APOSTILA 08 - PROCESSO COMO PROCEDIMENTO Flashcards
O que é a teoria do processo como procedimento?
Nessa época, já falamos que o direito de ação era compreendido como o próprio direito material em
movimento. Tal visão repercutiu também na noção do processo, na medida em que este era confundido com
o procedimento. Compreendiam o Processo como sendo apenas uma sucessão de atos processuais
necessários, restringindo seu estudo à forma, ao rito, ao procedimento.
Nessa toada, tal fase foi denominada de imanentista ou fase do praxismo ou fase do procedimentalismo
O que é o processo como contrato?
Criada pelo autor francês Pothier, essa teoria teve força nos séculos XVIII e XIX, num movimento de
engrandecimento do direito privado e tentativa de enquadramento de vários institutos dentro dos
quadrantes privatistas.
A teoria tinha dois fundamentos:
a) fundamento filosófico: Na linha do defendido por Rousseau no “Contrato Social”, havia a ideia de que os
cidadãos devem se submeter às regras por eles mesmo pactuadas, propugnando uma liberdade baseada no
consenso.
b) fundamento jurídico: tinha por base textos de Ulpiano e o direito romano formular, em especial a
litiscontestatio, que representava a concordância das partes em sofrer os efeitos da demanda.
O que é o processo como quase contarto?
No século XIX, o francês Arnault de Guényvau elabora a teoria do processo como quase contrato, sendo
uma definição por exclusão. Percebendo que o Processo não seria um contrato, tampouco poderia ser
enquadrado como “delito”, o Processo, por exclusão, poderia ser denominado como “quase contrato”. Para
Savigny e Guényvau, o consentimento não era inteiramente livre, motivo este que levou os autores a
acreditar que o processo “não era um contrato, que pressupõe vontade livre, sendo algo semelhante a um
contrato, algo como se fosse um contrato, embora contrato não fosse”.
O que é o processo como relação jurídica?
Como já sabemos, a certidão de nascimento do Direito Processual Civil foi a obra de Oskar Von Bülow, em
1868, com sua obra Teoria das Exceções Processuais e Pressupostos Processuais, fechando o ciclo da fase
imanentista e dando início à 2ª fase do Processo Civil, mais conhecida como fase do
autonomismo/processualismo.
Como salienta a doutrina, a relação jurídica processual é composta de posições jurídicas ativas (poderes,
faculdades e direitos) e passivas (sujeição, deveres, ônus) entre as partes entre si e entre as partes e o EstadoJuiz. Na relação jurídica processual, o juiz despacha a petição inicial, pois ele tem dever disso. Réu contesta,
pois ele tem ônus (se não o fizer, serão considerados verdadeiros). Partes produzem provas no processo,
pois têm direito e ônus. Elas recorrem porque têm direito de recorrer.
Portanto, juiz, autor e réu compõem relações jurídicas, que compõem plexo de situações jurídicas ativas
(poderes, direitos) e passivas (ônus, deveres etc.) e essas situações são cambiantes (antes tinha ônus, agora
tem direito etc.).
O que é o Processo como Situação Jurídica?
James Goldschmidt foi o criador desta teoria, concebendo o processo como uma sucessão de diferentes
situações jurídicas, capazes de gerar para os sujeitos deveres, poderes, ônus, faculdades e sujeições.
O autor diz que, quando o direito assume uma condição dinâmica (o que se dá por meio do processo), operase nele uma mutação estrutural: aquilo que, numa visão estática, era um direito subjetivo, agora se degrada
em meras possibilidades (de praticar atos para que o direito seja reconhecido), expectativas (de obter esse
reconhecimento), perspectivas (de uma sentença favorável ou desfavorável), ônus (encargo de praticar
certos atos, cedendo a imperativos ou impulsos do próprio interesse, para evitar a sentença desfavorável).
Em suma, onde havia direitos há agora meras chances (expressão utilizada pelo autor para englobar todas
as possibilidades, expectativas, perspectivas e ônus).
O que é o Processo como Instituição?
Embora desenvolvida por Jaime Guasp, esta teoria teve seu principal representante na figura de Eduardo J.
Couture (que depois a abandonou). Segundo ela, o processo seria uma instituição jurídica. A primeira e
maior dificuldade que dela decorre reside em esclarecer, com precisão, o que significa a expressão instituição
jurídica.
O que é o Processo como Procedimento em Contraditório?
