Arrendamento; Arrendamento urbano Flashcards

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Q

Natureza obrigacional do Arrendamento:

A

O arrendamento tem natureza essencialmente pessoal, ainda que equiparado aos direitos reais para certos efeitos - 1037º, nº 2, 1276º e ss e 1285º … o direito do locatário, por mais piruetas que os autores dêem à volta do seu regime e por mais rombos que o legislador vá abrindo no casco da sua couraça original, continua a ser um direito de raiz estruturalmente obrigacional, assente no dever que recai sobre o locador de proporcionar ao locatário o gozo (temporário) da coisa, para o fim a que ela se destina - RLJ, A. Varela, nº 3749, pág. 249, comentário a Ac. STJ, de 21.12.82, e recentemente BMJ 458-227, com indicação de muita doutrina e jurisprudência.

Consequentemente, o direito ao arrendamento não é usucapível - Ac. de 22.2.94, no BMJ 434-635.

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Q

Tipos de Arrendamento:

A

I. Arrendamento urbano:
O arrendamento urbano é o contrato pelo qual uma das partes concede a outra o gozo temporário de um prédio, no todo ou em parte, mediante retribuição (artigo 1º do RAU).

As normas que regulam o arrendamento urbano em geral são as dos art.° 1064.º a 1091.° do CC. O arrendamento para fim habitacional rege-se, ainda, pelas disposições especiais contidas nos art.° 1092.° a 1107.° do CC; O arrendamento para fim não habitacional obedece às normas próprias dos art.°s 1108.° a 1113.° do CC. No que não estiver em oposição com tais disposições próprias ou gerais, aplicar-se-ão ainda ao contrato de arrendamento as regras que disciplinam a locação (art.° 1022.° a 1063.° do CC) e as obrigações, em geral (art.°s 397.° a 873.° do CC).

NRAU:
Significa isto que passaram a estar sujeitos ao NRAU:
- os arrendamentos para habitação não permanente em praias, termas, lugares de vilegiatura, ou para outros fins transitórios [al. b) do n.° 2 do art. 5.° do RAU];
- os arrendamentos de casa habitada pelo senhorio, por período correspondente à ausência temporária deste [al. c) do n.° 2 do art.° 5.° do RAU];
- os subarrendamentos totais feitos por período correspondente à ausência temporária do arrendatário, em conformidade com os requisitos exigidos por lei [al. d) do n.° 2 do art.° 5.° do RAU];
- os arrendamentos de espaços não habitáveis, para afixação de publicidade, armazenagem, parqueamento de viaturas ou outros fins limitados [al. e) do n.° 2 do art.° 5.°];
- os arrendamentos de prédios rústicos não sujeitos a regimes especiais (art.° 6.° do RAU).

Os três primeiros enquadram-se na categoria dos arrendamentos para fim habitacional (art. 1092.° a 1107.° do CC), embora a disciplina dos arrendamentos para habitação não permanente ou para fins especiais transitórios apresente algumas especificidades, mormente resultantes do disposto no art.° 1069.° do CC (quanto à forma do contrato), nos art.° 1095.º, n.° 3 e 1096.°, n° 1, do CC (quanto à estipulação de prazo certo e à renovação automática, respectivamente) e ainda no art.° 2.°, al. c), do DL n.° 160/2006, de 08-08 quanto ao conteúdo necessário do contrato). Os dois últimos integram a categoria dos arrendamentos para fim não habitacional (art.° 1108.° a 1113.° do CC), salientando-se, quanto aos arrendamentos de espaços não habitáveis ou outros fins limitados o preceituado no art.° 5.°, n.° 9, do DL n.° 160/2006, de 08-08 (atinente à licença de utilização).

Ficam subtraídos à disciplina do arrendamento urbano os contratos submetidos a legislação especial, designada-mente, os arrendamentos de imóveis do domínio privado Estado [antes excluídos do RAU por força do disposto na alínea a) do n.° 2 do art.° 5.° RAU] e os arrendamentos de imóveis pelo Estado, cujo regime se encontra actualmente tipificado no DL n.° 280/2007, de 07-08, maxime, nos seus art.°s 59.° a 66.° e 42.° e 43.°, respectivamente.» - Drs. Albertina Pedroso, Laurinda Gemas e João Caldeira Jorge, op. cit, notas ao art.1064.º

Com a entrada em vigor do NRAU, a mora no pagamento da renda só passou a assumir relevância como fundamento da resolução do contrato quando exceda os três meses de rendas em dívida.

Os coeficientes de actualização das rendas, desde 1982, podem ser consultados no Portal da Habitação, em Outra Legislação Relacionada com o NRAU.

II. Arrendamento para comércio ou indústria:
É, por seu turno, arrendamento para comércio ou indústria o que tem por objecto mediato prédios urbanos ou partes destes com vista à prossecução de fins directamente relacionados com alguma actividade comercial ou industrial (artigo 110º do RAU). Neste tipo de relação locatícia, o locador transfere para o locatário o gozo de um prédio urbano ou rústico ao qual está afectado um fim determinado e específico, qual seja o de nele vir a ser explorada ou desenvolvida uma actividade de índole comercial.

Os contratos de arrendamento para comércio ou indústria ou para o exercício de profissão liberal e os para outra aplicação lícita necessitam de ser reduzidos a escrito. Porém, a omissão dessa formalidade importa, agora, nulidade, invocável a todo o tempo por qualquer interessado e declarada oficiosamente pelo tribunal - artigos 280º e 286º do CC. O regime do nº 2 não é aplicável a essas situações, por nestes contratos não existir regime de renda condicionada, que é exclusiva dos arrendamentos para habitação, e o intérprete não poder aplicar uma sanção não tipificada na lei para o caso con¬creto, adequar uma já existente ou criar uma outra para o efeito. E não estando uma sanção especialmente prevista na lei, a consequência da falta de forma legalmente prescrita é a nulidade da declaração negocial - artigo 220º do CC.

