SENTENÇA CRIMINAL - Mutatio e emendatio libelli Flashcards
O princípio da correlação/congruência é aplicável ao direito processual penal?
Com certeza
Assim como no Processo Civil, mas com mais razão ainda no Processo Penal, o Princípio da Congruência entre a acusação e a sentença sobreleva a importância, tendo em vista a principiologia inerente ao Processo Penal, notadamente, os Princípios do Contraditório e da Ampla Defesa. Então, Correlação, no Processo Penal, nada mais quer dizer sobre a impossibilidade de o juiz prolatar uma sentença extrapetita, uma sentença que não tem um suporte fático, uma sentença que não espelhe a acusação que lhe foi apresentada e que foi submetida ao Contraditório e à Ampla Defesa.
Há violação ao Princípio da Correlação em uma situação em que, mesmo diante do pedido absolutório do órgão do Ministério Público, em uma Ação Penal de natureza pública, o juiz, entendendo haver prova da materialidade, da autoria, da tipicidade, ilicitude e culpabilidade, promova a condenação?
Por expressa autorização legal
Desde que seja uma ação penal pública
Art. 385. Nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada.
Atentem, no entanto, que esse art. 385 só tem incidência em se tratando de ação penal pública. Se a ação penal for privada e houver o pedido de absolvição por parte do querelante, o juiz está jungido a acolher esse pedido e, inclusive, declarando a extinção da punibilidade, em face do Princípio da Disponibilidade da Ação Penal Privada.
O que é a emendatio libelli no contexto do Princípio da Correlação?
Juízo de tipicidade distinto…
… daquele apresentado na peça acusatória
A emendatio libelli é a possibilidade de o juiz conferir uma qualificação jurídica distinta daquela dada pelo Órgão de Acusação. A emendatio libelli nada mais é do que um juízo de tipicidade distinto daquele realizado na peça acusatória. Ela tem por base, portanto, a chamada imutabilidade do substrato fático da acusação.
Qual a grande limitação para a prática da emendatio libelli, para a atribuição, pelo juiz, de uma qualificação jurídica distinta daquela realizada na peça acusatória? A pena pode ser mais grave? Podem ser considerados fatos exsurgidos na instrução, mas não descritos na peça acusatória?
A narrativa fática da acusação
[procedimento comum] Art. 383. O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em conseqüência, tenha de aplicar pena mais grave.
[procedimento do Júri] Art. 418. O juiz poderá dar ao fato definição jurídica diversa da constante da acusação, embora o acusado fique sujeito a pena mais grave.
Não se altera a narração, não se altera a essência do fatos contidos na peça acusatória. O que se altera apenas é a qualificação jurídica, o colorido jurídico que se dá a esses fatos, divergindo, portanto, da tipicidade realizada pelo órgão acusatório. Então, muito atenção: imutabilidade da base empírica da acusação é o pressuposto da emendatio libelli, e ela tem previsão em dois dispositivos no nosso Código de Processo Penal, arts. 383 e art. 418 do CPP.
A emendatio libelli é aplicável ao Tribunal do Júri?
Sim (art. 418 do CPP)
Tanto no procedimento comum, como no procedimento do Tribunal do Júri, a emendatio libelli é um instituto que tem perfeita aplicação, não se viola o sistema acusatório, ainda que se tenha aplicação de uma pena grave, pois há uma imutabilidade da base fática e a ampla defesa e o contraditório são exercidos não em relação à definição jurídica do fato, não em relação à tipicidade, mas em relação aos fatos narrados em si.
Como há imutabilidade dessa base fática, o réu, logicamente, exerceu o seu contraditório e sua ampla defesa em relação a esses fatos e não em relação à definição jurídica que o órgão acusatório, Ministério Público ou o querelante tenha dado a esses fatos.
Qual o momento adequado para se promover a emendatio libelli?
Prolação da sentença
Embora parte da doutrina defenda o oposto, o STF é firme em vedar ao juiz promover a emendatio libelli no início da ação penal
Parte da doutrina, que entende que já no limiar, no início do processo, seria adequado ao juiz fiscalizar a atividade de acusação e, se for o caso, promover, desde logo, a adequação do juízo de tipicidade contido na denúncia ou na queixa. Então, o juízo estaria autorizado, segundo essa doutrina, a realizar desde logo a emendatio libelli e evitar, assim, por exemplo, um excesso ou um abuso no poder de acusar por parte do querelante ou o Ministério Público.
