Envolvimento Renal nas Doenças Hematológicas Flashcards

1
Q

ANEMIA FALCIFORME

Defenição e fisiopatologia

A

A anemia falciforme é uma doença genética na qual há uma substituição de ácido glutâmico por valina na sexta posição da cadeia beta da hemoglobina, resultando em uma molécula anormal, constando de duas cadeias alfa normais e duas cadeias beta defeituosas. A esta hemoglobina damos o nome de hemoglobina S (HbS).
A desordem falcêmica (doença SS) tem como características principais:

(1) anemia hemolítica, pela destruição esplênica precoce das hemácias alteradas; e

(2) fenômenos vaso-oclusivos, provocados pela polimerização da HbS.

Este fenômeno confere à hemácia, além de um formato distorcido (“afoiçamento”), uma grande tendência de se aderir ao endotélio vascular, o que provoca a obstrução de vasos na microcirculação.
O principal estímulo que deflagra a polimerização da HbS é a baixa tensão de oxigênio. Cada vez que as hemácias liberam O2 aos tecidos, a HbS se polimeriza, provocando imediato afoiçamento. A hemácia volta ao seu estado original logo após ser novamente oxigenada nos vasos pulmonares. Em determinadas circunstâncias, o fenômeno do afoiçamento é exacerbado, a ponto de provocar isquemia ou infarto tecidual por vaso-oclusão da microvasculatura.
A desidratação das hemácias, quando circulam em meios hipertônicos, e a ocorrência de infecções (estresse oxidativo) são os principais fatores precipitantes de fenômenos vaso-oclusivos na doença falciforme. Tais fenômenos resultam em episódios álgicos recorrentes e numa variedade de complicações em diversos sistemas orgânicos, que sofrem uma disfunção progressiva e trazem para o organismo grande morbidade, colocando muitas vezes a vida do paciente em risco.

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Q

ANEMIA FALCIFORME

Manifestações renais

A

O envolvimento renal é comum na anemia falciforme e pode se apresentar de diversas formas, desde distúrbios da concentração urinária (comprometimento tubulointersticial) até síndrome nefrótica com perda progressiva da função renal (comprometimento glomerular); o mais comum é que tenhamos um pouco de cada componente.
A doença, na verdade, afeta primariamente a microvasculatura renal, tendo como consequência a disfunção isquêmica tubular e a ocorrência de múltiplos infartos corticais e principalmente medulares. O envolvimento glomerular decorre, em parte, da isquemia cortical e, em parte, de uma condição de hiperfluxo renal de gênese ainda pouco conhecida.

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Q

ANEMIA FALCIFORME

Quais as formas de lesão renal? 5

A

1- Isquemia Medular Renal

2- Disfunção Tubular Distal

3- Hematúria e Necrose de Papila

4- Glomerulopatia Falcêmica

5- Carcinoma Medular

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4
Q

ANEMIA FALCIFORME

Isquemia Medular Renal

Fisiopatologia da lesão

A

A medula renal é a estrutura mais acometida!! Por oferecer um ambiente com baixa tensão de oxigênio (devido ao pobre suprimento vascular) e alta osmolaridade (hipertonicidade), o ambiente medular favorece a polimerização da HbS e, portanto, o afoiçamento de hemácias.
Histologicamente, o que se observa é congestão e estase nos capilares da vasa recta. Estas alterações proporcionam áreas focais de hemorragia e necrose, com subsequente inflamação intersticial e fibrose, atrofia tubular e infartos papilares. As lesões medulares também podem ser encontradas em indivíduos com traço falcêmico (heterozigotos para o gene da HbS).

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5
Q

ANEMIA FALCIFORME

Isquemia Medular Renal

Qual é a alteração urinária mais frequente?

Fisiopatologia

A

A alteração urinária mais comum da anemia falciforme vem do comprometimento quase universal da medula renal nesta doença. É a chamada ISOSTENÚRIA ou HIPOSTENÚRIA, presente desde o início da doença (aos 6-12 meses de idade).

