TEMAS AVANÇADOS - "Iter criminis" Flashcards
O que é o iter criminis?
Literalmente, seria o itinerário do crime. Iter é itinerário, é caminho, e criminis, crime, evidentemente. Então, iter criminis é o itinerário do crime, é o caminho do crime, é o caminho que o crime tem a percorrer, é o caminho que o crime pode percorrer, ou que já percorreu no caso dos crimes que já concluíram o iter criminis. SÃO AS FASES ou ETAPAS DO CRIME.
Quais são as fases do crime? Quais são as etapas que o crime tem a percorrer?
Para a doutrina majoritária, são até quatro etapas (há quem defenda, minoritariamente, haver uma quinta etapa):
- A primeira é a fase de cogitação ou na expressão latina cogitatio.
- Um segundo momento, teremos a fase de preparação ou fase de atos preparatórios
- Um terceiro momento, temos a fase de execução ou de atos executórios
- No quarto momento temos, finalmente, a consumação, concluindo esse iter criminis.
Há quem entenda que nós teríamos uma quinta fase que seria o exaurimento, mas o entendimento majoritário é no sentido de que o exaurimento não integra o iter criminis.
O que é a fase do cogitatio, ou da cogitação? Quais são suas três etapas? Pode haver incriminação nesta etapa?
É aquela fase do pensar, do criar mentalmente, do representar (representação é uma criação mental). A fase da cogitatio é aquela em que eu apenas tenho vontade de praticar o crime. Essa fase de cogitação é uma fase que pode ser dividida em três etapas:
- A idealização, ou seja, é a fase em que eu realmente apenas estou pensando;
- A deliberação, que é aquele momento em que eu vou decidir se realmente eu vou concretizar a minha vontade;
- A resolução, quando eu finalmente me decido que realmente vou lá agredir aquele sujeito, vou deflagrar disparos naquele sujeito.
Neste primeiro momento (momento da cogitação), não pode haver criminalização.
O segundo momento do iter criminis é a preparação (ou atos preparatórios). O que o caracteriza? Ele pode ser punido?
Aquele momento em que já estou materializando a minha vontade, transformando a minha vontade em atos concretos, ou seja, não é uma situação na qual eu quero matar apenas, agora, além de querer matar, eu já comprei a arma, adquiri a arma de fogo.
O ato preparatório de um crime por si só, em regra, não pode ser punido (mas há uma exceção). Quem quer matar alguém e compra a arma de fogo para tanto, ainda não pode ser punido sequer por tentativa. É mero ato preparatório.
Quais as duas situações em que o ato preparatório (segunda fase do iter criminis) pode ser punido? Dê dois exemplos da primeira e mais comum delas.
Consumação de outro crime
Ou atos preparatórios de atos de terrorismo
A PRIMEIRA EXCEÇÃO: Às vezes o ato preparatório de um crime (eu estou aí na segunda fase do iter criminis) já é consumação de algum outro crime. Comprar uma arma pensando em matar alguém não pode ser punido, pois é mero ato preparatório que não resvala em outro tipo penal. Todavia, comprar uma arma com numeração raspada, por exemplo, pode ser punido, pois é a consumação de outro crime. Um exemplo bastante conhecido, para quem faz concurso para área federal, é o crime de moeda falsa (é o crime do art. 289 do Código Penal – CP), e nós temos no art. 291 do CP, o crime de petrechos para falsificação de moeda. Então, se eu tenho ali instrumentos para falsificar a moeda, isso é ato preparatório do crime de moeda falsa (que é o art. 289), mas isso já é consumação do art. 291, que é o crime de petrechos para a falsificação de moeda.
A SEGUNDA EXCEÇÃO está na nossa Lei de Terrorismo (a Lei nº 13.260/2016). Lá, nós temos o crime de atos de terrorismo. Essa lei, no seu art. 5º, pune os atos preparatórios de atos de terrorismo. Então, os atos de terrorismo são crimes, mas os atos preparatórios de atos de terrorismo já são punidos.
Em que momento do iter criminis, por regra, começa a punibilidade?
A punibilidade, como regra, se inicia nos atos de execução. Diz o art. 14, inciso II, do CP (que trata da tentativa, ou melhor, define o crime tentado): “diz-se tentado o crime quando, iniciados os atos de execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente”. No crime tentado, eu inicio a terceira fase (que é a fase dos atos executórios, é a fase de execução), e eu, então, não alcanço a quarta fase (que é a fase de consumação) por circunstâncias que são alheias à minha vontade.
