APOSTILA 3 - DIREITO TRIBUTÁRIO Flashcards
Quais os princípios do Direito Tributário?
1.1 Princípio da Legalidade Tributária
1.1.1 Análise do artigo 150, inciso I, da Constituição Federal
O princípio da legalidade tributária encontra supedâneo no artigo 150, inciso I, da Constituição Federal.
Ao utilizar o verbo exigir, o que a Constituição proíbe não é apenas a cobrança de um tributo, mas a sua
própria instituição por um ato infralegal. A edição de lei é um requisito de validade, e não uma condição de
mera eficácia da regra tributária. Assim, a melhor leitura do artigo 150, inciso I, da Constituição Federal, é a
de que as entidades federativas não podem “Instituir tributo sem lei que o estabeleça”.
Essa interpretação conduz à conclusão de que a lei deve prever todos os elementos que compõem a norma
imponível e que são essenciais para que esta possa incidir. Tais elementos, identificados pelo jurista Paulo
de Barros Carvalho, são os seguintes. No antecedente, os critérios material, espacial e temporal; no
consequente, os critérios pessoal e quantitativo.
O critério material é formado por um verbo e um complemento, que indica um comportamento humano
(matar alguém, auferir renda, importar produtos) ou um determinado estado (ser proprietário de bem
imóvel). Trata-se do núcleo essencial do enunciado normativo, em que se descreve uma conduta humana
condicionada no tempo e no espaço. Por abstração, desconsidera-se nesse momento os condicionantes de
tempo e de espaço. Pensemos em um exemplo do direito tributário, o ITR – Imposto Territorial Rural, cuja
instituição foi operada pela Lei 9.393/9618.
O critério espacial é o local em que a conduta descrita no critério material deve ocorrer. Pode ser veiculada
expressamente ou estar de modo implícito no texto legislativo.
Um caso de definição explícita é o do IPTU, em que a legislação diz que o critério material (ser proprietário
de bem imóvel) deve ocorrer na zona urbana (critério espacial). Já um exemplo de definição implícita é o do
IPI, cujo critério espacial é todo território nacional.
O critério espacial pode ser:
i) pontual, quando o local do fato deve ocorrer em um ponto bastante específico (ex. estacionar
veículo em local proibido, apresentar-se à Delegacia de Polícia localizada em determinada
cidade);
ii) regional, quando o local eleito pela lei, embora específico, é um pouco mais amplo (ex. ser
proprietário de bem imóvel urbano, ou seja, dentro de uma determinada zona geográfica);
iii) territorial, bastante genérico, em que o critério espacial se confunde com o âmbito de vigência
da lei (industrializar produtos em qualquer lugar do território nacional);
iv) universal, quando o critério espacial é mais amplo do que o âmbito territorial da própria
norma. (É o caso do IRPF, em que se tributa, nos casos de residentes no Brasil, a renda auferida
no exterior).
No caso do ITR, o critério espacial é a zona rural, porque é nessa região geográfica que alguém deve ser
proprietário de um imóvel para que haja a incidência da norma jurídica.
O critério temporal é o momento, contido no suposto da regra, que indica o instante em que ocorre o fato
jurídico.
Em alguns casos, como do IPTU, a sua veiculação explícita é imprescindível, porque se está diante de uma
conduta que exprime uma situação duradoura (ser proprietário de bem imóvel urbano). Assim, é preciso
responder de maneira expressa em que momento que essa situação (ser proprietário) se afigura relevante
para fins de incidência. Já em outras circunstâncias, o critério temporal se encontra inserido de maneira implícita, porque pode ser construído a partir do critério material. Um exemplo de definição explícita ocorre
com o ITR, cujo critério temporal é o dia 1º de janeiro, por definição do artigo 1º da Lei 9.393/96.
O critério pessoal é formado pelo conjunto de informações constantes do consequente da norma, que
permite identificar quem são o sujeito ativo e o sujeito passivo da relação obrigacional. No caso do ITR, via
de regra o sujeito ativo é a União Federal. Os sujeitos passivos são os proprietários, enfiteutas e possuidores
dos imóveis rurais.
O critério quantitativo é aquele que permite a identificação do objeto da prestação. Em direito tributário,
tratando-se de obrigação principal, a prestação é sempre pecuniária, ou seja, de dar uma quantia em
dinheiro. Essa quantia é calculada mediante a multiplicação da base de cálculo pela alíquota.No caso do ITR
a base de cálculo é o valor da Terra Nua Tributável – VTN e as alíquotas variam entre 0,03% a 20%, a depender
do tamanho do imóvel e do grau da sua utilização.
Pois bem, como se pôde observar, a norma imponível depende de todos os critérios enunciados acima. Não
há como instituir um tributo sem definir qual a conduta tributável (critério material), em que momento essa
conduta deve ocorrer (critério temporal) e em que local (critério espacial). Também não há como prescindir
da definição de quem é o credor ou devedor (critério pessoal), assim como da prestação que deve ser paga
(critério quantitativo).
Logo, todos esses elementos devem ser veiculados por meio de lei para que haja a observância do princípio
da legalidade tributária. Ademais, ao utilizar a expressão aumentar tributos, a Constituição determina que o princípio da legalidade não se satisfaz com a mera instituição. O incremento do seu valor também depende
de lei.
Assim, a regra geral é a de que qualquer modificação na base de cálculo ou na alíquota da norma imponível
que represente um incremento real no valor da obrigação não pode ser realizada por meio de um ato
infralegal. Frisamos o termo real pelo seguinte motivo: O artigo 97, §2º, do Código Tributário Nacional
determina que não se considera como majoração do tributo “a atualização do valor monetário da respectiva
base de cálculo”. O Supremo Tribunal Federal considera que essa regra é compatível com a Constituição
Federal.
Portanto, é possível que um ato infralegal atualize monetariamente a base de cálculo de um tributo sem que
isso represente ofensa ao princípio da legalidade tributária.
Quais os princípios do Direito Tributário?
1.1 Princípio da Legalidade Tributária
1.1.1 Análise do artigo 150, inciso I, da Constituição Federal
O princípio da legalidade tributária encontra supedâneo no artigo 150, inciso I, da Constituição Federal.
Ao utilizar o verbo exigir, o que a Constituição proíbe não é apenas a cobrança de um tributo, mas a sua
própria instituição por um ato infralegal. A edição de lei é um requisito de validade, e não uma condição de
mera eficácia da regra tributária. Assim, a melhor leitura do artigo 150, inciso I, da Constituição Federal, é a
de que as entidades federativas não podem “Instituir tributo sem lei que o estabeleça”.
Essa interpretação conduz à conclusão de que a lei deve prever todos os elementos que compõem a norma
imponível e que são essenciais para que esta possa incidir. Tais elementos, identificados pelo jurista Paulo
de Barros Carvalho, são os seguintes. No antecedente, os critérios material, espacial e temporal; no
consequente, os critérios pessoal e quantitativo.