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3
Q

Locação:

A

A locação é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a proporcionar a outra o gozo temporário de uma coisa, mediante retribuição, designando-se por arrendamento se versar sobre coisa imóvel (artigos 1022º e 1023º do Código Civil).

A lei ao tratar da locação e do seu regime, encara o direito do locatário como um direito obrigacional, pessoal, relativo e não como um direito real, absoluto, erga omnes.

A locação por mais de seis anos é considerada não um acto de administração ordinária mas de disposição, conforme o n.º 1 do artigo 1024º do CC

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4
Q

Contrato de cessão de exploração de estabelecimento:

A

Contrato de cessão de exploração de estabelecimento:
A propósito do contrato de cessão de exploração de estabelecimento, expressa a lei que não é havido como arrendamento de prédio urbano ou rústico o contrato pelo qual alguém transfere temporária e onerosamente para outrem, juntamente com o gozo do prédio, a exploração de um estabelecimento comercial ou industrial nele instalado (artigo 111º, n.º 1 do RAU).
É que o objecto da cessão de exploração não é o imóvel em si, mas sim o estabelecimento como um bem unitário, compreendendo a globalidade dos elementos que o integram e a sua destinação ao prosseguimento de uma dada actividade mercantil.

A cessão de exploração do estabelecimento comercial pressupõe, nos termos do n.º 2 remissivo ao n.º 2 do artigo 115º do RAU, que se verifiquem, cumulativamente, os seguintes requisitos:

a) Acordo entre o detentor de um estabelecimento comercial e um outro sujeito, tendo por objecto a transferência para este da exploração de um estabelecimento comercial ou industrial, englobando a transmissão de instalações, utensílios, mercadorias ou outros elementos que integram o estabelecimento;
b) Feita juntamente com o gozo do prédio, continuando a exercer-se nele o mesmo ramo de comércio ou indústria, não podendo ser-lhe dado destino diferente;
c) Tendo essa transferência um carácter ou uma duração temporariamente delimitada ou fixada;
d) E feita a título oneroso, ou seja, mediante o pagamento de uma contraprestação.

Confrontando estas duas figuras (arrendamento comercial e locação de estabelecimento), constituem pontos de contacto e de comunhão a existência de uma transferência com carácter oneroso e de feição temporária, mas ocorre uma distinção essencial e definidora que se radica no seguinte facto: enquanto no arrendamento comercial o locador transfere para o locatário o direito de gozo de um prédio, na locação de estabelecimento o detentor do estabelecimento transfere para o cessionário o gozo e fruição de uma unidade comercial, com todas as marcas e feições distintivas que acompanham esta figura de direito comercial.

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5
Q

Estabelecimento comercial:

A

A lei refere-se em várias normas ao estabelecimento mas não o caracteriza expressamente. É indubitável, porém, que lei trata o estabelecimento comercial unitáriamente, quando permite que seja objecto de trespasse e de locação, de penhora e de penhor e até de hipoteca. A reivindicação do estabelecimento, então muito discutida, acabou por ser admitida e é hoje pacífica.

Dir-se-á, então, que o estabelecimento comercial ou industrial é a estrutura material e jurídica integrando, em regra, uma pluralidade de coisas corpóreas e incorpóreas, coisas móveis e/ou imóveis, incluindo as próprias instalações, direitos de crédito, direitos reais e a própria clientela ou aviamento, organizados com vista à realização do respectivo fim.
O estabelecimento é, assim, um bem mercantil. Na sua globalidade funcional, é um bem “a se”, que se distingue de cada um dos seus componentes.

Neste sentido, considera a doutrina “o estabelecimento comercial como um conjunto organizado de bens e direitos afectados a um fim específico, que é o de suportar o exercício da empresa e que o direito trata unitariamente para certos efeitos, sem prejuízo da individualidade e autonomia dos seus componentes”.

Locação do estabelecimento comercial:
Por isso, na locação do estabelecimento, há uma transmissão global unitária, para o mesmo ramo do comércio, sem prejuízo de alguns dos bens que compõem o estabelecimento poderem ser excluídos da transmissão por estipulação das partes. Aliás a penhora do estabelecimento comercial (artigo 862º-A do Código de Processo Civil) abrange, em princípio, todos os bens que o integram, sem afectar a penhora dos que já o tiverem sido anteriormente.

Poder-se-á, pois, definir “o estabelecimento comercial como um bem mercantil, que engloba o complexo de bens e de direitos que o comerciante afecta à exploração da sua empresa, que tem uma utilidade, uma funcionalidade e um valor próprios, distintos de cada um dos seus componentes e que o direito trata unitariamente”.

Assim sendo, afigura-se-nos adequado o critério proposto por Ferrer Correia, no sentido de que haverá arrendamento se o titular do local se limitar a pôr à disposição do locatário o gozo e fruição da instalação, por esta não ter mais do que «a marca do seu destino», ou seja, uma configuração física apta ao exercício da actividade mercantil visada; e já haverá cessão de exploração se o prédio já se encontrar provido dos meios materiais indispensáveis á sua utilização como empresa, designadamente móveis, máquinas, utensílios que tornem viável, mediante a simples colocação de mercadoria, o arranque da exploração comercial. Não será, pois, indispensável que o estabelecimento já antes estivesse em exploração.

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6
Q

Trespasse do estabelecimento comercial:

A

Como é sabido, a lei não define o conceito de trespasse, motivando que a doutrina e a jurisprudência se venham empenhando na procura da sua identificação, podendo, hoje e de acordo com a doutrina dominante, entender-se tal conceito como “a transmissão definitiva, por acto entre vivos (seja a título oneroso, seja a título gratuito), da titularidade do estabelecimento comercial”.