A isquemia ou infarto da medula renal, decorrente do afoiçamento de hemácias, impede a formação de um interstício hiperosmolar, prejudicando a capacidade de concentração da urina. Desse modo, o paciente com anemia falciforme necessita naturalmente de uma maior ingesta de líquidos! Lembre-se: a desidratação predispõe à ocorrência de fenômenos vaso-oclusivos nesses pacientes…A isostenúria da anemia falciforme é reversível com a terapia transfusional até uma faixa etária próxima aos 15 anos; daí em diante, a lesão medular já costuma ser irreversível, tal como o distúrbio de concentração urinária.
É importante ressaltar que mesmo os pacientes que têm apenas o traço falcêmico (heterozigotos) apresentam isostenúria, mostrando que a medula renal é o tecido mais “sensível” nas doenças falciformes…

É comum o paciente com traço falcêmico ser totalmente assintomático, mas seu sedimento urinário mostrar uma densidade urinária baixa. O acometimento nesses casos geralmente é mais tardio e menos intenso do que nos pacientes com anemia falciforme.

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6
Q

O que é a ISOSTENÚRIA?

Como funciona o mecanismo de concentração urinária?

A

Podemos defini-la como uma osmolaridade urinária “fixa” e relativamente baixa (200-300 mOsm/L). A densidade varia na faixa entre 1.008-1.010. Com uma osmolaridade mais baixa, a urina encontra-se inapropriadamente diluída, gerando uma poliúria, com “urina clara”, semelhante à água.

Quando o fluido tubular alcança o túbulo coletor medular (último segmento do néfron), sua osmolaridade é baixa (100 mOsm/L). Para que a urina seja concentrada, a água deve ser reabsorvida neste segmento sem o acompanhamento de solutos, aumentando a osmolaridade da urina para até 800 1.200 mOsm/L (densidade em torno de 1.030). A água é reabsorvida (em presença do ADH) na tentativa de equilibrar a osmolaridade do fluido tubular com o interstício medular, que deve estar sempre hiperosmolar (800-1.200 mOsm/L). Quem garante a hiperosmolaridade do interstício medular é a reabsorção de solutos (NaCl), sem acompanhamento de H2O, na porção ascendente espessa da alça de Henle, processo que fica prejudicado na anemia falciforme, devido à isquemia medular.

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7
Q

Explicar a relação entre isostenúria e desidratação?

A

A diluição urinária normalmente acompanha a ingestão e a perda hídrica do paciente… Se um indivíduo bebe muita água, a sua urina TEM QUE ficar diluída, para que ele possa eliminar o excesso de líquido ingerido. Por outro lado, uma pessoa que está bebendo pouco líquido e aumenta as perdas (ex.: pelo suor), torna-se desidratada: agora a sua urina TEM QUE ficar concentrada e em menor quantidade (oligúria), um mecanismo fisiológico de conservação renal de água. O paciente que tem isostenúria, mesmo quando desidratado, tem sua urina relativamente diluída, pois ele perdeu o principal mecanismo de conservação hídrica renal: a habilidade de concentrar a urina, realizada graças à hipertonicidade medular. Por abolir o mecanismo de conservação da água, a própria isostenúria (secundária à lesão medular da anemia falciforme) predispõe à desidratação.

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8
Q

ANEMIA FALCIFORME

Disfunção Tubular Distal

A

A disfunção tubular distal é uma complicação descrita na anemia falciforme, manifestando-se como acidose tubular renal tipo I parcial.
Neste caso, há uma perda da capacidade de acidificar a urina (pH urinário inapropriadamente elevado), porém o paciente não chega a desenvolver acidose, mantendo o bicarbonato sérico normal.

A disfunção tubular prejudica também a secreção tubular de potássio, havendo uma tendência à hipercalemia.