O italiano Elio Fazzalari inaugurou a referida teoria, a partir da ideia de módulo processual.Conforme aponta
Assumpção, Fazzalari defende que o procedimento contém atos interligados de maneira lógica e regida por
certas normas, sendo que o ato subsequente depende do anterior, e assim sucessivamente.
Para a prática de cada ato, deve-se permitir a participação das partes em contraditório, sendo exatamente
essa oportunidade de participação em cada etapa que torna o processo um procedimento em contraditório.
O que faz o procedimento caminhar não é relação jurídica, pois isso é coisa de direito privado. O que faz o
procedimento caminhar é o contraditório, o poder-dever-ônus de atuar no processo. Assim, procedimento
seria gênero, do qual o processo seria uma espécie, mais especificamente um procedimento pautado no
contraditório. Nesse passo, a presença da relação jurídica no processo seria apenas instrumentação técnica
da exigência político-constitucional do contraditório.
O que é procedimento?
O procedimento é uma sucessão de atos interligados de maneira lógica e consequencial, visando a obtenção
de um objetivo final.
Assumpção afirma que o procedimento é a exteriorização do processo, consubstanciada numa noção formal,
significando essa sucessão de atos com um objetivo final.
Na concepção de processo como entidade complexa, o procedimento é o aspecto extrínseco do processo,
enquanto que a relação jurídica consubstancia o aspecto intrínseco.
O que é Relação Jurídica Processual?
Como dito, a doutrina do Processo como entidade complexa (relação jurídica processual animada pelo
procedimento em contraditório) afirma que esta relação se distingue da relação jurídica de direito material
por três aspectos: a) sujeitos (autor, réu e Estado-Juiz); b) objeto (provimento jurisdicional); c) pressupostos.
O que são sujeitos?
São três os principais atores processuais, quais sejam, Estado, demandante e demandado. Para diferenciá-la
da relação jurídica de direito material, não é só a presença do Estado-Juiz que importa, mas também a sua
condição de sujeito exercente do poder (jurisdição). Correlativamente, as partes figuram em situação de
sujeição ao juiz.
Claro que podem existir casos de processos sem autor (excepcionalmente, nas demandas iniciadas de ofício
pelo juiz), bem como processos sem réu (ex: controle de constitucionalidade, algumas hipóteses de jurisdição
voluntária, a exemplo do pedido de alteração de nome etc.), mas a regra é que ambos demandante e
demandado estejam presentes.
Nesse ponto, Daniel Assumpção pontua que, mesmo que se conceba o processo como relação jurídica
triangular (concepção majoritária), formada por autor, réu e Estado-Juiz, o processo já existe antes da
citação. Para que o processo exista, basta que alguém (com capacidade de ser parte) postule (demanda)
perante um órgão que esteja investido de jurisdição. Tanto é assim que o juiz pode proferir sentença nesse
momento, tanto terminativa, extinguindo o processo sem resolução do mérito (art. 330 c/c art. 485, I, CPC)
quanto definitiva, extinguindo o processo com resolução do mérito (art. 332, CPC).
Não há dúvida, pois, que um processo possa existir antes de o réu ser citado; para este, porém, só terá
eficácia se produzir alguma consequência jurídica, se for validamente citado (art. 312, CPC).
O que é objeto?
A relação jurídica de direito material tem por objeto o bem da vida, o objeto dos interesses em conflito (ex:
importância em dinheiro, imóvel, móvel etc.). A relação jurídica processual, por sua vez, tem por objeto a
tutela jurisdicional solicitada, normalmente designado de demanda (pedido).
O objeto litigioso do processo, por sua vez, é o objeto da prestação jurisdicional solicitada, normalmente
designado de demanda. Como dissemos na aula 03, esse objeto litigioso do processo é delimitado pelo
pedido e causa de pedir).
O que são Pressupostos Processuais?
É importante destacar que, como afirmamos nesta aula e na aula 03, com os influxos da teoria eclética de
Liebman, o juiz tem de passar por três análises no decurso do processo.
Primeiro, verifica a higidez dos pressupostos processuais (de existência e validade). Em segundo lugar,
analisa se as condições da ação foram preenchidas. Por último, detém-se sobre o mérito. Por isso que não
deve ser confundidos os pressupostos processuais com as condições da ação (interesse e legitimidade).
Destacaremos quando essa dúvida pode ocorrer ao longo desta aula.
Quais as características da relação processual?