Sem dúvida, é possível – assim se tem entendido e bem – ceder a exploração (ou fazer o trespasse) de um estabelecimento comercial que ainda não entrou em funcionamento ou que, inclusive, ainda está em formação e portanto se mostra incompleto.
Ou seja, o que releva é o facto de o estabelecimento já ter existência, “e no caso dos autos provou-se que o mesmo já se encontrava apto a ser explorado como snack-bar”.
Neste sentido, considera a doutrina e a jurisprudência que pode haver cessão de exploração de estabelecimento comercial cuja exploração ainda se não tenha iniciado, ou esteja interrompida, pois o que tem de existir é um estabelecimento, ou seja, um conjunto de bens organizados com estabilidade e autonomia, com vista a realização de uma actividade produtiva, de natureza comercial ou industrial.

Nós vamos mais longe e sustentamos, mesmo, que a cessão de exploração (ou o trespasse) pode recair sobre um estabelecimento de que ainda não existe, que não está sequer em começo de formação, como pura realidade futura, pois são legalmente admissíveis contratos sobre bens futuros, exceptuadas as doações (CC, arts. 399º, 880º e 942º)”.
Esta posição doutrinal merece a frontal oposição de Pinto Furtado (in “Manual de Arrendamento Urbano”, Vol. II, 4ª Ed., pags. 698/699 e 711), o qual, abordando a temática do estabelecimento ainda apenas em formação (“in fieri”), e após considerar que “o punctum prurens estará em saber – e é aí que divergem as respostas – qual o estádio exacto em que, a montante, a crisálida já é estabelecimento susceptível de ser trespassado, não obstante não ser ainda insecto perfeito, ou, a jusante, que fracção residual pode continuar a considerar-se ainda estabelecimento para o efeito de ser trespassada”, sustenta que “a tese da recondução do trespasse da alienação de um estabelecimento em formação, não integrado por outros elementos além do prédio (“só paredes”, como costuma dizer-se na linguagem comum) em que deverá funcionar, será, para nós, completamente inaceitável”.
Não obstante, apesar da respectiva discutibilidade (Cfr. Ac. da Rel. do Porto, de 02.07.92, relatado pelo falecido Cons. Lopes Furtado – “Col. – 4º/231”), a transcrita tese do Prof. I. Galvão Telles mostra-se perfilhada, designadamente e em termos incondicionais, pelo Cons. Aragão Seia, a pags. 514 do seu “Arrendamento Urbano”, Anotado e Comentado, 3ª Ed., não vislumbrando nós qualquer razão plausível para não a abraçar, em sintonia, aliás, com o entendimento sufragado nas instâncias.

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7
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Contrato de arrendamento urbano (DL 106/2006 de 08.08):

A

I. Arrendamento sem existência da exigível licença ou - nos casos de alegação de urgência - do documento comprovativo de esta ter sido requerida:
- Por um lado, o locador ficará sujeito a uma coima, de montante correspondente, pelo menos, a um ano de renda, caso a violação legal lhe seja imputável — artigo 5.°, n.° 5.

  • Paralelamente, sempre em caso de culpa do locador, o locatário poderá resolver o contrato de arrendamento e exigir uma indemnização, nos termos gerais — artigo 5.°, n.° 7. Este regime - que pressupõe, pois, a validade do contrato - corresponde, na sua estatuição, ao do artigo 801.°, n.° 2, do Código Civil; caberá, pois, ao arrendatário, optar (se assim entender) pela resolução do contrato, promovendo a sua extinção, sem prejuízo da indemnização a que haja lugar.

É nulo o contrato de arrendamento cujo local arrendado (para fins não habitacionais) não disponha de licença de utilização (cfr. art. 1070.º/1 e 294.º do C. Civil e 5.º/1 e 8 do DL 160/2006, de 8 de Agosto).
Nulidade que é típica, determinando o seu conhecimento oficioso pelo tribunal.

II. Arrendamento para fim diverso do licenciado:

  • Nulidade do contrato.
  • Aplicabilidade, ao senhorio culpado, de coima, de valor não inferior a um ano de renda.
  • Atribuição, ao arrendatário, de um direito a indemnização; não obstante a nulidade do contrato, os danos sofridos pelo locatário, imputáveis a dolo ou negligência do locador, deverão ser, por este, indemnizados. A solução legal insere-se nos quadros da responsabilidade pré-contratual, por culpa in contrahendo, por celebração de contrato inválido - nulo - por facto imputável à contraparte (artigo 227.°, do Código Civil).

Tudo nos termos do artigo 5.°, n.° 8, do Decreto-Lei n.° 160//2006.

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8
Q

Contrato de arrendamento:

A

Deste modo, o contrato de arrendamento acompanhado do comprovativo da comunicação feita ao arrendatário e aos fiadores do montante das rendas em dívida, a que alude o n.º 2 do artigo 15º do NRAU, constitui título executivo não só em relação aos arrendatários mas também em relação às pessoas que no dito contrato tenham assumido a obrigação de fiadores.

I - Contratos anteriores a 15-11-1990:
a) Para habitação até 6 anos = forma escrita - o vício é imputável ao se¬nhorio, e invocável só pelo arren¬datário (art. 1º Dec.-Lei nº 13/86) - a existência do contrato pode, porém, provar-se por qualquer meio, por ambas as partes;

b) Por mais de 6 anos - estão su¬jeitos a registo (aI. m) do art. 2º, nº 1, do CRPred) = escritura pública. Se constarem de simples escrito, reduzem-se a 6 anos e são válidos nessa base (art. 1029-2 CC); caso contrário, cai-se na regra anterior;
c) Comerciais, indus. e prof. lib. = escritura pública (aI. b) art. 1029-1 CC) - vício imputável ao locador. O locatário pode fazer a prova do contrato por qualquer meio (art. 1029-3 CC) - mas o locador pode ilidir a presunção e provar então o contrato também por qualquer meio;

II. Novo Regime Jurídico do Arrendamento Urbano (NRAU):
Resulta claramente do artº 59º da Lei nº 6/2006, de 27/2 (sobre o regime transitório), que o N.R.A.U. se aplica imediatamente a todos os contratos, mesmo aos celebrados antes da sua entrada em vigor, embora, quanto a estes, com as especificidades resultantes do regime transitório constante dos arts. 26º a 58º da Lei nº 6/2006, de 27/2, ou seja, quanto à matéria da transmissão por morte do direito ao arrendamento, ao regime das benfeitorias e à actualização das rendas.