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9
Q

ANEMIA FALCIFORME

Hematúria e Necrose de Papila

Tratamento

Manifestações clínicas

A
  • *A hematúria indolor (microscópica ou macroscópica) é um achado frequente em indivíduos com anemia falciforme ou traço falcêmico. A lesão encontrada geralmente é uma úlcera localizada numa papila renal necrosada.** O sangramento renal é de pequena intensidade, mais comumente unilateral (à esquerda) e autolimitado.
  • *Os casos graves são abordados com hidratação venosa abundante** (que reduz a osmolaridade da medula renal), uso de bicarbonato de sódio (a alcalinização retarda a polimerização da HbS) e transfusão sanguínea. Caso persista o sangramento, podemos utilizar um agente antifibrinolítico, como o Ácido Épsilon-Aminocaproico (EACA). Todo cuidado é pouco, uma vez que esta droga pode propiciar a formação de coágulos que obstruem o trato urinário.

A necrose de papila, detectada pela urografia excretora, é observada tanto na anemia falciforme quanto no traço falcêmico, sendo na maioria das vezes assintomática. Porém, os casos sintomáticos costumam ser dramáticos, evoluindo com hematúria macroscópica, dor lombar, febre, obstrução ureteral e pielonefrite bacteriana complicada.

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10
Q

ANEMIA FALCIFORME

Glomerulopatia Falcêmica

Que tipos de glomerulopatias existem relacionadas à anemia falciforme?

A
  1. Glomerulosclerose Focal e Segmentar (GEFS), do tipo secundária
  2. glomerulonefrite membranoproliferativa
  3. glomerulonefrite que se seguiram à crise aplástica pelo parvovírus B19
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11
Q

ANEMIA FALCIFORME

Glomerulopatia Falcêmica

Glomerulosclerose Focal e Segmentar
(GEFS)

Fisiopatologia

manifestações clínicas

prognóstico

Tratamento

A

A taxa de filtração glomerular e o fluxo sanguíneo cortical encontram-se elevados na criança e declinam ao longo do tempo, normalizando-se por volta dos 20 anos de idade. A partir desse momento, a filtração glomerular poderá cair progressivamente em um grupo de pacientes. O hiperfluxo e a hiperfiltração glomerular podem provocar Glomerulosclerose Focal e Segmentar (GEFS), do tipo secundária. Este é o tipo mais comum de glomerulopatia relacionado à anemia falciforme.

O fenômeno responsável pelo hiperfluxo renal é controverso, mas provavelmente tem como base uma isquemia medular crônica, o que levaria a um aumento na síntese de prostaglandinas e de Óxido Nítrico (NO) pelo endotélio capilar, ambas as substâncias vasodilatadoras.

Manifesta-se com proteinúria geralmente subnefrótica e eventualmente com a síndrome
nefrótica (em 40% dos casos).
A função renal declina paulatinamente até que, ao longo de 10-15 anos, o paciente evolui para “estado de
rim terminal”, necessitando de diálise ou transplante.

Aproximadamente 4% de todos os pacien-tes com anemia falciforme e 2% dos portadores de traço falcêmico desenvolvem insuficiência renal, com idade média de 23 e 50 anos respectivamente.
A sobrevida média nesse momento é curta, oscilando em torno de quatro anos. Entre os pacientes falcêmicos acima de 40 anos, 60% apresentam proteinúria; e 30%, insuficiência renal. Hipertensão é um achado incomum.

O tratamento da fase proteinúrica está bem definido: baseia-se nos inibidores da ECA, drogas capazes de reduzir a pressão de filtração glomerular, controlando a proteinúria e reduzindo a progressão da nefropatia.