A relação jurídica processual tem 5 características, segundo Ada, Dinamarco e Cintra:
i- autonomia: é autônoma em relação ao direito material. Se houver improcedência, houve mesmo assim
relação jurídica processual. Expurga-se, assim, a teoria imanentista e a teoria concreta da ação.
ii- complexidade: são inúmeras situações jurídicas (ativas ou passivas) que se verificam no decurso do
procedimento. Há ônus, deveres, faculdades, direitos das partes, enquanto o juiz possui poderes e deveres.
iii- dinamismo: a relação processual é continuada desenvolvendo-se ao longo do tempo.
iv- unidade: os atos praticados pelos sujeitos estão todos interligados de forma lógica, dependendo o
posterior de como foi praticado o anterior.
v- natureza pública: em razão da participação do Juiz, como presentante do Estado. Já discorremos a respeito
do fato de o Direito Processual Civil ser ramo do Direito Público.
O que é a Escada Ponteana?
Na relação de direito material, é muito famosa a Escada Ponteana construída por Pontes de Miranda, em
seu Tratado de Direito Privado (volumes 3 e 4), que descreve quais elementos são impresincídveis para
existência, validade ou eficácia de um negócio jurídico. Os civilistas dizem que o art. 104, CC simboliza bem
esses três passos:
Para a existência do negócio jurídico, necessitaríamos de agente; objeto e forma. Como requisitos de
validade, teríamos agente capaz; objeto lícito, possível, determinado ou determinável; e forma prescrita ou
não defesa em lei. Quanto ao plano da eficácia, verificaríamos se o negócio jurídico possui alguma condição, termo, encargo; se o inadimplemento gerou juros, multas, perdas e danos etc.
Há diferença em falar pressuposto ou requisito?
A doutrina, normalmente, trata ambos os termos de maneira uniforme. Contudo, segundo a melhor técnica,
pressuposto é aquilo que precede ao ato e se coloca como elemento indispensável para sua existência
jurídica. Requisito, por sua vez, é tudo quanto integra a estrutura do ato e diz respeito à sua validade. Assim,
o mais técnico é falar em pressuposto de existência e requisito de validade.
Ocorre que a doutrina trata o tema dos “Pressupostos Processuais” englobando tanto os de existência,
quanto os de validade, razão pela qual iremos diferenciar quando a expressão designa os dois,
englobadamente, e quando o termo é utilizado da forma tecnicamente correta. Vocês verão a pertinente
classificação e aprofundamento com o Professor de Direito Civil, mas saibam que esses planos de existência,
validade e eficácia servem primordialmente ao negócio jurídico. Não são planos da relação de direito
material como um todo.
Da mesma forma, em nossa matéria, Didier ressalta que os pressupostos de existência, requisitos de validade
e condições de eficácia não são da relação jurídica processual, mas sim do procedimento, que seria um ato
jurídico complexo de formação sucessiva. Nesse sentido, não podemos confundir pressupostos/requisitos
do processo (mais especificamente do seu componente extrínseco – procedimento) como um todo com os
pressupostos/requisitos de cada ato.
Ex: A sentença tem que ser motivada (art. 93, IX, CRFB e art. 489, §1º, CPC). A existência de motivação é um
requisito de validade da sentença e não do processo como um todo.
Ex2: Já a competência do juiz é um requisito de validade do processo como um todo.
Quais os 3 princípios devem guiar o exame dos pressupostos/requisitos? Cite exemplos.
Montans destaca que três princípios devem guiar o exame dos pressupostos/requisitos:
instrumentalidade das formas (art. 277, CPC); primazia da decisão de mérito (art. 4º c/c art. 488, CPC) e
ausência de prejuízo (pas de nullité sans grief), consoante art. 282, §1º, CPC.
Ex1: Embora a petição inicial seja inepta, o réu pode ter se defendido ao longo de todo o processo acerca do
mérito. Não pode o juiz, no final, extinguir o feito sem resolução do mérito, se a decisão de mérito já pode
ser dada. Seria prestigiar a forma em detrimento da substância.
Ex2: imagine-se que uma criança esteja em um processo, representada por advogado, mas não representada
pelos pais (tem capacidade de ser parte, mas lhe falta de capacidade processual). Esta criança vence a ação.
Nesse caso, não haveria sentido em anular o processo se a criança venceu.
Ex3: a causa envolve incapaz e o MP não foi intimado. Então, não se observou um requisito de validade.
Acontece que o menor ganhou e, portanto, não há razão de se declarar a nulidade.
Nesse caso, seria interessante remeter o processo ao MP que, consoante o art. 279, §2º, CPC, poderia se
manifestar pela não anulação do feito por conta dessa ausência de prejuízo.