Informativo 700 - 14.06.2021 Flashcards
É possível a usucapião em uma área irregular (área na qual não houve regularização fundiária)?
É cabível a aquisição de imóveis particulares situados no Setor Tradicional de Planaltina/DF, por usucapião, ainda que pendente o processo de regularização urbanística.
EXPLICAÇÃO COMPLETA: Existem três dimensões envolvendo a regularização fundiária:
- a) a* dimensão urbanística**, relacionada aos investimentos necessários para melhoria das condições de vida da população;
- b) a* dimensão jurídica**, que diz respeito aos instrumentos que possibilitam a aquisição da propriedade nas áreas privadas e o reconhecimento da posse nas áreas públicas; e
- c) a* dimensão registrária**, com o lançamento nas respectivas matrículas da aquisição destes direitos, a fim de atribuir eficácia para todos os efeitos da vida civil.
Isso, contudo, não interfere no direito de propriedade. A forma como determinado imóvel se apresenta no contexto urbano não se confunde com o direito de propriedade. Se o imóvel é assistido por vias públicas, se conta com sistemas de água e esgoto, se foi edificado com respeito aos recuos e gabarito previsto nas posturas municipais, nada disso é capaz de criar ou suprimir o direito de propriedade ou os reflexos desse direito no registro imobiliário.
- Não há, portanto, como negar o direito à usucapião sob o pretexto de que o imóvel está inserido em loteamento irregular, porque o direito de propriedade declarado pela sentença (dimensão jurídica) não se confunde com a certificação e publicidade que emerge do registro (dimensão registrária) ou com a regularidade urbanística da ocupação levada a efeito (dimensão urbanística).*
- O reconhecimento da usucapião não impede a implementação de políticas públicas de desenvolvimento urbano. Ao contrário, isso representa, em várias hipóteses, o primeiro passo para restabelecer a regularidade da urbanização. Se a utilização do imóvel desrespeita o interesse público, isso continuará a acontecer independentemente do reconhecimento da prescrição aquisitiva. Eventual construção irregular, supressão de nascente ou risco à saúde pública continuarão a existir independentemente de o juiz, na sentença, deferir ou indeferir o pedido de usucapião, sendo certo que tais irregularidades devem ser corrigidas por remédios próprios, a cargo do Poder Público, pelo poder de polícia que lhe é inerente.*
- A declaração da usucapião, vale dizer, é incapaz de causar prejuízo à ordem urbanística, sendo certo, da mesma forma, que o indeferimento do pedido de usucapião não é capaz, por si só, de evitar a utilização indevida da propriedade.*
DECISÃO DO STF NO RE 422.349/RS
- O Pleno do STF, ao julgar o RE 422.349/RS, sob a relatoria do Ministro Dias Toffoli, fixou a tese de que: Se forem preenchidos os requisitos do art. 183 da CF/88, a pessoa terá direito à usucapião especial urbana e o fato de o imóvel em questão não atender ao mínimo dos módulos urbanos exigidos pela legislação local para a respectiva área (dimensão do lote) não é motivo suficiente para se negar esse direito, que tem índole constitucional.*
- Para que seja deferido o direito à usucapião especial urbana basta o preenchimento dos requisitos exigidos pelo texto constitucional, de modo que não se pode impor obstáculos, de índole infraconstitucional, para impedir que se aperfeiçoe, em favor de parte interessada, o modo originário de aquisição de propriedade. STF. Plenário. RE 422349/RS, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 29/4/2015 (repercussão geral) (Info 783).*
- STJ. 2ª Seção. REsp 1818564-DF, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 09/06/2021 (Recurso Repetitivo – Tema 1025) (Info 700).*
A morte de usufrutuário que arrenda imóvel, durante a vigência do contrato de arrendamento, sem a reivindicação possessória pelo proprietário, torna precária e injusta a posse exercida pelos seus sucessores? Ela constitui óbice ao exercício dos direitos provenientes do contrato de arrendamento pelo espólio perante o terceiro arrendatário?
Usufrutuário havia arrendado o imóvel objeto do usufruto; usufrutuário morreu; com isso, extingue-se o usufruto; porém, enquanto o proprietário não reivindicar a posse, os sucessores do usufrutuário poderão pleitear os direitos contratuais em face do arrendatário
A morte de usufrutuário que arrenda imóvel, durante a vigência do contrato de arrendamento, sem a reivindicação possessória pelo proprietário, torna precária e injusta a posse exercida pelos seus sucessores, mas não constitui óbice ao exercício dos direitos provenientes do contrato de arrendamento pelo espólio perante o terceiro arrendatário.