Essa, porém, não é a posição prevalecente na jurisprudência, inclusive, do Supremo Tribunal Federal. O Supremo Tribunal Federal entende que o momento adequado para a emendatio libelli É QUANDO DA PROLAÇÃO DA SENTENÇA, pois o encerramento da instrução processual.
Emendatio libelli em segunda instância é possível? Pode o Tribunal, ao conhecer, ao julgar um recurso de Apelação, um recurso de natureza ordinária, pode realizar essa emendatio libelli?
Sem sombra de dúvida, sim
Art. 617. O tribunal, câmara ou turma atenderá nas suas decisões ao disposto nos arts. 383, 386 e 387, no que for aplicável, não podendo, porém, ser agravada a pena, quando somente o réu houver apelado da sentença.
Sem dúvida nenhuma, tendo em vista que é apenas um juízo de tipicidade, sem alteração da base fática da acusação, não há nenhum problema em se realizar essa nova capitulação, em segundo grau. Isso seria tolher a liberdade de convencimento e a própria liberdade de análise jurídica do caso, tolher essa possibilidade do órgão colegiado. A grande diferença é a limitação pela vedação à reformatio in pejus (“não podendo, porém, ser agravada a pena, quando somente o réu houver apelado da sentença”).
O que é a mutatio libelli?
Alteração da narrativa da denúncia
Prerrogativa do órgão de acusação em crimes de ação pública
Enquanto a ementatio se pauta na imutabilidade da base fática, a mutatio, diversamente, tem como pressuposto a alteração da base fática da acusação, a mutabilidade do substrato empírico da acusação. Aquele fato que foi narrado na denúncia, no curso da instrução, se descortinaram circunstâncias ou outros fatos relevantes suficientes a alterar a base da imputação, suficientes a alterarem a base da acusação.
Art. 384. Encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica do fato, em conseqüência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação, o Ministério Público deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-se a termo o aditamento, quando feito oralmente.
Então, primeiro ponto: pressuposto, mutabilidade da base fática; segundo ponto relevante decorrente de uma leitura literal do art. 384: mutatio libelli, ela só tem lugar em crimes de Ação Pública.
A queixa, apresentada em uma ação penal privada subsidiária da pública, admite mutatio libelli?
Apenas em crime de ação pública
E a ação subsidiária não deixa de ser uma ação pública
Quando se fala na possibilidade de queixa, essa queixa é subsidiária, é a queixa apresentada em uma ação penal privada subsidiária da pública que, como a gente bem sabe, essa ação penal privada subsidiária da pública nada mais é do que uma ação de natureza pública, uma ação de natureza pública incondicionada que foi ajuizada pelo ofendido ou algum descendente seu no caso de omissão, no caso de inércia do órgão acusatório.
Então, a mutatio libelli só tem lugar em Ação Penal de natureza Pública ou na Ação Penal Privada Subsidiária, o que significa dizer que não cabe mutatio libelli em Ação Penal exclusivamente Privada. Muita atenção a esse detalhe!
O artigo 384 do CPP trata da mutatio libelli, o aditamento da denúncia para incluir novos fatos e circunstâncias que não constaram da denúncia original, mas que surgiram durante a instrução. Apresentado o aditamento, qual o procedimento que se segue?
“Um outro ponto relevante: havendo essa alteração da base fática, se surgem novos fatos relevantes a alterarem a capitulação, é óbvio que, em homenagem ao Contraditório e à Ampla Defesa, o réu além de ter o direito de se manifestar sobre esses novos fatos, ele deverá, necessariamente, ter o direito de produzir provas contra esses novos fatos”.
Art. 384, § 2º Ouvido o defensor do acusado no prazo de 5 dias e admitido o aditamento, o juiz, a requerimento de qualquer das partes, designará dia e hora para continuação da audiência, com inquirição de testemunhas, novo interrogatório do acusado, realização de debates e julgamento.
§ 4º Havendo aditamento, cada parte poderá arrolar até 3 (três) testemunhas, no prazo de 5 (cinco) dias, ficando o juiz, na sentença, adstrito aos termos do aditamento.
Em caso de mutatio libeli, quantas testemunhas podem ser arroladas pelas partes?
