitucional a partir do próprio problema, após a identificação ou o estabelecimento de certos pontos de partida. É um método aberto, fragmentário ou indeterminado, que dá preferência à discussão do problema em virtude da abertura textual das normas constitucionais.

O método tem como ponto de partida o problema e como ponto de apoio o consenso ou o senso comum, os quais são revelados, e.g., pela doutrina dominante ou pela jurisprudência pacífica. O compromisso central do intérprete passa a ser, portanto, o de encontrar a melhor solução para o “problema” apresentado.

A partir das topoi, que são pontos de vistas admitidos de forma generalizada, o intérprete deve dar uma solução justa ao caso concreto e, posteriormente, buscar a norma constitucional que melhor se adeque àquela solução encontrada.

O método tópico se contrapõe ao sistemático, pois tem a proposta de resgatar um raciocínio dirigido ao problema, e não à norma ou ao sistema.

É criticado, porém, por correr o risco de conduzir a um casuísmo ilimitado.

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32
Q

O que é o método hermêneutico-concretizador?

A

Segundo este método, elaborado por Konrad Hesse, o método tópico-problemático exagera ao desvencilhar a solução hermenêutica da norma jurídica. Esse método, diferentemente do tópico-problemático, parte da Constituição para o problema.

O caso concreto, o problema a ser desvendado, também é importante para o método hermenêutico-concretizador, mas, diferentemente do método da tópica, o primado não é do problema, mas do texto constitucional.

O intérprete parte, na verdade, da pré-compreensão da norma para o problema, embora o próprio problema também influencie a compreensão sobre a norma, em um verdadeiro círculo hermenêutico.

O método hermenêutico-concretizador parte do pressuposto que a interpretação constitucional é concretização, entendida como uma norma preexistente na qual o caso concreto é individualizado.

Os pressupostos interpretativos são:

1) pressuposto subjetivo (o intérprete parte de suas pré-compreensões sobre o tema para obter o sentido da norma);
2) pressupostos objetivos (o intérprete atua como mediador entre a norma e a situação concreta, tendo como ‘pano de fundo’ a realidade social);
3) círculo hermenêutico (é o movimento de ‘ir e vir’ do subjetivo para o objetivo, até que o intérprete chegue a compreensão da norma).

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33
Q

O que é o método normativo-estruturante?

A

Idealizado por Friedrich MÜLLER, parte da premissa de que direito e realidade não subsistem autonomamente, por ser impossível isolar a norma da realidade, deve-se falar em concretização, e não em interpretação. Esta é apenas um dos elementos, ainda que dos mais importantes, do processo de concretização.

Segundo esse método, o texto normativo é só a ponta do iceberg normativo, pois o intérprete deve levar em consideração inúmeros outros fatores além do texto constitucional no momento de interpretar.

MÜLLER faz uma distinção entre a norma e o texto normativo: a norma não se confunde com o seu texto, pois tem a sua estrutura composta também pela realidade social em que incide, sendo esse elemento indispensável para a extração do significado da norma. Não é o teor literal da norma (seu texto) que efetivamente regulamenta um caso concreto, mas sim o órgão legislativo, o órgão governamental, o funcionário da administração pública, os juízes e todos aqueles que elaboram, decidem e fundamentam a decisão reguladora do caso concreto.

A norma jurídica não se identifica com seu texto (expresso), pois ela é o resultado de um processo de concretização. O texto da norma não possui normatividade, mas sim apenas VALIDADE.

Segundo esse método, é possível o raciocínio orientado para o problema, desde que não ultrapasse o texto da norma. Nesse método, há influência da jurisprudência, doutrina, história, cultura e das decisões políticas.

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34
Q

O que se entende pela teoria da argumentação jurídica?

A

O que normalmente se entende hoje por teoria da argumentação jurídica tem sua origem numa série de obras dos anos 50 (século XX), e as três mais relevantes como precursoras das atuais teorias da argumentação jurídica são: a tópica de Viehweg; a nova retórica de Perelman e a lógica informal de Toulmin.

A) A tópica de VIEHWEG: Na linha de Aristóteles e Cícero, Viehweg entende por tópica um processo especial por tratamento de problemas, que se caracteriza pelo emprego de certos pontos de vista, questões e argumentos gerais, considerados pertinentes (os tópicos). Os tópicos são pontos de vista, com validade geral, que servem para ponderação dos prós e dos contras das opiniões e podem conduzir-nos ao que é verdadeiro. Sua tese é a forma de pensar tópico-problemática da jurisprudência romana, que construía sua justiça a partir de decisões concretas e daí extraia princípios que lhe servissem de fundamento de validade. Sistema é a contraposição da tópica. Viehweg caracteriza a tópica por três elementos: (i) é uma técnica do pensamento problemático; (ii) opera com a noção de topos (pontos de vista aceitáveis em toda parte); (iii) sua atividade é a busca e exame de premissas.

B) A nova retórica de PERELMAN: Perelman pretendia demonstrar a aptidão da razão para lidar também com valores, organizar preferências e fundamentar, com razoabilidade, nossas decisões. Para ele as deliberações humanas ou preferências razoáveis deixam de ser arbitrárias à medida que se apresentam por meio de justificativas. Perelman apresenta como fórmula de justiça o tratamento igual para aqueles considerados iguais, segundo critérios estabelecidos de acordo com os valores que venham a informar o que ele chama de “justiça concreta.” Para Perelman, raciocinar não é somente deduzir e calcular, mas é também deliberar e argumentar. Essa argumentação será qualificada de racional quando se achar que ela é válida para um auditório universal, constituído pelo conjunto das mentes razoáveis. Perelman verifica que onde há controvérsia prevalecem, em vez da lógica, as técnicas da argumentação, que se apresentam como via propícia ao acordo.

C) A lógica informal de TOULMIN: parte da mesma constatação de Viehweg e Perelman, a saber, a insuficiência da lógica formal dedutiva para dar conta da maioria dos raciocínios; mas, a sua concepção se diferencia porque sua crítica consiste em se opor a uma tradição que parte de Aristóteles que pretende fazer da lógica uma ciência formal comparável a geometria. Toulmin, ao contrário, propõe deslocar o centro de atenção da teoria lógica para à prática lógica. A Toulmin não interessa uma “lógica idealizada”, e sim uma lógica eficaz ou aplicada; e, para produzir essa eficácia ele escolhe como modelo não a geometria, mas a jurisprudência. A lógica, podemos dizer, é jurisprudência generalizada. Segundo Toulmin o modelo de análise tradicional da lógica é excessivamente simples. Enquanto a lógica só distingue entre premissas e conclusão, para Toulmin parece essencial introduzir proposições para dar conta dos argumentos substanciais e não formais. Estabelecendo critérios sobre a correção material dos argumentos, Toulmin pretende se aproximar mais das argumentações que ocorrem na realidade, do que os esquemas habituais da lógica formal.

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35
Q

O que se entende por teoria padrão da argumentação jurídica?

A

As teorias desenvolvidas por Cormick e Alexy constituem o que se poderia chamar de teoria padrão da argumentação jurídica. Nesta teoria, a perspectiva de análise das argumentações jurídicas se situa num conceito de justificação dos argumentos. Haveria aqui uma justificação formal dos argumentos (argumentos formalmente corretos) e uma justificação material (que se refere a aceitabilidade do argumento).

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36
Q

Conceitue princípio da proporcionalidade.

A

Inicialmente, interessante registrar que parte da doutrina entende que o termo “princípio” não designa bem esse instrumento. A rigor, a proporcionalidade, tal qual é conhecido pelo Direito Alemão, não é um princípio, mas sim um POSTULADO NORMATIVO (“máxima da proporcionalidade” é o termo utilizado por Alexy). Não é princípio porque a proporcionalidade não é ponderada diante de outros princípios; trata-se na verdade de uma estrutura formal de pensamento. Ela não tem um conteúdo próprio, é apenas um modo de raciocínio da aplicação dos princípios.

A proporcionalidade envolve três regras: adequação, necessidade (princípio da menor ingerência possível) e proporcionalidade em sentido estrito. Quando vai se analisar se uma medida estatal é proporcional ou não, é preciso que ela passe pelo crivo dessas três regras. Assim, a medida deve ser adequada, necessária e proporcional em sentido estrito. Tal procedimento teórico é, na realidade, uma construção alcançada a partir de uma teoria da argumentação jurídica, que, se seguida, conduziria a decisões dotadas sempre de racionalidade, segundo dizeres de Alexy.

Esse caminho seria um verdadeiro critério racional da ponderação, onde a racionalidade da decisão se dá a partir de uma perspectiva formal, ou seja, se forem observadas as sub-regras (ou máximas) da proporcionalidade – que sempre são estruturadas de maneira a funcionarem sucessiva e subsidiariamente, mas nunca aleatoriamente. Por isso, nem sempre será necessária uma análise de todas as três sub-regras.

A ADEQUAÇÃO, também chamada de princípio da idoneidade ou da conformidade, envolve uma relação entre meio e fim. O meio utilizado pelo Estado tem que ser um meio APTO a atingir o fim almejado.

Há dois pontos envolvidos dentro dessa análise da adequação (e hoje alguns autores vêm tratando esses dois passos como requisitos distintos do princípio da proporcionalidade): o OBJETIVO LEGÍTIMO e o MEIO LEGÍTIMO.

Se o objetivo do Estado não for legítimo, o meio não pode ser considerado adequado, proporcional.

Além do objetivo legítimo, é necessário verificar se o meio empregado pelo Estado é legítimo. Exemplo: reduzir os custos da execução penal é um objetivo legítimo. Agora, utilizar como meio para isso a pena de morte, seria utilização de um meio ilegítimo, para atingir um fim legítimo.

