Informativo 726 - 02.03.2022 Flashcards
O servidor público tem direito subjetivo à progressão funcional quando atendidos todos os requisitos legais, ou a superação dos limites orçamentários da Lei de Responsabilidade Fiscal pode constituir óbice legítimo à sua concessão?
É ilegal o ato de não concessão de progressão funcional de servidor público, quando atendidos todos os requisitos legais, a despeito de superados os limites orçamentários previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal, referentes a gastos com pessoal de ente público, tendo em vista que a progressão é direito subjetivo do servidor público, decorrente de determinação legal, estando compreendida na exceção prevista no inciso I do parágrafo único do art. 22 da Lei Complementar n. 101/2000.
“Condicionar a progressão funcional do servidor público a situações alheias aos critérios previstos por lei poderá, _por via transversa, transformar seu direito subjetivo em ato discricionário da Administração_, ocasionando violação aos princípios caros à Administração Pública, como os da legalidade, da impessoalidade e da moralidade**.”
REsp 1.878.849-TO, Rel. Min. Manoel Erhardt (Desembargador Convocado do TRF da 5ª região), Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 24/02/2022. (Tema 1075)
Na autolavagem há a consunção entre a corrupção passiva e a lavagem de dinheiro?
Não
Nota-se que não há falar em ausência de autonomia entre a corrupção passiva e a lavagem de dinheiro, com a consunção do segundo delito pelo primeiro. Isso porque não é possível ao agente, a pretexto de não ser punido pelo crime anterior ou com o fim de tornar seguro o seu produto, praticar novas infrações penais, lesando outros bens jurídicos.
Embora a tipificação da lavagem de capitais dependa da existência de um crime antecedente, é possível a AUTOLAVAGEM, isto é, a imputação simultânea, ao mesmo réu, do delito antecedente e do crime de lavagem, desde que sejam demonstrados atos diversos e autônomos daquele que compõe a realização do primeiro crime, circunstância em que não ocorrerá o fenômeno da consunção.
Com efeito, a autolavagem (self laundering/autolavado) merece reprimenda estatal, na medida em que o autor do crime antecedente, já com a posse do proveito do crime, poderia simplesmente utilizar-se dos bens e valores à sua disposição, mas reinicia a prática de uma série de condutas típicas, a imprimir a aparência de licitude do recurso obtido com a prática da infração penal anterior.
APn 989-DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 16/02/2022, DJe 22/02/2022.
É cabível a interposição de agravo de instrumento contra decisões que versem sobre o mero requerimento de expedição de ofício para apresentação ou juntada de documentos ou coisas? E se a decisão não mencionou o termo “exibição” ou aos arts. 396 a 404 do CPC/2015?
Sim
O art. 1.015, VI, do Código de Processo Civil de 2015 autoriza a interposição de agravo de instrumento contra decisão interlocutória que versa sobre exibição ou posse de documento ou coisa.
Acerca do tema, a Corte Especial deste Tribunal Superior, em precedente sujeito ao rito dos recursos especiais repetitivos, rejeitou a possibilidade de interpretação extensiva, e firmou tese segundo a qual “o rol do art. 1.015 do CPC é de taxatividade mitigada, por isso admite a interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão no recurso de apelação”.
Dessa maneira, o pleito que reivindica a expedição de ofício para apresentação ou juntada de documento ou coisa possui natureza de pedido de exibição de documento ou coisa, independentemente da menção expressa ao termo “exibição” ou aos arts. 396 a 404 do Código de Processo Civil de 2015.
Assim, é cabível agravo de instrumento contra decisão interlocutória que versa sobre a exibição de documento ou coisa, seja ela objeto de incidente processual instaurado conforme os arts. 396 a 404 do CPC/2015, de pedido de produção antecipada de provas, ou de requerimento singelo de expedição de ofício para apresentação ou juntada de documento ou coisa.
REsp 1.853.458-SP, Rel. Min. Regina Helena Costa, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 22/02/2022, DJe 02/03/2022.
O habeas corpus constitui via própria para impugnar Decreto de governador de Estado sobre adoção de medidas acerca da apresentação do comprovante de vacinação contra a COVID-19 para que as pessoas possam circular e permanecer em locais públicos e privados?
Não
Trata-se de Habeas Corpus preventivo apontado como coator o Decreto de Governador de Estado que dispõe sobre a necessidade de apresentação de documento que comprove a vacinação contra a Covid-19 para que as pessoas possam circular e permanecer em locais públicos e privados.
O Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que a impetração em análise se mostra evidentemente descabida, na linha do que prescreve a Súmula n. 266/STF, seguindo-se o entendimento jurisprudencial de que o habeas corpus não constitui via própria para o controle abstrato da validade de leis e atos normativos em geral.
