Culpabilidade Flashcards
quais são as causas de inimputabilidade em razão da embiraguez? quais suas espécies e formas de punição?
C) Inimputabilidade em razão da embriaguez
Embriaguez é a intoxicação transitória causada pelo álcool ou substância de efeitos análogos.
Esclarece Fernando de Almeida Pedroso: a embriaguez repercute no psiquismo da pessoa por ela acometida, podendo afetar a sua capacidade intelectiva ou volitiva.
A embriaguez é classificada em espécies e graus:
(i) Embriaguez NÃO ACIDENTAL (voluntária ou culposa)
a) embriaguez voluntária quando o agente ingere a substância alcoólica com a intenção de embriagar-se;
b) embriaguez culposa quando o agente, por negligência ou imprudência, acaba por embriagar-se.
Pode ser completa (retirando do agente, no momento da conduta, a capacidade de entendimento e autodeterminação) ou incompleta (diminuindo a capacidade de entendimento e autodeterminação). Seguindo a orientação do nosso Código Penal, a EMBRIAGUEZ NÃO ACIDENTAL JAMAIS EXCLUI A IMPUTABILIDADE (art. 28, II), seja ela completa ou incompleta.
(ii) Embriaguez acidental (caso fortuito ou força maior):
Aqui, a embriaguez decorre de caso fortuito (o sujeito desconhece o efeito inebriante da substância que ingere) ou força maior (o sujeito é obrigado a ingerir a substância inebriante).
Quando COMPLETA, isenta o agente de pena (art. 28, 1°, do CP); se INCOMPLETA, NÃO EXCLUI A CULPABILIDADE, MAS DIMINUI A PENA (art. 28, 2, do CP).
Note que a embriaguez, para gerar a inimputabilidade do ébrio, pressupõe os seguintes requisitos: causal (proveniente de caso fortuito ou força maior), quantitativo (completa), cronológico (ao tempo da ação ou omissão) e consequencial (inteira incapacidade intelectiva ou volitiva).
(iii) Embriaguez patológica
Patológica é a embriaguez doentia, que, conforme o caso concreto, pode ser tratada como anomalia psíquica, gerando a inimputabilidade do agente ou redução de sua pena, nos moldes do art. 26 do CP.
(iv) Embriaguez preordenada
Nessa espécie, o agente ingere bebida alcoólica ou consome substância de efeitos análogos com a finalidade de cometer um crime. Completa ou incompleta, não haverá exclusão da imputabilidade, tampouco redução de pena, mas a INCIDÊNCIA DE AGRAVAMENTO DA SANÇÃO PENAL (artigo 61, II, “1”, do Código Penal);
Qual a razão de a embriaguez preordenada ser punível?
O fundamento encontra-se no princípio da actio libera in causa, assim explicado por Juan Ferré Olivé, Miguel Nunez Paz, William Terra de Oliveira e Alexis Couto de Brito:
“”Há séculos se vem formulando na Alemanha o problema da actio libera in causa (conhecida como a.l.i.c.), que recebeu tratamento em obras clássicas como a do barão SAMUEL VON PUFENDORF (…). Existe a.l.i.c quando se imputa a uma conduta posterior, impune por si mesma, o comportamento prévio doloso ou culposo que a provocou. É muito conhecida a Sentença do Tribunal Supremo do Reich de 1892, na qual se julgou um entregador de leite que atropelou um pedestre com sua carroça, alegando inimputabilidade sobre a base de seu estado de embriaguez completa. A solução jurídica que deu nascimento ao chamado “modelo da tipicidade’ consistiu em aplicar uma peculiar analogia com a autoria mediata, dizendo que a situação equivaleria a ter deixado as rédeas do cavalo a um terceiro inconsciente (entendendo dessa forma que existe simultaneidade temporal entre a realização do tipo e a culpabilidade). Por isso o leiteiro foi condenado pelo resultado imprudente produzido”.
Em resumo, o ato transitório revestido de inconsciência (momento do crime, em que o agente se encontra embriagado) decorre de ato antecedente que foi livre na vontade (momento de ingestão da bebida ou substância análoga), transferindo-se para esse momento anterior a constatação da imputabilidade e da voluntariedade. A constatação da imputabilidade+vontade do agente no momento em que ingeria a bebida, evita a responsabilidade penal objetiva (Aquela em que o agente responde pela conduta ainda que não haja dolo ou culpa em relação ao resultado):
Se bebeu prevendo o resultado, querendo a sua produção, haverá crime doloso; se bebeu, prevendo o resultado, e aceitou sua produção, temos o dolo eventual; se bebeu e previu o resultado, o qual acreditou poder evitar, configura-se a culpa consciente; se não previu, mas era previsível, culpa inconsciente; se imprevisível, fato atípico.