O segundo ponto a ser analisado no princípio da proporcionalidade é a NECESSIDADE DA MEDIDA. Medida necessária ou exigível significa que existindo mais de um meio similarmente eficaz, deve-se optar pelo menos oneroso/gravoso possível. Como esses meios vão implicar na restrição de outros direitos fundamentais, é preciso que se escolha a opção que menos restrinja-os.

Um ato que limita um direito fundamental só será considerado necessário se para realizar seu objetivo pretendido não houver outra medida ou ato que limite em menos intensidade (menos gravidade) o direito fundamental a ser atingido.

Obs.: enquanto a adequação exige um exame absoluto do ato, a necessidade demanda um exame comparativo do ato.

O terceiro passo é a PROPORCIONALIDADE EM SENTIDO ESTRITO, que corresponde à ponderação, e apenas acontecerá depois de verificado que o ato é adequado e necessário.

Ao analisar a proporcionalidade em sentido estrito deve-se verificar o grau de restrição e de promoção causado por aquela medida. Robert Alexy utiliza o que ele chama de “lei material de sopesamento” - quando você tem uma medida que restringe um direito fundamental, é necessário que a promoção do outro direito fundamental que ela visa seja maior que essa restrição, caso contrário essa medida não será proporcional em sentido estrito. Aí que entra a ponderação entre as duas medidas.

Há aqui um raciocínio baseado na relação custo-benefício da norma avaliada, isto é, o ônus imposto pela norma deve ser inferior ao benefício (bônus) que pretender gerar.

Robert Alexy afirma que quando há uma dúvida fundada se a medida é proporcional ou não, entra-se na “margem de ação do legislador”, não cabendo ao Poder Judiciário dizer qual a medida mais adequada.

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37
Q

Quais são os cinco níveis de aferição do princípio da proporcionalidade?

A

Segundo o autor alemão Matias Klatt, os outros dois níveis, além da necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito, são: objetivo lícito (o Estado não pode buscar objetivos ilícitos) e meio lícito (o Estado para alcançar seus desideratos deve agir por meios lícitos), sendo o objeto lícito e o meio lícito, a decisão estatal deve ser adequada, necessária e ponderada!

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38
Q

Há diferença entre proporcionalidade e razoabilidade?

A

Como se sabe, alguns autores tratam ‘proporcionalidade’ e ‘razoabilidade’ da mesma forma. É a posição de Barroso e Gilmar Mendes. Contudo, alguns esforços vêm sendo empreendidos para dotar a razoabilidade de algum conteúdo indeterminado e separado do tema ‘proporcionalidade’, ambos teriam conteúdo diferente, como Daniel Sarmento, Humberto Ávila e Virgílio Afonso da Silva.

Algumas tentativas de dar algum conteúdo para razoabilidade:
1) Virgílio entende que a razoabilidade é aquilo que viola o sentido do que é justo. Na verdade, diferencia, mas não avança no sentido de atribuir conteúdo menos vago;

2) Humberto Ávila avança nessa direção e dá três diferentes acepções de razoabilidade (elas não se excluem):
i) de razoabilidade como EQUIDADE – a razoabilidade dá percepção que há situações muito singulares que, embora se subsumam à norma legal, não podem ser aplicadas porque iam gerar injustiça. Exemplo: ambulância que fura semáforo não pode ser multada quando estiver em situação de emergência, pois violaria a razoabilidade;

ii) razoabilidade como CORRESPONDÊNCIA – as normas jurídicas e decisões do estado devem corresponder ao que ordinariamente ocorre, não podem estar em contrariedade à natureza das coisas.
iii) razoabilidade como EQUIVALÊNCIA – a ideia é de não atribuir consequências excessivas a um determinado ato ou comportamento. Exemplo: uma pena alta diante da gravidade do comportamento.

Sem excluir essas três possibilidades, Daniel Sarmento traz outras para o uso da razoabilidade. Uma delas diz respeito à exigência interna no Direito. Ou seja, é a ideia da razoabilidade como coerência.

Outra ideia tem relação com ‘razões públicas’. Ou seja, a razoabilidade é usada como reciprocidade, quando o argumento pode ser usado pelo outro. As razões invocadas pelo estado devem ser razões que possam ser aceitas pelo povo sem que isso envolva uma violência. Não é que elas sejam aceitas, mas precisam ser aceitáveis (aceitabilidade racional das medidas tomadas pelo governo).

Finalmente, há a divisão entre:
- razoabilidade interna: existiria quando não houvesse uma conexão lógica entre a situação em si (o problema que deve ser resolvido), a medida adotada e os efeitos que se espera obter com aquela medida.

  • razoabilidade externa: é a compatibilidade externa seria a incompatibilidade entre a medida adotada e a dimensão social sobre o que é justo e adequado.
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39
Q

Qual a diferença entre interpretação autêntica da interpretação não autêntica?

A

KELSEN distingue a interpretação das normas jurídicas em duas espécies:

  • autêntica, aquela é interpretada pelo órgão com competência para aplicá-la e
  • não autêntica, interpretação realizada por pessoas estranhas ao órgão jurídico, quais sejam as pessoas em geral e a ciência jurídica.
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40
Q

Gustavo Binenbojm afirma que o termo “estado democrático de direito” é a síntese de dois princípios, até certo ponto, antagônicos. Por que?

A

Porque democracia equivale à soberania do povo ou à regra da maioria; já estado de direito equivale à juridicização do poder e respeito aos direitos fundamentais. Assim, o irrestrito poder da maioria poderia subverter as regras jurídicas e vulnerar o conteúdo essencial daqueles direitos, enquanto que a cristalização de determinados princípios jurídicos, pelo estado de direito, poderia acarretar uma indesejável asfixia da vontade popular.

O papel do constitucionalismo é harmonizar esse ideal até um ponto de equilíbrio institucional e desenvolvimento da sociedade política.

Assumindo a democracia como um jogo, a constituição seria o manual de regras e os jogadores os agentes políticos representantes do povo. A jurisdição constitucional assume o papel de árbitro do jogo democrático.

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41
Q

O que seria o risco democrático proveniente das decisões proferidas pelas cortes constitucionais?

A

Se trata da questão da legitimidade democrática das cortes constitucionais, que não decorrem da vontade popular.

Além disso, na visão de Gustavo Binenbojm, esse “risco democrático” é ensejado ainda pela inexistência de qualquer controle de legitimidade a posteriori das decisões da corte constitucional.

Assim, a questão da legitimidade democrática da jurisdição constitucional poderia ser equacionada em dois pontos básicos:

  1. o fato de as cortes constitucionais serem compostas de juízes não eleitos, que não se submetem aos controles periódicos de aferição da legitimidade de sua atuação.
  2. as decisões da corte não são submetidas, em regra, a qualquer controle democrático, salvo por meio de emendas constitucionais que venham a corrigir a jurisprudência do tribunal. Ainda assim, essa solução também não é satisfatória, porque também as emendas podem ser objeto de declaração de inconstitucionalidade pela corte.

A doutrina constitucional clássica justifica a jurisdição constitucional argumentando que:

  • o reconhecimento dos direitos fundamentais independe de previsão legal e deveriam ser assegurados pela jurisdição constitucional em face das maiorias ocasionais;
  • há distinção entre poder constituinte e poder constituído;
  • a constituição é norma jurídica superior, que condiciona qualquer ato produzido no âmbito do estado.
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42
Q

O que são normas constitucionais inconstitucionais?

A

A tese é defendida por Otto Bachof, segundo o qual o direito positivo constitucional está submisso a certas normas de direito natural (direito supralegal).

Assim, utilizando-se como parâmetro normas de direito supralegal, seria possível realizar o controle de constitucionalidade mesmo em relação às normas originais de uma constituição, até para se reputar inconstitucional uma norma fraca da constituição quando em antinomia com outra norma forte da constituição, advinda de um preceito supralegal.

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43
Q

O que é a inconstitucionalidade circunstancial?

A

Situações singulares e excepcionais, como desastres naturais, tsunami, terremoto, pandemia, guerra podem provocar esse fenômeno: uma lei pode ser inconstitucional em razão de sua incompatibilidade com a realidade vivida em determinado momento, o que faz com que ela não se amolde ou passe a não mais se amoldar às exigências constitucionais, ainda que momentaneamente.

Superada a situação, a norma poderá retomar sua compatibilidade com a Constituição.

O fenômeno da inconstitucionalidade circunstancial enfatiza não só ideia de que a Constituição está em vigor, mas também a de que ela está atenta às circunstâncias em seu entorno. Uma vez unidas essas duas ideias, é possível afirmar que a Constituição não é só transformada de acordo com as necessidades de seu tempo, mas também pela situação excepcional vivida por seus destinatários. É em razão dessa relevante plasticidade temporal e circunstancial que podemos falar de uma genuína “Constituição viva”.

Foi exatamente em razão de inúmeros desafios reais e dificuldades concretas e circunstanciais que vários tribunais ao redor do mundo se propuseram a agir pragmaticamente e passaram a proferir decisões ou sentenças intermediárias.

Com o passar do tempo, essas verdadeiras técnicas de decisão empregadas por tribunais de grande reputação tornaram obsoleta a lógica binária segundo a qual esses órgãos só poderia declarar a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade de uma norma. E, para o nosso bem, nenhuma dessas técnicas é desconhecida do Supremo Tribunal Federal, que as aplica rotineiramente em suas decisões.

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44
Q

Segundo Daniel Sarmento, a supremacia constitucional se impõe por meio de dois institutos jurídicos importantes. Quais são eles?

A
  1. a rigidez da constituição - que demanda um procedimento mais difícil para a alteração dos preceitos constitucionais do que o resto da legislação infraconstitucional.
  2. o controle de constitucionalidade dos atos normativos - que permite a invalidação daqueles que contrariem a constituição.