O critério material é formado por um verbo e um complemento, que indica um comportamento humano
(matar alguém, auferir renda, importar produtos) ou um determinado estado (ser proprietário de bem
imóvel). Trata-se do núcleo essencial do enunciado normativo, em que se descreve uma conduta humana
condicionada no tempo e no espaço. Por abstração, desconsidera-se nesse momento os condicionantes de
tempo e de espaço. Pensemos em um exemplo do direito tributário, o ITR – Imposto Territorial Rural, cuja
instituição foi operada pela Lei 9.393/9618.
O critério espacial é o local em que a conduta descrita no critério material deve ocorrer. Pode ser veiculada
expressamente ou estar de modo implícito no texto legislativo.
Um caso de definição explícita é o do IPTU, em que a legislação diz que o critério material (ser proprietário
de bem imóvel) deve ocorrer na zona urbana (critério espacial). Já um exemplo de definição implícita é o do
IPI, cujo critério espacial é todo território nacional.
O critério espacial pode ser:
i) pontual, quando o local do fato deve ocorrer em um ponto bastante específico (ex. estacionar
veículo em local proibido, apresentar-se à Delegacia de Polícia localizada em determinada
cidade);
ii) regional, quando o local eleito pela lei, embora específico, é um pouco mais amplo (ex. ser
proprietário de bem imóvel urbano, ou seja, dentro de uma determinada zona geográfica);
iii) territorial, bastante genérico, em que o critério espacial se confunde com o âmbito de vigência
da lei (industrializar produtos em qualquer lugar do território nacional);
iv) universal, quando o critério espacial é mais amplo do que o âmbito territorial da própria
norma. (É o caso do IRPF, em que se tributa, nos casos de residentes no Brasil, a renda auferida
no exterior).
No caso do ITR, o critério espacial é a zona rural, porque é nessa região geográfica que alguém deve ser
proprietário de um imóvel para que haja a incidência da norma jurídica.
O critério temporal é o momento, contido no suposto da regra, que indica o instante em que ocorre o fato
jurídico.
Em alguns casos, como do IPTU, a sua veiculação explícita é imprescindível, porque se está diante de uma
conduta que exprime uma situação duradoura (ser proprietário de bem imóvel urbano). Assim, é preciso
responder de maneira expressa em que momento que essa situação (ser proprietário) se afigura relevante
para fins de incidência. Já em outras circunstâncias, o critério temporal se encontra inserido de maneira implícita, porque pode ser construído a partir do critério material. Um exemplo de definição explícita ocorre
com o ITR, cujo critério temporal é o dia 1º de janeiro, por definição do artigo 1º da Lei 9.393/96.
O critério pessoal é formado pelo conjunto de informações constantes do consequente da norma, que
permite identificar quem são o sujeito ativo e o sujeito passivo da relação obrigacional. No caso do ITR, via
de regra o sujeito ativo é a União Federal. Os sujeitos passivos são os proprietários, enfiteutas e possuidores
dos imóveis rurais.
O critério quantitativo é aquele que permite a identificação do objeto da prestação. Em direito tributário,
tratando-se de obrigação principal, a prestação é sempre pecuniária, ou seja, de dar uma quantia em
dinheiro. Essa quantia é calculada mediante a multiplicação da base de cálculo pela alíquota.No caso do ITR
a base de cálculo é o valor da Terra Nua Tributável – VTN e as alíquotas variam entre 0,03% a 20%, a depender
do tamanho do imóvel e do grau da sua utilização.
Pois bem, como se pôde observar, a norma imponível depende de todos os critérios enunciados acima. Não
há como instituir um tributo sem definir qual a conduta tributável (critério material), em que momento essa
conduta deve ocorrer (critério temporal) e em que local (critério espacial). Também não há como prescindir
da definição de quem é o credor ou devedor (critério pessoal), assim como da prestação que deve ser paga
(critério quantitativo).
Logo, todos esses elementos devem ser veiculados por meio de lei para que haja a observância do princípio
da legalidade tributária. Ademais, ao utilizar a expressão aumentar tributos, a Constituição determina que o princípio da legalidade não se satisfaz com a mera instituição. O incremento do seu valor também depende
de lei.
Assim, a regra geral é a de que qualquer modificação na base de cálculo ou na alíquota da norma imponível
que represente um incremento real no valor da obrigação não pode ser realizada por meio de um ato
infralegal. Frisamos o termo real pelo seguinte motivo: O artigo 97, §2º, do Código Tributário Nacional
determina que não se considera como majoração do tributo “a atualização do valor monetário da respectiva
base de cálculo”. O Supremo Tribunal Federal considera que essa regra é compatível com a Constituição
Federal.
Portanto, é possível que um ato infralegal atualize monetariamente a base de cálculo de um tributo sem que
isso represente ofensa ao princípio da legalidade tributária.
Como é a relação entre medidas provisórias e a instituição de tributos?
Como regra geral, cabe à Lei ordinária instituir ou majorar tributos. Excepcionalmente, nos casos indicados
pela Constituição Federal, há a necessidade da edição de Lei Complementar. Cumpre agora enfrentarmos o
seguinte questionamento: É possível a utilização de Medida Provisória na instituição ou majoração de
tributos?
Durante a redação originária da Constituição Federal, a doutrina majoritária entendia que não, pelas
seguintes razões.
Primeira, porque a expressão “força de lei”, utilizada no caput do artigo 62 da Constituição Federal para
definir as Medidas Provisórias, não conduziria à conclusão de que esse veículo introdutor seria igual à lei.
Estas vigorariam a título definitivo, e aquelas teriam vigor precário, porque dependiam da sua aprovação
pelo Congresso Nacional.
Segunda, porque os pressupostos de relevância e urgência seriam incompatíveis com o Princípio da
Anterioridade.
Terceira, porque, tratando-se de tributos emergenciais ou extrafiscais, utilizados para o atingimento de
outros objetivos que não apenas a arrecadação, a Constituição Federal teria concedido instrumento mais
célere e efetivo do que as Medidas Provisórias, autorizando a elevação da alíquota por mero decreto do
Poder Executivo.
Apesar desses argumentos, o Supremo Tribunal Federal, mesmo na redação originária da Constituição
Federal, entendia pela possibilidade de utilização das Medidas Provisórias para instituir ou majorar tributos.
Em 2001, foi editada a Emenda Constitucional nº 32, que passou a dispor expressamente sobre essa
possibilidade:
Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas
provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional.
§ 2º Medida provisória que implique instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos
nos art. 153, I, II, IV, V, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver
sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada.