Quando é que se iniciam os atos de execução? Quando é que se encerra a fase de atos preparatórios e se inicia a fase de execução?
Esse, segundo o professor, é um dos temas mais tormentosos da parte geral do direito penal. Há várias teorias, mas nenhuma das teorias atende a contento a todos os casos.
Eu vou além: essas teorias, na prática, sabe para o que elas servem? Para serem cobradas no seu concurso, porque, na prática, o Judiciário muito pouco tem se valido delas. Eu até vou comentar o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) a respeito, mas, na prática, tem sido muito casuísmo mesmo, é analisar o caso concreto e, à luz daquele caso concreto, identificarmos se houve ou não o início da fase de execução.
- A primeira teoria é a teoria negativa ou negativista (pragmática, pois nega qualquer relevância na distinção entre ato preparatório e ato de execução… por isso mesmo, naõ é acolhida no Brasil)
- A segunda teoria é a teoria subjetiva (minoritária no Brasil: dá ênfase no elemento subjetivo, na vontade, o que gera sérias dificuldades de aplica-la na prática)
- A terceira teoria é a teoria objetiva (que se divide em pelo menos quatro diferentes teorias)
A teoria objetiva para diferenciação entre a fase preparatória e a executória do iter criminis é, na verdade, um gênero de teorias, o qual se subdivide em ao menos quatro espécies diferentes. Quais são estas quatro “teorias objetivas”?
- em primeiro lugar, a teoria objetivo-formal;
- vou falar, em segundo lugar, na teoria objetivo-material;
- falo na teoria da hostilidade ao bem jurídico;
- falo na teoria objetiva-individual, também chamada de objetiva-subjetiva.
A teoria objetiva para diferenciação entre a fase preparatória e a executória do iter criminis é, na verdade, um gênero de teorias, o qual se subdivide em ao menos quatro espécies diferentes. O que diz a primeira destas espécies, a chamada teoria objetivo-formal?
Iniciam-se os atos de execução quando o agente inicia a realização do núcleo do tipo. O núcleo do tipo é o verbo, então, iniciam-se os atos de execução quando ele inicia a realização do verbo. Então, por exemplo, no furto, subtrair para si ou para outrem coisa alheia móvel. Quando se inicia a execução? Quando o ladrão inicia a realização do verbo subtrair. Então, enquanto ele não colocou a mão na coisa móvel para puxar, para subtrair, quando ele ainda está tentando chegar lá, ainda não seria ato de execução de acordo com essa teoria.
A teoria objetiva para diferenciação entre a fase preparatória e a executória do iter criminis é, na verdade, um gênero de teorias, o qual se subdivide em ao menos quatro espécies diferentes. O que diz a segunda destas espécies, a chamada teoria objetivo-material?
Diz que há determinadas situações nas quais o sujeito já inicia a execução mesmo antes de iniciar a realização do verbo. Pense no caso de um ladrão: ele já pulou o muro da casa, já invadiu a casa, já está na residência, ele só não pegou ainda um objeto, mas será que ele já não teria iniciado a execução já que ele invadiu a casa? Então, nesse caso, para a teoria objetivo-material, você leva em consideração não apenas a realização do núcleo do tipo, mas também a prática de atos materiais, imediatamente anteriores à realização do núcleo do tipo.
A teoria objetiva para diferenciação entre a fase preparatória e a executória do iter criminis é, na verdade, um gênero de teorias, o qual se subdivide em ao menos quatro espécies diferentes. O que diz a terceira destas espécies, a chamada teoria da hostilidade ao bem jurídico?
Na teoria da hostilidade ao bem jurídico, o nome é autoexplicativo. Você precisaria analisar, no caso concreto, se o bem jurídico já foi hostilizado ou não. Essa é uma teoria que até conta com alguns adeptos em sede doutrinária aqui no Brasil, mas a teoria majoritária, realmente, a última, é a teoria objetivo-individual ou a teoria objetivo-subjetiva.
O que é um crime material?
Crime material é aquele que se consuma com a produção do resultado material que também é chamado de resultado naturalístico (aquele que promove uma alteração no mundo da natureza).