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12
Q

ANEMIA FALCIFORME

Glomerulopatia Falcêmica

glomerulonefrite membranoproliferativa

fisiopatologia

A

Outra forma de glomerulopatia na doença falciforme é a glomerulonefrite membranoproliferativa, com deposição de imunocomplexos no glomérulo.
Alguns trabalhos têm demonstrado que antígenos ainda “não revelados”, provenientes de isquemia tubular, ganhariam a circulação e seriam os responsáveis por tal resposta imunológica.

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13
Q

ANEMIA FALCIFORME

Glomerulopatia Falcêmica

glomerulonefrite que se seguiram à crise aplástica pelo parvovírus B19

prognóstico

A

Relatos recentemente publicados revelaram sete casos de glomerulonefrite que se seguiram à crise aplástica pelo parvovírus B19. Curiosamente, este micro-organismo não provoca doença renal em indivíduos sem hemoglobinopatias.

Somente em um destes pacientes a função renal recuperou-se completamente; a maioria desenvolveu, após o episódio agudo, falência renal progressiva com histologia compatível com glomerulosclerose focal e segmentar.

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14
Q

ANEMIA FALCIFORME

Carcinoma Medular

epidemioilogia

manifestações clinicas

prognostico

A

Este raríssimo tumor é praticamente exclusivo de pacientes com anemia falciforme ou traço falcêmico, especialmente negros.

Manifesta-se com hematúria, lombalgia, massa em flanco e emagrecimento.

O prognóstico é bastante reservado, com sobrevida média entre um e sete meses.

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15
Q

ANEMIA FALCIFORME

COMPROMETIMENTO RENAL NA ANEMIA FALCIFORME (7)

A
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16
Q

PÚRPURA TROMBOCITOPÊNICA TROMBÓTICA

Fisiopatologia

A

A Púrpura Trombocitopênica Trombótica (PTT) é uma doença multissistêmica de curso fulminante e frequentemente letal, cuja gênese parece estar na lesão endotelial generalizada, liberando, na circulação, formas anormais do fator de von Willebrand e outros elementos pró-coagulantes. A deficiência da atividade de uma metaloproteinase específica (chamada ADAMTS 13, responsável pela clivagem desses fatores de von Willebrand), tanto congênita quanto induzida por anticorpos, parece ter papel central na patogenia da doença. As arteríolas de diversos órgãos acumulam depósitos hialinos de fibrina, que podem chegar a ocluir os vasos, determinando injúria isquêmica. As plaquetas são consumidas em tal processo, enquanto que as hemácias, ao passar pela rede de fibrina, sofrem rotura, levando à anemia hemolítica microangiopática.

17
Q

PÚRPURA TROMBOCITOPÊNICA TROMBÓTICA

Factores de risco

Epidemiologia

A

A doença é mais comum em adultos, tendo como principais fatores de risco a gestação/puerpério, adenocarcinoma metastático, infecção pelo HIV e o uso de certas drogas, sendo as mais importantes ticlopidina, clopidogrel, quinina, ciclosporina, mitomicina C e outros quimioterápicos.

É mais comum no sexo feminino (2:1) e na raça branca (5:1), predominando na faixa etária entre 20-40 anos.

18
Q

PÚRPURA TROMBOCITOPÊNICA TROMBÓTICA

Semelhanças e diferenças com a SHU?

A

A patogênese é semelhante à da síndrome hemolítico urêmica, mas ao contrário desta, o acometimento é generalizado – qualquer órgão pode ser afetado, com forte predomínio do sistema nervoso central.

19
Q

PÚRPURA TROMBOCITOPÊNICA TROMBÓTICA

Manifestações clínicas (5)

Envolvimento renal

A

Clinicamente, a síndrome apresenta-se pela pêntade:
1- Distúrbios Neurológicos (encefalopatia, convulsões, deficit focal);
2- Febre alta;
3- Trombocitopenia (petéquias e equimoses);
4- Anemia Hemolítica Microangiopática;
5- Disfunção Renal.