RDC no HC 700.487-RS, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 22/02/2022.
A compensação é direito potestativo extintivo e, no direito brasileiro, opera por força de lei no momento da coexistência das dívidas. Para que as dívidas sejam compensáveis, elas devem ser exigíveis. Sendo assim, as obrigações naturais e as dívidas prescritas não são compensáveis. Todavia, há dúvida em uma situação. Imagine uma situação na qual há a coexistência de dívidas entre duas pessoas (cada qual, concomitantemente, credora e devedora uma da outra), e uma das dívidas prescreve no caminho (após surgir tal coexistência). Em tal caso, continua sendo possível fazer a compensação entre a dívida ainda exigível judicialmente e a prescrita, ou a prescrição obsta a compensação? O que o STJ decidiu?
A compensação é direito potestativo extintivo e, no direito brasileiro, opera por força de lei no momento da coexistência das dívidas. Para que as dívidas sejam compensáveis, elas devem ser exigíveis. Sendo assim, as obrigações naturais e as dívidas prescritas não são compensáveis.
Não se pode afirmar, no entanto, que a obrigação prescrita não possa ser, em nenhuma hipótese, objeto de compensação. Quer dizer que a prescrição somente obstará a compensação se ela for anterior ao momento da coexistência das dívidas. Se o prazo prescricional se completou posteriormente a esse fato, tal circunstância não constitui empecilho à compensação dos débitos.
Outrossim, ainda que a pretensão de cobrança do débito esteja prescrita quando configurada a simultaneidade das dívidas, a parte que se beneficia da prescrição poderá efetuar a compensação.
REsp 1.969.468-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 22/02/2022, DJe 24/02/2022.
O mero desrespeito à legislação local acerca do tempo máximo de espera em filas em bancos, por si só, não conduz à responsabilização por danos morais, segundo o STJ. Questionaram, contudo, uma situação particular: o excesso de tempo de espera em filas, por tempo superior ao legal, decorrente da reiterada existência de caixas eletrônicos inoperantes (no caso, por falta de numerário). O argumento é que se o excesso de tempo estar ligado a uma prestação de serviços bancários inadequada, tal fato, sozinho, seria suficiente para caracterizar danos morais coletivos. A questão chegou no STJ. O que ele decidiu?
A inadequada prestação de serviços bancários, caracterizada pela reiterada existência de caixas eletrônicos inoperantes, sobretudo por falta de numerário, e pelo consequente excesso de espera em filas por tempo superior ao estabelecido em legislação municipal, é apta a caracterizar danos morais coletivos.
Na decisão foi destacado que a Terceira Turma, em julgamento envolvendo a má prestação de serviços bancários e a excessiva espera em filas, já teve oportunidade de consignar que “o desrespeito voluntário das garantias legais, com o nítido intuito de otimizar o lucro em prejuízo da qualidade do serviço, revela ofensa aos deveres anexos ao princípio boa-fé objetiva e configura lesão injusta e intolerável à função social da atividade produtiva e à proteção do tempo útil do consumidor” (REsp 1.737.412/SE, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJe 08/02/2019).
REsp 1.929.288-TO, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por maioria, julgado em 22/02/2022, DJe 24/02/2022.
As hipóteses do artigo 99, II, da Lei n. 11.101/2005 (art. 99, II: “A sentença que decretar a falência do devedor, dentre outras fixará o termo legal da falência, sem poder retrotraí-lo por mais de 90 dias contados do pedido de falência, do pedido de recuperação judicial ou do 1º protesto por falta de pagamento, excluindo-se, para esta finalidade, os protestos que tenham sido cancelados”) são taxativas, devendo o marco legal da falência, no caso, ser fixado levando-se em conta a data do pedido de autofalência, ou é possível ao juiz, com base no dever de cautela, fixar data anterior, caso presentes indícios de que o falido praticou atos que acabaram prejudicando os credores mesmo antes dos 90 dias legais?
Na hipótese de autofalência, inexistindo protestos contra a devedora, o termo legal deve ser fixado em até 90 (noventa) dias antes da distribuição do pedido.
A necessidade de fixação de um termo legal da falência tem origem na percepção de que o estado de insolvência do devedor se instala paulatinamente, afetando suas decisões negociais. Nessa fase, o falido, buscando salvar a empresa, pode praticar atos que acabem prejudicando seus credores. Daí porque se fixar um período em que os atos do falido são passíveis de investigação.
A fixação do termo legal pode seguir 2 (dois) sistemas: o da determinação judicial ou o da determinação legal. O sistema por nós adotado foi inspirado em grande parte na determinação legal, o qual tem a seu favor a prevalência da segurança jurídica, estabelecendo o legislador os marcos para a fixação do termo legal da falência no artigo 99, II, da Lei n. 11.101/2005.