STJ. 3ª Turma. REsp 1758946-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 08/06/2021 (Info 700).
É obrigatório o fornecimento, a qualquer interessado, das informações relativas à participação individual de cada artista nas obras musicais coletivas?
As associações de gestão coletiva de direitos autorais, a despeito de possuírem natureza jurídica de direito privado, exercem, tal qual dispõe o art. 97, § 1º, da Lei nº 9.610/98, atividade de interesse público, devendo atender a sua função social.
Nos termos do art. 98, § 6º, da Lei nº 9.610/98, introduzido pela Lei nº 12.853/2013, as associações deverão manter um cadastro centralizado de todos os contratos, declarações ou documentos de qualquer natureza que comprovem a autoria e a titularidade das obras e dos fonogramas, bem como as participações individuais em cada obra e em cada fonograma, prevenindo o falseamento de dados e fraudes e promovendo a desambiguação de títulos similares de obras.
Ainda, nos moldes do que dispõe o § 7º do mencionado dispositivo legal, tais informações são de interesse público e o acesso a elas deverá ser disponibilizado por meio eletrônico a qualquer interessado, de forma gratuita.
STJ. 3ª Turma. REsp 1921769-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 08/06/2021 (Info 700).
Os créditos decorrentes de contratos a termo de moeda submetem-se aos efeitos da recuperação judicial? E se os vencimentos ocorrerem após o deferimento do pedido de soerguimento?
Exemplo: em 02/02/2017, a sociedade empresária Fertilizantes Heringer S/A celebrou com o Banco do Brasil um contrato a termo de moeda. Em 15/03/2017, ou seja, logo depois da celebração desse contrato, a Fertilizantes Heringer S/A ingressou com pedido de recuperação judicial. Em 02/05/2017, depois de deferido o pedido de recuperação judicial, ocorreu o vencimento do contrato a termo de moeda e isso resultou um crédito de R$ 1 milhão em favor da instituição financeira. Esse crédito está sujeito aos efeitos da recuperação judicial mesmo que seu vencimento tenha ocorrido após o deferimento do pedido de recuperação?
O contrato a termo de moeda, espécie de instrumento derivativo, possibilita proteção de riscos de mercado decorrentes da variação cambial. Por meio dele, assume-se a obrigação de pagar a quantia correspondente à diferença resultante entre a taxa de câmbio contratada e a taxa de mercado da data futura estabelecida na avença. A existência do crédito está diretamente ligada à relação jurídica estabelecida entre credor e devedor, devendo-se levar em conta, para sua aferição, a ocorrência do respectivo fato gerador, isto é, a data da fonte da obrigação.
A fonte (fato gerador) da obrigação de pagar a quantia que vier a ser liquidada na data do vencimento do contrato a termo de moeda é o próprio contrato firmado com a instituição bancária. A oscilação do parâmetro financeiro (taxa de câmbio) constitui evento previsto e traduz risco deliberadamente assumido pelas partes, não sendo ela, todavia, a fonte da obrigação.
STJ. 3ª Turma. REsp 1924161-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 08/06/2021 (Info 700).
Cabe a aplicação de multa pelo não comparecimento pessoal à audiência de conciliação, por ato atentatório à dignidade da Justiça, quando a parte não comparecer, mas enviar advogado com poderes específicos para transigir?
A parte tem o direito de se fazer representar na audiência de conciliação por advogado com poderes para negociar e transigir. Assim, não cabe a aplicação de multa pelo não comparecimento pessoal à audiência de conciliação, por ato atentatório à dignidade da Justiça, quando a parte estiver representada por advogado com poderes específicos para transigir.
Isso está expressamente previsto no § 10 do art. 334 do CPC/2015: Art. 334 (…) § 10. A parte poderá constituir representante, por meio de procuração específica, com poderes para negociar e transigir.
ATENÇÃO! Esse entendimento não se aplica aos Juizados Especiais, os quais possuem regramento próprio e em sentido diverso.
STJ. 4ª Turma. AgInt no RMS 56422-MS, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 08/06/2021 (Info 700).
Quem possui legitimidade recursal concorrente quanto à fixação dos honorários advocatícios? A parte ou o advogado?