Embora o §2º se refira tão somente aos impostos, o Supremo Tribunal Federal manteve a interpretação de
que a Medida Provisória pode ser utilizada para instituir ou majorar tributos, independentemente de se
tratar de impostos ou de outras espécies tributárias. Por fim, há exceções a essa regra: Aqueles tributos
reservados à lei complementar não podem ser instituídos ou serem majorados por meio de medida
provisória, em razão da vedação expressa do artigo 62, §1º, inciso III, do texto constitucional.
Quais as Mitigações constitucionais ao princípio da legalidade?
Como vimos, a Constituição exige que todos os elementos necessários ao nascimento da obrigação tributária
estejam previstos em lei, bem como que, segundo o entendimento atualmente predominante, não há
contradição entre essa afirmação e a que possibilita a utilização de conceitos indeterminados e normas
tributárias em branco. A partir de agora, vamos direcionar a atenção para os dispositivos constitucionais que
mitigaram o princípio da legalidade tributária, autorizando que um ato infralegal alterasse a alíquota de um
tributo para majorá-lo.
Como se observa, o artigo 153, §1º, da Constituição Federal, autoriza que o Poder Executivo, atendidas as
condições e os limites estabelecidos em lei, possa alterar as alíquotas do Imposto de Importação (II), Imposto
de Exportação (IE), Imposto sobre operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores
mobiliários (IOF) e Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).
O artigo 177, § 4º, da CF, também traz uma mitigação ao princípio da legalidade, aplicável à contribuição de
intervenção no domínio econômico relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e
seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool combustível. É a chamada CIDE-Combustível, instituída
pela Lei 10.336/2001. Aqui, valem os comentários que fizemos anteriormente. A lei estabelece um limite
máximo às alíquotas, sendo possível ao Poder Executivo reduzi-las ou elevá-las até aquele limite.19
Por fim, nos termos do art. 155, § 4º, inciso IV, da Constituição, também se afigura como mitigação ao
Princípio da Legalidade Tributária o chamado ICMS-Combustível, incidente sobre os combustíveis e
lubrificantes definidos em Lei Complementar. A particularidade aqui é a de que a alíquota deve ser definida
mediante deliberação dos Estados e Distrito Federal, através de convênio.
O que não precisa ser veiculado por lei?
Até aqui, examinamos o que, em razão do princípio da legalidade, deve ser necessariamente veiculado por
meio de lei. Agora faremos o caminho inverso. Vamos tratar daquilo que dispensa lei em sentido estrito para
sua regulamentação. Chamamos a atenção para três circunstâncias bastante cobradas em provas de
concurso.
A primeira delas diz respeito às obrigações acessórias. Observe o que diz o artigo 113 do CTN:
Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória. […]
§ 2º A obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações,
positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos.
Obrigações acessórias são aqueles deveres instrumentais exigidos no interesse da arrecadação ou da
fiscalização dos tributos. Podem ser materializadas por um fazer, como entregar a Declaração do Imposto de
Renda; ou por um não fazer, como não opor embaraços à fiscalização.
Como se viu acima, o artigo 113 expressamente consigna que “a obrigação acessória decorre da legislação
tributária”, o que significa afirmar que cabe a ela, à legislação tributária, criar obrigações acessórias. A
expressão legislação tributária não foi empregada por acaso. Trata-se de um conceito técnico, definido pelo
Código Tributário Nacional no artigo 96:
Art. 96. A expressão “legislação tributária” compreende as leis, os tratados e as convenções
internacionais, os decretos e as normas complementares que versem, no todo ou em parte, sobre
tributos e relações jurídicas a eles pertinentes.
Portanto, abarca-se ao conceito de legislação tributária não apenas as leis, mas também os decretos e as
normas complementares. Ambos, os decretos e as normas complementares – estas últimas conceituadas
pelo artigo 100 do CTN -são instrumentos secundários, ou seja, atos hierarquicamente inferiores à lei. Desta forma, o Código Tributário Nacional é claro: Tratando-se de obrigação acessória, sua veiculação pode ser
realizada por meio de um ato infralegal, sendo dispensável a edição de lei.
Art. 100. São normas complementares das leis, dos tratados e das convenções internacionais e
dos decretos:
I - os atos normativos expedidos pelas autoridades administrativas;
II - as decisões dos órgãos singulares ou coletivos de jurisdição administrativa, a que a lei atribua
eficácia normativa;
III - as práticas reiteradamente observadas pelas autoridades administrativas;
IV - os convênios que entre si celebrem a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios.
A segunda circunstância que dispensa a edição de lei é a alteração na data de vencimento do pagamento.
Como vimos, trata-se de circunstância que não integra nenhum dos elementos da regra-matriz de incidência
tributária. Assim, a alteração na data do vencimento não importa na instituição de um novo tributo ou no
aumento do valor da tributação, não atraindo a incidência do disposto no artigo 150, inciso I, da Constituição
Federal.
A terceira circunstância é a atualização monetária da base de cálculo de um tributo. O artigo 97, § 2º, do
CTN, afirma que “Não constitui majoração de tributo, para os fins do disposto no inciso II deste artigo, a
atualização do valor monetário da respectiva base de cálculo”.
Portanto, o que dispositivo diz é que pode um ato infralegal proceder a atualização monetária para recompor
a inflação. Assim, dispensa lei em sentido formal a criação de obrigação acessória, a alteração na data de
vencimento do pagamento e a atualização do valor monetário da base de cálculo.
O que é o Princípio da Anterioridade?
1.2.1 Origem e Fundamento
Encerrada a análise do Princípio da Legalidade, passamos agora a estudar o princípio da anterioridade,
também conhecido como princípio da não surpresa. Pode-se falar em duas modalidades de anterioridade. A
anterioridade anual e a anterioridade nonagesimal, cujos fundamentos constitucionais repousam nos
dispositivos (arts. 150, III e 195 §6º da CR/88).
O Princípio da anterioridade tem origem no antigo princípio da anualidade, não mais vigente no direito
brasileiro. Pelo princípio da anualidade, a cobrança de um tributo estava condicionada à prévia autorização
orçamentária. Assim, se ocorresse um aumento da carga tributária sem que existisse previamente a sua
previsão na lei orçamentária, a eficácia da lei ficaria postergada para o ano seguinte, quando então o novo
orçamento fosse aprovado.
Ocorre que, a jurisprudência abrandou o rigor do princípio da anualidade, pelo seguinte motivo: a
autorização orçamentária normalmente era aprovada pelo legislativo em julho, mas o início do exercício
financeiro daquele orçamento começava em primeiro de janeiro do ano seguinte. Então, na prática, a aplicação do princípio da anualidade exigia que a alteração da legislação tributária fosse realizada até julho
para que pudesse vigorar no ano seguinte.
