CUMPRIMENTO DE SENTENÇA - Bem de família Flashcards
Qual é, segundo a Lei nº 8.009/1990, o imóvel por regra impenhorável, o chamado “bem de família”?
Residencial próprio
Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.
A Lei nº 8.009/1990 define como imóvel impenhorável o imóvel “residencial” próprio do casal. O que vem a ser imóvel residencial, para os fins da lei?
Único imóvel, residência permanente
Se mais de um imóvel, o de menor valor ou o registrado como tal
Art. 5º Para os efeitos de impenhorabilidade, de que trata esta lei, considera-se residência um único imóvel** utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para **moradia permanente.
Parágrafo único. Na hipótese de o casal, ou entidade familiar, ser possuidor de vários imóveis utilizados como residência, a impenhorabilidade recairá sobre o de menor valor, salvo se outro tiver sido registrado, para esse fim, no Registro de Imóveis e na forma do art. 70 do Código Civil.
Em se tratando do enquadramento como bem de família, a quem toca o ônus da prova quanto à unicidade do imóvel? O autor deve provar que é seu único imóvel, ou o exequente deve provar que existem outros?
Sobre o exequente
Segundo o Superior Tribunal de Justiça (STJ), não se exige que o devedor faça prova de que é o único imóvel de sua propriedade (REsp. nº 1.762.249/RJ, 3ª Turma, rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 04.12.2018). Se forem vários imóveis só será impenhorável o de menor valor, diz o parágrafo único do art. 5º da Lei nº 8.009/1990, salvo se outro tiver sido registrado para este fim.
Quais são os bens que se incluem na impenhorabilidade do imóvel de família, de acordo com a Lei nº 8.009/1990, e quais são excluídos? O quintal, ou a parcela do terreno que não está edificada, pode ser penhorada?
Art. 1º, Parágrafo único. A impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados.
Art. 2º EXCLUEM-SE da impenhorabilidade os veículos de transporte, obras de arte e adornos suntuosos.
Sobre o assunto, o STJ disse que
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. OFENSA AO ART. 535 DO CPC/73 NÃO CONFIGURADA. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. BEM DE FAMÍLIA. PENHORA DE FRAÇÃO IDEAL. IMÓVEL UTILIZADO COMO RESIDÊNCIA PELO GARANTIDOR DO CONTRATO. POSSIBILIDADE DE PENHORA DE TERRENOS NÃO EDIFICADOS QUE COMPÕEM O IMÓVEL RESIDENCIAL. PRECEDENTES 1. Possibilidade de penhora de fração ideal de imóvel caracterizado como bem de família. 2. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO (AgInt no REsp. nº 1.624.356/SP, 3ª Turma, rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 10.12.2018).
E se a penhora for anterior a constituição de residência pela entidade familiar, aplica-se a hipótese de impenhorabilidade do bem?
De acordo com o STJ, a penhora feita nessa situação deverá ser desconstituída. Deve-se admitir que a proteção legal alcance a entidade familiar única, ainda que constituída posteriormente à realização da penhora, porquanto tal fato não se mostra relevante aos olhos da lei, que se destina à proteção da família em seu sentido mais amplo (AgInt no AREsp. nº 1.158.338/SP, 5ª Turma, rel. Min. Lázaro Guimarães − Desembargador Convocado do TRF 5ª Região, julgado em 14.08.2018).
Sobre impenhorabilidade de imóvel bem de família. Se o devedor demonstrar que não reside no imóvel apenas em razão da falta de serviço estatal, pode alegar que o imóvel no qual não reside é bem de família?
Sim
Se o devedor não reside no imóvel apenas em razão da falta de serviço estatal, entende o STJ que ainda assim incide a impenhorabilidade.
CIVIL. BEM DE FAMÍLIA. IMÓVEL DESOCUPADO. AUSÊNCIA DE CONDIÇÕES DE MORADIA. FATO DE TERCEIRO. 1. Não pode ser objeto de penhora o único bem imóvel do devedor que não é destinado à sua residência ou mesmo à locação em face de circunstância alheia à sua vontade, tais como a impossibilidade de moradia em razão de falta de serviço estatal. 2. Recurso especial provido (REsp. nº 825.660/SP, 4ª Turma, rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 01.12.2009).
O imóvel de altíssimo padrão continua protegido pela impenhorabilidade do bem de família?
Sim
Recentemente o STJ entendeu que cabe ao credor o ônus da prova para descaracterizar o bem de família, bem como que os imóveis de alto padrão não são excluídos da proteção do bem de família. Desta feita, ainda que seja uma mansão, continuará possuindo proteção pela Lei nº 8.009/1990.
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CIVIL. BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE. ÔNUS DA PROVA. CREDOR. IMÓVEL DE LUXO (ALTO VALOR). PROTEÇÃO. POSSIBILIDADE. 1. Recurso interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. Cabe ao credor o ônus da prova de descaracterizar o bem de família. Precedentes. 3. Os imóveis de alto padrão não são excluídos da proteção do bem de família. Precedentes. 4. Agravo interno não provido (AgInt no REsp. nº 1.656.079/RS, 3ª Turma, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 03.12.2018).