Os dois. O STJ já reconhecia esta legitimidade concorrente desde o CPC de 1973. A dúvida que surgiu é se seria possível entender que o § 5º do art. 99 do CPC/2015 alterou essa legitimidade recursal concorrente em matéria de honorários sucumbenciais. A resposta, como visto, foi negativa. Veja o que diz esse dispositivo: “Art. 99. (…) § 5º Na hipótese do § 4º, o recurso que verse exclusivamente sobre valor de honorários de sucumbência fixados em favor do advogado de beneficiário estará sujeito a preparo, salvo se o próprio advogado demonstrar que tem direito à gratuidade”.
O § 5º do art. 99 do CPC não trata sobre legitimidade recursal, mas sim do requisito do preparo. Assim, mesmo interposto recurso pela parte que seja beneficiária de gratuidade judiciária e que se limite a discutir os honorários de advogado, o preparo deverá ser realizado caso o advogado também não seja beneficiário da gratuidade. Assim, a própria parte pode interpor, concorrentemente com o titular da verba honorária, recurso acerca dos honorários de advogado.
STJ. 3ª Turma. REsp 1776425-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 08/06/2021 (Info 700).
Qual é o termo inicial do prazo para oferecer contestação na hipótese de acolhimento da impugnação ao cumprimento de sentença fundada no art. 525, § 1º, I, do CPC/2015 (falta ou nulidade de citação)?
Em fase de execução, intimação da decisão
Em fase de conhecimento, a data de comparecimento espontâneo
O termo inicial do prazo para oferecer contestação na hipótese de acolhimento da impugnação ao cumprimento de sentença fundada no art. 525, § 1º, I, do CPC/2015 é a data da intimação da decisão que acolhe a impugnação.
No caso de acolhimento da impugnação ao cumprimento de sentença fundada no art. 525, § 1º, I, do CPC/2015, o prazo para a apresentação de contestação se inicia somente na data em que houver a intimação da decisão do juiz que acolheu a impugnação. Esse prazo não se iniciou no momento em que o executado compareceu espontaneamente. O réu poderá esperar a decisão do juiz antes de apresentar a contestação.
O art. 239, § 1º do CPC afirma que o prazo para a apresentação de contestação se inicia na data do comparecimento espontâneo do réu. Isso significa que o réu não deve ficar esperando a decisão do juiz, tendo em vista que seu prazo já começou a correr. Ocorre que o art. 239, § 1º do CPC é voltado para as hipóteses em que o réu toma conhecimento do processo ainda na sua fase de conhecimento. Esse dispositivo não se aplica para o caso em que o processo já está na fase de cumprimento de sentença.
STJ. 3ª Turma. REsp 1930225-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 08/06/2021 (Info 700).
As revisões de valores previstos na LC 123/2006 (quantitativos máximos de receita bruta para enquadramento como ME ou EPP) retroagem para descaracterizar o crime de frustração do caráter competitivo de licitação?
As sucessivas revisões dos quantitativos máximos de receita bruta para enquadramento como ME ou EPP, da LC 123/2006, para fazer frente à inflação, não descaracterizam crimes de inserção de informação falsa em documento público, para fins de participação em procedimento licitatório, cometidos anteriormente.
Caso concreto: foi aberta licitação que era restrita a MEs e EPPs. A empresa “X” tinha um faturamento acima daquilo que a LC 123/2006 estabelecia como sendo o teto para ser considerada EPP. Desse modo, a empresa “X”, segundo a lei vigente na época, não podia ser considerada EPP. Mesmo assim, os sócios da empresa “X” forneceram declaração dizendo que ela se enquadrava como EPP, com o objetivo de fazer com que ela pudesse participar da licitação. Pouco tempo depois, entrou em vigor a LC 139/2011, que aumentou os valores máximos para fins de caracterização como ME ou EPP previstos no art. 3º da LC 123/2006. Com essa mudança, a empresa “X” passou a ser considerada como empresa de pequeno porte.
Essa alteração legislativa não tem eficácia retroativa, não servindo para absolver os réus pela declaração falsa.
STJ. 5ª Turma. AREsp 1526095-RJ, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 08/06/2021 (Info 700).
A quem compete processar e julgar o crime de esbulho possessório de imóvel vinculado ao Programa Minha Casa Minha Vida? À Justiça Estadual ou Federal?
Compete à Justiça Federal processar e julgar o crime de esbulho possessório de imóvel vinculado ao Programa Minha Casa Minha Vida.