Passou-se a entender, então, que não seria imprescindível a precedência da lei tributária em relação à
autorização orçamentária. Seria suficiente que a aprovação da lei tributária antecedesse o início do exercício
financeiro do orçamento (janeiro do ano seguinte). O Supremo Tribunal Federal editou inclusive Súmula
nesse sentido:
Súmula 66: É legítima a cobrança do tributo que houver sido aumentado após o orçamento, mas
antes do início do respectivo exercício financeiro.
Foi essa jurisprudência que acabou “transformando” o princípio da anualidade no princípio da anterioridade
anual (também chamada de anterioridade de exercício), atualmente previsto no artigo 150, inciso III, alínea
b, da Constituição Federal. Pela redação originária da Constituição Federal, aplicava-se o princípio da
anterioridade anual ou de exercício a todos os tributos, salvo com relação aqueles expressamente
mencionados no § 1º do artigo 150 da Constituição Federal e às Contribuições para Seguridade Social. Estas
últimas se sujeitavam tão somente ao prazo de 90 dias, ou seja, à anterioridade nonagesimal ou noventena.
Essa situação perdurou até o advento da Emenda Constitucional nº 42/2003, que ampliou a anterioridade
nonagesimal, determinando sua incidência não apenas às Contribuições para Seguridade Social, conforme §
6º do artigo 195, mas aos demais tributos existentes, com exceção daqueles ressalvados expressamente pelo
texto. O motivo dessa mudança legislativa foi o de que o princípio da anterioridade anual passou a se tornar
inócuo.
Em dezembro, costumava-se aprovar “pacotes” que alteravam a legislação tributária, já para vigorar em
janeiro do ano seguinte. Chegou-se ao ponto de se editar uma norma no dia 31 de dezembro para vigorar a
partir de 01 de janeiro.
. Nesse sentido, a ampliação da anterioridade nonagesimal teve como objetivo
garantir aos contribuintes um prazo razoável de adaptação à legislação tributária.
Portanto, desse breve contexto histórico, podemos perceber o seguinte:
A relativização do princípio da anualidade acabou dando origem ao princípio da anterioridade de
exercício; a pouca efetividade do princípio da anterioridade de exercício fez com que se
ampliasse o princípio da anterioridade nonagesimal.
A segunda observação inicial diz respeito ao porquê da existência do princípio da anterioridade.
A resposta aqui é bastante intuitiva:
O princípio da anterioridade deita raízes em outro princípio – considerado por Paulo de Barros
Carvalho como um sobreprincípio. Trata-se do princípio da segurança jurídica.
Em longo estudo sobre o tema, Humberto Ávila demonstrou que a análise sobre a segurança jurídica ocorre
mediante um alto grau de parcialidade e vagueza. A parcialidade ocorre em razão de o tema ser examinado
sob um aspecto em particular, negligenciando-se as demais manifestações da segurança jurídica. A vagueza
decorre do fato de o estudo ser feito de maneira excessivamente ampla, sem que sejam apontados critérios
para efetivação prática do princípio da segurança jurídica.
A fim de superar tais dificuldades, o autor reduziu a indeterminação conceitual do princípio da segurança
jurídica e construiu critérios seguros que lhe garantem a operacionalidade. Com base nessa doutrina,
podemos afirmar que o princípio da segurança jurídica determina a adoção de determinados
comportamentos para realização dos estados que ele determina atingir. Esses estados ideais cuja promoção
é determinada pelo princípio da segurança jurídica são a confiabilidade, a calculabilidade e a
cognoscibilidade.
Nas palavras de Humberto Ávila, tais elementos podem ser descritos da seguinte forma:
o ideal de confiabilidade representa, sob perspectiva retrospectiva, a mudança do passado ao
presente, denotando aquilo que, do passado, deve permanecer no presente; o ideal de
calculabilidade ilustra, sob perspectiva prospectiva, a passagem do presente ao futuro, para
demonstrar aquilo que, do presente, deve ser mantido na transição para o futuro; e a
transparência do controle semântico-argumentativo revela a necessidade de objetividade
discursiva na transição do dispositivo à norma, e da norma à decisão
Para o nosso estudo, assume relevância o estado de calculabilidade, que diz respeito à dimensão futura do
princípio da segurança jurídica. Pode-se defini-la como a capacidade de antecipação das consequências
alternativas atribuíveis pelo Direito a fatos ou a atos, de forma que a consequência efetivamente aplicada
no futuro se situe dentro daquelas alternativas que foram antecipadas no presente.
Como se extrai da definição, o estado de calculabilidade não tem a pretensão de exigir que o cidadão tenha
certeza sobre a norma que será aplicada no futuro, mas apenas determina que a norma que venha a incidir
seja objetivamente previsível, ou seja, situe-se dentro do espectro de alternativas que possam ser
antecipadas no presente.
Dentre as várias manifestações do estado de calculabilidade, destacam-se em importância a anterioridade
de exercício financeiro e a anterioridade nonagesimal. Tais normas proporcionam um conhecimento prévio
da legislação do porvir, garantindo aos contribuintes a possibilidade de exercerem legitimamente um
planejamento estratégico.
Encerradas essas considerações iniciais, passamos a análise dogmática do princípio da anterioridade.
Quais as Considerações Gerais sobre o princípio da anterioridade?
O princípio da anterioridade anual se encontra previsto no artigo 150, inciso III, alínea b, da Constituição
Federal, e o princípio da anterioridade nonagesimal no artigo 150, inciso III, alínea c e parágrafo 6º do artigo
195 da Constituição Federal.
Uma interpretação literal dos verbos cobrar e exigir poderia conduzir à conclusão de que, uma vez publicada
a lei, ela poderia entrar em vigor imediato e desencadear seus efeitos, permitindo inclusive o nascimento da
obrigação tributária. Assim, o período de espera seria necessário apenas para o desencadeamento da
cobrança, o que equipararia o princípio da legalidade a um alargamento do prazo de pagamento.
De fato, essa interpretação promoveria de maneira tímida aquele estado de calculabilidade salvaguardado
pelo princípio da segurança jurídica, motivo pelo qual não prevalece na doutrina e na jurisprudência.
A interpretação predominante é aquela que considera a finalidade do dispositivo, vinculando o termo cobrar
e o termo exigir à ideia de eficácia jurídica. Nessa perspectiva, considera-se que a nova lei tributária fica com
a eficácia paralisada, o que impede a sua incidência antes do transcurso do prazo previsto pelo princípio da
anterioridade.
Imaginemos que, em novembro de 2019, um município publicou uma lei majorando o valor de uma taxa.
Como a eficácia da norma fica paralisada até fevereiro de 2020 – em razão da incidência das duas
anterioridades – somente a partir de fevereiro, com o decurso dos 90 dias da anterioridade nonagesimal, é
que a norma retoma eficácia, podendo incidir sobre os fatos que ocorrerem posteriormente. Antes disso, o
contribuinte que realizar o fato gerador estará sujeito ao valor previsto pela lei pretérita.