Mas a supremacia da constituição depende ainda de outro elemento, de natureza sociológica, que os textos normativos não têm como impor: a existência de uma CULTURA CONSTITUCIONAL, caracterizada pela generalizada adesão do povo à Constituição estatal.

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45
Q

A constituição sempre foi entendida como norma jurídica?

A

NÃO. Segundo explica Sarmento, descontada a exceção norte-americana, a ideia que prevalecia no mundo constitucional até meados do século XX era de que as constituições não eram normas jurídicas, mas PROCLAMAÇÕES POLÍTICAS, que se destinavam a INSPIRAR A ATUAÇÃO DO LEGISLADOR.

Elas não incidiam diretamente sobre as relações sociais, não geravam direitos subjetivos para os cidadãos, nem podiam ser aplicadas pelos juízes na resolução de casos concretos. Só as leis editadas pelos parlamentos obrigavam e vinculavam; não as solenes e abstratas provisões contidas nos textos constitucionais. O paradigma jurídico vigente era o legalista.

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46
Q

A partir de quando a constituição passou a ser vista como norma jurídica e não mais somente como inspiração para a atuação do legislador?

A

Esse cenário começou a mudar depois do final da II Guerra Mundial, diante da descrença em relação aos poderes políticos majoritários, surgido após a derrota do nazismo.

A realidade histórica revelou a necessidade de criação de mecanismos para a contenção dos abusos do legislador e das maiorias políticas. As constituições do pós-guerra, neste sentido, incorporaram direitos fundamentais, que passaram a ser considerados diretamente aplicáveis, independentemente da vontade do legislador.

No Brasil, essa mudança é mais recente, tendo ocorrido após a promulgação da Constituição de 1988, quando a sociedade começou a enxergar a constituição como autêntica norma jurídica.

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47
Q

Por que e até que ponto pode uma geração adotar decisões vinculativas para as outras que a sucederão? Não seria uma fórmula de governo dos mortos sobre os vivos?

A

O artigo 28 da Constituição francesa continha uma resposta firme para esta indagação: “um povo tem sempre o direito de rever, de reformar e de mudar a sua constituição. Uma geração não pode sujeitar as suas leis às gerações futuras”.

O problema se agrava quando consideramos a presença, no texto constitucional, das chamadas “cláusulas pétreas”.

Mas, se é correto que as constituições limitam o conteúdo de deliberações futuras, não é menos correto que elas também definem AS REGRAS DO JOGO QUE VIABILIZAM ESTAS DELIBERAÇÕES. Com efeito, se a cada nova questão surgida no cenário político fosse necessário definir questões como o “quem” decide (competência), e o “como” se decide (procedimento), seria muito difícil deliberar sobre qualquer tema.

As constituições, ademais, protegem instituições e direitos que são pressupostos para o funcionamento democrático da política — como o direito de voto ou a liberdade de expressão, que permitem que a minoria de hoje possa aspirar converter-se na maioria do futuro.

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48
Q

Da supremacia constitucional resulta a invalidade dos atos normativos contrários à Constituição.

A

CORRETO

Sarmento

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49
Q

O controle de constitucionalidade deve ser efetuado por todos os poderes do estado.

A

CORRETO. É o que explica Daniel Sarmento - o controle realizado pela Administração e pelo Legislativo é denominado de controle político, em oposição ao controle judicial.

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50
Q

Em qual país a associação entre a supremacia da constituição e o controle de constitucionalidade foi feita de forma precursora?

A

Nos Estados Unidos. Embora o texto da constituição norte-americana não preveja o controle judicial de constitucionalidade das leis, a Suprema corte do país, em decisão redigida pelo seu então Presidente John Marshall, o inferiu da supremacia constitucional, no conhecido precedente Marbury x Madison, 1803.

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51
Q

Controle difuso é aquele que pode ser exercido por todo e qualquer órgão do poder judiciário?

A

SIM (definição de Sarmento).

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52
Q

Controle concreto de constitucionalidade é aquele que só pode ocorrer no julgamento de algum litígio intersubjetivo?

A

CORRETO (definição de Sarmento).

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53
Q

Como funciona o controle de constitucionalidade pensado por Hans Kelsen?

A

Hans Kelsen não defendia a atribuição do controle de constitucionalidade a todos os juízes, como no modelo norte-americano. Para ele, os juízes não estariam bem aparelhados para o exercício desta função. Daí por que Hans Kelsen preconizou que este poder fosse concedido com exclusividade a uma Corte Constitucional especializada, composta por juízes investidos em seus cargos por mandatos fixos, indicados pelos órgãos políticos representativos. A Corte atuaria não em casos concretos, mas de forma abstrata, como uma espécie de legislador negativo.

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54
Q

A associação direta entre a supremacia da Constituição e o controle judicial de constitucionalidade — chamada por alguns de “lógica de Marshall”— não é isenta de críticas. É possível afirmar-se numa ordem jurídica a superioridade da Constituição em face da legislação, mas, ainda assim, não se acolher a possibilidade de controle jurisdicional de constitucionalidade.

A

CORRETO - conforme explica Daniel Sarmento, confia-se a prevalência da constituição por outros meios, como a separação dos poderes ou a força da opinião pública.

Aliás, até o final da II Guerra Mundial, a maioria dos países que contavam com constituições rígidas, tidas como superiores, não adotava o controle jurisdicional de constitucionalidade das leis. Portanto, a instituição do controle jurisdicional de constitucionalidade não é consequência lógica inexorável da atribuição de supremacia à Constituição.

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55
Q

O Brasil conta com a possibilidade de controle jurisdicional de constitucionalidade das leis desde o advento da República.

A

CORRETO. No começo, por influência de Ruy Barbosa, se adotou o modelo norte-americano em sua pureza, em que todos os juízes poderiam realizar o controle de constitucionalidade de forma concreta.

A partir da Emenda Constitucional nº 16/65, o modelo se tornou mais complexo, com a introdução do controle abstrato e concentrado de constitucionalidade, inspirado na matriz kelseniana, que passou a conviver lado a lado com o controle concreto e difuso, num sistema misto.

O controle abstrato, todavia, não desempenhava papel relevante no sistema até a Constituição de 88, porque só podia ser deflagrado por iniciativa do Procurador-Geral da República, que, àquela época, era agente público livremente nomeado pelo Presidente da República e a ele politicamente subordinado.

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56
Q

A legitimidade democrática da jurisdição constitucional tem sido questionada em razão da apontada dificuldade contramajoritária do Poder Judiciário, que decorre do fato de juízes, apesar de não serem eleitos, poderem invalidar as decisões adotadas pelo legislador escolhido pelo povo.

A

CORRETO (Daniel Sarmento). No Brasil, se discute sobre a maneira e a intensidade com que juízes e, em geral, o STF, devem empregar o controle de constitucionalidade - de maneira mais modesta e deferente em relação às opções realizadas pelos poderes políticos ou de outra forma.

A dificuldade contramajoritária está no reconhecimento de que, diante da vagueza e abertura de boa parte das normas constitucionais, quem as interpreta e aplica acaba por participar do seu processo de criação.

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57
Q

Há, na teoria constitucional, aqueles que descartam a existência da dificuldade contramajoritária do controle de constitucionalidade. Quais são os argumentos trazidos?

A
  1. nega-se a premissa que o Poder Judiciário atua contra a vontade da maioria popular, pois com frequência ele julga em sintonia com a opinião pública, que nem sempre é bem representada pelo Poder Legislativo.
  2. outro argumento é o de que a democratização da jurisdição constitucional teria superado a dificuldade contramajoritária, na medida em que a jurisdição constitucional foi aberta à sociedade civil, com a ampliação do elenco dos legitimados ativos para a propositura de ações diretas e com a figura do amicus curiae. Tais medidas democratizaram o acesso ao controle de constitucionaldiade e pluralizaram as vozes presentes no debate constitucional.
  3. por fim, afirma-se que a democracia não equivale à mera prevalência da vontade das maiorias, mas corresponde a um ideal político mais complexo, que envolve o respeito aos direitos fundamentais e aos valores democráticos.
58
Q

Por que Daniel Sarmento diz que a relação entre jurisdição constitucional e democracia envolve um TENSÃO SINÉRGICA?

A

Há sinergia, porque o exercício adequado do controle de constitucionalidade pode proteger pressupostos necessários ao bom funcionamento da democracia, como as regras equânimes do jogo político e os direitos fundamentais. Isso se comprova diante do fato que o surgimento ou o fortalecimento da jurisdição constitucional na maior parte dos países se deu no momento em que estes se democratizavam ou redemocratizavam, e não em cenários de autoritarismo.

Mas há também uma tensão potencial entre a jurisdição constitucional e a democracia, pois o exagero da primeiro pode revelar-se antidemocrático, cerceando a possibilidade do povo de se autogovernar.

O problema se agrava quando a jurisdição constitucional passa a ser concebida como o fórum central para o equacionamento dos conflitos políticos, sociais e morais mais relevantes da sociedade, ou como a detentora do poder de ditar a “última palavra” sobre o sentido da Constituição.

Como forma de solucionar o problema, Sarmento propõe duas medidas:

  1. adoção de uma teoria de diálogos constitucionais, que negue tanto à jurisdição constitucional como aos poderes políticos majoritários a prerrogativa de dar a última palavra sobre o significa das normas constitucionais.
  2. a definição de diferentes standards de deferência do Poder Judiciário no exercício do controle de constitucionalidade.
59
Q

O que se entende por sentimento constitucional?

A

Karl Loewenstein designou de sentimento constitucional o elemento PSICOSSOCIAL e SOCIOLÓGICO, de cuja presença depende o sucesso da experiência constitucional em cada estado.

Para o jurista alemão, o desenvolvimento constitucional depende de fatores imponderáveis, e pode ser estimulado por meio de EDUCAÇÃO CÍVICA. A cultura constitucional na sociedade contribui decisivamente para a GARANTIA DA CONSTITUIÇÃO.