São comuns os sintomas gerais – febre, astenia, perda de peso. A doença é muito parecida com uma vasculite sistêmica, uma colagenose, uma leucemia ou uma infecção grave. É comum a leucocitose. A insuficiência renal aguda ocorre em apenas 10% dos casos, tendo o mesmo mecanismo e histopatologia que a síndrome hemolítico-urêmica. O acometimento renal geralmente se apresenta com aumento de creatinina leve a moderado, associado à proteinúria subnefrótica, evoluindo com oligúria dependendo da gravidade do quadro.

  • *Sedimento urinário positivo para hematúria dismórfica e cilindros celulares podem também ser encontrados**.
  • *Alguns pacientes evoluem com necrose cortical aguda – uma complicação que determina a perda definitiva da função renal.**
20
Q

PÚRPURA TROMBOCITOPÊNICA TROMBÓTICA

Prognóstico

diagnóstico

tratamento

A

O prognóstico da PTT é bem pior que o da SHU… Sem tratamento, a maioria evolui para óbito após em média três meses do início dos sintomas. Daí a importância do diagnóstico precoce.

O diagnóstico é feito através do quadro clínico e dos exames laboratoriais. Biópsia renal está indicada em pacientes selecionados com dúvida diagnóstica. Pesquisas da atividade da metaloproteinase ADAMTS 13 ou de seus inibidores podem ser úteis, mas ainda não são disponíveis na prática clínica.
Os sobreviventes geralmente recuperam totalmente a função neurológica e renal, ficando isentos de sequelas.

O tratamento específico é feito com plasmaférese (retirada do plasma, substituindo-o por soluções coloides), levando à cura da doença em mais de 70% dos casos!!
Existem poucas doenças na medicina em que a plasmaférese tem um efeito tão benéfico…
Cerca de 10% dos pacientes podem apresentar recidiva do quadro meses depois.

21
Q

MIELOMA MÚLTIPLO

definição

fisiologia

classificaçao

A
O mieloma múltiplo é uma neoplasia maligna da linhagem plasmocitária, originária da medula óssea, que se manifesta com múltiplas lesões líticas nos ossos, levando à dor e à deformidade óssea, acompanhando-se de anemia normocítica normocrômica. O plasmócito neoplásico produz uma imunoglobulina monoclonal (componente M), que pode ser detectada pela imunoeletroforese de proteínas plasmáticas.
A imunoglobulina (ou gamaglobulina) é formada por 4 cadeias peptídicas – duas pesadas e duas leves. De acordo com o tipo de cadeia pesada, as imunoglobulinas são classificadas em IgG, IgM, IgA, IgD e IgE. Só existem dois tipos de cadeia leve – kappa (κ) e lâmbda (λ).
O mieloma múltiplo pode ser classificado de acordo com o tipo de imunoglobulina monoclonal. Por ordem de frequência, temos o mieloma do tipo IgG (50-60%), IgA (21%), cadeia leve (16%), IgD (2%). O mieloma do tipo IgE é raríssimo. A gamopatia monoclonal que produz IgM não é o mieloma, mas sim a macroglobulinemia de Waldeström (uma neoplasia linfoplasmocitária). A sobrevida do mieloma nos dias atuais oscila em torno de 3-7 anos.
22
Q

MIELOMA MÚLTIPLO

Prognóstico de acordo com a função renal

A

O mieloma múltiplo é a doença hematológica mais associada à insuficiência renal. Os estudos mostram que cerca de 20% dos pacientes abrem a doença já com creatinina plasmática superior a 2,0 mg/dl. O clearance de creatinina está reduzido em 50% dos pacientes, mostrando que muitos indivíduos com creatinina plasmática normal já apresentam uma disfunção renal incipiente.
Sabemos que a sobrevida em um ano de indivíduos com níveis de creatinina sérica inferior a 1,5 mg/dl é de 80%, enquanto que esse número se reduz para 50% com valores de creatinina acima de 2,3 mg/dl. A resposta à terapêutica da insuficiência renal tem implicação favorável, com indivíduos não responsivos sobrevivendo uma média de 4 meses, ao contrário dos pacientes que respondem, com uma taxa de sobrevida de 28 meses.