A melhor interpretação do artº 59º da Lei nº 6/2006 é a de considerar, como regra geral, e porque resulta expressamente no nº 1 do referido preceito legal, que o N.R.AU. se aplica às relações contratuais que subsistiam à data da sua entrada em vigor, o que significa que, em regra, aos contratos antigos se empregam as disposições do Novo Regime do Arrendamento Urbano, aplicável «ex vi» artº 4º do artº 26º da Lei 6/2006 de 27/2.

Em conformidade com o estabelecido no artigo 26.º, n.ºs 1 e 4, da Lei n.º 6/2006, nos contratos sem duração limitada celebrados no domínio do RAU, não é possível a denúncia imotivada pelo senhorio.

  • A exceptio non adimpleti contratus consistente na recusa de pagamento da renda, por parte do arrendatário, fundada no incumprimento, pelo senhorio, da obrigação de realizar obras necessárias ao gozo do locado, não pode ser invocada no domínio do arrendamento urbano. (Ac. STJ, de 31-01-2002, Revista n.° 190/00 -2.ª, Sum. Ac., wwwstj.pt).
  • Admite-se, pois, que a exceptio possa ser invocada pelo locatário quando ocorra incumprimento parcial da correspectiva obrigação, por parte do locador, assente na privação, ainda que parcial, do gozo do arrendado. O que se exige é que essa privação do uso seja relevante e que haja adequação entre a ofensa do direito e o exercício da excepção.
  • O desaparecimento físico do imóvel locado, por motivo de força maior, ou por causa não imputável ao locador, implica extinção por caducidade do contrato de arrendamento; todavia, se a ruína se deveu a omissão de prestações a cargo do senhorio, no que respeita à conservação do imóvel, a caducidade, implicando a extinção do contrato de arrendamento, não exclui o seu dever de indemnizar os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, verificados que estejam os requisitos da responsabilidade civil contratual.
  • A falta de pagamento de renda, independentemente do número de rendas em atraso e da duração da mora, é susceptível de constituir fundamento de resolução do contrato, integrando a cláusula geral do n.º 2 do art.° 1083.°.
    A falta de pagamento pontual da renda apenas não constituirá fundamento de resolução contratual num núcleo limitado de casos em que seria de considerar abusivo o exercício do direito pelo senhorio, designadamente situações em que o arrendatário por lapso, distracção ou outros motivos pagou a renda mas com um atraso pouco significativo (por exemplo, a renda foi paga com 1 ou 2 dias de atraso para além do permitido pelo art.° 1041.°, n.° 2 do CC) ou num montante ligeiramente inferior ao devido, regularizando depois a falta.
    Porém, há que distinguir: tratando-se de mora superior a 3 meses, a resolução tanto pode operar judicial, como extrajudicialmente; em caso de mora igual ou inferior a 3 meses, o direito à resolução judicial do contrato de arrendamento apenas poderá ser exercido através de acção de despejo fundada na falta de pagamento de renda.
    A doutrina e a jurisprudência cuidarão de definir orientações ou critérios norteadores concretização da referida cláusula geral, muito embora nos pareça que perante a falta de pagamento de renda será, em princípio, de reconhecer que se torna inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento. É evidente que tal falta de pagamento pode ter consequências patrimoniais negativas para o senhorio cuja subsistência é assegurada com a renda dum imóvel. Mas se isso não acontecer, quer porque o montante da renda é baixo, quer porque o senhorio tem uma situação patrimonial desafogada, não deixará de estar em causa um incumprimento grave, já que a renda é elemento essencial do contrato de arrendamento e a obrigação de efectuar o seu pagamento é a obrigação principal do arrendatário.
    No entanto, reconhecemos que possa ser prudente, sobretudo em casos de rendas baixas, que o senhorio aguarde 3 meses de duração da mora para instaurar a acção de despejo (naturalmente a causa de resolução abrangerá todas as rendas em atraso, ainda que só quanto à mais antiga a mora tenha a referida duração). Deste modo torna mais difícil ao arrendatário a purgação da mora e não restarão dúvidas na concretização da cláusula geral constante do n.° 2 do art.° 1083.°, fundamento de resolução do contrato, estar indiscutivelmente preenchida a previsão específica da 1.ª parte do n.° 3 do mesmo artigo. Drs. Albertina Pedroso, Laurinda Gemas e João Caldeira Jorge, Arrendamento Urbano, 3.ª ed., 376/377.