60
Q

O que é o PATRIOTISMO CONSTITUCIONAL?

A

É a adesão do cidadão aos princípios constitucionais básicos, ligados sobretudo à democracia e aos direitos fundamentais. É um modelo de substituição ao antigo nacionalismo, em que se reconhecem as diferenças e não envolve qualquer tendência à homogeneização cultural. Pelo contrário, pois implica no respeito à diversidade e ao pluralismo.

61
Q

A constitucionalização do direito envolve dois fenômenos distintos - a constitucionalização-inclusão e constitucionalização-releitura. Qual a diferença entre elas?

A

A constitucionalização-inclusão consiste no tratamento pela constituição de temas que antes eram disciplinados pela legislação ordinária ou mesmo ignorados.

Já a constituição-releitura liga-se à impregnação de todo o ordenamento jurídico pelos valores constitucionais. Trata-se da eficácia irradiante dos princípios constitucionais para a totalidade da ordem jurídica.

62
Q

Qual a crítica que se faz ao fenômeno da constitucionalização-inclusão?

A

Questiona-se a legitimidade democrática do entrincheiramento constitucional de decisões políticos conjunturais ou de interesses corporativos que conseguiram vencer na arena constituinte.

Além disso, essa banalização constitucional equipara temas tipicamente constitucionais, cujo tratamento demanda um processo de deliberação mais complexo, com outros sem a mesma estatura, que deveriam ser decididos na esfera da política ordinária. E isso acaba exigindo o apoio de 3/5 dos integrantes de cada casa do congresso nacional para a implementação de programas de governo.

Esta dificuldade muitas vezes é equacionada da pior maneira possível, com barganhas não republicanas envolvendo o governo e parlamentares.

63
Q

Em relação ao fenômeno da constituição-releitura, qual a crítica que se faz?

A

É preciso avaliar até que ponto é legítimo numa democracia restringir a liberdade de conformação do legislador em nome da irradiação dos valores constitucionais. Nesse sentido, Sarmento explica que não se deve supor que seja possível extrair da Constituição, pela via hermenêutica, as respostas para todos os problemas jurídicos e sociais.

Quem defende que tudo ou quase tudo já está decidido pela Constituição, e que o legislador é um mero executor das medidas já impostas pelo constituinte, nega, por consequência, a autonomia política ao povo para, em cada momento da sua história, realizar as suas próprias escolhas.

Em suma, a constitucionalização do Direito — pelo menos na sua dimensão de “constitucionalização-releitura” —, é fenômeno positivo, que semeia por todo o ordenamento os valores emancipatórios contidos na Constituição. Porém, ela deve respeitar espaços mínimos de liberdade de conformação do legislador.

de Souza Neto, Cláudio Pereira. Direito constitucional: teoria, história e métodos de trabalho (Locais do Kindle 774-776). Edição do Kindle.

64
Q

O conceito de bloco de constitucionalidade tem origem no direito constitucional de qual país?

A

No direito constitucional francês. Em 1971, o conselho constitucional francês, decidiu que como o preâmbulo da constituição do país se refere à declaração dos direitos do homem e do cidadão, esse texto também seria incorporado à ordem constitucional.

65
Q

O que significa o controle destrutivo de convencionalidade e o controle construtivo de convencionalidade?

A
  1. CONTROLE DESTRUTIVO DE CONVENCIONALIDADE - gera a invalidação das normas internas contrárias aos tratados internacionais de direitos humanos.
  2. CONTROLE CONSTRUTIVO DE CONVENCIONALIDADE - busca ajustar a legislação interna à normativa internacional pela via hermenêutica.
66
Q

As normas jurídicas dotadas de superior hierarquia no ordenamento jurídico são empregadas em qual sentido à constituição?

A

Constituição formal.

67
Q

O principal texto jurídico que contenha as normas superiores do ordenamento jurídico dá ensejo à qual tipo de constituição?

A

Constituição documental ou instrumental. Podem existir normais integrantes da constituição em sentido formal, com superioridade, mas sem integrar esse documento, como os costumes constitucionais reconhecidos.

68
Q

A expressão constituição em sentido material é ambígua porque usada com diversos significados diferentes. Quais são eles?

A
  1. no primeiro sentido, a constituição em sentido material é associada às chamadas normas materialmente constitucionais, que tratam de temas considerados essencialmente constitucionais, como a organização do estado e os direitos fundamentais. Todos os estados modernos são dotados de normas jurídicas materialmente constitucionais, que distribuem competência e organizam o exercício do poder político. Daí porque TODOS OS ESTADOS POSSUEM CONSTITUIÇÃO EM SENTIDO MATERIAL, MAS NEM TODOS TENHAM CONSTITUIÇÃO EM SENTIDO FORMAL OU INSTRUMENTAL.
  2. num segundo sentido, fala-se em constituição em sentido material para aludir não às normas jurídicas dotadas de um conteúdo próprio, mas à realidade social subjacente a estas normas. Neste outro sentido, a Constituição material é concebida como a estrutura básica da comunidade política, como o seu “modo de ser”, compreendendo as mais importantes relações de poder político, social e econômico travadas nesta comunidade. Nessa acepção, a constituição material se aproxima do conceito sociológico de Ferdinand Lassale, sendo concebida como os fatores reais de poder presentes numa dada sociedade.

de Souza Neto, Cláudio Pereira. Direito constitucional: teoria, história e métodos de trabalho (Locais do Kindle 934-936). Edição do Kindle. y

69
Q

Qual o conceito de constituição em sentido ideal?

A

A constituição se identifica com determinado modelo, só existindo constituição quando esse documento corresponder a esse modelo.

Foi neste sentido que a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, elaborada na França, em 1789, proclamou, em seu art. 16, que “toda sociedade, na qual a garantia dos direitos não é assegurada nem a separação de poderes determinada, não tem Constituição”.

No apogeu do positivismo jurídico, o conceito ideal de Constituição foi desprezado, tido como uma descabida abstração jusnaturalista.
A Constituição, para o positivismo, poderia ser dotada de qualquer conteúdo, do mais liberal ao mais totalitário.

de Souza Neto, Cláudio Pereira. Direito constitucional: teoria, história e métodos de trabalho (Locais do Kindle 944-948). Edição do Kindle.

70
Q

Quanto à forma, as constituições podem ser escritas ou dogmáticas e não escritas ou históricas. Qual a diferença entre elas?

A

CONSTITUIÇÕES ESCRITAS, DOGMÁTICAS ou CODIFICADAS - a Constituição está reunida em um texto, editado em um determinado momento da história do país. Mas constituições escritas não são incompatíveis com o reconhecimento de elementos constitucionais não escritos, como costumes constitucionais, normas implícitas etc.

CONSTITUIÇÕES NÃO ESCRITAS ou HISTÓRICAS - são as que não estão positivadas em um texto escrito único, editado em determinado momento da vida nacional. É um modelo que praticamente desapareceu, tendo o seu exemplo típico na Constituição britânica. Essa é composta por uma variedade de convenções constitucionais, por precedentes judiciais e também por documentos escritos. As constituições não escritas ou históricas são as que não estão positivadas em um texto escrito único, editado em determinado momento da vida nacional. As constituições não escritas ou históricas são integradas, portanto, também por textos escritos, os quais, contudo, não se reduzem a um documento que abarque a totalidade ou, pelo menos, a maior parte da Constituição.

de Souza Neto, Cláudio Pereira. Direito constitucional: teoria, história e métodos de trabalho (Locais do Kindle 978-980). Edição do Kindle.

71
Q

Por que Daniel Sarmento diz que, na prática, a constituição de 1937 funcionou como constituição flexível?

A

Porque o poder legislativo estava fechado, assim, tanto a legislação ordinária como as emendas constitucionais foram editadas unilateralmente pelo presidente da república.

72
Q

Constituição não escrita é sinônimo de qual expressão?

A

Constituição histórica, em que o texto não está positivado em um só texto escrito, editado num determinado momento da vida nacional.

É um modelo que praticamente desapareceu, tendo o seu exemplo típico na Constituição britânica. Essa é composta por uma variedade de convenções constitucionais, por precedentes judiciais e também por documentos escritos que foram editados ao longo do tempo, dentre os quais a Carta Magna, oHabeas Corpus Acte aBill of Rights.

As constituições não escritas ou históricas são integradas, portanto, também por textos escritos, os quais, contudo, não se reduzem a um documento que abarque a totalidade ou, pelo menos, a maior parte da Constituição.

de Souza Neto, Cláudio Pereira. Direito constitucional: teoria, história e métodos de trabalho (Locais do Kindle 976-980). Edição do Kindle.

73
Q

Na nossa história constitucional, existe algum exemplo de constituição que funcionou na prática como uma constituição flexível (possibilidade de alteração dos seus preceitos por meio de procedimento igual ao previsto para a modificação da legislação ordinária)?

A

SIM, a Carta de 1937 (constituição polaca), outorgada por Getúlio Vargas, funcionou, na prática, como Constituição flexível. É que, como o Poder Legislativo estava fechado, tanto a legislação ordinária como as emendas constitucionais eram editadas unilateralmente pelo então Presidente da República.

de Souza Neto, Cláudio Pereira. Direito constitucional: teoria, história e métodos de trabalho (Locais do Kindle 1012-1014). Edição do Kindle.

74
Q

Cite um exemplo na história constitucional brasileira de constituição semirrígida (uma parte dos dispositivos, tida como mais relevante, é dotada de rigidez, e a outra não é, podendo ser modificada pelo legislador da mesma maneira como são elaboradas as leis ordinárias).

A

Carta de 1824.

75
Q

Antes da II Guerra Mundial não era comum o emprego de cláusulas pétreas.