3 testemunhas por parte
No contexto da mutatio libelli: o que é o aditamento espontâneo e o aditamento provocado da denúncia?
A doutrina divisa duas espécies de adiantamento: ADITAMENTO ESPONTÂNEO, que é aquele feito pelo órgão do Ministério Público, de ofício, tão logo tome conhecimento do surgimento dessa circunstância fática nova, ou o ADITAMENTO PROVOCADO, que é aquele previsto no 384, §1º, do CPP.
Veja aqui que no §1º do art. 384, tem-se uma previsão de que, no caso de inércia do órgão do Ministério Público em apresentar o aditamento, o juiz deverá, nesta situação, valer-se do disposto no art. 28, do CPP, do nosso conhecido Princípio da Devolução.
Então, no caso de inércia, recusando-se ou omitindo-se o órgão do Ministério Público a realizar o aditamento, o juiz, exercendo a sua função anômala de fiscal do Princípio da Obrigatoriedade da Ação Penal, remeterá os autos à instância superior do Ministério Público, a Procuradoria-Geral de Justiça ou a Procuradoria-Geral da República, no caso de delitos cuja percepção caiba ao Ministério Público Federal. Então, muita atenção aí a essa possibilidade de, no aditamento provocado, o juiz valer-se do instituto previsto no art. 28 do CPP.
Imagine que originariamente o Ministério Público apresenta uma denúncia sobre furto. No curso da instrução, surgem fatos novos relacionados a uma possível violência e grave ameaça, o que altera a capitulação do furto para o crime de roubo. Indaga-se: nessa situação, havendo aditamento, havendo recebimento desse aditamento, reaberta a instrução, quando da prolação da sentença, o juiz pode condenar o réu tanto pelo roubo (a imputação superveniente), como pelo delito de furto (a imputação originária) ou ele está, necessariamente, vinculado a apenas poder condenar pelo delito de roubo?
A resposta a essa acusação está na parte final do §4º do art. 384: Havendo aditamento, cada parte poderá arrolar até 3 (três) testemunhas, no prazo de 5 (cinco) dias, ficando o juiz, na sentença, adstrito aos termos do aditamento.
Mas veja que a leitura desse dispositivo é que o juiz, neste meu exemplo, só poderá condenar pelo delito de roubo, não por um outro delito, mas poderá, também, condenar pelo delito de furto, ou seja, o juiz pode condenar pela imputação originária e pela imputação superveniente, ele só não pode promover uma condenação por uma outra imputação que não esteja compreendida, quer na originária, quer na superveniente. Essa é a correta interpretação deste dispositivo.
A mutatio libelli é admissível na 2ª Instância?
Ao contrário da emendatio, não
Diferentemente da emendatio libelli, que tem aplicação em segundo grau de jurisdição, respeitada apenas a proibição de reformatio in pejus, a mutatio libelli não se aplica em segundo grau de jurisdição. O próprio art. 617 do Código de Processo Penal, não faz referência ao art. 384 e isso por um fato muito simples: aplicar-se mutatio libelli em segundo grau de jurisdição implicaria suprimir-se uma instância, implicaria reduzir o contraditório e ampla defesa do acusado, que não pôde ali, no primeiro grau de jurisdição, fazer a sua reação defensiva da forma mais ampla possível em relação ao fato aditado. Esse é o entendimento cristalizado ainda na Súmula 453 do STF.
Se, eventualmente, houver, no aditamento a reclassificação do fato ou na ementatio libelli, essa reclassificação alterar a capitulação do fato, tornando aquele fato um crime de menor potencial ofensivo, será cabível o oferecimento da transação penal? E do SURSIS processual?
Pode
Se, eventualmente, houver, no aditamento a reclassificação do fato ou na ementatio libelli, essa reclassificação alterar a capitulação do fato, tornando aquele fato um crime de menor potencial ofensivo, serão cabíveis tanto o oferecimento da transação penal como do SURSIS processual na derradeira etapa do procedimento.
Súmula 337 do STJ: é cabível a suspensão condicional do processo na desclassificação do crime e na procedência parcial da pretensão punitiva.
Súmula 696 do STF: reunidos os pressupostos legais permissivos da suspensão condicional do processo, mas se recusando o promotor de justiça a propô-la, o juiz, dissentindo, remeterá a questão ao procurador0geral, aplicando-se por analogia o artigo 28 do CPP.