O meio extrajudicial de resolução do contrato de arrendamento por falta de pagamento de rendas, previsto no NRAU, é optativo.
Assim, o senhorio pode resolver o contrato com esse fundamento, utilizando o meio processual comum de despejo logo que o arrendatário esteja em mora relevante.
Finalmente, dir-se-á que impor ao senhorio uma espera de três meses para resolver o despejo por via extrajudicial, com todos os percalços e demoras acima mencionados, seria agravar a sua posição em face do regime anterior em que ele podia intentar a acção de despejo logo após o não pagamento de uma renda(16), quando se sabe que o NRAU pretendeu agilizar a resolução do contrato, a favor do interesse do senhorio.
Como se defende no acórdão da RLx citado, anotado por Gravato Morais, o senhorio poderá intentar a acção de despejo sem a espera trimestral para recorrer à via extrajudicial, logo que se verifique uma mora relevante ou seja, passados oito dias sem que o arrendatário faça cessar a mora e o direito à consequente indemnização, como estipula o art. 1041.º, 2 do CC, solução que o espírito da lei nos permite defender.
As vantagens são várias, a saber:
- evitar o “compasso de espera” de 3 meses de duração da mora, conforme exigido no art. 1083.º, n.º 3, do CC, para o senhorio poder efectuar a comunicação destinada à resolução extrajudicial do contrato
- evitar novo “compasso de espera” de mais 3 (hoje 1) meses, subsequentes à comunicação do senhorio, para eventual purgação da mora conforme previsto (embora de forma pouco clara quanto ao início da contagem do prazo) no art.° 1084.º, n.° 3, do CC, e para a exigibilidade da desocupação do locado nos termos art ° 1087.° do CC (já que na acção de despejo pode pedir-se e ser decretado o despejo imediato);
- evitar as vicissitudes e dificuldades inerentes à notificação avulsa ou contacto pessoal exigidos pela lei para efectivar a resolução extrajudicial (cfr.: 1084.°, n ° 1, do CC, e 9.°, n.° 7, da NLAU), em especial nos casos em que op defiro do arrendatário é desconhecido;
- evitar que a execução para entrega de coisa certa fique suspensa se for recebida oposição à execução, nos termos previstos no art.° 930.°-B, n ° 1, al. a), do CPC;
- obviar a uma eventual responsabilização nos termos do art.° 930.°-E do CPC, norma cujo campo de aplicação se circunscreve à execução fundada em título extrajudicial;
- cumular o pedido de resolução com o de indemnização ou rendas, ou com o de denúncia quando esta tenha de operar pela via judicial (art.° 1086.° do CC) ou cumular vários fundamentos de resolução, evitando que o litígio sobre a resolução do contrato seja tratado em dois processos distintos, ou seja, na acção de despejo e na oposição à execução;
- permitir ao arrendatário que deduza logo pedido reconvencional, em especial com fundamento em benfeitorias e respectivo direito de retenção, evitando a discussão dessa matéria seja relegada para a oposição à execução;
- forçar a uma purgação da mora mais célere (até ao termo do prazo para a contestação) por via do art.° 1048.° do CC, esgotando o recurso a essa faculdade (mormente na fase executiva), pois apenas pode ser usada uma única vez na fase judicial (cfr. n.° 2 do art.° 1048.°);
- lançar mão do incidente de despejo imediato previsto no art.° 14.°, n.° 4 da NLAU.
Em face deste amplo leque de vantagens, parece-nos não ser defensável considerar que há falta de interesse em agir por parte do senhorio que recorra à acção declarativa de despejo quando podia ter desencadeado a formação de título executivo extrajudicial.

Caducidade da acção (1 ano ou 3 meses – 1085º) e prescrição das rendas (5 anos – 310º, b), CC):
A acção de despejo, o direito de pedir a resolução do arrendamento, caduca se não for proposta nos termos do art. 1085º: dentro de um ano (ou 3 meses), a contar do conhecimento do facto que lhe serve de fundamento. Se este facto for continuado ou duradouro, o mesmo prazo de um ano conta-se a partir da data em que o facto tiver cessado.

Quanto à falta de pagamento de rendas, é sabido que cada falta de pagamento constitui fundamento de resolução, pelo que a acção para resolução com este fundamento pode caducar pelas faltas ocorridas há mais de um ano, mas mantém-se pelas verificadas há menos de um ano.

Além disso, caduca a acção em relação àquelas rendas, não quer dizer que elas não sejam devidas, pois só prescrevem em cinco anos – 310º, b), CC.

Assim, porque a falta de pagamento daquelas rendas vencidas há mais de um ano não pode ser invocada para resolver o contrato, pode o senhorio pedir o seu pagamento com a indemnização legal de cinquenta por cento – 1041º.
É discutível que o conhecimento de causa de resolução pelo anterior senhorio se transmita com a venda do locado – 1057º CC (Col. 89-IV-134: não se transmite o conhecimento que leva à caducidade; sim – Col. 90-III-130).

A caducidade do direito de pedir o despejo, a caducidade da acção (coisa diferente da caducidade - forma de extinguir o arrendamento) não é de conhecimento oficioso – 333º, nº 2 e 303º CC e 578º CPC.

Notar, hoje, o disposto no n.º 2 do art. 1085.º do CC, quanto à resolução por falta de pagamento de renda: três meses, em vez de um ano do n.º 1.

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9
Q

Transmissão da posição contratual do arrendatário habitacional, por morte deste:

A
  • Transmissão da posição contratual do arrendatário habitacional, por morte deste:
    O NRAU consagrou uma solução aplicável aos arrendamentos celebrados após a sua entrada em vigor, introduzida no artigo 1106.º, do Código Civil, e outra aplicável aos arrendamentos celebrados anteriormente à sua entrada em vigor, constante do seu artigo 57.º.
    Este último regime é mais restritivo, relativamente à admissibilidade da transmissão do arrendamento, do que aquele que é aplicável aos novos contratos de arrendamento, nomeadamente no que respeita à transmissão do arrendamento para filhos maiores de 26 anos e sem qualquer incapacidade, ou com uma incapacidade inferior a 60%.
    Enquanto o artigo 1106.º, do C.C., apenas exige, para que se verifique a transmissão do arrendamento para um filho nessas condições, que este tenha vivido em economia comum com o progenitor arrendatário no ano anterior à morte deste, já o artigo 57.º, do NRAU, não permite essa transmissão.
    A diferença de regimes a operar sincronicamente tem o seu fundamento na circunstância de nos novos contratos de arrendamento habitacional já não vigorar o sistema de prorrogação forçada para o senhorio do vínculo contratual, ao contrário do que sucede na maioria dos contratos celebrados anteriormente à entrada em vigor do NRAU. Enquanto nestes, com excepção dos contratos de duração limitada previstos no artigo 98.º e seg., do RAU, o senhorio não pode denunciar o contrato no termo do prazo acordado, estando vinculado através de renovações sucessivas, enquanto essa for a vontade do arrendatário, como ocorre com o contrato de arrendamento sub iudice, nos contratos celebrados após a entrada em vigor do NRAU, o prolongamento da relação contratual já não lhe pode ser imposto unilateralmente pelo arrendatário. Nestes novos contratos, o senhorio pode opor-se à renovação do contrato no termo do prazo acordado (artigo 1096.º, n.º 2, e 1097.º, do C.C.), ou não