A vítima do crime de esbulho possessório, tipificado no art. 161, § 1º, II, do Código Penal é o possuidor direto, pois é quem exercia o direito de uso e fruição do bem. Na hipótese de imóvel alienado fiduciariamente, é o devedor fiduciário que ostenta essa condição, pois o credor fiduciário possui tão-somente a posse indireta.
A Caixa Econômica Federal, enquanto credora fiduciária e, portanto, possuidora indireta, não é a vítima do referido delito. Contudo, no âmbito cível, a empresa pública federal possui legitimidade concorrente para propor eventual ação de reintegração de posse, diante do esbulho ocorrido. A sua legitimação ativa para a ação possessória demonstra a existência de interesse jurídico na apuração do crime, o que é suficiente para fixar a competência penal federal, nos termos do art. 109, IV, da CF/88.
Os imóveis que integram o Programa Minha Casa Minha Vida são adquiridos, em parte, com recursos orçamentários federais. Tal fato evidencia o interesse jurídico da União na apuração do crime de esbulho possessório em relação a esse bem, ao menos enquanto for ele vinculado ao mencionado Programa, ou seja, quando ainda em vigência o contrato por meio do qual houve a compra do bem e no qual houve o subsídio federal, o que é a situação dos autos.
STJ. 3ª Seção. CC 179467-RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 09/06/2021 (Info 700).
A matriz pode discutir relação jurídico-tributária, pleitear restituição ou compensação relativamente a indébitos de suas filiais?
As filiais são estabelecimentos secundários da mesma pessoa jurídica, desprovidas de personalidade jurídica e patrimônio próprio, apesar de poderem possuir domicílios em lugares diferentes (art. 75, § 1º, do CC) e inscrições distintas no CNPJ.
O fato de as filiais possuírem CNPJ próprio confere a elas somente autonomia administrativa e operacional para fins fiscalizatórios, não abarcando a autonomia jurídica, já que existe a relação de dependência entre o CNPJ das filiais e o da matriz.
Os valores a receber provenientes de pagamentos indevidos a título de tributos pertencem à sociedade como um todo, de modo que a matriz pode discutir relação jurídico-tributária, pleitear restituição ou compensação relativamente a indébitos de suas filiais.
- STJ. 1ª Turma. AREsp 1273046-RJ, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 08/06/2021 (Info 700).*
- Obs: existem alguns julgados mais antigos da 2ª Turma do STJ em sentido contrário. Nesse sentido: “a matriz não tem legitimidade para representar processualmente as filiais nos casos em que o fato gerador do tributo se dá de maneira individualizada em cada estabelecimento comercial/industrial” (STJ. 2ª Turma. AgRg no REsp 832.062/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 2/12/2008).*
A antecipação do vencimento do benefício fiscal de alíquota zero do PIS/PASEP e Cofins pelo art. 9º da Medida Provisória nº 690/2015, convertida na Lei nº 13.241/2015, é legal?
É ilegal a antecipação do vencimento do benefício fiscal pelo art. 9º da Medida Provisória nº 690/2015, convertida na Lei nº 13.241/2015, sendo imperioso o restabelecimento da desoneração fiscal objetiva dada ao PIS e à Cofins pelos artigos 28 a 30 da Lei do Bem até o dia 31 de dezembro de 2018, nos termos do artigo 5º da Lei nº 13.097/2015, incidentes sobre a receita bruta a varejo de produtos relacionados ao Programa de Inclusão Digital.
O CTN trata, no art. 178, sobre a isenção condicionada e com prazo certo: “Art. 178. A isenção, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo, observado o disposto no inciso III do art. 104.” Desse modo, a isenção condicionada e por prazo certo não pode ser extinta pela pessoa política tributante, antes do termo final assinalado, sob pena de ofensa ao direito adquirido, uma das expressões do princípio da segurança jurídica.
STJ. 1ª Turma. REsp 1725452-RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. Acd. Min. Regina Helena Costa, julgado em 08/06/2021 (Info 700).
Qual é o termo inicial do auxílio-acidente?
O termo inicial do auxílio-acidente deve recair no dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença que lhe deu origem, conforme determina o art. 86, § 2º, da Lei nº 8.213/91.
STJ. 1ª Seção. REsp 1729555-SP, Rel. Min. Assusete Magalhães, julgado em 09/06/2021 (Recurso Repetitivo – Tema 862) (Info 700).