P. Penal (princípios fundamentais) Flashcards
O princípio da presunção de inocência sempre foi previsto nas constituições brasileiras?
NÃO. No ordenamento jurídico pátrio, até a entrada em vigor da CF/88, esse princípio somente existia de forma implícita, como decorrência da cláusula geral do devido processo legal.
LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;
Inclusive, comparando-se a forma como referido princípio foi previsto nos tratados internacionais e na CF, percebe-se que naqueles costuma-se referir à PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA, ao passo que na CF em momento algum se utiliza a expressão inocência, dizendo que ninguém será considerado culpado. Por conta dessa diversidade terminológica, o preceito inserido na CF passou a ser denominado de PRESUNÇÃOA DE NÃO CULPABILIDADE. Contudo, não há diferença entre os dois normas, sendo inútil e contraproducente a tentativa de apartar ambas as ideiais.
Do princípio da presunção de inocência derivam duas regras fundamentais. Quais são elas?
- regra probatória ou regra do juízo - por força da regra probatória do princípio da presunção de inocência, a parte acusadora tem o ônus de demonstrar a culpabilidade do acusado além de qualquer dúvida razoável, e não este provar sua inocência. Em outras palavras, recai exclusivamente sobre a acusação o ônus da prova, incumbindo-lhe demonstrar que o acusado praticou o fato delituoso.Nessa acepção, presunção de inocência confunde-se com in dubio pro reo. Não havendo certeza, mas dúvida sobre os fatos em discussão em juízo, inegavelmente é preferível a absolvição de um culpado à condenação de um inocente.
Obs.: o in dubio pro reo só incide até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Portanto, na revisão criminal, que pressupõe o trânsito em julgado, não há que se falar em in dubio pro reo, mas sim em IN DUBIO CONTRA REUM. O ônus da prova recai única e exclusivamente sobre o postulante.
- regra de tratamento - a prisão só se justifica em hipóteses excepcionais, já que a regra é responder ao processo penal em liberdade. Por força da regra de tratamento proveniente do princípio da presunção de inocência, o Poder Público está impedido de agir e de se comportar em relação ao suspeito e ao acusado em geral como se já houvesse sido condenado.
Há quem entenda que esse dever de tratamento atua em duas dimensões:
a) INTERNA AO PROCESSO: funciona como dever imposto ao magistrado na medida em que o ônus da prova recai sobre a acusação, bem como as prisões devem ser utilizadas apenas em situações excepcionais;
b) EXTERNA AO PROCESSO: o princípio da presunção de inocência demanda uma proteção contra a publicidade abusiva e a estigmatização do acusado, funcionando como limite democrático à abusiva exploração midiática em torno do fato criminoso e do próprio processo judicial.
A execução provisória da pena ofende o princípio da presunção de inocência?
Entre fevereiro de 2016 e novembro de 2019, prevaleceu no STF o entendimento de que não havia necessidade de se aguardar o trânsito em julgado, permitindo-se a EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA.
Entendia-se que em regra os recursos extraordinário e especial não são dotados de efeito suspensivo, assim seria cabível a execução provisória da pena, independentemente da demonstração de qualquer hipótese que autorizasse a prisão preventiva do acusado.
Recentemente, porém, por ocasião do julgamento definitivo das ADCs 43, 44 e 54, houve uma mudança de orientação daquela corte. Segundo os ministros, não se pode esquecer que a CF é categórica ao afirmar que SOMENTE O TRÂNSITO EM JULGADO DE UMA SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA PODERÁ AFASTAR O ESTADO INICIAL DE NÃO CULPABILIDADE DE QUE TODOS GOZAM. Seu caráter mais amplo deve prevalecer, portanto, sobre o teor da Convenção Americana de Direitos Humanos, assegurando-se assim a MÁXIMA EFETIVIDADE DA GARANTIA CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA - deve sempre prevalecer a disposição mais favorável (princípio pro homine).
Art. 8º, §2º, “h”, da Convenção Americana: Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa.
Consequentemente, o STF decidiu que a prisão antes do trânsito em julgado a condenação somente pode ser decretada a título cautelar.
Em razão do princípio da presunção de inocência, inquéritos e processos criminais em curso devem ser considerados NEUTROS na definição dos antecedentes criminais.
CORRETO.
