Conceções dos Princípios Flashcards

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Q

Princípios como Ratio

A

A conceção dos princípios como ratio tem uma herança do positivismo normativista do século XIX, especialmente do positivismo conceitual, durante o qual se falava num direito posto (por via da lei) e imposto (através do costume). Esta compreensão unidimensional do sistema jurídico reduz o direito ao estrato das normas, de modo que não se identificam os princípios enquanto direito vigente.

No século XIX, os Princípios gerais de Direito eram muitos e estavam em dispersos os diferentes materiais jurídicos, admitindo-se que a jurisprudência inferior deveria proceder à análise, concentração e interpretação dos mesmos, reduzindo a complexidade do direito.

De acordo com Jhering, a jurisprudência inferior (correspondente a um degrau inferior de racionalização do direito) deve debruçar-se inicialmente sobre os materiais jurídicos vigentes (que são muitos e muito dispersos) e, em função das questões a que as normas respondem, dos domínios dogmáticos em que se inserem e dos institutos que lhes correspondem, realizar um exercício de concentração lógica, de simplificação quantitativa e de generalização, desconsiderando aquilo que as distingue e atentando no que têm em comum.
Assim, poder-se-á reconstruir um enunciado normativo mais geral e abstrato que reproduzirá simplificadamente o conteúdo dessas mesmas normas, permitindo ao jurista obter uma perceção sintética e prévia do seu sentido.
Precisamente por serem princípios gerais, o seu conteúdo nunca ultrapassa o das normas e não pode haver conflito entre ambos. Estes princípios também não atuam enquanto fundamentos.
Podem, contudo, desempenhar uma importante função metodológica ao nível da aplicação do direito sempre que se verifique uma situação especialmente grave de lacuna da lei : no caso de uma controvérsia não poder ser resolvida por analogia legis (por inexistência de norma adequada ao caso), o jurista poderá solucioná-la por analogia iuris – mobilizando um princípio geral para auferir daí uma proposição normativa.

A jurisprudência inferior chega, assim, a um direito objetivo, pressuposto para a atuação da jurisprudência superior. Por sua vez, esta deverá construir um autêntico sistema de corpos jurídicos – os institutos e conceitos – capazes de constituir um verdadeiro direito-dogma, no fundo capaz de resolução das controvérsias juridicamente relevantes.

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Q

Principios como Intentio

A

A conceção dos princípios como intentio emerge no início do século XX, no contexto do pensamento jurídico europeu de crítica ao positivismo, associado a Stammler – célebre jurista neokantiano. Segundo esta compreensão, os princípios aparecem já como aspirações, exigências com um sentido próprio e autónomo em termos prático-normativos. Exclui-se, no entanto, a possibilidade de considerá-los, em si mesmos, como autêntico direito vigente. Identificam-se sempre como intenções e conteúdos pré-jurídicos, com uma índole moral e ético-comunitária, com uma intenção regulativa, e só adquirem força jurídica quando são assimilados pelas normas legais (como leis constitucionais) e/ou pelos precedentes vinculantes ou pela autoridade-potestas que os sustenta.

Concebem-se estes princípios como intenções regulativas sem caráter constitutivo que poderão ser convocadas pelo legislador, para o orientarem na construção de critérios jurídicos (isto é, para a constituição do direito positivo), e pelo julgador, para o orientarem na resolução de problemas de indeterminação das normas e de casos omissos. Traduzem expectativas e compromissos de uma determinada comunidade.

Quando são transformados em normas legais para 1 órgão institucional com legitimidade no plano político-constitucional ou quando estão presentes de forma clara nas decisões jurídicas, que são formalmente vinculantes (common law).

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3
Q

Como podem ser entendidos os principios como Intentio

A
  • Intenções regulativas orientadoras na produção de critérios jurídicos: Constituição de direito positivo. Como correspondem a exigências de sentido comunitariamente partilhadas, o legislador deve ter os princípios em atenção ao pensar o conteúdo de novas leis, de modo a que haja coerência entre as leis e os valores que regem a comunidade. Ainda assim, é importante não esquecer que estes princípios não têm carácter constitutivo;
  • Intenções regulativas com um carácter metodológico: apesar de não constituir direito vigente, podem ser mobilizadas como apoios que orientam o juíz na resposta às controvérsias jurídicas. Assim, são compreendidas como apoios-arrimos que permitem ao jurista vencer indeterminações das normas legais e dos critérios jurisprudenciais e enfrentar problemas de integração de lacunas, evitando que os designados “casos omissos” permaneçam sem solução.
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4
Q

Princípios como Ius

A

A conceção dos princípios como ius permite pensá-los enquanto expressões constitutivas da validade jurídica, com relevo normativo e metodológico autónomo, dispensando a confirmação por qualquer instância de decisão para serem considerados fundamentos. São já intrinsecamente jurídicos e constituem institucionalizações projetadas na perspetiva da bilateralidade atributiva, valem por si próprios e não necessitam de ser validados por parte de uma autoridade, princípios podem constituir verdadeiros fundamentos, e da comparabilidade da validade comunitária.

Estes princípios beneficiam de uma bivalência normativa: são autêntico direito vigente e, simultaneamente, impõem-se-nos como intenções regulativas e de validade para os atos constituintes que venham a criar novo direito. Dispõem, ainda, de um excesso normativo, na medida em que as suas expressões não se esgotam nas suas possíveis manifestações objetivas num determinado sistema jurídico, no momento em que o jurista se debruça sobre elas- estas explicitações constituem apenas leituras históricas dos sentidos dos princípios, não impedindo a atribuição, no tempo, de novos sentidos aos mesmos. Por serem limites normativos de validade, condicionam o entendimento de todo o sistema jurídico.