No artigo 1106.º, do Código Civil, aplicável aos contratos de arrendamento celebrados após a entrada em vigor do NRAU, dispõe-se o seguinte:
1 - O arrendamento para habitação não caduca por morte do arrendatário quando lhe sobreviva:
a) Cônjuge com residência no locado ou pessoa que com o arrendatário vivesse no locado em união de facto e há mais de um ano;
b) Pessoa que com ele residisse em economia comum e há mais de um ano.
2 - No caso referido no número anterior, a posição do arrendatário transmite-se, em igualdade de circunstâncias, sucessivamente para o cônjuge sobrevivo ou pessoa que, com o falecido, vivesse em união de facto, para o parente ou afim mais próximo ou de entre estes para o mais velho ou para o mais velho de entre as restantes pessoas que com ele residissem em economia comum há mais de um ano.
3 - A morte do arrendatário nos seis meses anteriores à data da cessação do contrato dá ao transmissário o direito de permanecer no local por período não inferior a seis meses a contar do decesso.

E no artigo 57.°, do NRAU, aplicável aos contratos de arrendamento celebrados anteriormente à entrada em vigor deste diploma, consta o seguinte:
1 - O arrendamento para habitação não caduca por morte do primitivo arrendatário quando lhe sobreviva:
a) Cônjuge com residência no locado;
b) Pessoa que com ele vivesse em união de facto, com residência no locado;
c) Ascendente que com ele convivesse há mais de um ano;
d) Filho ou enteado com menos de 1 ano de idade ou que com ele convivesse há mais de um ano e seja menor de idade ou, tendo idade inferior a 26 anos, frequente o 11.° ou 12.° ano de escolaridade ou estabelecimento de ensino médio ou superior;
e) Filho ou enteado maior de idade, que com ele convivesse há mais de um ano, portador de deficiência com grau comprovado de incapacidade superior a 60%.
2 — Nos casos do número anterior, a posição do arrendatário transmite-se, pela ordem das respectivas alíneas, às pessoas nele referidas, preferindo em igualdade de condições, sucessivamente, o ascendente, filho ou enteado mais velho.
3 — Quando ao arrendatário sobreviva mais de um ascendente, há transmissão por morte entre eles;
4 — A transmissão a favor dos filhos ou enteados do primitivo arrendatário, nos termos dos números anteriores, verifica-se ainda por morte daquele a quem tenha sido transmitido o direito ao arrendamento nos termos das alíneas a), b) e c) do n.° 1 ou nos termos do número anterior».

o novo regime do Código Civil liberalizou deliberadamente a transmissão do arrendamento por morte do arrendatário, ao que não foi estranho o fim do sistema da renovação automática dos contratos de arrendamento para habitação.

Já o regime transitório do artigo 57.º, do NRAU, visou sobretudo aperfeiçoar, na óptica do novo legislador, as regras de transmissão do arrendamento, no âmbito do cariz vinculístico da grande maioria dos contratos a que era aplicável, diminuindo em algumas circunstâncias a possibilidade de transmissão do arrendamento e facilitando-a noutras (vide, com apreciações globais não inteiramente coincidentes sobre o sentido geral deste regime transitório, relativamente ao regime do RAU, SOUSA RIBEIRO, em “O novo regime do arrendamento urbano: contributos para uma análise”, em “Estudos jurídicos em homenagem ao Prof. Dr. António Mota Veiga, pág. 770-771, da ed. de da Almedina, MENEZES LEITÃO, em “Arrendamento Urbano”, pág. 122, da ed. de 2006, da Almedina, e RITA LOBO XAVIER, em “Concentração ou transmissão do direito ao arrendamento habitacional em caso de divórcio ou morte”, em “Estudos em honra do Professor Doutor José de Oliveira Ascensão”, vol. II, pág. 1046, da ed. de 2008, da Almedina).

Relativamente a uma primeira transmissão para um filho do arrendatário, uma vez que é essa realidade que está em causa neste processo, constata-se que no artigo 85.º, do RAU, apenas se exigia que este vivesse no arrendado com o progenitor arrendatário há mais de um ano à data da sua morte, ou que tivesse menos de um ano de idade; o artigo 1106.º, do C.C., apenas aplicável aos novos contratos de arrendamento celebrados após a entrada em vigor do NRAU, ao englobar os descendentes do arrendatário nas pessoas que com ele viviam em economia comum, além de continuar a exigir que o filho do arrendatário vivesse com este no arrendado há mais de um ano, à data da sua morte, passou a exigir que essa convivência se desenrolasse numa situação de economia comum; o artigo 57.º, do NRAU, aplicável aos contratos anteriores à sua entrada em vigor, apenas admitiu a transmissão do arrendamento para filho do arrendatário com menos de 1 ano de idade ou que com ele convivesse há mais de um ano e fosse menor de idade ou, tendo idade inferior a 26 anos, frequentasse o 11.° ou 12.° ano de escolaridade ou estabelecimento de ensino médio ou superior, ou que fosse portador de deficiência com grau comprovado de incapacidade superior a 60%, pelo que, relativamente ao regime do RAU, restringiu a possibilidade de transmissão do arrendamento para os descendentes do arrendatário.

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Despejo:

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I. Despejo:
Procedimento especial de despejo (regulado nos termos dos art.s 15º a 15º-S da Lei nº 6/2006 de 27.2 (NRAU): visa o despejo do arrendado com vista à célere recolocação do mesmo no mercado de arrendamento.

No âmbito do mesmo não é admissível deduzir reconvenção invocando os requeridos o direito a serem indemnizados pela realização de benfeitorias no arrendado, uma vez que o procedimento só comporta dois articulados, requerimento inicial e oposição.