A

CORRETO. Depois da segunda guerra é que as cláusulas pétreas vêm sendo adotadas por grande parte das novas constituições, como a alemã, a portuguesa, a espanhola e a italiana.

76
Q

Os conceitos de RIGIDEZ e FLEXIBILIDADE constitucional foram formulados tendo em vista apenas o procedimento FORMAL de alteração das constituições. Mas há a possibilidade da alteração da Constituição sem modificação em seu texto, pelo fenômeno é chamado “mutação constitucional”.

A

CORRETO.

77
Q

Sob o ponto de vista concreto, a distinção peremptória entre constituições rígidas e flexíveis perde, atualmente, muito de seu sentido. Hoje, poucos são os países que deixam de adotar constituições dotadas de rigidez. Mas há constituições muito mais rígidas do que outras.

A reflexão atual sobre o tema inclina-se ao estudo dos graus de rigidez e dos fatores que contribuem para o enrijecimento ou para a flexibilização do regime constitucional.

A

CORRETO.

78
Q

As constituições liberais costumam ser constituições sintéticas ou analíticas?

A

Sintéticas, restringindo-se à fixação de direitos fundamentais e ao estabelecimento das linhas gerais da estrutura estatal.

79
Q

Em decorrência do detalhamento excessivo, a Constituição Federal de 1988 costuma ser definida não apenas como analítica, mas como “prolixa”, tratando-se de uma das mais extensas do mundo.

A

CORRETO. Esse caráter detalhista da Constituição produz importantes impactos na realidade política brasileira, interferindo no funcionamento concreto das instituições nacionais. Para o governo executar suas diretrizes políticas aprovadas nas urnas, tem sido necessário alterar o texto constitucional, devendo, para isso, obter maioria de três quintos dos votos em cada casa do Congresso Nacional. Essa maioria somente é obtida por meio de coligações excessivamente amplas, ocasionando, não raro, a perda de identidade programática do governo e estimulando a relativização da observância das regras da ética pública.

80
Q

O que é uma constituição garantia?

A

Constituições garantias são aquelas que apenas ESTRUTURAM e LIMITAM o exercício do poder político. São constituições liberais, sintéticas, em regra, cuja função é estabelecer anteparos de proteção do indivíduo contra o poder do Estado e organizar o governo com base no compromisso com a moderação.

Trata-se do modelo clássico de Constituição, que havia sido concebido pelo constitucionalismo do século XIX. Em sua origem, as constituições modernas eram constituições-garantia.

de Souza Neto, Cláudio Pereira. Direito constitucional: teoria, história e métodos de trabalho (Locais do Kindle 1109-1112). Edição do Kindle.

81
Q

As constituições dirigentes ou programáticas também estabelecem garantias da liberdade individual ante o poder do estado?

A

SIM. As constituições dirigentes ou programáticas também podem estabelecer “garantias” da liberdade individual ante o poder do estado. Todavia, além de realizarem essa função, PRESCREVEM OBJETIVOS A SEREM PERSEGUIDOS, fixando um estado ideal de coisas que o constituinte deseja ver concretizado no futuro.

82
Q

A Constituição dirigente oferece às futuras gerações um plano de desenvolvimento econômico e social. Não apenas limita a atividade governamental futura: antecipa o teor que essa atividade deve conter, definindo, mesmo que por meio de princípios gerais, a própria substância das leis a serem editadas. A decisão constituinte não vincula o legislador apenas negativamente: vincula-o também de modo positivo. Elas são típicas do constitucionalismo social.

A

CORRETO. Exemplo expressivo de Constituição dirigente é a Constituição portuguesa de 1976, resultante da Revolução dos Cravos.

83
Q

Por que atualmente fala-se em crise do constitucionalismo dirigente?

A

A crise do constitucionalismo dirigente, segundo Sarmento, está ligada a diversos fatores como:

  1. globalização econômica, que diminui o poder real dos estados de implementarem os projetos consagrados nas suas constituições.
  2. as ordens jurídicas internacionais e regionais disputam espaço com o constitucionalismo estatal.
  3. problemas econômicos e políticos enfrentados pelo welfare state.

Além disso, o autor afirma que o dirigismo constitucional apresenta problemas graves sob o ponto de vista da legitimação democrática. Todas as constituições limitam a liberdade decisória das gerações futuras, mas as constituições dirigentes o fazem em maior extensão, ao definirem caminhos que devem ser necessariamente seguidos pelas forças políticas do futuro. Portanto, a Constituição dirigente agrava o problema da legitimidade intergeracional, ainda quando forneça às futuras gerações um projeto bom e generoso.

84
Q

Qual o outro sinônimo para constituições MONITAS e o que elas significam?

A

Constituições “monistas” ou “ortodoxas”são as constituições vinculadas a uma IDEOLOGIA DETERMINADA.

É o que acontecia com as constituições do bloco socialista, que contemplavam um projeto ideológico global de sociedade: o socialismo.

85
Q

Qual o outro sinônimo para constituições PLURALISTAS e o que elas significam?

A

Constituições “pluralistas” ou “compromissórias” são aquelas que possuem normas inspiradas em ideologias diversas. Geralmente resultam de um “compromisso” entre os diversos grupos participantes do momento constituinte.

O conceito de Constituição compromissória foi formulado com a Constituição alemã de 1919, a chamada Constituição de Weimar. Quando, no momento constituinte, nenhum grupo tem força suficiente para, sozinho, tomar a decisão soberana, a Constituição resulta de um compromisso entre as correntes antagônicas.

A Carta de 1988 é exemplo típico de Constituição compromissória. Durante a constituinte de 1987-1988, atuaram as mais diversas forças políticas, inspiradas em diferentes ideologias.

de Souza Neto, Cláudio Pereira. Direito constitucional: teoria, história e métodos de trabalho (Locais do Kindle 1165-1167). Edição do Kindle.

86
Q

O que é a constituição imparcial?

A

Na teoria, há a possibilidade de se conceber a Constituição em termos imparciais, circunscrita à esfera da neutralidade política. AConstituição imparcialnão tem a pretensão de instituir um amplo projeto econômico e social. Ela visa a garantir que a interação democrática entre os diversos grupos plurais ocorra de maneira justa e pacífica: protege os direitos fundamentais, os procedimentos democráticos e as instituições políticas básicas.

de Souza Neto, Cláudio Pereira. Direito constitucional: teoria, história e métodos de trabalho (Locais do Kindle 1172-1175). Edição do Kindle.

87
Q

Quanto à aptidão para produzir efeitos concretos na realidade social e política, a constituição pode ser classificada como…

A

… normativa, semântica, nominal e simbólica.

Considerando esse aspecto, Karl Loewenstein elaborou classificação das constituições, que rotulou de “ONTOLÓGICA”, dividindo-as emnormativas,nominaisesemânticas.

CONSTITUIÇÕES NORMATIVAS são as que efetivamente conformam o processo político e as relações sociais, sendo objeto de plena observância pela sociedade. As relações de poder, de fato, se desenvolvem em conformidade com as regras e os princípios fixados no texto constitucional. A Constituição normativa é uma Constituição “para valer”. Evidentemente, ela é violada algumas vezes, mas geralmente as ofensas à Constituição são combatidas e sancionadas.

A Constituição Federal de 1988 é a primeira Constituição brasileira que, pelo menos em parte, pode-se considerar relativamente normativa.

CONSTITUIÇÕES NOMINAIS são as quenãocorrespondem à forma como a sociedade se organiza efetivamente. As condições sociais e econômicas para a Constituição ser de fato respeitada não estão presentes. Porém, o conceito não é de todo pejorativo na concepção de Loewenstein. A Constituição nominal, mesmo não sendo capaz de incidir de modo imediato sobre a realidade, exerce a importante função de prover objetivos a serem alcançados.

Por fim, há ainda as CONSTITUIÇÕES SEMÂNTICAS. São constituições que, além de não serem capazes de limitar o exercício do poder político, funcionam como instrumento para legitimação de regimes contrários à tradição democrática do constitucionalismo. Elas legalizam o exercício autoritário do poder. Uma Constituição que, após um golpe militar, conceda amplos poderes discricionários aos golpistas, eliminando os direitos dos seus opositores, será semântica.

A Carta de 1937 (polaca), sobretudo pelas suas disposições transitórias, ao legitimar o fechamento do Congresso, a intervenção automática em todos os Estados e o amplo exercício de poderes discricionários por Getúlio Vargas, até a realização de um plebiscito que nunca ocorreu, pode ser qualificada como Constituição semântica.

A categoria das CONSTITUIÇÕES SIMBÓLICAS foi formulada por Marcelo Neves.Trata-se de Constituição que não corresponde minimamente à realidade, não sendo tomada como norma jurídica verdadeira,sem a expectativa de ser cumprida. Neste ponto, ela se assemelha à categoria da Constituição nominal, de Loewenstein. Porém, a apreciação de Marcelo Neves do fenômeno é mais negativa do que a do autor alemão. Para Neves, as constituições simbólicas tendem a servir como álibi para manutenção dostatus quo.

de Souza Neto, Cláudio Pereira. Direito constitucional: teoria, história e métodos de trabalho (Locais do Kindle 1212-1217). Edição do Kindle.

88
Q

O que são as constituições outorgadas? Qual seu oposto?

A

As CONSTITUIÇÕES OUTORGADASsão as impostas pelos governantes, elaboradas sem a participação do povo. O líder político, ou grupo instalado no poder, decreta a Constituição do país, que, em geral, possui traços autoritários.

Diferem das CONSTITUIÇÕES PROMULGADAS, que são aquelas elaboradas por assembleias constituintes.

89
Q

Quais são as três constituições brasileiras outorgadas? E de constituições promulgadas?