Como não antecipam problemas ou tipos de problemas, as significações dos princípios como ius são, em grande parte, determinadas pelo modo como estes são experimentados na perspetiva de um caso concreto, assegurando uma verdadeira consonância prática. São, por isso, chamados a atuar na construção das respostas dadas às controvérsias, quer quando essa solução possa contar com o auxílio de um critério já existente (atuando pela mediação desse critério), quer quando não haja ainda um critério estruturado (atuando diretamente sobre o critério original que o jurista irá constituir). Somente no contexto de um problema jurídico é possível compreender plenamente quais as exigências daquele compromisso comunitário.

Leva ao problema da realização do direito sem a mediação de um critério-norma e a que os princípios sejam, simultaneamente, direito vigente e intenções regulativas e de validade para a criação de novo direito.
Deste modo, assumem um carácter subsidiário e, portanto, apenas convocados na ausência de critérios que possam solucionar o problema jurídico em causa.

Ainda assim, não deixa de se procurar assegurar a consonância prática entre os princípios e o conteúdo das nomas que os possam realizar.

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5
Q

Concentração lógica associada aos Princípios como ratio- momento científico da Escola Histórica

A

Este momento tem origem na sistematização exemplar, proposta por Jhering, do direito (im)posto pelas forças históricas ao elemento político.
Numa primeira abordagem, a jurisprudência inferior (estádio de determinação racional inferior) procede à análise jurídica – que consiste, metaforicamente, na “química do direito” –, reconduzindo todos os materiais a autênticas proposições normativas gerais e abstratas. Posteriormente, dada a sua diversidade e abundância, as proposições lógicas são organizadas e simplificadas quantitativamente, num exercício de concentração lógica, através da construção de princípios gerais do direito, obtidos pela indução de um centro lógico comum aos vários enunciados.

Por sua vez, a jurisprudência superior opera a construção e sistematização conceitual: partindo dos materiais já disponibilizados pela jurisprudência inferior, reconstitui-se a sua unidade (e a consequente unidade do sistema – pensado em termos coerentes e horizontais).

As normas estabelecem relações de vizinhança, uma vez que todas utilizam a mesma rede de conceitos e a mesma linguagem ao nível das significações. A tarefa em causa consiste, fundamentalmente, em esclarecer tais significações da forma mais rigorosa possível, criando um sistema de corpos jurídicos compreendido por institutos (emancipados da sua historicidade e contingência) e conceitos.

De acordo com a pirâmide conceitual de Puchta, tratar-se de sistematizar os conceitos admitindo vários estratos. À medida que subimos da base para o vértice, vai-se estreitando a largura dos estratos; de estrato para estrato, perde a pirâmide em largura o que ganha em altura. Quanto maior a largura (a abundância da matéria), tanto menor a altura (a capacidade de perspetiva) e vice-versa. À largura corresponde a compreensão e à altura a extensão (o âmbito da aplicação) do conceito em abstrato. O ideal do sistema lógico é atingido quando no vértice se coloca o conceito mais geral possível, em que se venham a subsumir os outros conceitos. Tomando como exemplo o conceito de servidão de passagem em benefício de prédio encravado, e convocando a rede dos conceitos: a) vértice: direito subjetivo; b) estrato inferior: direito subjetivo sobre uma coisa; c) estrato inferior: direito subjetivo sobre uma coisa alheia; d) estrato inferior: direito subjetivo sobre uma coisa alheia imóvel; e) estrato inferior: direito subjetivo sobre uma coisa alheia imóvel sujeita à fruição de uma utilidade.

Chegando-se ao direito-dogma.

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6
Q

Dialética Princípios/Normas

A

Os princípios normativos beneficiam de uma presunção de validade e vinculam-nos enquanto validade. Da mesma forma, impõem limites de validade aos critérios que compõem o sistema jurídico. Por vezes, surge o problema das relações entre os princípios e as normas legais.

  • O sentido de um princípio positivo e contingente não pode ser alterado de forma autoritário- prescritiva sem que se respeitem as consonâncias de fundamentação e de função.
  • Quando a norma se opõe aos fundamentos normativos de um princípio transpositivo, impõe- se, pelo menos num primeiro momento, a invalidade da mesma como um problema de coerência entre ela e o domínio dogmático do direito em causa.
  • No caso de uma norma contrariar os fundamentos normativos de um princípio suprapositivo, reconhece-se diretamente a prevalência do princípio enquanto exigência constitutiva da juridicidade.

Os supra referidos limites normativos e, portanto, a invalidade das normas, são apurados em concreto, experimentando-se o sentido dos critérios legais e dos problemas jurídicos que os convocam como solução.

Assim, tal invalidade, apurada em concreto, não se confunde com o problema da lei injusta, que decorre do confronto, em abstrato, entre a lei e o sentido transsistemático do direito, que está relacionado com uma ordem político-social que não pode ser considerada uma verdadeira ordem de direito.

É de salientar que os princípios pautam por uma concordância prática entre eles, ainda que por vezes estejam associados, em abstrato, a exigências contrárias. Por exemplo, entre os princípios da perigosidade e da culpa deve privilegiar-se o primeiro, não deixando de se considerar e admitir o segundo.

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