O princípio da anterioridade anual impede a deflagração da eficácia da norma no mesmo exercício
financeiro em que ela haja sido publicada. Portanto, a interpretação do dispositivo depende da atribuição de
significado à expressão “exercício financeiro”. De maneira simples e direta, podemos afirmar que exercício
financeiro coincide com o ano civil, ou seja, inicia-se em 01/01 e termina em 31/12 do mesmo ano.
O princípio da anterioridade nonagesimal, por sua vez, obsta a cobrança de tributos antes de decorridos
noventa dias da data em que haja sido publicada a lei. Assim, uma lei que institua um novo tributo e que seja
publicada em 15/12/2019 só pode desencadear seus efeitos a partir de 15/03/2020. Ambas as anterioridades
se aplicam tanto à lei que instituir um novo tributo quanto à lei que aumentar o valor de um tributo já
existente.
Quanto ao verbo aumentar, valem as mesmas observações que fizemos quando analisamos o princípio da
legalidade. O entendimento dominante considera que o artigo 97, § 2º, do CTN20, é compatível com a
Constituição Federal. Logo, a mera atualização monetária da base de cálculo não precisa observar as
anterioridades.
Por fim, vale frisar que, como regra geral, aplicam-se tanto o princípio da anterioridade anual quanto o
princípio da anterioridade nonagesimal. Isso porque, ao prever a anterioridade nonagesimal, o dispositivo expressamente consigna que deve também ser “observado o disposto na alínea b”, ou seja, que também
deve ser observada a anterioridade anual.
Portanto, podemos até aqui firmar as seguintes conclusões:
1. Anualidade é diferente de anterioridade. A anualidade diz respeito à necessidade de prévia
autorização orçamentária, e não mais se encontra prevista na Constituição.
2. Há duas modalidades de anterioridade: a) a anterioridade anual ou anterioridade de exercício,
prevista no artigo 150, inciso III, alínea b; b) a anterioridade nonagesimal ou noventena, prevista no
artigo 150, inciso III, alínea c e no § 6º do artigo 195 da Constituição Federal.
3. Como regra, aplicam-se ambas as anterioridades de maneira conjunta.
Qual as exceções às anterioridades anual e nonagesimal?
Iniciamos agora a análise das exceções ao princípio da anterioridade.
Comecemos com a anterioridade anual.
A primeira hipótese de não incidência da anterioridade anual se encontra prevista no artigo 195, § 6º, da
Constituição Federal. A Constituição quis que as contribuições para a seguridade social observassem tão
somente a anterioridade nonagesimal, tendo as excluído da incidência da anterioridade anual. Nesse
sentido, tratando-se de contribuições para a seguridade social, o aumento ou a instituição de um novo
tributo deve observar tão somente o prazo de 90 dias, sendo dispensável aguardar o término do exercício
financeiro.
As outras exceções à anterioridade anual se encontram nos dispositivos (artigos 150 §1º; 155, c; Art. 177 da
CR/88).
Da conjunção desses três dispositivos se percebe que a anterioridade anual não se aplica aos seguintes
tributos: a) Imposto sobre Importação (II) b) Imposto sobre Exportação (IE) c) Imposto sobre Produtos
Industrializados (IPI) d) Imposto sobre operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou
valores mobiliários (IOF) e) Imposto Extraordinário de Guerra (IEG) e) Empréstimo Compulsório para
Calamidade Pública ou Guerra Externa (EC-Cala/Gue) f) CIDE-Combustível g) ICMS-Combustível.
Como se observa, todos aqueles tributos que aparecem como mitigações ao princípio da legalidade também
são exceções ao princípio da anterioridade anual. Porém, há dois tributos que não aparecem como
mitigações ao princípio da legalidade, mas são exceções ao princípio da anterioridade anual: referimo-nos
ao Imposto Extraordinário de Guerra e ao Empréstimo Compulsório para Calamidade Pública ou Guerra
Externa.
As hipóteses de não incidência do princípio da anterioridade nonagesimal se encontram inseridas no artigo
150, §1º, da Constituição Federal. Os seguintes tributos aparecem no rol daquele dispositivo: a) Imposto
sobre Importação (II) b) Imposto sobre Exportação (IE) c) Imposto sobre operações de crédito, câmbio e
seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários (IOF) d) Imposto Extraordinário de Guerra (IEG) e)
Empréstimo Compulsório para Calamidade Pública ou Guerra Externa (EC-Cala/Gue); f) Imposto sobre renda
e proventos de qualquer natureza; g) fixação da base de cálculo do IPTU; i) fixação da base de cálculo do
IPVA.
Observem que “faltam” três tributos nesse rol: ICMS-Combustível, CIDE-Combustível e IPI.
Todos esses três aparecem como mitigações ao princípio da legalidade e são exceções ao princípio da
anterioridade anual, mas não aparecem como exceções ao princípio da anterioridade nonagesimal. Dessa
maneira, a modificação da norma que importe na majoração do valor desses tributos não precisa observar a
anterioridade anual, mas deve necessariamente observar a anterioridade nonagesimal, ficando a eficácia da
nova lei suspensa até que haja o transcurso do prazo de 90 dias.
Esse raciocínio foi rechaçado à unanimidade pelo Supremo Tribunal Federal, em medida cautelar apreciada
na ADI 4661.
Por outro lado, o dispositivo apresenta três exceções ao princípio da anterioridade nonagesimal que não
figuram no rol das mitigações ao princípio da legalidade nem no rol das exceções ao princípio da
anterioridade anual. Referimo-nos aos seguintes tributos: a) Imposto sobre renda e proventos de qualquer
natureza; b) fixação da base de cálculo do IPTU; c) fixação da base de cálculo do IPVA.
Quanto ao IPTU e ao IPVA, é importante frisar: O que escapa à incidência da anterioridade nonagesimal é
tão somente a fixação das bases de cálculo. O aumento da tributação através do incremento das alíquotas
desses impostos necessita observá-la.
Com o objetivo de facilitar a fixação da matéria, colacionamos um gráfico que sintetiza as exceções ao
princípio da anterioridade anual e as exceções ao princípio da anterioridade nonagesimal:
Qual a relação entre o princípio da anterioridade e medidas provisórias?
Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força
de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional.
Assim, abrem-se três possibilidades: a) a medida provisória é aprovada e convertida em lei; b) a medida
provisória é rejeitada pelo Congresso Nacional; c) a medida provisória não é votada no prazo de 60
dias, prorrogável por mais 60 dias, e perde a sua eficácia.
É válido lembrar que estudamos a ligação desse tema com o direito tributário quando tratamos do princípio
da legalidade. Naquela oportunidade, assentamos dois pressupostos: o primeiro, de que é possível a
instituição ou a majoração de tributos por meio de medidas provisórias, sendo esse o entendimento do
Supremo Tribunal Federal desde a promulgação da CF de 1988; e o segundo, de que há exceções a essa
regra, não sendo possível a utilização de medidas provisórias nos casos em que a Constituição Federal exigiu
a edição de Lei Complementar.