A

Na história brasileira há três constituições formalmente outorgadas: a Constituição de 1824, a Constituição de 1937, e Constituição de 1969 (também conhecida como Emenda Constitucional nº 1 à Constituição de 1967).

Já as constituições promulgadas foram as de 1891, 1934, 1946, 1967 e 1988.

90
Q

É frequente a conceituação da Constituição promulgada como democrática. Está correta essa assimilação?

A

Sarmento entende que não, pois há constituições formalmente promulgadas cuja elaboração não pode ser qualificada de democrática, em razão dos constrangimentos impostos à assembleia constituinte. Foi o caso da Constituição de 1967, que, embora elaborada pelo Congresso Nacional, investido de poderes constituintes, não teve origem efetivamente democrática.

Ademais, nem toda Constituição elaborada de forma democrática apresentará conteúdo democrático.

de Souza Neto, Cláudio Pereira. Direito constitucional: teoria, história e métodos de trabalho (Locais do Kindle 1240-1241). Edição do Kindle.

91
Q

O que são as constituições cesaristas?

A

São constituições elaboradas unilateralmente pelo líder político do país, e depois submetidas à aprovação popular. Não há participação de representantes eleitos pelo povo na redação do texto. Esse tipo de Constituição surge em contextos políticos em que o líder se comunica direto com as massas, sem intermediários.

de Souza Neto, Cláudio Pereira. Direito constitucional: teoria, história e métodos de trabalho (Locais do Kindle 1246-1248). Edição do Kindle.

92
Q

O que são as hetero-constituições ou constituições heterônomas?

A

São constituições impostas por outras nações, como no caso do Japão logo após o fim da II Guerra Mundial em que a constituição foi escrita por um general norte-americano.

Observe-se, contudo, que o fato de a Constituição ter origem heterônoma nem sempre impede que, com o tempo, seja ela legitimada pelo povo. A Constituição japonesa é amplamente reconhecida por aquela nação, não tendo sido substituída por outra, mesmo depois do fim da ocupação norte-americana.

E a Constituição alemã — que não é propriamente heterônoma, mas teve uma origem certamente maculada pela excessiva intervenção externa — acabou adquirindo ampla legitimidade entre o povo do país.

93
Q

De acordo com o conceito de Constituição-moldura, o texto constitucional deve apenas apresentar limites para a atividade legislativa, cabendo ao Poder Judiciário avaliar se o legislador agiu conforme o modelo configurado pela Constituição.

A

CORRETO.

94
Q

No Brasil existe jurisdição constitucional desde a constituição de 1891. Esse controle desempenhava papel relevante na cena política?

A

NÃO. O controle de constitucionalidade não desempenhava papel relevante na cena política ou no dia a dia dos tribunais. Esse quadro só começou a mudar ao final da segunda guerra mundial, depois das violações de direitos humanos praticadas pelo nazismo, demonstrando a importância de um controle de garantias de direitos que fossem subtraídos do alcance das maiorias de ocasião.

95
Q

O que são as constituições privadas?

A

São constituições que ignoram fronteiras e servem para disciplinar determinados campos ou subsistemas sociais. Estas constituições privadas não teriam a forma de tratados, nem estariam vinculadas a entidades internacionais de caráter público, mas surgiriam no curso do processo de desenvolvimento e autonomização de esferas sociais dotadas de racionalidade própria. A chamada “constituição privada”, nesta ótica, não corresponderia a uma espécie de Constituição global unitária.

Um exemplo deste tipo de constitucionalização teria ocorrido na área das comunicações digitais (internet). Neste campo, normas privadas superiores teriam sido criadas, desempenhando um papel similar ao das constituições estatais na política nacional.

Contudo, Sarmento discorda do emprego do termo ‘constituição’ no caso, pois o que há quase sempre são normas informais que surgem em espaços transnacionais ainda pouco organizados institucionalmente.

de Souza Neto, Cláudio Pereira. Direito constitucional: teoria, história e métodos de trabalho (Locais do Kindle 2597-2599). Edição do Kindle.

96
Q

A constituição de 1824 tinha caráter liberal ou social?

A

A ideia central da constituição de 1824 correspondia a uma fórmula de compromisso com o liberalismo conservador (previa vários direitos individuais) e o semiabsolutismo (previa o poder moderador).

Sem embargo do seu conservadorismo, a Constituição de 1824 já manifestava uma certa “sensibilidade precursora para o social”,ao antecipar institutos que seriam típicos do constitucionalismo do século seguinte: o direito aos “socorros públicos” e à instrução primária gratuita.

de Souza Neto, Cláudio Pereira. Direito constitucional: teoria, história e métodos de trabalho (Locais do Kindle 3313-3316). Edição do Kindle.

97
Q

A constituição de 1824 foi outorgada ou promulgada?

A

Em que pese a existência de interpretações divergentes,a submissão do projeto de Constituição ao crivo das câmaras municipais não expurgou a primeira das nossas Cartas da mácula da outorga.

de Souza Neto, Cláudio Pereira. Direito constitucional: teoria, história e métodos de trabalho (Locais do Kindle 3222-3226). Edição do Kindle.

98
Q

A constituição de 1824 contemplou algum mecanismo de controle de constitucionalidade?

A

NÃO. A Carta de 1824 não contemplou qualquer mecanismo de controle judicial de constitucionalidade das leis.

99
Q

Outro traço característico da Constituição Imperial foi o seu caráter semirrígido.

A

CORRETO.

100
Q

Quais eram as principais características adotadas pela constituição de 1891?

A

Como o texto foi revisado por Ruy Barbosa, profundo admirador da constituição norte-americana, adotou-se o modelo federalista dual, o presidencialismo e o controle jurisdicional de constitucionalidade das leis.

A Constituição de 1891 era a encarnação, em texto legal, do liberalismo republicano que havia se desenvolvido nos EUA. Importaram-se dos Estados Unidos as instituições e os valores do liberalismo, para uma sociedade que nada tinha de liberal: o exemplo acabado do “idealismo na Constituição”.

de Souza Neto, Cláudio Pereira. Direito constitucional: teoria, história e métodos de trabalho (Locais do Kindle 3457-3460). Edição do Kindle.

101
Q

A Constituição de 1934 inaugurou o constitucionalismo social no Brasil.

A

CORRETO, pois passou a prever normas relacionadas à relação de trabalho, família, educação e cultura. Foi nessa constituição que foi previsto pela primeira vez o mandado de segurança e a ação popular.

Além disso, o direito de propriedade foi garantido, mas não poderia mais ser exercida contra o interesse social ou coletivo - chega ao direito brasileiro a ideia de função social da propriedade.

102
Q

O elenco de direitos trabalhistas previstos pela primeira vez na constituição de 1934 se estendiam ao trabalho rural?

A

NÃO.

103
Q

A Constituição de 1934 inaugura no Brasil a disciplina constitucional da economia,consagrando, de forma ampla, a possibilidade de intervenção do Estado na seara econômica.

A

CORRETO.

104
Q

A constituição de 1937 foi outorgada ou promulgada?

A

Outorgada, previu um modelo autoritário e corporativista.

Foi influenciada pela constituição da Polônia, o que lhe rendeu o apelido de constituição polaca.

Dentre os direitos individuais consagrados constavam as liberdades públicas tradicionais. A Carta não contemplou a proteção do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada, nem tampouco o mandado de segurança e a ação popular, que figuravam na Constituição de 1934.

de Souza Neto, Cláudio Pereira. Direito constitucional: teoria, história e métodos de trabalho (Locais do Kindle 3882-3884). Edição do Kindle.

105
Q

O advento do Estado Social não seguiu, no Brasil, o caminho percorrido na Europa Ocidental, em que, num primeiro momento, foram assegurados concretamente os direitos individuais e políticos, ditos de 1ª geração, e depois, como conquista decorrente de pressões sociais e eleitorais, vieram os direitos sociais, considerados de 2ª geração.

Na verdade, a consagração dos direitos sociais na Era Vargas pautou-se por uma lógica diferente. Embora, obviamente, os novos direitos correspondessem às aspirações e aos interesses do povo, especialmente dos trabalhadores urbanos, sua concessão resultou mais do impulso governamental do que da reivindicação organizada da cidadania.O contexto era de “cidadania regulada”.

A

CORRETO. Em regra, os direitos sociais não eram assegurados em bases universalistas, para todos os cidadãos, mas sim aos pertencentes a determinadas categorias profissionais ou econômicas que eram objeto de regulação estatal. O direito a saúde, por exemplo, só era efetivamente garantido para os trabalhadores que mantinham relação formal de emprego. Esta lógica combinava-se com o modelo de sindicalismo oficial então adotado, caracterizado pela subordinação do sindicato ao Estado, com o controle governamental das atividades e reivindicações dos trabalhadores, dentro do arcabouço jurídico do corporativismo.

106
Q

A Constituição de 1946 buscou conciliar liberalismo político e democracia com o Estado Social. Desprovida de grandes pretensões inovadoras, ela se afastou do autoritarismo da Carta de 37, acolhendo as fórmulas e instituições do liberalismo democrático — como separação de poderes e pluripartidarismo — sem, no entanto, abdicar dos direitos trabalhistas e da intervenção do Estado na ordem econômica.

A

CORRETO.

107
Q

Cite características da Constituição de 1934.

A

A Constituição de 1934 inaugurou o constitucionalismo social no Brasil. Rompeu com o modelo liberal anterior, incorporando uma série de disciplinas que antes não eram tratadas, de ordem econômica, como trabalho, família, educação e cultura.

No que tange ao Poder Executivo, foi suprimida a figura do Vice-Presidente. No Poder Legislativo, houve mudanças profundas. Pela Constituição, ele seria composto pela Câmara dos Deputados, “com a colaboração do Senado Federal”. Portanto, o Senado deixara de ser um órgão do Legislativo, que se tornava unicameral.