23
Q

MIELOMA MÚLTIPLO

Quais são os mecanismos de lesão renal no mieloma múltiplo? IRC (4) e IRA (3)

A
24
Q

MIELOMA MÚLTIPLO

Principal responsavel de lesão renal

A

O grande “vilão” para o rim é a cadeia leve de imunoglobulina, que pode ser detectada no exame de urina, quando recebe o nome de proteína de Bence-Jones.
O glomérulo não filtra as cadeias pesadas, nem a imunoglobulina completa, pelo grande tamanho destas moléculas. O mieloma do tipo cadeia leve (3º tipo mais comum) é aquele que produz apenas cadeias leves. Porém, os outros tipos de mieloma (IgG, IgA e IgD) também podem produzir cadeias leves que circulam livres no plasma.

Se investigarmos todos os pacientes com mieloma múltiplo, podemos detectar cadeias leves na urina (proteinúria de Bence-Jones) em 70-75% dos casos. É fundamental termos em mente que a proteína de Bence-Jones não é detectada por métodos convencionais de pesquisa de proteinúria (ex.: dipstick do EAS), mas sim por técnicas especiais (método do ácido sulfossalicílico, eletroforese de proteína urinária, etc.).

25
Q

MIELOMA MÚLTIPLO

Qual é o tipo de mieloma mais agressivo para o rim?

A

É o mieloma do tipo IgD. Este raro tipo de mieloma produz grandes quantidades de cadeia leve e, por isso, é o tipo de pior prognóstico.

O mieloma de cadeia leve é o segundo mais agressivo para o rim.

26
Q

MIELOMA MÚLTIPLO

Rim do Mieloma

Fisiopatologia

A

O rim do mieloma é uma condição ocasionada pela filtração de cadeias leves pelos rins, que pode levar à injúria tubular direta ou à formação de cilindros intratubulares que promovem obstrução.
A formação desses cilindros resulta da capacidade dos agregados de cadeia leve de se combinarem com uma mucoproteína secretada pelas células do segmento espesso da alça de Henle – a proteína de Tamm Horsfall – que serve como matriz.
Os túbulos proximais, por reabsorverem a maior parte da cadeia leve filtrada, são os mais acometidos. No interior da célula tubular, a região variável da cadeia leve é resistente à degradação pelas proteases lisossomais. O acúmulo destes fragmentos leva à formação de cristais intracelulares, o que acarreta a lesão das células tubulares, instalando-se uma nefrite tubulointersticial crônica.

Uma vez lesados, os túbulos proximais não mais absorvem a proteína de Bence Jones, que então se acumula nos túbulos distais, formando ainda mais cilindros obstrutivos, fazendo progredir rapidamente a disfunção renal.

A hipercalcemia aumenta a toxicidade tubular da cadeia leve.​

27
Q

MIELOMA MÚLTIPLO

Rim do Mieloma

manifestações clínicas

alterações laboratoriais

A

Clinicamente, o “rim do mieloma” manifesta-se com insuficiência renal progressiva e um sedimento urinário “inocente”, sem albuminúria.
A proteinúria de Bence-Jones está presente em alta concentração, detectada pela imunoeletroforese e imunofixação urinária.

Sabemos que a desidratação é um fator de risco adicional, uma vez que aumenta a concentração de cadeias leves no interior dos túbulos.
Esse tipo de injúria pode se manifestar como insuficiência renal aguda ou crônica. A hipercalcemia aumenta a toxicidade tubular da cadeia leve.

28
Q

MIELOMA MÚLTIPLO

Síndrome de Fanconi

Definição

A

Antes da insuficiência renal se estabelecer de forma declarada, alguns pacientes manifestam sinais da disfunção generalizada dos túbulos proximais, denominada síndrome de Fanconi.