Súmula 444 do STJ - É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base.
Tese de Repercussão Geral fixada no tema n. 129 do STJ: A existência de inquéritos policiais ou de ações penais sem trânsito em julgado não pode ser considerada como maus antecedentes para fins de dosimetria da pena.
Tese de Repercussão Geral fixada no tema n. 1.139 do STJ: É vedada a utilização de inquéritos e/ou ações penais em curso para impedir a aplicação do art. 33, § 4.º, da Lei n. 11.343/06.
Tese de Repercussão Geral fixada no tema n. 22 do STJ: Sem previsão constitucionalmente adequada e instituída por lei, não é legítima a cláusula de edital de concurso público que restrinja a participação de candidato pelo simples fato de responder a inquérito ou ação penal.
Na visão da Corte, a lei pode instituir requisitos mais rigorosos para determinados cargos, em razão da relevância das atribuições envolvidas, como é o caso, por exemplo, das carreiras da magistratura, das funções essenciais à justiça e da segurança pública.
O que se entende pelo princípio do contraditório?
O princípio do contraditório está previsto na CF:
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
Sempre se compreendeu o princípio do contraditório como a ciência dos atos do processo e a possibilidade de contrariá-los. De acordo com esse conceito, o núcleo fundamental do contraditório estaria ligado à discussão dialética dos fatos, devendo se assegurar a ambas as partes a oportunidade de fiscalização recíproca dos atos praticados no processo.
Seriam dois, portanto, os elementos do contraditório:
a) o direito à informação;
b) o direito de participação.
Contudo, esse conteúdo do princípio do contraditório formado pelo conhecimento e possibilidade de reação/participação, alterou-se diante da concepção sobre o princípio da isonomia, com a superação da mera igualdade formal e a busca de uma igualdade material. Assim, o contraditório deixou de ser visto como uma mera possibilidade de participação, passando a se assegurar a efetividade e plenitude do contraditório. É o que se denomina “contraditório efetivo e equilibrado”.
Ou seja, não basta assegurar ao acusado o direito à informação e a possibilidade de reação num plano formal.
Assim, pode-se concluir que o contraditório passou a ser analisado também no sentido de se assegurar o respeito à paridade de tratamento (par conditio ou paridade de armas).
Resumindo: pela concepção original do princípio do contraditório, entendia-se que quanto à reação, bastava que a mesma fosse possibilitada, ou seja, tratava-se de REAÇÃO POSSÍVEL. Contudo, houve uma dupla mudança no princípio do contraditório, subjetiva e objetiva. Quanto ao seu objeto, deixou de ser o contraditório uma mera possibilidade de participação de desiguais, passando a se estimular a participação dos sujeitos em igualdade de condições. Subjetivamente, a missão de igualar os desiguais é atribuída ao juiz, assim o contraditório não só permite a participação das partes, mas impõe a participação do juiz.
Qual a diferença entre o contraditório sobre a prova e para a prova?
- CONTRADITÓRIO PARA A PROVA: conhecido como CONTRADITÓRIO REAL, demanda que as partes atuem na própria formação da prova, sendo indispensável que sua produção se dê na presença do órgão julgador e das partes. É o que acontece com a prova testemunhal produzida em juízo.
- CONTRADITÓRIO SOBRE A PROVA: também conhecido como CONTRADITÓRIO DIFERIDO ou POSTERGADO, é aquele ocorrido após a formação da prova. A observância do contraditório é feita posteriormente, dando-se oportunidade para que o acusado e seu defensor contestem a prova feita no curso do IP.
O contraditório aplica-se na fase investigatória?
NÃO. Prevalece na doutrina e na jurisprudência o entendimento de que a observância do contraditório só é obrigatória, no processo penal, na fase processual, e não na fase investigatória. Isso porque o art. 5º da CF faz menção à observância do contraditório “em processo judicial ou administrativo”.
Qual a diferença da natureza jurídica do princípio da ampla defesa sob a ótica do acusado e sob o enfoque publicista?
Sob a ótica que privilegia o interesse do acusado, a ampla defesa pode ser vista como um direito; todavia, sob o enfoque publicista, no qual prepondera o interesse geral de um processo justo, é vista como garantia.
Só é possível o exercício do direito da ampla defesa em virtude de um dos elementos que compõem o contraditório. Qual é ele?