Foi mantido o regime de controle de constitucionalidade da Constituição anterior, com três inovações relevantes:

(i) a instituição do princípio da reserva de plenário;
(ii) a previsão da competência do Senado para suspender a execução das normas declaradas inconstitucionais pelo Poder Judiciário e
(iii) a criação de um mecanismo de controle preventivo obrigatório de constitucionalidade das leis federais que decretavam a intervenção da União nos Estados, nos casos de violação dos chamados princípios constitucionais sensíveis. Essa última inovação será o embrião a partir do qual, mais a frente, desenvolver-se-á no Brasil o controle concentrado e abstrato de constitucionalidade.

A maior novidade foi a previsão de direitos sociais (direitos trabalhistas, como o salário-mínimo, limite de jornada de trabalho, repouso semanal).

108
Q

Durante a Constituição de 37 o Brasil foi um estado federativo ou um estado unitário?

A

Um verdadeiro Estado unitário, e o governo cumulou as funções do executivo e do legislativo.

109
Q

Durante a Constituição de 37 manteve-se o controle de constitucionalidade?

A

Sim, mas com uma heterodoxa inovação: permitia-se, no caso de declaração de inconstitucionalidade de uma lei, que o Presidente a submetesse de novo ao Parlamento. Se esse confirmasse a norma, por dois terços dos membros de cada uma das casas, ficaria sem efeito a declaração de inconstitucionalidade.

110
Q

Pode-se dizer que a Constituição de 1937 teve importância prática na vida da época?

A

Não, pois não forneceu parâmetros jurídicos para a ação do Estado. Até 1945, o país viveu sob estado de emergência, com o Congresso fechado, numa genuína ditadura. Previu um modelo de Estado autoritário, com influência da Constituição da Polônia, fato que valeu à Carta de 37 o apelido de ‘polaca’ .

111
Q

A Constituição de 1937 dissolveu o Poder Legislativo apenas da União ou dos Estados e Municípios também?

A

A Carta de 1937 dissolveu o Poder Legislativo não apenas da União, como também dos Estados e Municípios.

As novas eleições só ocorreriam depois da realização de plebiscito previsto para que o povo brasileiro se manifestasse pela confirmação ou não da Carta, o que nunca ocorreu.

112
Q

A Constituição de 1946 buscava conciliar a democracia com o Estado social e o liberalismo político?

A

Sim, acolheu a separação de poderes e o pluripartidarismo, sem abdicar dos direitos dos trabalhadores.

113
Q

A figura do Vice Presidente esteve ausente nas Constituições de 1934 e 1937?

A

Sim. A figura voltou a existir durante a Constituição de 1946. Presidente e Vice seriam eleitos diretamente para mandatos de cinco anos. As eleições para os dois cargos eram simultâneas, mas não se exigia que ambos integrassem a mesma chapa, o que acabaria gerando crises institucionais no futuro.

114
Q

Cite características da Constituição de 1891.

A
  1. O texto da nova constituição era fortemente inspirado na Constituição norte-americana, de onde se importou o modelo federalista dual, o presidencialismo e o controle jurisdicional de constitucionalidade das leis.
  2. A constituição de 1891 era a encarnação do liberalismo republicano que se desenvolvido nos EUA. Contudo, importaram-se valores do liberalismo numa sociedade que nada tinha de liberal: exemplo de IDEALISMO na Constituição.
  3. Outro ponto importante foi a previsão do controle de constitucionalidade das leis. O modelo adotado foi o norte-americano, do controle difuso e concreto.
  4. Foi institucionalizada a doutrina brasileira do habeas corpus, que ampliou essa garantia constitucional para diversas outras situações em que se configurasse a arbitrariedade estatal, sem que estivesse envolvido o direito de ir e vir.
  5. Diferentemente da Carta do Império — neste ponto, à frente do seu tempo — a Constituição de 1891 não demonstrou nenhuma sensibilidade para o social, estatuindo apenas direitos individuais defensivos, voltados à limitação do arbítrio estatal.
115
Q

Cite características da Constituição de 1824.

A
  1. Surgida dois anos depois da proclamação da Independência do Brasil por D. Pedro I.
  2. Em que pese tenha sido submetida ao crivo das câmaras municipais, foi objeto de outorga.
  3. Ao invés dos tradicionais três poderes, a Constituição de 1824 consagrava quatro: Legislativo, Judiciário, Executivo e Moderador, sendo este último a principal inovação no desenho institucional da Carta.
  4. A Carta de 1824 não contemplou qualquer mecanismo de controle judicial de constitucionalidade das leis. A única possibilidade de controle externo ao Legislativo era o emprego da prerrogativa imperial, inerente ao Poder Moderador. Não por outra razão, há quem identifique o Poder Moderador como instituto antecedente do controle judicial da constitucionalidade das leis.
116
Q

Segundo o professor Sarmento, constituições principiológicas tendem a ser mais plásticas e abertas do que aquelas estruturadas sob regras?

A

Sim. A plasticidade ou maleabilidade da constituição permite sua alteração por mutação constitucional.

117
Q

O que se entende por constituição aberta?

A

É aquela que permanece dentro do seu tempo.

118
Q

O que pode ser entendido por uma constituição não escrita ou histórica?

A

É aquela formada por documentos esparsos, fruto de construção histórica. Ela pode, e normalmente tem textos escritos, mas eles são esparsos, soltos, por costumes constitucionais.

119
Q

De acordo com o modo de elaboração, as constituição escritas são dogmáticas por qual motivo?

A

Porque são elaboradas em um instante preciso. A constituição que está reunida num só texto é editada num determinado momento da história do país.

120
Q

Na história constitucional brasileira, o conceito ideal de constituição teve relevância para alguma das constituições?

A

Sim, para a Constituição de 1824, que previa um procedimento mais rigoroso para a alteração das normas relativas à estruturação e limitação do poder e aos direitos políticos e individuais. O restante do texto poderia ser alterado de acordo com o procedimento legislativo ordinário.

Essa Constituição adotava o conceito ideal para distinguir as normas materialmente constitucionais dos demais preceitos integrantes do texto constitucional, conferindo apenas àquelas o atributo da rigidez - exemplo de constituição semirrígida.

121
Q

O idealismo constitucional previsto no constitucionalismo liberal do século XVIII (o conceito ideal servia para distinguir as normas materialmente constitucionais dos demais preceitos) retornou em algum momento da história constitucional?

A

Sim. Com o predomínio do positivismo jurídico, a concepção ideal da Constituição cedeu espaço a outras construções, mais focadas na forma constitucional do que no seu conteúdo. Contudo, com a crise do positivismo jurídico, a partir da segunda metade do século XX, o componente ideal volta a penetrar em teorias e filosofias contemporâneas da Constituição, agora associada a outras dimensões. Ou seja, o modelo ideal agora é enriquecido com novos aportes, como DEMOCRACIA e IGUALDADE MATERIAL, que não se enquadravam na moldura do liberalismo-burguês dos séculos XVIII e XIX.

122
Q

Em que sentido a teoria idealista da Constituição (normas materiais) começou a ser objeto de duras críticas na doutrina?

A

Sustentava-se que o modelo de estado concebido pelas constituições liberais não correspondia à realidade concreta das sociedade. Embora positivasse liberdade e igualdade, a realidade social era marcada pela desigualdade.

Assim, começou-se a entender que o conceito de constituição deveria ser formulado em termos sociológicos. A teoria da constituição deveria refletir a ‘CONSTITUIÇÃO REAL’.

A primeira crítica significativa ao constitucionalismo idealista foi feita por Ferdinand Lassalle, que definiu a Constituição como resultado dos fatores reais de poder atuantes em determinada sociedade. Para Lassale, a “essência da Constituição” advém da realidade social em que o texto constitucional estiver inserido, e não das normas nele positivadas.

123
Q

Com a introdução, no século XX, de novos temas nas constituições, como organização da economia, direitos sociais e trabalhistas, função social da propriedade, passou a ser impossível sua definição a partir do conteúdo de suas normas (constituição ideal). A constituição então passou a ser conceituada de que forma?

A

De acordo com seus aspectos formais. Essa era a concepção de Hans Kelsen, principal expositor dessa vertente teórica. Quer estabeleça uma ditadura, quer institua um governo democrático, a Constituição, para Kelsen, define-se por ocupar o ápice do ordenamento jurídico.

De acordo com esta vertente, as constituições possuem em comum a supremacia formal; ou seja, o fato de ocuparem o ápice da ordem jurídica, servindo de fundamento de validade para o restante do ordenamento.

124
Q

Qual era o calcanhar de aquiles apontado na teoria kelseniana do positivismo constitucional?

A

O fundamento de validade da própria Constituição, já que Kelsen a identificava como norma hipotética fundamental.
Tanto é assim que, diante da evidente insuficiência do argumento, Kelsen foi obrigado a fazer concessões de cunho sociológico para dar sustentação a seu modelo.

A Teoria Pura do Direito, além de negar que a validade das normas decorra da correção de seu conteúdo material, como defendia a teoria idealista, também rejeita que ela derive de sua eficácia social. A eficácia é, porém, requisito de validade do ordenamento jurídico como um todo: “uma ordem jurídica é considerada válida quando as suas normas são, numa consideração global, eficazes, quer dizer, são de fato observadas e aplicadas”. 

125
Q

Para o positivismo, a tarefa da teoria constitucional é descrever com objetividade a Constituição ou prescrever para ela determinado conteúdo?

A

Apenas descrever com objetividade a Constituição. O direito deve se ocupar das normas como elas são, e não como deveriam ser.

126
Q

A teoria kelseniana constitucional chega a sustentar que as constituições devem ter algum conteúdo normativo?