Se, ao tempo em que o agente decidiu beber, a conduta posterior fosse imprevisível, o sujeito teria cometido crime?
NÃO. O dolo e a culpa somente serão analisados no momento originário da ingestão da bebida alcoólica. Trata-se de fato atípico, pois o Direito Penal não admite a responsabilidade penal objetiva.
A emocão e paixão excluem a responsabilidade penal?
Como estabelece o artigo 28, I, do Código Penal, a emoção e a paixão NÃO EXCLUEM A RESPONSABILIDADE PENAL.
Emoção é o estado súbito e passageiro, enquanto a paixão é o sentimento crônico e duradouro. Pode a emoção servir como circunstância atenuante, nos moldes do artigo 65, III, “c”, ou como causa de diminuição de pena, como prescrevem os artigos 121, 1 e 129, 4, ambos do CP. Já a paixão, dependendo do grau e da capacidade de entendimento do agente, pode ser encarada como doença mental (paixão patológica — art. 26, caput, CP).
Vogal com vogal-Consoante com consoante. Para não errar mais:
Influência de violenta emoção = Atenuante
DOMÍNIO de violenta emoção = Privilegiadora do homicídio
Como se analisa a potencial consciência de ilicitude?
A potencial consciência da ilicitude é o segundo elemento da culpabilidade, representando a possibilidade que tem o agente imputável de compreender a reprovabilidade da sua conduta.
Note que não se exige do sujeito ativo uma compreensão técnica, um conhecimento jurídico sobre o enquadramento jurídico do evento praticado, mas apenas que tenha condições de perceber que o seu comportamento não encontra respaldo no direito, sendo por ele reprovado. Contenta-se com a percepção leiga, uma valoração paralela na esfera do profano, ou seja, juiz promove uma valoração paralela, fora da sua própria, diante do profano, diante daquele que não conhece o Direito. Trata-se do critério intermediário de determinação da consciência da ilicitude. Os demais são:
i) formal: é necessário que o agente tenha conhecimento de que viola uma norma penal. Não é adotado porque, nestas circunstâncias, somente a alguém com formação jurídica poderiam ser atribuídas infrações penais;
ii) material: pressupõe o conhecimento de que, com a conduta, pratica-se um ato antissocial, imoral e injusto, que viola um interesse. Também não tem aplicação porque desconsidera a existência de infrações penais que não se estabelecem com base na materialidade do injusto.
Erro de proibição é excludente de qual elemento do crime? para auferir se foi escusável ou inescusável o que é considerado?
A causa excludente (dirimente) da potencial consciência da ilicitude é o erro de proibição, positivado no artigo 21 do Código Penal, in verbis:
“O desconhecimento da lei é inescusável. O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena; se EVITÁVEL, PODERÁ DIMINUÍ-LA DE 1/6 A 1/3.
Parágrafo único —Considera-se evitável o erro se o agente atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato, quando lhe era possível, nas circunstâncias, ter ou atingir essa consciência”
É sabido que uma vez publicada no Diário Oficial da União, a lei se presume conhecida por todos. Logo, não nos é dado desconhecer a lei. É possível, no entanto, que o agente, mesmo conhecendo a lei, incida em erro quanto à proibição do seu comportamento, valorando equivocadamente a reprovabilidade da sua conduta, podendo acarretar a exclusão da culpabilidade.
Para aferir se o erro foi escusável ou inescusável são consideradas as características pessoais do agente, tais como idade, grau de instrução, local em que vive e os elementos culturais que permeiam o meio no qual sua personalidade foi formada, e não o critério inerente ao homem médio.
(A) o agente, apesar de ignorar a lei, conhecia a reprovabilidade da sua conduta: não se configura o erro de proibição, podendo caracterizar atenuante da pena. Exemplo: JOÃO, apesar de ignorar que o desrespeito ao hino nacional é contravenção penal tipificada no art. 35 da Lei n° 5.700/71, passa a achincalhar a letra, sabendo que seu comportamento é reprovado socialmente.