É certo que não se trata de adoção do sistema legal de forma pura, pois o Juiz pode estabelecer um prazo menor do que a lei coloca como limite. No entanto, os marcos estão previstos na lei e geralmente segue-se o prazo de 90 dias, denotando a opção do legislador pelo vetor segurança jurídica.
É preciso esclarecer, no ponto, que a fixação do termo legal da falência não é o único parâmetro utilizado na declaração de ineficácia dos atos do falido. Com efeito, a Lei de Falências também considera ineficazes determinados atos elencados em seu artigo 129, IV e V, praticados no período de 2 (dois) anos antes da decretação da quebra, além da venda ou transferência do estabelecimento feita sem o consentimento expresso ou o pagamento dos credores (inciso VI), hipótese em que não há limitação temporal.
Há, portanto, um segundo período, diferente do termo legal, a que alguns doutrinadores denominam de “período suspeito”, embora não haja unanimidade na utilização dessa nomenclatura. Ademais, há o prazo de 15 (quinze) dias antes da decretação da quebra em relação à entrega de mercadorias vendidas a prazo.
Além disso, a declaração de ineficácia da transferência do estabelecimento empresarial não depende de que tenha ocorrido dentro do termo legal ou do período de 2 (dois) anos anterior à quebra (art. 129, VI, da Lei n. 11.101/2005).
Nesse contexto, mostra-se equivocada a argumentação no sentido de que a alteração do termo legal da falência justifica-se diante da consonância do marco de retroação com o da ação revocatória, aludindo para o fato de que a falida teria se desfeito dos bens que compunham o seu principal estabelecimento. Trata-se de parâmetros diversos, não havendo impedimento para que se analise a ineficácia dos atos de alienação dos bens do estabelecimento ainda que o termo legal seja fixado em 90 (noventa) dias antes do pedido de autofalência, como determina o artigo 99, II, da Lei n. 11.101/2005.
Disso decorre que, inexistindo notícia da ocorrência de protestos nos autos, o termo legal da falência deve ser fixado em 90 (noventa) dias antes do pedido de autofalência.
REsp 1.890.290-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 22/02/2022.
Em um processo, a parte alegou que não há impeditivo para que a prescrição seja alegada em cumprimento de sentença, mormente porque a cobrança quanto ao período prescrito somente surgiu com o laudo pericial. Ressaltou, ainda, que se trata de matéria de ordem pública, podendo ser alegada em qualquer fase processual. A parte contrária, de seu turno, aduziu que a prescrição não pode ser alegada depois do trânsito em julgado do título exequente. A questão chegou ao STJ. O que ele decidiu?
Apenas a superveniente
Assim, “em observância ao instituto da coisa julgada e sua eficácia preclusiva, apenas a prescrição consumada após a formação do título judicial exequendo é passível de conhecimento em impugnação do cumprimento de sentença, nos termos dos arts. 475-L, VI, do CPC/1973 e 525, § 1º, VII, do CPC/2015” (AgInt no AREsp 1.828.492/SP, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 7/6/2021, DJe 1º/7/2021).
Na hipótese, o período da cobrança foi definido na sentença transitada em julgado e não no laudo pericial, que apenas determinou os valores devidos.
REsp 1.931.969-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 08/02/2022, DJe 11/02/2022.
Dirigentes, unidades ou órgãos de entidades de administração do desporto podem ser enquadradas no conceito de autoridade pública ou exercício de função pública? Em outras palavras, é possível impetrar mandado de segurança contra decisões destes?
É inviável a subsunção de dirigentes, unidades ou órgãos de entidades de administração do desporto ao conceito de autoridade pública ou exercício de função pública, sobressaindo o caráter privado dessas atividades, declarando-se a ilegitimidade passiva a obstar o exame de mérito do mandado de segurança.
REsp 1.348.503-SE, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 22/02/2022.
O Ministério Público pode utilizar peça sigilosa obtida em procedimento em curso no Supremo Tribunal Federal para abertura de procedimento investigatório criminal autônomo com objetivo de apuração dos mesmos fatos objeto da demanda no STF?
É ilegal a utilização, por parte do Ministério Público, de peça sigilosa obtida em procedimento em curso no Supremo Tribunal Federal para abertura de procedimento investigatório criminal autônomo com objetivo de apuração dos mesmos fatos já investigados naquela Corte.
RHC 149.836-RS, Rel. Min. Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado Do TJDFT), Rel. Acd. Min. João Otávio de Noronha, Quinta Turma, julgado em 15/02/2022.