Quais são as principais exceções à impenhorabilidade do bem de família?
Dívidas do imóvel, pensão alimentícia, crime e fiança
Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:
- pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato
- pelo credor da pensão alimentícia, resguardados os direitos, sobre o bem, do seu coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal, observadas as hipóteses em que ambos responderão pela dívida
- para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar
- para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar;
- por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens.
- por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.
Quais são as duas exceções à impenhorabilidade da Lei nº 8.009/1990, que foram revogadas com o passar do tempo?
- I - em razão dos créditos de trabalhadores da própria residência e das respectivas contribuições previdenciárias (Revogado pela Lei Complementar nº 150, de 2015)
- VIII - para cobrança de crédito constituído pela Procuradoria-Geral Federal em decorrência de benefício previdenciário ou assistencial recebido indevidamente por dolo, fraude ou coação, inclusive por terceiro que sabia ou deveria saber da origem ilícita dos recursos (incluído pela MP 871/2019, que caducou)
Uma das exceções à impenhorabilidade do imóvel bem de família são as ações movidas “pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato”. O crédito para a realização de benfeitorias no imóvel se enquadra em tal exceção, ou a impenhorabilidade é oponível a ele?
Oponível
No tocante ao art. 3º do inciso II, o STJ entendeu que se o crédito for para realização de benfeitorias no imóvel incidirá a impenhorabilidade, logo se não for para aquisição ou construção não se aplica a regra (REsp. nº 1.765.656/SP, 3ª Turma, rel. Min. Marco Aurélio Belizze, julgado em 04.12.2018).
Uma das exceções à impenhorabilidade do imóvel bem de família são as ações movidas “pelo credor da pensão alimentícia, resguardados os direitos, sobre o bem, do seu coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal, observadas as hipóteses em que ambos responderão pela dívida”. Tal exceção estende-se a dívida de honorários advocatícios, verba de caráter alimentar?
Não se estende
O inciso III, por sua vez, trata da dívida em razão de pensão alimentícia. Nesse sentido, o STJ entende que essa exceção não se estende a dívida de honorários advocatícios, ainda que eles tenham caráter alimentar.
(…) O crédito resultante de contrato de honorários advocatícios (art. 24 da Lei n. 8.906/1994), não se assemelha à pensão alimentícia, de sorte que não se encontra entre as exceções à benesse da Lei n. 8.009/1990, de modo a preservar-se a impenhorabilidade do bem de família. 2. Agravo interno não provido (AgInt no AREsp. nº 1.246.675/ES, 4ª Turma, rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 16.10.2018).
Uma das exceções à impenhorabilidade do imóvel bem de família são as ações movidas “para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar”, o que inclui as dívidas condominiais. E se a dívida condominial for anterior à aquisição da propriedade pela entidade familiar? Tal exceção continua aplicável?
Obrigação propter rem
Por exemplo, a família adquiriu o imóvel e antes já havia dívidas condominiais. O STJ decidiu que mesmo sendo dívida anterior o bem de família é penhorável se a obrigação for propter rem.
(…) Constitui obrigação de todo condômino concorrer para as despesas condominiais, na proporção de sua cota-parte, dada a natureza de comunidade singular do condomínio, centro de interesses comuns, que se sobrepõe ao interesse individual. 2. As despesas condominiais, inclusive as decorrentes de decisões judiciais, são obrigações propter rem e, por isso, será responsável pelo seu pagamento, na proporção de sua fração ideal, aquele que detém a qualidade de proprietário da unidade imobiliária ou seja titular de um dos aspectos da propriedade (posse, gozo, fruição), desde que tenha estabelecido relação jurídica direta com o condomínio, ainda que a dívida seja anterior à aquisição do imóvel. 3. Portanto, uma vez ajuizada a execução em face do condomínio, se inexistente patrimônio próprio para satisfação do crédito, podem os condôminos ser chamados a responder pela dívida, na proporção de sua fração ideal. 4. O bem residencial da família é penhorável para atender às despesas comuns de condomínio, que gozam de prevalência sobre interesses individuais de um condômino, nos termos da ressalva inserta na Lei n. 8.009/1990 (art. 3º, IV) (REsp. nº 1.473.484/RS, 4ª Turma, rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 21.06.2018).
Uma pessoa jurídica contrai uma dívida e oferece em garantia real um imóvel que seja de propriedade do sócio. Esse imóvel será impenhorável?
Há mais sócios na sociedade?
O STJ concebeu duas hipóteses, quais sejam:
- quando a pessoa jurídica tiver outros sócios que não o proprietário desse imóvel oferecido em garantia, neste caso o bem será impenhorável, salvo se o credor provar que essa dívida beneficiou a entidade familiar;
- quando os sócios forem os próprios proprietários do imóvel, o bem será penhorável, salvo se os proprietários comprovarem que a família não se beneficiou com a dívida.