Quais são as espécies de erro de proibição? E o erro sobre elementos normativos do tipo?
(A) Erro de proibição direto
No erro de proibição direto o agente se equivoca quanto ao conteúdo de uma norma proibitiva, ou porque ignora a existência do tipo incriminador, ou não conhece completamente o seu conteúdo, ou não entende o seu âmbito de incidência.
Exemplo: holandês, habituado a consumir maconha no seu país de origem, acredita ser possível utilizar a mesma droga no Brasil, equivocando-se quanto ao caráter proibido da sua conduta.
(B) Erro de proibição indireto
No erro de proibição indireto (descriminante putativa por erro de proibição) o agente sabe que a conduta é típica, mas supõe presente uma norma permissiva, ora supondo existir uma causa excludente da ilicitude, ora supondo estar agindo nos limites da descriminante.
Exemplo: “A”, traído por sua mulher, acredita estar autorizado a matá-la para defender sua honra ferida.
A doutrina debate a natureza deste erro. Para Alcides Munhoz Neto, há de ser feita distinção entre os elementos normativos do tipo e os elementos normativos da ilicitude. Os primeiros traduzem circunstâncias relativas à constituição do fato criminoso (ex.: “cheque”, “coisa alheia” etc.) e, consequentemente, a ignorância do agente sobre eles deve ser tratada como erro de tipo; os elementos normativos da ilicitude, por outro lado, não obstante integrem o tipo, não têm nenhuma relevância para a constituição do fato típico, limitando-se a ressaltar a ilicitude característica de toda infração penal (ex.: “indevidamente”, “sem justa causa”). Por esta razão, o erro sobre estes elementos deve ser equiparado ao erro de proibição.
Quais são as causas de inexigibilidade de conduta diversa?
Para a reprovação social, não basta que o autor do fato lesivo seja imputável e tenha possibilidade de lhe conhecer o caráter ilícito. Exige-se, ainda, que nas circunstâncias tivesse a possibilidade de atuar de acordo com o ordenamento jurídico. Explica Fernando de Almeida Pedroso:
“O cometimento de fato típico e antijurídico, por agente imputável que procedeu com dolo ou culpa, de nada vale em termos penais se dele não era exigível, nas circunstâncias em que atuou, comportamento diferente.
Nos termos do artigo 22 do Código penal, “Se o fato é cometido sob coação irresistível ou em estrita obediência a ordem, não manifestamente ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor da coação ou da ordem”
Se a pena é castigo, não se pode castigar quem agiu sem liberdade (em circunstâncias de anormalidade). As figuras da coação irresistível e obediência hierárquica são excludentes desse elemento da culpabilidade.
Se, no entanto, o bem sacrificado é maior que o dano causado pela ameaça, subsiste a culpabilidade do coagido”.
O coator responde pelo crime cometido pelo coato (na condiçâo de autor mediato), em concurso material com o crime de tortura, decorrente do constrangimento a que foi submetido o coagido. Na coação resistível, os dois personagens respondem pelo crime, o coator com a agravante do art. 62, II, do CP, e o coagido com a atenuante do art. 65, III, “c”, do CP.
A subordinação doméstica (pai e filho) ou eclesiástica (bispo e sacerdote) não configura a dirimente (podendo caracterizar causa supralegal de exclusão da culpabilidade).
É admitido as dirimentes supralegais?
A questão de existir ou não causa de exclusão da culpabilidade não prevista na legislação penal já foi muito discutida, hoje admitida pela doutrina (com respaldo em crescente jurisprudência). Percebeu-se, sem muita dificuldade, que, por mais previdente que seja, o legislador não consegue prever todos os casos em que é inexigível do agente conduta diversa, sendo perfeitamente possível, diante das circunstâncias do caso concreto, haver situações não antevistas pelo legislador.
As dirimentes supralegais se fundamentam, basicamente, no fato de que a exigibilidade de conduta diversa é característica fundamental da culpabilidade, motivo pelo qual não é admissível que se estabeleça a responsabilidade penal em decorrência de comportamentos humanos inevitáveis.
São exemplos de causas supralegais de exclusão da culpabilidade:
(A) Cláusula de consciência
Nos termos da cláusula de consciência, estará isento de pena aquele que, por motivo de consciência ou crença, praticar algum fato previsto como crime, DESDE QUE NÃO VIOLE DIREITOS FUNDAMENTAIS INDIVIDUAIS. A doutrina costuma amparar a cláusula de consciência na liberdade de crença e de consciência assegurada constitucionalmente, nos termos do artigo 5°, VI da CF/88.