Os requeridos, em sede de oposição, apenas, podem invocar a compensação de um crédito devido a benfeitorias no caso de os requerentes terem deduzido o seu pedido de despejo cumulativamente com o pedido de pagamento de rendas, encargos ou despesas, nos termos do nº 5 do art. 15º daquela Lei.

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Contrato de exploração em centro comercial:

A

I. Regulamentação do contrato:
Diga-se, desde já, que a nova realidade dos “shopping centers”, surgida há pouco mais de trinta anos, não permitiu o estudo da respectiva dogmática e a sua consagração legal em sede doutrinária em paralelo com outros institutos do ramo obrigacional que apresentam semelhanças em termos de objecto do negócio.
Daí que a jurisprudência tivesse oscilado, ao longo das ultimas décadas, entre a qualificação dos contratos (em que uma das partes cede à outra o gozo de determinada área de um centro comercial para aí explorar um estabelecimento) ou como de arrendamento, ou, como contrato misto de arrendamento comercial e de prestação de serviços ou, ainda, como contrato atípico ou inominado.

O Prof. Galvão Telles (apud CJ, XV, 2, 23 ss) defende tratar-se de contrato típico de arrendamento de imóvel (cf., no mesmo sentido, o Cons. Pinto Furtado – “Os centros comerciais e seu regime jurídico”, 27 e Doutor Coutinho de Abreu, in “Da empresarialidade – As empresas no Direito – 1996, 320-323), enquanto o Prof. Antunes Varela (“Das obrigações em geral”, 7ª ed, I, 300 ss) opina que o contrato não é “enquadrável nos contratos típicos com ele mais ou menos aparentados (arrendamento para comércio e locação de estabelecimento comercial) e deve ser qualificado como um contrato atípico ou inominado de exploração de loja integrada em Centros Comerciais”. (cf., também, “Centros Comerciais/Shopping Centers”, 1995, e RLJ, 128, 315 e 129 49 ss).
E apesar da divergência, todos reconhecem que nestas situações, e para além da cedência temporária do gozo de certo espaço mediante uma retribuição, o centro comercial proporciona ao lojista um conjunto de facilidades (que passam por inserção num espaço físico atraente e frequentado, por existência de múltiplas opções e ramos comerciais, segurança, limpeza de áreas comuns, por vezes, água, luz, telefone, elevadores, estacionamento, ar condicionado e, até, certos confortos e higiene) que valorizam especialmente o negócio e atraem uma clientela mais favorável, poupando, outrossim, despesas que, necessariamente, teria se instalado solitariamente numa qualquer via pública.

O Prof. Oliveira Ascensão (in “Integração Empresarial e Centros Comerciais”, BMJ 407) defende tratar-se de contrato inominado de integração empresarial, chamando a atenção para a integração da empresa (“cada uma das lojas, na empresa mais vasta, o centro comercial, com uma gestão unitária e uma dinamização empresarial do conjunto que sobreleva o mero aspecto de gozo estático de cada uma das lojas”.).
E convém ter presente a noção constante da Portaria nº 424/85 de 25 de Julho e o Decreto-lei nº 190/89 de 6 de Junho que apontam para as figuras da integração e da unidade de gestão.

Lançando mão do critério dos índices do tipo contratual (aqui os índices objecto, contrapartida, sentido, estipulação e configuração), o Dr. Pedro Pais Vasconcelos conclui que “as partes nunca querem celebrar contratos que sejam o arrendamento típico ou a típica cessão de exploração de estabelecimento comercial. No que respeita ao último, não querem os lojistas adquirir e explorar um estabelecimento comercial já existente e a funcionar, porque querem antes instalar o seu; no que respeita ao arrendamento, também não querem a vigência do regime vinculistico; em relação a ambos os tipos, não querem nem a desintegração atomística que lhes é característica. (…). Os contratos celebrados entre entidades exploradoras de centros comerciais e os respectivos lojistas são pois contratos legalmente atípicos”. (in “Contratos de Utilização de Lojas em Centros Comerciais. Qualificação e Forma”, apud “Revista da Ordem dos Advogados”, 56, Agosto 1996, 544/5).

Aderimos incondicionalmente a esta argumentação (aliás, na linha, quase uniforme, dos Acórdãos do STJ de 24 de Março de 1992 – 080755 – de 6 de Dezembro de 1990 – 079450 – de 20 de Maio de 1996 – 06 A765 – de 27 de Outubro de 1998 – 98 A834 – de 20 de Janeiro de 1998 – 97 A949 – de 11 de Abril de 2002 – 02B826 – de 12 de Outubro de 2006 – 05B2093 – e de 23 de Janeiro de 2007 – 06 A4201 – “inter alia”), não só, também, acompanhando o Prof. Antunes Varela (“quem confere à loja dos centros a sua utilização privilegiada, quem lhe assegura a complementaridade valiosa de outras lojas, quem lhe dá a vizinhança de estabelecimentos doutros ramos de alta qualidade, com grande poder de atracção sobre o público, quem lhe garante a organização complexa de todo o conjunto … é uma entidade estranha ao seu negócio, é o fundador do centro” – in “Estudos em homenagem ao Prof. Doutor António de Arruda Ferrer Correia”, II, 64) mas, e ainda, porque as obrigações do lojista coexistem com uma intervenção activa do fundador ou organizador, dando sempre a este um direito de opção sobre o tipo de comércio e a sua apresentação, em termos do centro surgir como um todo plurifacetado e harmónico.
Ora, tal implica uma maior agilização ou rapidez, negocial que não se compadece com a natureza vinculística e muito mais formal do arrendamento. (Aqui, apesar de, recentemente, se ter procurado flexibilizar o arrendamento, comercial com a introdução dos contratos de duração limitada – Decreto-lei nº 257/95 de 30 de Setembro – ou com a eliminação da exigência da escritura pública – Decreto-lei nº 64/A2000, de 22 de Abril – e revogação do artigo 1029º CC pelo artigo 2º nº1 da Lei nº 6/2006 de 27 de Fevereiro).
Estamos pois perante um contrato atípico. ( cfr ainda Dr. Hugo Duarte Fonseca in “Sobre a Atipicidade dos Contratos de Instalação de Lojistas em Centros Comerciais”apud BFDC LXXX, 2004,720).