Agora vamos avançar no tema, na tentativa de enfrentarmos a questão à luz do Princípio da Anterioridade.
Cabe-nos responder, a partir de agora, como a doutrina e a jurisprudência têm compatibilizado a utilização
de medidas provisórias – cujos pressupostos são a relevância e a urgência – com o princípio da anterioridade, que exige o transcurso de um determinado prazo para que a norma possa desencadear seus efeitos. Mais
especificamente, cabe-nos responder à seguinte indagação: Qual o termo inicial para contagem dos prazos
trazidos pelas anterioridades? Deve-se utilizar como termo inicial a edição da medida provisória ou a sua
conversão em lei? O Supremo Tribunal Federal, na redação originária da Constituição Federal, firmou
entendimento de que o termo inicial da contagem era a edição da Medida Provisória.
Contudo, posteriormente houve uma mudança na Constituição Federal, operada pela Emenda Constitucional
nº 32/2001, que inseriu o § 2º ao artigo 62 da CF. O dispositivo determinou que, tratando-se de medida
provisória que institua ou aumente impostos – salvo aqueles ressalvados expressamente - a produção de
efeitos no exercício financeiro seguinte fica condicionada à conversão da Medida provisória em lei até o dia
31 de dezembro do exercício em que a medida provisória foi editada. A ressalva feita com relação aos
impostos previstos nos arts. 153, I, II, IV, V, e 154, II não tem maior relevância, porque esses impostos são
exceções ao princípio da anterioridade anual.
Portanto, a novidade foi a mudança no termo inicial da contagem do prazo, que, a partir da inserção desse
novo dispositivo, passou a ser a conversão em lei da medida provisória. No entanto, essa regra não resolveu
todos os problemas.
Como se pôde observar, ele trata somente da anterioridade anual, silenciando acerca da anterioridade
nonagesimal. De certa forma, a omissão é explicável: quando da edição da Emenda Constitucional nº 32, só
existia a anterioridade nonagesimal do artigo 195, § 6º, da CF; a anterioridade nonagesimal do artigo 150,
inciso III, alínea c, só foi inserida posteriormente, pela EC 42/2003.
Entretanto, o fato é que o dispositivo não diz se a anterioridade nonagesimal deve ser contada da data da
edição da medida provisória ou também da sua conversão em lei.
O segundo problema que se apresenta é que o dispositivo se refere a impostos, e não a tributos. Nessa
perspectiva, cabe indagar se, tratando-se de outras espécies tributárias, o termo inicial deve ser o da edição
da medida provisória, como decidia o STF na redação originária da CF, ou se da conversão da medida
provisória em lei, aplicando-se analogicamente às outras espécies tributárias o § 2º do artigo 62.
O Supremo Tribunal Federal tem mantido sua jurisprudência e interpretado de maneira restritiva o § 2º do
artigo 62 da CF, para aplicá-lo tão somente à anterioridade anual, nos casos em que a medida provisória se
refira a impostos.
No entanto, a Corte tem feito uma ressalva: O termo inicial deve ser a da conversão em lei nos casos em que
a instituição ou a majoração do tributo não tenha sido prevista originariamente no texto da Medida
Provisória, mas tenha sido realizada somente no curso do processo legislativo.
Portanto, podemos assentar as seguintes conclusões:
1ª – O termo inicial do prazo da anterioridade anual é a edição da medida provisória, quando o objeto
da MP for a instituição ou a majoração de qualquer outra espécie tributária que não impostos (ex.
taxas, contribuições de melhoria e contribuições especiais).
2ª: O termo inicial do prazo da anterioridade anual é a conversão em lei da medida provisória, quando
esta última instituir ou majorar impostos, salvo aqueles ressalvados pelo §2º do artigo 62 – que sequer
se submetem à anterioridade anual.
3ª: O termo inicial do prazo da anterioridade nonagesimal é a edição da medida provisória.
4ª: Em qualquer caso, o termo inicial é a conversão em lei da medida provisória, nos casos em que a
instituição ou a majoração do tributo só foi realizada no curso do processo legislativo.
Quais são as controvérsias sobre sobre a (não) incidência do Princípio da Anterioridade?
Antes de encerrarmos, abordaremos algumas controvérsias sobre a incidência ou não do princípio da
anterioridade.
Comecemos pela alteração na data de pagamento do tributo.
O raciocínio que utilizamos aqui é o mesmo de quando enfrentamos esse tema tendo como pano de fundo
o princípio da legalidade: a alteração na data de pagamento do tributo não importa na instituição de um
novo tributo ou na sua majoração. Logo, não há a necessidade de observância do princípio da anterioridade.
O Supremo Tribunal Federal editou inclusive Súmula Vinculante acerca do assunto:
Súmula Vinculante 50: Norma legal que altera o prazo de recolhimento de obrigação tributária
não se sujeita ao princípio da anterioridade.
O segundo tema diz respeito à revogação de isenções concedidas por prazo indeterminado e/ou não
condicionadas.
Do ponto de vista da jurisprudência, o plenário do Supremo Tribunal Federal adotava o entendimento no
sentido da inaplicabilidade do princípio da anterioridade quando da revogação de isenções.
No entanto, essa jurisprudência mudou a partir de 2014, quando a Primeira Turma do Supremo Tribunal
Federal julgou o RE 564.225. Na ocasião, a Corte entendeu que a anterioridade anual e a anterioridade
nonagesimal se aplicavam em caso de revogação de benefício fiscal. Transcrevemos trecho do voto proferido
pelo Ministro Luís Roberto Barroso, em que ele defendeu a modificação da jurisprudência da Corte:
[…] 6. A ocasião é oportuna para revisitar a jurisprudência da Corte, que foi muito bem retratada
pela divergência. A concepção de anterioridade que me parece mais adequada é aquela afeta ao
conteúdo teleológico da garantia. O princípio busca assegurar a previsibilidade da relação fiscal
ao não permitir que o contribuinte seja surpreendido com um aumento súbito do encargo,
confirmando o direito inafastável ao planejamento de suas finanças. O prévio conhecimento da
carga tributária tem como fundamento a segurança jurídica e como conteúdo a garantia da
certeza do direito.
7. Deve ser entendida como majoração do tributo toda alteração ocorrida nos critérios
quantitativos do consequente da regra-matriz de incidência. Sob tal perspectiva, um aumento de
alíquota ou uma redução de benefício relacionada a base econômica apontam para o mesmo
resultado: agravamento do encargo. O que não é a diminuição da redução da base de cálculo
senão seu próprio aumento com relação à situação anterior.
8. A proteção ao contribuinte remonta à origem do próprio constitucionalismo, quando passou
a constar da Carta ao Rei João Sem-Terra que o povo é quem determina a medida do seu esforço.