A

Sim, devem conter normas que estabeleçam competências e procedimentos. Como, para Kelsen, o ordenamento jurídico é escalonado, e a Constituição ocupa o seu ápice, ela deve conter normas que atribuam poderes para as autoridades estatais produzirem outras normas.

A expressão “Constituição material” é utilizada por Kelsen para designar justamente as normas que regulam a produção de outras normas.

Já o termo “Constituição formal” é o documento escrito, que pode conter além das normas da constituição material (relativas a competências e procedimentos) também normas atinentes a outros assuntos.

127
Q

Do que trata a constituição como decisão política fundamental de Carl Schmitt?

A

No importante debate constitucional travado no cenário da Constituição de Weimar surgiram teorias alternativas tanto ao IDEALISMO da corrente liberal quanto ao FORMALISMO de Kelsen e de outros positivistas. Os protagonistas daquele debate sustentavam, de diferentes maneiras, teorias constitucionais centradas na realidade concreta. Eram as “teorias materiais da Constituição” — materiais por privilegiarem elementos oriundos da realidade constitucional, e não por prescreverem determinado conteúdo particular.

A teoria mais influente nessa linha foi a de Carl Schmitt, para o qual a Constituição deveria ser definida como a decisão política fundamental do poder constituinte.

A Constituição, para Schmitt, não se confunde com as “leis constitucionais”, pois seria a manifestação concreta do poder político, definindo as bases do novo regime: uma democracia ou uma ditadura, um Estado capitalista ou socialista etc.

O conceito de Constituição de Carl Schmitt não se apoia em critérios de justiça ou racionalidade, como sustenta a teoria ideal. Para Schmitt, o poder constituinte pode estabelecer qualquer conteúdo constitucional, inclusive um completamente divergente dos princípios do Estado Liberal.

Na lição de Carl Schmitt, encontramos o sentido político, que distingue a Constituição de lei constitucional. Constituição só se refere à decisão política fundamental. As leis constitucionais seriam os demais dispositivos inseridos no texto constitucional, mas que não contêm matéria de decisão política fundamental.

Para Carl Schmitt, o fundamento da Constituição está na vontade política concreta que a antecede. Ou seja, a Constituição não é a positivação de um sistema racional de princípios, mas um ato de vontade do poder constituinte. Sob o prisma normativo, a decisão nasce do nada.

Para o doutrinador, a constituição em “sentido pensado” corresponde a um sistema fechado de normas, que tem como caráter distintivo certo conteúdo ideal, como por exemplo constituições liberais e não liberais. Em “sentido positivo”, designa as normas constitutivas, em concreto, da unidade política de um povo.

Essa decisão política fundamental pode ou não estar no texto constitucional. A constituição é entendida como um ato de poder, muito mais do que norma.

128
Q

Do que trata a constituição total de Herman Heller?

A

A perspectiva de Heller se insere em um momento de SÍNTESE entre as teorias normativa e sociológica, no sentido da formulação de um conceito unitário (também chamado de total ou estrutural) de Constituição.

A Constituição, além de ser norma, é também realidade social. Porém, o reconhecimento de que a Constituição é também realidade constitucional não resulta na negação de que as normas integrem a Constituição.

Ao conceber a Constituição simultaneamente como normatividade e como normalidade, Heller já revelava a preocupação com o tema da efetividade constitucional, que seria a preocupação central da teoria da Constituição formada a partir do advento do constitucionalismo social.

129
Q

Do que trata a constituição concretista de Konrad Hesse?

A

Para Hesse, o elemento essencial de uma Constituição é a NORMA. Mas o conteúdo material dessa norma deve ser extraído das exigências substantivas que se situam na sociedade.

Konrad Hesse então cria a teoria concretista, que buscava uma espécie de meio do caminho entre Kelsen e o Lassale. Segundo o autor, Constituição não é só fato, mas também não é só norma.

Na compreensão da teoria concretista, interpretar não é algo que envolve só o texto, mas o texto e o fragmento sobre o qual a norma incide, porque Constituição é norma e fato.

O fato influencia muito o sentido da norma constitucional, primeiro porque quem interpreta a norma é um ser humano, que naturalmente compartilha valores com a sociedade de sua época.

Os fatores reais de poder influenciam, ou seja, a realidade influencia. Mas o Direito Constitucional também pode influenciar a realidade.

É nesse sentido que Konrad Hesse resgata a proposta de Heller, para quem a Constituição deveria ser definida simultaneamente como NORMATIVIDADE e NORMALIDADE SOCIAL (norma e realidade).

Seu objetivo é operar uma síntese das duas posições (sociológica e normativa), ao formular a conhecida TEORIA DA FORÇA NORMATIVA DA CONSTITUIÇÃO.

As normas constitucionais, quando não espelharem as forças hegemônicas, não são inúteis, ao contrário do que afirmava Lassale. Elas podem, em alguma medida, regular a vida política e social e podem acarretar a “vontade de Constituição”, que é o empenho dos que vivem sob a sua égide no sentido de lutar pela efetivação dos seus comandos.

A teoria de Konrad Hesse foi desenvolvida e aprofundada por seu discípulo Friedrich Muller que, partindo das mesmas premissas sobre a relação entre a Constituição e a realidade, buscou fornecer parâmetros para a interpretação do texto da norma. Ele denominou a sua concepção de “teoria estruturante do Direito”.

130
Q

É correto dizer que no conceito de constituição dirigente defendida por Canotilho, o tribunal constitucional seria o grande protagonista para defender a constituição?

A

NÃO. Em sede de constituição dirigente, o programa estabelecido pela Constituição, que deveria ser cumprido pelo legislador, não ficava a cargo da defesa pelo Poder Judiciário.

Canotilho apostava muito mais na PARTICIPAÇÃO POPULAR do que na atuação do Judiciário como mecanismo de concretização dos objetivos constitucionais traçados pelas normas programáticas.

Contudo, no Brasil, prevaleceu o entendimento de que como o nível de organização e atuação política da sociedade civil é menor, a responsabilidade do Poder Judiciário na concretização das normas constitucionais deve ser aumentada.

131
Q

Atualmente, fala-se em crise do constitucionalismo dirigente?

A

Sim. Todas as constituições limitam a liberdade decisória das gerações futuras, mas as constituições dirigentes o fazem em maior extensão, ao definirem caminhos que devem ser necessariamente seguidos pelas forças políticas do futuro. Portanto, a Constituição dirigente agrava o problema da legitimidade intergeracional, ainda quando forneça às futuras gerações um projeto bom e generoso.

132
Q

A constituição de 1937 pode ser classificada como semântica, nominal ou normativa?

A

Semântica, ao legitimar o fechamento do Congresso e permitir a intervenção automática do Poder executivo federal em todos os estados.

133
Q

Qual cidade é historicamente identificada como o primeiro grande precedente de limitação do poder político?

A

Atenas na Grécia - governo das leis, e não dos homens e de participação dos cidadãos nos assuntos públicos.

134
Q

Na virada do século XX para o século XXI, duas mudanças importantes e de largo alcance prenunciaram uma possível revolução no direito inglês. Quais foram elas?

A
  1. Human Rights Act, de 1998, que incorporou ao direito inglês os direitos previstos na Convenção Europeia de Direitos Humanos.
  2. Constitucional Reform Act, de 2005 que reorganizou o Poder Judiciário inglês, dando-lhe autonomia em relação ao parlamento e criando uma Suprema Corte. Embora o sistema britânico judiciário inglês fosse tido como imparcial e justo, inexistia separação orgânica em relação ao Parlamento. Assim, a nova lei criou uma Suprema Corte fora do Parlamento e esvaziou as funções judiciais da Câmara dos Lordes e do Lorde Chanceler.
135
Q

A Constituição de Weimar foi promulgada em 1919 após o fim da Primeira Guerra Mundial num contexto de intensa turbulência política?

A

Sim, e se tornou um dos documentos constitucionais mais influentes da história, apesar de sua curta vigência, encerrada em 1933.

136
Q

A Constituição de Weimar pode ser considerada como um marco do constitucionalismo social? Ela foi efetiva?

A

Considerada um marco do constitucionalismo social, essa Carta jamais foi efetiva.

137
Q

A Lei Fundamental da República Federal da Alemanha de 1949 prevê de forma clara os direitos sociais?

A

Não há previsão expressa dos direitos sociais, embora sua existência tem sido reconhecida.

138
Q

É correto dizer que a Constituição de Weimar era estrutura em duas partes?

A

Sim: na parte I organizava-se o Estado alemão, disciplinando a relação entre os entes federativos e os poderes; na parte II estabelecia o catálogo dos direitos fundamentais, do qual constavam tanto os direitos individuais como os direitos sociais, como a proteção do trabalhador e o direito à educação.

139
Q

O estado moderno se consolidou ao longo do século XX sob a forma de Estado de direito?

A

Sim. O núcleo essencial das primeiras constituições escritas é composto por normas de repartição e limitação do poder, abrangendo a proteção dos direitos individuais em face do Estado. Mas a noção de democracia viria a se desenvolver só mais tarde.

140
Q

O pós-positivismo se caracteriza pela busca da ligação entre direito e moral?

A

SIM.

141
Q

É possível aplicar a derrotabilidade das regras no Brasil?

A

Trata-se de uma técnica contra legem, logo, não encontra amparo explícito no Direito. Com uma sinceridade rara e sem maiores cerimônias, Cristiano Chaves de Farias arremata: “Sem dúvida, a admissibilidade da derrotabilidade das regras, ainda que em caráter excepcional, autoriza a prolação de uma decisão contra legem – sem eufemismo ou puritanismo” (Derrotabilidade das Normas-Regras (legal defeseability) no Direito das Famílias: Alvitrando Soluções para os Extreme Cases (Casos Extremos). Revista do Ministério Público do Rio de Janeiro: MPRJ, n. 53, jul./set. 2014, p.45).