II. Forma:
Os contratos inominados – ou atípicos – regem-se em primeira linha pelo estipulado pelas partes e, se necessário e onde puder recorrer-se à analogia do clausulado, pelos contratos típicos com afinidade, sempre considerando que, em principio, foi afastada a tipificação dos contratos padronizados.
Os contratos atípicos não estão, como regra, sujeitos a forma.
A consensualidade só é afastada se a lei impuser forma especial (artigo 219º CC) o que acontece perante o objecto e (ou) os efeitos do contrato.
“In casu”, a lei não o impõe expressamente não valendo o disposto na alínea k) do artigo 89º do Código do Notariado (já que não se trata de ter por objecto o gozo de um estabelecimento comercial que não existe aquando da celebração do contrato) sendo que a qualificação como atípico sempre afastaria a aplicação das coevas regras de forma do arrendamento.
É que uma das consequências da atipicidade é, precisamente, a não aplicação das exigências de forma dos vários tipos coenvolvidos, por não serem contratos coligados (ou união de contratos) nem contratos mistos.
A diferença está em que, nestes, os tipos coexistem sem perda das respectivas tipicidades; ou se a um tipo principal são acrescentadas meras cláusulas acessórias que não o arredam da sua linha primária, que se regem ou pela absorção ou pela combinação.
Mas como vimos em nenhuma destas classificações se insere o contrato “sub judicio”, inserível na atipicidade coincidente com o princípio do “numerus apertus” vigente no direito das obrigações.

Em suma.

a) É atípico, ou inominado, o contrato de cedência temporária do gozo de um espaço para instalação de uma loja num centro comercial.
b) Os contratos atípicos só estão sujeitos a forma se a lei o impuser expressamente, na ponderação do seu objecto ou efeitos.
c) Os contratos de cedência referidos em a) não estão sujeitos a escritura pública.

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Denúncia para habitação própria:

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Deve entender-se que a denúncia para habitação própria exige a verificação cumulativa dos requisitos dos art. 1101º, nº 1, al. a) e 1102º, verificação cumulativa que o TC julgou não inconstitucional pelo Ac. de 27.9.00, no DR., II, de 5.12.00 e foi exigida, pelos Ac. do STJ no BMJ 487-292 e, por último, de 22.6.2005, Pº 05A1711:

I - A necessidade do locado é um requisito autónomo que integra a causa de pedir da acção de denúncia do contrato de arrendamento para habitação própria, sendo mesmo a principal base ou o mais importante fundamento de tal denúncia.

II - É um conceito abstracto a preencher por factos materiais concretos, sendo uma questão de direito, sindicável pelo STJ, determinar se a matéria de facto cimentada nos autos pode integrar aquele conceito de direito.

III - A necessidade só ocorre quando se comprovar um verdadeiro estado de carência motivado por um condicionalismo que, segundo a experiência comum, determinaria a generalidade das pessoas que nele se encontrassem a precisar do arrendado para habitação, devendo portanto ser séria e medida por um critério objectivo, não se podendo confundir com uma simples maior comodidade.

IV - É ao Estado, às regiões autónomas e aos municípios, e não aos senhorios ou inquilinos, que cabe satisfazer o direito constitucional a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar.

V - O artº 114º do RAU concede uma moratória especial para desocupação do prédio ao arrendatário comercial ou industrial, não carecendo de ser pedida por este, por se tratar de uma faculdade directamente resultante da lei.

VI - A contagem dessa moratória inicia-se com o termo do contrato ou da sua renovação, sendo irrelevante a data do trânsito em julgado da decisão definitiva da acção de despejo.

Definido o regime jurídico aplicável, é à luz do estabelecido nos artigos 69º a 71º do RAU que tem de aferir-se da verificação dos requisitos necessários para a denúncia do contrato de arrendamento pelo senhorio.

Assim, decorre daqueles normativos que o senhorio pode denunciar o contrato de arrendamento quando, além do mais, necessite do prédio para sua habitação, dependendo neste caso o exercício desse direito de dois requisitos.
São eles:
- ser o senhorio proprietário, comproprietário ou usufrutuário do prédio há mais de cinco anos, ou, independentemente deste prazo, se o tiver adquirido por sucessão;
- não ter, há mais de um ano, na área das comarcas de Lisboa ou do Porto e suas limítrofes ou na respectiva localidade quanto ao resto do País, casa própria ou arrendada que satisfaça as suas necessidades de habitação.

Do elenco dos requisitos exigidos para a denúncia do contrato de arrendamento pelo senhorio para sua habitação a necessidade do locado vem emergindo como um macro-requisito ou requisito autónomo dos demais, que podem considerar-se como meras condições de exercício do direito (M. Januário Gomes, Arrendamentos para Habitação, 2ª ed., pág. 297 e Ac. do STJ de 25-01-2007, proferido no Processo nº 06B4373, acessível em www.dgsi.pt).

E é sobre esta necessidade que está centrada a controvérsia nestes autos, já que é pacífico nos autos que se verificam os dois requisitos acabados de enunciar.

Ao senhorio compete convencer que a sua pretensão corresponde a uma situação de real carência habitacional que só pode ser suprida através da devolução do arrendado, com o sacrifício que tal devolução comporta, na generalidade dos casos, para o arrendatário.

A necessidade terá de resultar de razões ponderosas, que, no conflito de interesses que se gera, farão prevalecer o interesse do senhorio sobre o do arrendatário, devendo apresentar-se com carácter sério e eminente quando seja futura.

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