Bem observam Luiz Flávio Gomes e Antonio Molina:
“É preciso distinguir as situações: a) quando não há nenhuma lesão ao bem jurídico colocado em risco, em razão da intervenção de uma terceira pessoa, nenhuma responsabilidade penal subsiste. O pai não permite a transfusão de sangue no filho menor, mas o médico atua por conta própria e salva a criança. Ninguém responde penalmente nesse caso (…). b) quando, de outro lado, o bem jurídico vida é lesado, o pai responde penalmente porque entre a liberdade de crença e a lesão ao bem jurídico vida ou integridade física, possuem maior valor estes últimos. O médico, por seu turno, só responde por algo se omitiu socorro. Se tentou de toda a maneira salvar a vida da criança e não conseguiu, por nada responde”.
(B) Desobediência civil
A desobediência civil representa atos de insubordinação que têm por finalidade transformar a ordem estabelecida, demonstrando a sua injustiça e necessidade de mudança. Exige-se para o reconhecimento desta dirimente:
(A) que a desobediência esteja fundada na proteção de direitos fundamentais;
(B) que o dano causado não seja relevante.
Exemplo: ocupações de prédios públicos; manifestações como a ocorrida na final da Copa do Mundo de 2018, em que algumas pessoas invadiram o campo para protestar contra o presidente russo e contra a falta de liberdade de expressão.
Mas as dirimentes supralegais devem ser invocadas com parcimônia, apenas em casos excepcionalíssimos, em que se demonstre cabalmente que em determinada situação não havia possibilidade de evitar a prática do ato ilícito. A inexigibilidade de conduta diversa jamais deve ser analisada sob prisma da saída mais fácil (comodidade).
Para o STJ, é possível que o juiz reconheça a coculpabilidade como atenuante genérica/inonimada?
- 5ª Turma: É possível. (HC 411.243/PE, j. em 07/12/2017)
- 6ª Turma: NÃO é possível. (AgRg no HC 752961/RJ, j. em 25/09/2023).
2.4. Teoria da coculpabilidade (Zaffaroni)
Já tivemos oportunidade de ressaltar a predominância do livre arbítrio dos indivíduos para que adotem comportamentos concordes ou contrários ao direito. Bem assim, destacamos que mesmo estabelecida esta premissa, fatores sociais negativos muitas vezes influenciam a formação do caráter, com reflexos nas escolhas individuais. Neste passo, surge a teoria da coculpabilidade, que imputa ao Estado parcela da responsabilidade social pelos atos criminosos dos agentes em razão das desigualdades sociais. Não há exclusão da culpabilidade, mas essas circunstâncias externas devem ser consideradas na dosimetria da pena.
Candidato (a), admite-se em nosso ordenamento o reconhecimento da ‘coculpabilidade às avessas?
Excelência, a teoria da coculpabilidade às avessas busca punir com maior rigor aquele que possui ótimas oportunidades de vida, boa condição econômica, social, cultural, escolar e, mesmo assim, opta por praticar crime. Isso posto, vigora o entendimento de que NÃO é admitida sua aplicação por ausência de previsão legal e porque o Direito Penal veda analogia in malam partem.
No máximo, poderá o juiz considerar este aspecto no momento em que analisar as circunstâncias judiciais (art. 59 do Código Penal), especialmente quanto à personalidade do agente e às circunstâncias do crime.
O que é a culpabilidade?
Conceitua-se a culpabilidade como o juízo de reprovação que recai na conduta típica e ilícita que o agente se propõe a realizar. Trata-se de um juízo relativo à necessidade de aplicação da sanção penal. São duas, basicamente, as teorias desenvolvidas para fundamentar a culpabilidade do autor do fato típico e ilícito: o livre-arbítrio e o determinismo.
O livre-arbítrio é proveniente da Escola Clássica e se estabelece no fato de que o homem é dotado de capacidade moral para eleger o melhor caminho e, por isso, deve ser responsabilizado pelas livres escolhas a que se dedica no decorrer da vida. O determinismo, por outro lado, originado da Escola Positiva, sustenta que ao homem não é possível atuar soberanamente em suas escolhas em virtude de fatores inúmeros, internos e externos, capazes de influenciá-lo a cometer determinado fato ilícito.