Mundo da natureza é o mundo dos fatos, o mundo sensível, é esse mundo que eu posso ver, sentir, cheirar, tocar. Então, por exemplo, o homicídio: o sujeito estava vivo e, agora, está morto; o furto: o dinheiro estava lá, a res furtiva estava lá com a vítima, agora, está com o ladrão. Então, você vai alterando o mundo dos fatos para consumar o crime. Esse é o chamado crime material.
Claro que a larga maioria dos crimes, de acordo com essa classificação (classificação dos crimes quanto ao resultado naturalístico), a larga maioria dos crimes será constituída de crimes materiais, porque, na larga maioria dos crimes, eu tenho a consumação com a produção do resultado material, também chamado de resultado naturalístico.
O que é o crime formal?
O crime formal, também chamado de crime de resultado antecipado. “Resultado antecipado” porque o crime formal é aquele que se consuma antes da produção do resultado naturalístico. Ele não depende da produção de resultado naturalístico para se consumar. Até pode haver resultado naturalístico, mas não mais como consumação e sim como exaurimento.
O que é o exaurimento?
É justamente um resultado naturalístico que ocorre após a consumação. Então, um exemplo bem emblemático é o crime de extorsão que está no art. 158 do CP. Quando o criminoso exige a vantagem econômica indevida - o extorsionário faz essa exigência -, ele já consumou o crime. Ao exigir a vantagem, já está consumado. Se após a exigência ele ainda recebe o dinheiro, aí eu tenho um resultado naturalístico e, esse resultado naturalístico, ocorreu após a consumação, a isso nós chamamos exaurimento.
Então, veja, que aqui é um crime formal, é um crime que se consuma antes do resultado naturalístico e o resultado naturalístico vem como exaurimento.
O crime de corrupção passiva é formal ou material?
Depende
Crime de corrupção passiva, por exemplo, quando o funcionário público solicita ou aceita a promessa de vantagem indevida, o crime já está consumado. Se depois de solicitar ou aceitar promessa de vantagem indevida, ele ainda receber a vantagem indevida, aí eu tenho exaurimento, eu tenho um resultado naturalístico após a consumação – crime formal.
Agora, vejam que curioso: se, porventura, o funcionário público receber a vantagem indevida sem ter solicitado ou aceitado a promessa, aí a consumação se dá como recebimento, porque o art. 317 fala nas três condutas: solicitar, aceitar promessa ou receber a vantagem indevida. Se ele solicitou ou aceitou promessa, já consumou e aí o recebimento seria mero exaurimento, mas, se ele recebeu sem ter solicitado, aceitado promessa, aí no recebimento é que a consumação e aí o crime se torna crime material.
Resumindo, não dá para gente dizer, a priori, que a corrupção passiva é crime material ou formal, não! Às vezes, depende - a corrupção passiva pode ser material ou formal, depende da conduta.
O que é o crime de mera conduta?
No crime de mera conduta que também é chamado de crime de mera atividade, nós não temos resultado naturalístico, nem a título de exaurimento. Um exemplo que me parece muito emblemático é o crime de injúria. Na injúria o sujeito ofende a honra da vítima. Eu xinguei alguém, então, eu vou dizer: “você é burro”, é uma ofensa, é uma injúria, uma adjetivação pejorativa é uma injúria e isso não muda o mundo da natureza, o mundo dos fatos. Isso pode mudar o mundo interno da vítima, do psicológico que agora está com raiva de mim, agora está magoada, está triste, está ofendido, quer se vingar de mim, enfim, não importa! Mudou o mundo interno, o mundo psicológico da vítima, o mundo exterior, ou seja, o mundo da natureza, mundo naturalístico, esse não é alterado em nada.
No crime permanente, quando se dá a consumação?
CRIME PERMANENTE é aquele cuja conduta se protrai no tempo, como o de cárcere privado, art. 148 do CP, porque o crime consiste em privar a vítima da sua liberdade física, liberdade ambulatorial. Nesse crime, eu tenho uma conduta só e eu privei de liberdade, consumei. Só que essa única conduta, essa consumação se prolonga porque eu posso manter a pessoa privada de sua liberdade por minutos, por horas, por dias, por meses, por anos e a consumação está se protraindo.