Direito à informação.
Além disso, a ampla defesa se exprime por intermédio de seu segundo elemento: a reação.
Apesar da influência recíproca entre o direito de defesa e o contraditório, os dois não se confundem. A defesa e o contraditório são manifestações simultâneas, intimamente ligadas pelo processo, sem que daí se possa concluir que uma derive da outra. O contraditório deve ser aplicado em relação a ambas as partes, além da obrigatória observância pelo próprio magistrado, ao passo que a defesa diz respeito apenas ao acusado.
Há entendimento doutrinário no sentido de que é possível subdividir a ampla defesa em dois aspectos. Quais são eles?
- POSITIVO - se dá com a efetiva utilização de todos os instrumentos, meios e modos de produção, esclarecimentos e confrontação de elementos de provas, que digam respeito à materialidade e autoria.
- NEGATIVO - consiste na não produção de elementos probatórios de elevado risco ou potencialidade danosa à defesa do réu.
Quando a CF assegura aos litigantes e aos acusados em geral a ampla defesa entende-se que a proteção deve abranger o direito de defesa técnica (defesa processual ou específica) e à autodefesa (defesa material ou genérica).
CORRETO.
Segundo Renato Brasileiro, por força da ampla defesa, admite-se que o acusado seja FORMALMENTE tratado de maneira desigual em relação ao acusado, delineando o viés material do princípio da igualdade.
CORRETO.
Por conseguinte, ao acusado são outorgados diversos privilégios em detrimento da acusação, como a existência de recursos privativos da defesa, proibição da reformatio in pejus, regra do princípio in dubio pro reo, revisão criminal exclusivamente pro reo, etc.
Como pode ser conceituada a autodefesa?
A autodefesa é aquela exercida pelo próprio acusado, em momentos cruciais do processo. Diferentemente da defesa técnica, ela é disponível, já que não há como obrigar o réu a exercer seu direito ao interrogatório, nem tampouco acompanhar os atos da instrução.
Como a autodefesa se manifesta no processo penal?
De várias formas, como por exemplo pelo:
- DIREITO À AUDIÊNCIA (direito de apresentar ao juiz sua defesa pessoalmente. Esse direito se materializa através do interrogatório. Daí o entendimento hoje majoritário em torno da natureza jurídica do interrogatório: MEIO DE DEFESA, e não meio de prova como se entendia antigamente). Essa modalidade do direito de autodefesa é facultativa, ou seja, o réu pode escolher ou não exercê-la.
Caso o acusado opte por não comparecer, estará também exercendo um direito, qual seja, o de não se autoincriminar ou produzir provas contra si. Esta escolha, entretanto, não pode interromper o curso normal do processo.
- DIREITO DE PRESENÇA (direito de estar presente nos atos do processo e acompanhar os atos de instrução - daí a importância da obrigatória intimação do defensor e do acusado; chamado por alguns de DIREITO AO CONFRONTO. Não se trata de direito absoluto, pois pode colidir com os direitos das testemunhas e das vítimas à vida, segurança, intimidade e liberdade de declarar, os quais se revestem de inequívoco interesse público, e cuja proteção é indiscutível dever do Estado. Portanto, na hipótese de efetiva prática de atos intimidatórios, subentende-se que houve uma renúncia tácita ao direito de presença pelo acusado);
- DIREITO DE POSTULAR PESSOALMENTE - possibilidade de interpor recursos, impetrar HC e ajuizar revisão criminal.
Apesar de não estar previsto expressamente na CF/88, o direito à presença do réu na audiência encontra-se consagrado no Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e na Convenção Americana de Direitos Humanos.
É necessária a presença do réu preso em oitiva de testemunha por carta precatória?
Sobre o tema, o STF, recentemente, tem entendido que a alegação de necessidade de presença do réu, estando ele preso, configura nulidade relativa, devendo-se comprovar a oportuna requisição e também a presença de efetivo prejuízo. Assim, caso o pedido seja motivadamente indeferido pelo magistrado, não há que se falar em nulidade do feito.
A propósito, eis o teor da tese de repercussão geral fixada no tema 240: inexiste nulidade pela ausência, em oitiva de testemunha por carta precatória, de réu preso que não manifestou expressamente intenção de participar da audiência.