(…) O art. 1º da Lei n. 8.009/1990 instituiu a impenhorabilidade do bem de família, haja vista se tratar de instrumento de tutela do direito fundamental à moradia da família e, portanto, indispensável à composição de um mínimo existencial para uma vida digna, ao passo que o art. 3º, inciso V, desse diploma estabelece, como exceção à regra geral, a penhorabilidade do imóvel que tiver sido oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar. 2. No ponto, a jurisprudência desta Casa se sedimentou, em síntese, no seguinte sentido: a) o bem de família é impenhorável, quando for dado em garantia real de dívida por um dos sócios da pessoa jurídica devedora, cabendo ao credor o ônus da prova de que o proveito se reverteu à entidade familiar; e b) o bem de família é penhorável, quando os únicos sócios da empresa devedora são os titulares do imóvel hipotecado, sendo ônus dos proprietários a demonstração de que a família não se beneficiou dos valores auferidos. 3. No caso, os únicos sócios da empresa executada são os proprietários do imóvel dado em garantia, não havendo se falar em impenhorabilidade. 4. Embargos de divergência não providos (EAREsp. nº 848.498/PR, 2ª Seção, rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 25.04.2018).
Se o imóvel residencial familiar foi alienado fiduciariamente pelo proprietário, é penhorável ou impenhorável esse imóvel familiar?
Segundo o STJ, é válida a alienação fiduciária do imóvel residencial familiar, porque, em primeiro lugar, seria um comportamento contraditório daquele que fez a alienação fiduciária, seria um venire contra factum proprium; em segundo lugar, o bem de família não é inalienável; em terceiro lugar, porque o art. 22 da Lei nº 9.514/1997 prevê a possibilidade de alienação fiduciária do bem de família.
- Não pode o devedor ofertar bem em garantia que é sabidamente residência familiar para, posteriormente, vir a informar que tal garantia não encontra respaldo legal, pugnando pela sua exclusão (vedação ao comportamento contraditório). 8. Tem-se, assim, a ponderação da proteção irrestrita ao bem de família, tendo em vista a necessidade de se vedar, também, as atitudes que atentem contra a boa-fé e a eticidade, ínsitas às relações negociais. 9. Na hipótese dos autos, não há qualquer alegação por parte dos recorridos de que houve vício de vontade no oferecimento do imóvel em garantia, motivo pelo qual não se pode extrair a sua invalidade. 10. Ademais, tem-se que a própria Lei 8.009/90, com o escopo de proteger o bem destinado à residência familiar, aduz que o imóvel assim categorizado não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, mas em nenhuma passagem dispõe que tal bem não possa ser alienado pelo seu proprietário. 11. Não se pode concluir que o bem de família legal seja inalienável e, por conseguinte, que não possa ser alienado fiduciariamente por seu proprietário, se assim for de sua vontade, nos termos do art. 22 da Lei 9.514/97 (REsp. nº 1.677.015/SP, 3ª Turma, rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino. julgado em 28.08.2018).
Imagine um imóvel residencial alienado fiduciariamente (o morador, portanto, não tem mais a propriedade, mas apenas a posse sobre o bem). Em relação a um terceiro estranho ao contrato de alienação fiduciária (digamos que alguém a quem ele passou um cheque sem fundos), ele pode alegar que o imóvel é bem de família e, assim, impenhorável? Ou para tanto, é necessário ter a propriedade do imóvel?
Direito de posse é impenhorável
O STJ entendeu que sim, que o direito de posse sobre o imóvel alienado fiduciariamente é impenhorável.
Cinge-se a controvérsia a definir se os direitos (posse) do devedor fiduciante sobre o imóvel objeto do contrato de alienação fiduciária em garantia podem receber a proteção da impenhorabilidade do bem de família legal (Lei nº 8.009/1990) em execução de título extrajudicial (cheques). 3. Não se admite a penhora do bem alienado fiduciariamente em execução promovida por terceiros contra o devedor fiduciante, haja vista que o patrimônio pertence ao credor fiduciário, permitindo-se, contudo, a constrição dos direitos decorrentes do contrato de alienação fiduciária. Precedentes. 4. A regra da impenhorabilidade do bem de família legal também abrange o imóvel em fase de aquisição, como aqueles decorrentes da celebração do compromisso de compra e venda ou do financiamento de imóvel para fins de moradia, sob pena de impedir que o devedor (executado) adquira o bem necessário à habitação da entidade familiar. 5. Na hipótese, tratando-se de contrato de alienação fiduciária em garantia, no qual, havendo a quitação integral da dívida, o devedor fiduciante consolidará a propriedade para si, deve prevalecer a regra de impenhorabilidade. 6. Recurso especial provido (REsp. nº 1.677.079/SP, 3ª Turma, rel. Min. Ricardo Villas Boas Cueva, julgado em 25.09.2018).