A nosso ver (Rogério Sanches), entre tais conceitos, não há incompatibilidade, senão complementaridade. É fato que, no geral, vigora o livre-arbítrio, identificando-se nos indivíduos a capacidade de avaliar a correção de sua conduta e, portanto, de agir conforme o direito. Não se pode ignorar, todavia, a existência de fatores sociais que podem tornar certos indivíduos menos aptos a escolher livremente e passíveis de se submeter a influências externas que acabam inspirando sua linha de conduta.
Para a teoria biparte, como a culpabilidade é vista?
Para a corrente bipartite, a culpabilidade não é substrato do crime. O crime existe com os requisitos fato típico e ilicitude, mas só será ligado ao agente se este for culpável. Logo, de acordo com essa orientação, a culpabilidade aparece como pressuposto de aplicação da pena, juízo de reprovação e censura, pressupondo a prática de um crime. Seus adeptos defendem que a reforma do Código Penal de 1984 seguiu essa corrente, bastando observar que o legislador usa a expressão “isento de pena” quando se refere às causas excludentes da culpabilidade, enquanto que, ao se referir às causas de exclusão de tipicidade ou ilicitude, recorre à expressão “não há crime”.
Essa afirmativa não prevalece.
Discorra sobre a evolução histórica das teorias da culpabilidade
A análise da culpabilidade depende da compreensão da sua evolução histórica, permitindo, desse modo, entender os elementos que a compõem.
2.1. Teoria psicológica da culpabilidade
idealizada por Franz von Liszt e Ernst von Beling, predominou no século XIX, tendo por fundamento as premissas causalistas. A teoria psicológica é aplicável somente no âmbito do causalismo e sustenta, em resumo, que a culpabilidade consiste na relação psíquica entre o autor e o resultado, na forma de dolo ou culpa.
Percebe-se, com facilidade, que a culpabilidade confunde-se com o dolo e a culpa, sendo seu único pressuposto a imputabilidade. O dolo, nessa teoria, é normativo, pois contém a consciência da ilicitude. A imputabilidade, na qualidade de pressuposto da culpabilidade, e não seu elemento, precede em análise o dolo e a culpa.
Os principais apontamentos contrários que podem ser feitos à teoria psicológica são relativos à inexigibilidade de conduta diversa e à culpa inconsciente. Quanto à primeira, o dolo está presente, mas o resultado não é imputado ao agente porque não podia, naquela situação, agir de outro modo. No que concerne à segunda, não existe previsão do resultado, faltando, portanto, o vínculo psicológico entre o autor e o fato.
2.2. Teoria psicológica normativa
Defendida por Reinhart Frank em 1907, a teoria psicológica-normativa continua trabalhando com o dolo e a culpa na culpabilidade, os quais deixam de ser suas espécies para transformarem-se nos seus elementos, juntamente com a imputabilidade e a exigibilidade da conduta diversa.
A culpabilidade deixou de ser puro vínculo psíquico entre o agente e o fato. Aliás, foi a partir desta teoria que se reconheceu, definitivamente, a importância da consciência atual da ilicitude, integrante do dolo (dolo normativo). Em razão de estabelecer o dolo e a culpa na culpabilidade, a teoria psicológica normativa tem aplicação reservada ao campo do causalismo, mas, como modificou drasticamente a estrutura da culpabilidade, substituindo o sistema clássico da teoria psicológica, diz-se ter dado início ao sistema neoclássico.
2.3. Teoria normativa pura da culpabilidade (extremada e limitada)
Inspirada no finalismo de Hans Welzel, esta teoria é responsável pela migração do dolo e da culpa para o fato típico. Alerta-se, porém, que o dolo que migra para o primeiro substrato do crime está despido da consciência da ilicitude, e, por isso, passa a ser natural.
A teoria de Welzel fez a primeira construção puramente normativa da culpabilidade. Essa ficou despojada de todas as características psicológicas, de todos os objetos de valoração próprios do mundo de representações do autor, pois, agora, constitui exclusivamente um juízo do processo de motivação. A ideia central de Welzel é expressar a característica da reprovação pessoal na culpabilidade. Para o autor, essa reprovação se dá quando se constata que o autor podia agir em consonância com o Direito e, mesmo assim, optou por atuar de forma antijurídica, isso, não no plano abstrato, mas a partir da análise do caso concreto.