Resumindo, a síndrome é composta por acidose tubular proximal com bicarbonatúria (tipo II), fosfatúria com hipofosfatemia (associada a osteomalácia/ raquitismo), aminoacidúria, glicosúria sem hiperglicemia e uricosúria. A acidose metabólica é hiperclorêmica e hipocalêmica.

29
Q

MIELOMA MÚLTIPLO

Hipercalcemia e Nefrocalcinose

Fisiopatologia

A

Altos níveis de cálcio sérico são com frequência encontrados em pacientes com mieloma múltiplo, com cerca de 15% dos indivíduos apresentando uma concentração de cálcio superior a 11 mg/dl na época do diagnóstico. Esta alteração é decorrente da ação de citocinas produzidas pelas células tumorais (linfotoxina e a interleucina 6) que promovem uma maior reabsorção óssea. A hipercalcemia contribui para o desenvolvimento de lesão nos rins por causar vasoconstrição renal, por levar à deposição intratubular de cálcio e por favorecer a toxicidade tubular pelas cadeias leves filtradas. O termo nefrocalcinose se refere à doença tubulointersticial crônica causada pela deposição de cálcio no parênquima renal.

O declínio da função renal pode estar associado à poliúria, resultado da resistência tubular ao ADH promovida pelos depósitos teciduais de cálcio (diabetes insipidus nefrogênico da “nefropatia hipercalcêmica”). Os pacientes com depleção de volume e/ou hipercalcemia se encontram em grande risco para o agravamento da função renal após uso de Anti-Inflamatórios Não Esteroidais (AINEs). Dessa
forma, essa classe de drogas deve ser evitada
em pacientes com mieloma múltiplo.

30
Q

MIELOMA MÚLTIPLO

Amiloidose e Doença de Depósito de Cadeia Leve

Manifestações clínicas e fisiopatologia

A

Em alguns pacientes com mieloma que produzem cadeias leves em excesso, duas condições podem sobrevir: a amiloidose primária (presente em cerca de 10% dos casos) e a doença de depósito de cadeia leve. Diferente do rim do mieloma, a apresentação inicial desses distúrbios não é a insuficiência renal e sim a síndrome nefrótica. Neste caso, com proteinúria “real” (proteínas que não a cadeia leve) e hipoproteinemia. A amiloidose tem como característica a deposição nas alças capilares de agregados de cadeias leves em forma de fibrilas Vermelho- -Congo positivas, provocando o desarranjo da arquitetura glomerular, aparecimento de síndrome nefrótica e evolução posterior para a perda da função renal. A amiloidose que acomete pacientes com mieloma é considerada primária, do tipo AL. Em indivíduos com mieloma devemos suspeitar do aparecimento dessa desordem quando surgem, em combinações variadas, síndrome nefrótica (desta vez observamos o sedimento urinário com proteinúria > + 3), hepatomegalia, síndrome do túnel do carpo, neuropatia periférica sensoriomotora, macroglossia e insuficiência cardíaca.

Na Doença por Depósito de Cadeia Leve (DDCL), as características fisicoquímicas das cadeias leves impedem que elas formem fibrilas, entretanto sua deposição em nível glomerular também provoca lesão dessa estrutura e o surgimento de proteinúria nefrótica. Ao contrário da amiloidose, estes depósitos não se coram pelo Vermelho-Congo e o acometimento da patologia é mais restrito ao rim, podendo, porém, acometer outras estruturas.

31
Q

MIELOMA MÚLTIPLO

Crioglobulinemia

Definição e fisiopatologia

doenças associadas

clínica

envolvimento renal

A

As crioglobulinas são proteínas circulantes que se precipitam mediante resfriamento. As manifestações clínicas surgem em situações de exposição a baixas temperaturas, ou à temperatura ambiente.
As crioglobulinas são usualmente imunoglobulinas ou seus fragmentos (cadeias leves) e representam uma forma rara de lesão renal no mieloma múltiplo.