Então, no crime permanente eu tenho uma conduta única que já consuma o crime, mas, é uma conduta que se protrai no tempo e, por isso, a consumação também se protrai no tempo. É por isso que, em se tratando de crime permanente, se sobrevém uma lei maléfica ao réu, enquanto a conduta está sendo realizada, essa lei se aplica.
No crime habitual, quando se dá a consumação? Aliás, qual a diferença entre habitualidade e permanência?
O crime habitual é aquele que pressupõe uma habitualidade. Habitualidade é diferente de permanência. Enquanto na permanência temos uma conduta única que se protrai no tempo, na habitualidade temos várias condutas reiteradas que ocorrem habitualmente, com uma certa constância. Um bom exemplo é o crime de exercício ilegal da profissão.
O crime habitual, como o exercício ilegal da profissão, não se consuma com uma conduta apenas. Se eu me passar por médico uma vez e cobrar uma consulta, eu posso ser enquadrado no estelionato, estou levando a pessoa ao erro para obter vantagem econômica indevida, mas, não no exercício ilegal da profissão. Para que haja exercício ilegal da profissão é necessário que a pessoa se apresente como médico, monte um consultório, atenda em uma clínica, ou seja, eu tenho a reiteração daquela conduta e para consumar o crime pressupõe-se essa reiteração.
Os crimes de perigo têm momento consumativo particularizado, peculiar. Por que e qual?
Quando a gente fala em crime de perigo, a gente pode falar em crime de perigo concreto ou crime de perigo abstrato. Crime de perigo é aquele que se consuma sem que haja uma lesão ao bem jurídico (basta o risco de lesão). No crime de perigo concreto, nós temos que a lei exige que o bem jurídico seja exposto ao perigo real, efetivo. Já no crime de perigo abstrato a lei se contenta com a conduta e é a própria lei que já presume que o bem jurídico foi exposto ao perigo.
Nos crimes qualificados pelo resultado, quando ocorre sua consumação?
Nesses crimes qualificados pelo resultado, a consumação ocorre com essa qualificadora. Então, exemplo: o roubo qualificado pela morte, o chamado latrocínio, então, é com a qualificadora que a gente vai ter aqui essa consumação. Lembrando que no entendimento do STF, entendimento sumulado (Súmula nº 610 do STF), se o sujeito matar a vítima para subtrair os bens, ainda que ele não consiga subtrair os bens, o latrocínio estará consumado.
Quando se consuma o crime omissivo?
É preciso diferenciar o crime omissivo próprio (previsto em lei) do impróprio (garante).
O CRIME OMISSIVO IMPRÓPRIO não se consuma com a mera omissão do garantidor, ele se consuma com o resultado. O garantidor se omite, ocorre o resultado e é com esse resultado que eu tenho a consumação.
No CRIME OMISSIVO PRÓPRIO a mera omissão já consuma o crime.
Quais são os cinco institutos previstos no CP que estão relacionados ao iter criminis (artigos 14 a 17)?
- Tentativa
- Desistência voluntária
- Arrependimento eficaz
- Arrependimento posterior
- Crime impossível
Quando é que se diz “tentado o crime”? Qual a natureza jurídica da tentativa?
Diz-se “tentado o crime” quando iniciados os atos de execução, mas não consumado por circunstâncias alheias à vontade do agente. Eu inicio a terceira fase, que é a fase de execução, e não chego à quarta fase, que é a fase de consumação, por circunstâncias que são alheias à minha vontade, circunstâncias que não dependiam de mim.
A NATUREZA JURÍDICA DA TENTATIVA é de ampliação temporal da figura típica. Além disso, é uma causa de diminuição de pena prevista na parte geral do CP. É uma ampliação temporal da figura típica porque ela amplia o tipo penal, fazendo com que incida nele alguém que não cometeu, de fato, a ação contida no verbo do tipo penal específico. Na tentativa de homicídio, o agente não “mata alguém” e, mesmo assim, responde pelo crime de “matar alguém”. Tal se dá pela ampliação da figura típica engedrada pelo instituto da tentativa. É a chamada norma de extensão.
Qual é a consequência do crime tentado?
No crime tentado, salvo disposição legal em contrário, eu aplico a pena do crime consumado diminuída de um a dois terços. Importante a observação “salvo disposição legal em contrário”, pois a lei pode ter outra regra para o crime tentado. Então, por exemplo, existem alguns crimes que são chamados em doutrina de crimes de atentado ou de empreendimento.