Esta teoria (normativa pura) tem duas vertentes: a extremada e a limitada, ambas divergindo no tocante à natureza jurídica das descriminantes putativas sobre a situação fática. Como já estudamos no capítulo anterior (Cap. III — Ilicitude), de acordo com a teoria limitada, cuida-se de mais uma hipótese de erro sobre elementos do tipo; já para a extremada, equipara-se ao erro de proibição. Nosso CÓDIGO PENAL ADOTOU A TEORIA LIMITADA DA CULPABILIDADE.
A culpabilidade é do autor ou do fato?
A culpabilidade é juízo de reprovação que recai sobre o agente. Percebe-se, também, que os elementos da culpabilidade estão umbilicalmente atrelados à pessoa do autor (imputabilidade, potencial consciência da ilicitude e a exigibilidade de conduta diversa). Tudo indica, portanto, que a culpabilidade é do autor. Não é o que prevalece, como bem explicam Luiz Flávio Gomes e Antonio Molina:
“Quem é reprovado (censurado) é o agente, mas não qualquer agente, senão o agente do fato (ou seja: o agente de um fato formal e materialmente típico, antijurídico e punível). Com isso, fica claro o seguinte: o agente é o objeto da censura (da reprovação), mas só pode ser censurado pelo que fez, não pelo que “é”. De outro lado, só pode ser reprovado se podia se motivar de acordo com a norma e, ademais, se podia agir de modo diverso, consoante o Direito.
Para o reconhecimento do delito ou para o juízo de censura (de reprovação), em suma, valem as circunstâncias do fato; o Direito penal do fato assim como a culpabilidade do fato não permitem que a periculosidade pessoal do agente venha a definir a existência do crime ou a sua culpabilidade. De qualquer modo, é certo que as condições pessoais do agente (assim como a sua periculosidade) são relevantes para a graduação da pena, nos termos do art. 59 do CP. É aqui que elas ganham relevância e pertinência jurídica”
Com compreensão intermediária, Rogério Greco ensina que, apesar da adoção de um moderado direito penal do fato, é possível distinguir-se culpabilidade de ato e a culpabilidade de autor:
“A culpabilidade do ato seria a reprovação do homem por aquilo que ele fez, considerando-se a sua capacidade de autodeterminação; já na culpabilidade do autor, o que se reprova é o homem como ele é, e não aquilo que fez”.
Conclui o autor, com amparo em Hans-Heinrich Jescheck, que o mais adequado é a união de ambas as concepções: “O núcleo do conceito de culpabilidade somente pode ser a culpabilidade pelo fato individual, mas o Direito Penal deve ter em conta também muitas vezes a culpabilidade do autor”
Defina a cupabilidade formal e material
A culpabilidade formal é aquela definida em abstrato, que serve ao legislador na edição da lei para cominar os limites máximos e mínimos de pena atribuídos a determinada infração penal.
A culpabilidade material é estabelecida no caso concreto, dirigida a um agente culpável que cometeu um fato típico e ilícito, para a fixação da pena pelo juiz. Este viés da culpabilidade está positivado no artigo 59, caput, do Código Penal, que permite considerar “graus de culpabilidade” do agente, análise que influenciará na pena concretamente aplicada.
Quais dois elementos devem estar presente na imputabilidade?
Imputabilidade é a capacidade de imputação, ou seja, possibilidade de se atribuir a alguém a responsabilidade pela prática de uma infração penal. A imputabilidade é elemento sem o qual “entende-se que o sujeito carece de liberdade e de faculdade para comportar-se de outro modo, como o que não é capaz de culpabilidade, sendo, portanto, inculpável”.
São dois os elementos que devem se fazer presentes para que haja imputabilidade: intelectivo, consistente na higidez psíquica que permita ao agente ter consciência do caráter ilícito do fato; e volitivo, em que o agente domina sua vontade, ou seja, exerce controle sobre a disposição surgida com o entendimento do caráter ilícito do fato, e se determina de acordo com este entendimento.
O agente que em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento é punível penalmente?
Sim, o art. 26 não anuncia hipótese de inimputabilidade, mas de imputabilidade com responsabilidade penal diminuída (semi-imputabilidade). A consequência jurídica, no caso, é a condenação do semi-imputável, porém com redução de pena, de 1/3 a 2/3 ou substituição da pena por medida de segurança (art. 98 do CP).