A crioglobulinemia relacionada às discrasias plasmocitárias costuma ser a tipo I. Esta condição é encontrada no mieloma múltiplo, na macroglobulinemia de Waldeström, na gamopatia monoclonal de significado indeterminado, no linfoma não Hodgkin e na leucemia linfocítica crônica.
Apesar de 5-10% das proteínas do mieloma serem “crioprecipitáveis”, a maioria dos pacientes é assintomática. Quando as manifestações ocorrem, elas são mais comumente decorrentes de precipitação das crioglobulinas nos capilares da derme, com impedimento ao fluxo sanguíneo. Podemos notar fenômeno de Raynaud, livedo reticularis, púrpuras vasculares, cianose e ulcerações de dígitos.
As manifestações renais são encontradas em 25% dos casos, com os depósitos de crioglobulina produzindo um padrão membranoproliferativo com “trombo” intraluminal visto na biópsia renal. No geral, os pacientes podem apresentar síndrome nefrótica e nefrítica com predomínio de um dos componentes sobre o outro.

32
Q

MIELOMA MÚLTIPLO

IRA induzida por meio de Contraste

fisiologia

prevenção

A

A obstrução tubular pode ser facilitada por uma interação do radiocontraste com cadeias leves filtradas. A depleção de volume, por aumentar a concentração intratubular de cadeias leves, aumenta ainda mais a nefrotoxicidade pelo meio de contraste.
A hidratação parenteral vigorosa, antes da realização de determinados estudos radiológicos, tem obtido êxito em evitar a disfunção renal aguda precipitada por uso de contrastes radiológicos em pacientes com mieloma. A literatura não chega a um consenso a respeito do uso de radiocontraste não iônico em indivíduos com mieloma. Esses radiofármacos teoricamente seriam mais seguros, uma vez que teriam pouca interação com as cadeias leves no interior dos túbulos.

33
Q

MIELOMA MÚLTIPLO

Outras Condições

A

A infiltração renal por plasmócitos raramente ocorre, sendo também incomum o prejuízo da função renal por esse mecanismo.

A nefropatia por ácido úrico pode ocorrer, entretanto não é um evento muito comum.

34
Q

NEOPLASIAS LINFO-HEMATOPOIÉTICAS

Doenças implicadas relacionadas com os padrões de lesão renal

A

A doença de Hodgkin é uma malignidade do sistema linfático. Esta condição se apresenta mais frequentemente como uma linfadenopatia generalizada ou localizada e afeta mais comumente adultos jovens, embora quase todas as faixas etárias possam ser acometidas. Com as modalidades terapêuticas atuais, cerca de 70-80% dos pacientes conseguem a cura.

O comprometimento glomerular levando à síndrome nefrótica pode ocorrer anos antes do aparecimento da neoplasia. A maioria dos casos possui histologia, à microscopia óptica e à eletrônica, compatível com nefropatia por lesão mínima. A glomerulosclerose focal e outras variedades de acometimento glomerular têm sido observadas mais raramente.
A proteinúria nefrótica costuma remitir com o
tratamento do linfoma com rádio e/ou quimioterapia
(principalmente ciclofosfamida). A recidiva da síndrome pode preceder uma recaída da doença de Hodgkin. Lesões glomerulares eventualmente são encontradas na leucemia linfocítica crônica e linfomas relacionados de células B. O achado histológico mais comum é de uma glomerulonefrite membranoproliferativa, podendo ser encontrado também uma glomerulopatia imunotactoide. A terapia com agentes alquilantes (clorambucil) costuma melhorar a proteinúria nefrótica e as condições gerais dos pacientes.

Os linfomas cutâneos de células T podem se associar à nefropatia por IgA, glomerulonefrite membranosa e doença por lesão mínima.