As garantias contra o poder de tributar evoluem e hoje o povo tem o poder de decidir e o direito
de se preparar. Pedindo vênia à divergência, acompanho o Eminente relator para negar
provimento ao recurso.[…]
Esse novo entendimento foi adotado posteriormente também pela Segunda Turma do Supremo Tribunal
Federal em diversos julgados sobre a matéria. Outra questão já decidida pelo STF diz respeito à redução ou
extinção de desconto para pagamento de tributo em parcela única ou de maneira antecipada, normalmente
autorizada nos casos de IPVA ou IPTU. A Corte decidiu que, nessa hipótese, não há majoração no valor da
carga tributária, razão pela qual não se aplica o princípio da anterioridade.
Quais as considerações gerais sobre o Princípio da Irretroatividade?
No item anterior, ao relacionarmos o princípio da anterioridade com o sobreprincípio da segurança jurídica,
falamos que este último determina a promoção dos estados de calculabilidade, confiabilidade e
cognoscibilidade. A cognoscibilidade diz respeito a um conhecimento mínimo acerca da existência, validade,
vigência e eficácia das normas jurídicas; a calculabilidade, à possibilidade de antecipar as normas jurídicas
que serão aplicadas no futuro; a confiabilidade, à necessidade de garantia de estabilidade do ordenamento
jurídico.
Assim como o princípio da anterioridade tem como suporte o sobreprincípio da segurança jurídica, ao
promover o estado ideal de calculabilidade, também o princípio da irretroatividade, do qual nos ocuparemos
a partir de agora, tem o princípio da segurança jurídica como seu fundamento.
A irretroatividade jurídica fere os ideais de calculabilidade e confiabilidade, conforme explica Humberto
Ávila:
[…]Como a retroatividade faz com que a norma anterior, em cuja eficácia se confiou, tenha parte
da sua eficácia anulada pela norma posterior, a retroatividade não diz respeito apenas a um
problema relacionado à transição do passado ao presente, mas também do presente ao futuro:
o cidadão, tendo sido frustrada a sua confiança com relação à eficácia da norma anterior pela
modificação introduzida pela norma presente, passa a desconfiar de que também a eficácia da
norma presente pode ser alterada por um norma futura. Em outras palavras, o fenômeno da
retroatividade causa tanto uma frustração da confiança normativa com relação ao passado
quanto o nascimento de uma desconfiança jurídica com relação ao futuro. Retroatividade, enfim, é um problema toca tanto à exigência de confiabilidade quanto à de calculabilidade do
ordenamento jurídico. Ela atinge, em suma, a segurança jurídica na sua dupla dimensão.
Portanto, por promover a segurança jurídica, a garantia de irretroatividade ocupa papel central em um
Estado de Direito, tendo ganhado na Constituição Federal de 1988 dois dispositivos que lhe servem como
fundamentos:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;
Passaremos a analisar o artigo 150, inciso III, alínea a, que diz respeito ao princípio da irretroatividade
tributária, objeto da nossa matéria.
Qual o significado da expressão fatos geradores ocorridos, empregada pelo artigo 150, inciso III, alínea a,
da CF?
Logo, no momento em que se passa os olhos sobre a alínea a, do inciso III, do artigo 150, da CF, é possível
intuir que a expressão “fato gerador” ocupa posição central na oração. E, assim, a delimitação do conteúdo
normativo desse dispositivo depende da significação que lhe seja atribuída. De uma maneira geral, é possível
dizer que o termo fato gerador tem sido empregado para aludir a duas realidades bastante distintas.
Numa primeira acepção, fato gerador é a descrição por uma norma geral e abstrata de um determinado
comportamento ou estado, cuja realização concreta faz nascer a relação jurídica de direito tributário. Nessa
perspectiva, fato gerador é o antecedente da regra-matriz de incidência; é, por exemplo, a previsão de que
quem auferir renda deve pagar imposto de renda.
Na segunda acepção, o termo fato gerador é a própria realização concreta daquele comportamento previsto
pela norma tributária. Ocorre, por exemplo, quando alguém, em janeiro de 2018, recebe o seu salário,
auferindo renda. Por tratar-se de palavra ambígua, alguns autores têm abandonado o uso do termo fato
gerador.
O verbo ocorrer evidencia que a Constituição empregou nesse dispositivo a segunda acepção do termo fato
gerador, ou seja, utilizou-o como a realização concreta do comportamento previsto na norma geral e
abstrata. Com outras palavras, o que a Constituição disse é que é vedado cobrar tributos com relação a fatos
jurídicos (conforme terminologia de Paulo de Barros Carvalho) que ocorreram antes da vigência da lei que
os houver instituído ou aumentado.
Assim, se uma pessoa efetivamente realizou a importação em dezembro de 2017, deve pagar o imposto de
importação conforme a lei vigente em dezembro de 2017, e não de acordo com a lei vigente em janeiro de 2018. Portanto, até aqui não há dificuldades. O que a Constituição proíbe é que uma lei posterior retroaja e
incida sobre fatos que ocorreram antes da sua vigência.
O problema surge quando introduzimos a seguinte indagação: Quando que se considera ocorrido o fato
gerador?
Há duas respostas para essa pergunta.
A primeira delas interpreta a expressão “fatos geradores ocorridos” como a consumação de todos os
requisitos necessários e suficientes ao surgimento da obrigação tributária. A segunda interpretação é mais
ampla, porque compreende tal expressão como a realização de cada um dos eventos que, em conjunto com
outros, dão origem ao nascimento da obrigação tributária, independentemente da circunstância de ter
ocorrido a consumação de todos os eventos previstos pela norma.
Embora a segunda interpretação goze de prestígio na doutrina, não é ela que prevalece atualmente.
A jurisprudência tem entendido que a ocorrência do fato gerador pressupõe a realização de todos os
elementos previstos pela hipótese de incidência da regra-matriz, sendo insuficiente que apenas um ou alguns
deles tenham sido concretamente realizados.
1.3.2.2 Consequências dessa interpretação
Dois exemplos concretos evidenciam que essa interpretação fragiliza o princípio da irretroatividade.
O primeiro deles diz respeito ao Imposto de Importação:
O Poder Executivo editou o Decreto 1.291/95 com a promessa de reduzir gradativamente a alíquota do
tributo em dois percentuais por ano, passando da alíquota de 32% em 1995 até 20% em 2011. No meio do
caminho, ainda em 1995, o Poder Executivo editou o Decreto 1.427/95, voltando atrás em sua promessa, e
aumentando a alíquota do tributo para 70%.
O Supremo Tribunal Federal viu-se confrontado com a seguinte situação:
Um contribuinte celebrou o contrato de compra e venda na época em que vigia o Decreto 1.291/95,
de alíquota menor. Contudo, o fato gerador do tributo efetivamente ocorreu em 03/04/1995, quatro
dias após vigência do decreto que a majorou. Nesse caso, o Tribunal afastou a alegação de
irretroatividade, justamente em razão de o fato gerador ter ocorrido após a edição do novo decreto.
O segundo exemplo mostra-se ainda mais elucidativo. Diz respeito à Contribuição social sobre o lucro
líquido, cujo fato gerador ocorre no dia 31/12.
Quanto à anterioridade, a CSLL é uma contribuição para a seguridade social. Nesse sentido, aplica-se a ela
tão somente a anterioridade nonagesimal, cuja contagem tem como termo a quo a data de edição da Medida
Provisória, na esteira do que vimos no capítulo anterior.
Qual o aspecto negativo(o que a lei não pode discriminar) em relação ao princípio da isonomia tributária?
O princípio da isonomia tributária encontra previsão expressa no artigo 150, inciso II, da Constituição
Federal.
O princípio da isonomia proíbe que a lei tribute de maneira distinta pessoas que estejam em situação
equivalente, mas admite, a contrario sensu, que se tribute de maneira diferenciada as pessoas que se
encontram em condição desigual. A igualdade pressupõe sempre uma medida de comparação. Alguém pode
ser igual a outrem em relação a um aspecto – em inteligência, por exemplo – mas diferente em relação à
beleza ou riqueza.
Sob a perspectiva da isonomia tributária, não é toda diferença que pode conduzir a um tratamento distinto.
O fato de alguém ser mais belo do que outrem não justifica que a pessoa mais bela seja tributada de maneira
diferente. Nessa esteira, são duas as situações que, do ponto de vista do Direito Tributário, justificam um
tratamento diferenciado, por afastarem a equivalência pressuposta pelo dispositivo: diferentes capacidades
contributivas ou razões extrafiscais.
A diferença de capacidade contributiva – riqueza – é justificativa que pode ensejar um tratamento
diferenciado, sem que se possa falar em violação ao princípio da isonomia. É o caso do IRPF, cujas alíquotas
variam de acordo com a renda do contribuinte. Quem ganha um salário-mínimo não está em situação
equivalente à de quem aufere renda superior a R$ 4.664,68.
Outros exemplos de tratamentos diferenciados foram aqueles promovidos pela Lei 10.684/2003 e pela Lei
7.787/1989. A primeira delas majorou de maneira diferenciada a alíquota de contribuição previdenciária
incidente sobre a receita das instituições financeiras. A segunda determinou que as instituições financeiras
e assemelhadas deveriam pagar um adicional de 2,5% sobre a folha de salários.
Ao julgar o RE 599.309 e o RE 656.089, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucionalidade
dos dispositivos impugnados. Dentre outros fundamentos, a Corte entendeu que seria proporcional
que contribuintes que exercem atividade econômica de grande capacidade contributiva contribuíssem
mais para o custeio da seguridade social.
Razões extrafiscais também podem justificar um tratamento diferenciado, sem que se possa falar em ofensa
ao princípio da isonomia. Nesse sentido, não há que se falar em inconstitucionalidade na elevação da alíquota
do ITR nos casos de improdutividade de imóvel rural; ou na progressividade do IPTU em razão do não
cumprimento da função social da propriedade; nem mesmo na tributação acentuada de produtos como
cigarros e bebidas.
Em todas essas hipóteses – improdutividade de imóvel rural, não cumprimento da função social da
propriedade e consumo do tabaco – as razões de interesse público justificam que a legislação tributária seja
utilizada como indutora de determinados comportamentos.
Qual o aspecto positivo do princípio da isonomia tributária?
Parte da doutrina não se limita a analisar apenas o aspecto negativo do princípio da isonomia – estudando
o que a lei pode e o que a lei não pode discriminar. Defende que o princípio da isonomia também assume
uma feição positiva, determinando o que a lei deve discriminar.
Sob esse viés, o princípio da isonomia impõe que a lei discrimine os desiguais, na medida das suas
desigualdades. Assim, nessa perspectiva, além de proibir tratamento desigual a quem se encontre em
situação equivalente, o princípio da isonomia veda um tratamento igualitário nos casos em que a situação
seja distinta.
Quando há violação a isonomia, o que o Judiciário pode fazer?
Imaginemos que uma lei institua uma isenção tributária em favor do grupo A, mas não contemple o Grupo
B, que se encontra na mesma situação daquele. Nessa hipótese, em que há uma violação ao princípio da
isonomia, a doutrina menciona a existência de três técnicas de decisão que o Poder Judiciário poderia utilizar
para restabelecer a legalidade:
A primeira seria a extensão dos benefícios ao Grupo B. Assim, por meio de uma decisão judicial, o Poder
Judiciário conferiria aos contribuintes desse grupo a mesma regra isentiva que foi concedida ao Grupo A.
A segunda possibilidade é a supressão dos benefícios que foram concedidos ao Grupo A. Por esse
mecanismo, a norma isentiva seria declarada inconstitucional, e tanto os contribuintes do Grupo A quanto
do Grupo B passariam a sofrer a incidência da mesma norma tributária.
A terceira possibilidade seria fazer um apelo ao legislador, conclamando-o a editar uma lei que
restabelecesse o princípio da isonomia, sob pena de, no futuro, reconhecer-se a inconstitucionalidade da
norma isentiva.
As três técnicas mencionadas constam do voto do Ministro Celso de Mello no RMS 22.307-7/DF.
Dentre essas três técnicas de decisão, o Supremo Tribunal Federal tem rechaçado a utilização da
primeira, de extensão dos benefícios às categorias que foram deles excluídas.
O argumento é o de que essa postura transformaria o Poder Judiciário em legislador positivo.
Esse foi um dos fundamentos - não o único - utilizado pela Corte para julgar improcedente a ADI 6025,
julgada em julho de 2020. Nessa ação, a Procuradoria Geral da República objetivava ampliar a isenção
conferida pelo artigo 6º, inciso XIV, da Lei de nº 7.713/88 - que isenta os proventos de aposentadoria
de portadores de doenças graves do IRPF - também aos rendimentos do trabalho auferidos pelos
trabalhadores que permanecem na ativa. O argumento é o de que existiria uma violação à isonomia,
pela ausência de fundamento idôneo que justificasse a diferenciação entre aposentados doentes e
trabalhadores doentes. Ao apreciar a demanda, o Supremo Tribunal Federal assentou que “não é
possível que o Poder Judiciário, atuando como legislador positivo, amplie a incidência da concessão de benefício tributário, de modo a incluir contribuintes não expressamente abrangidos pela legislação
pertinente”.
Portanto, o Supremo Tribunal Federal entende que o Poder Judiciário só pode utilizar as duas últimas, não
sendo viável a extensão de um benefício fiscal a um grupo de contribuintes que foi excluído pela legislação.