Pancreatite aguda Flashcards
Definição e etiologia
- Processo inflamatório secundário à autodigestão enzimática do órgão
- Mais prevalente no sexo feminino, em pacientes com fatores de risco ou antecedente de litíase biliar e etilistas.
- Etiologia:
–> Litíase biliar (principal causa): especialmente MICROLITÍASE (pedras < 5 mm), que apresenta risco maior de impactação da papila duodenal maior.
–> Álcool
–> Tumores, divertículos, áscaris, pós-trauma (ex., CPRE)
–> Infecções (qualquer agente)
–> Medicamentos: metronidazol, azatioprina, derivados de sulfas e diuréticos tiazídicos
–> Hipertrigliceridemia (principalmente para valores > 500)
–> Acidente escorpiônico
–> Intoxicações: etanol, metanol, organofosforados
Quadro clínico
- Dor abdominal alta em faixa, irradiação para o dorso, náuseas e vômitos
- Sinal de Cullen: equimose periumbilical / Sinal de Grey-Turner e Fox: equimose em flancos e em pênis, respectivamente. Tais sinais são sinais sugestivos de hemorragia retroperitoneal, não são específicos de pancreatite, porém indicativas de gravidade.
- Sequestro de líquidos para o retroperitônio: há depleção volêmica intensa para o espaço retroperitoneal.
Diagnóstico
- Eminentemente clínico, com 2 dos 3 critérios:
1. CLÍNICA SUGESTIVA (dor abdominal em faixa, irradiada para o dorso, em paciente com fatores de risco)
2. AMILASE E LIPASE AUMENTADAS: a lipase é mais específica para afecções do pâncreas, enquanto a amilase aumentada pode denotar múltiplas etiologias. Além disso, a amilase tende a elevar seus níveis rapidamente, porém decai rápido. A lipase demora um pouco mais para subir (1-2 h de diferença), porém persiste elevada por mais tempo!
3. EXAME DE IMAGEM COM ACHADOS CARACTERÍSTICOS:
–> TC de abdome com contraste VO: denuncia COMPLICAÇÕES (edema, necrose) e a evolução da pancreatite. Deve ser solicitada a partir de 48 h de evolução dos sintomas.
CUIDADO! O USG de abdome é o exame INICIAL na investigação etiológica, a ser solicitada ANTES MESMO da TC, pois é o exame de escolha para avaliar a litíase biliar.
DICA: os níveis de amilase e lipase NÃO SE CORRELACIONAM COM GRAVIDADE, NEM COM PROGNÓSTICO. SÃO MERAMENTE USADAS PARA FINS DIAGNÓSTICOS. NÃO DEVEM SER EMPREGADAS NO SEGUIMENTO CLÍNICO.
Quando devo solicitar a TC de abdome contrastada antes mesmo do USG de abdome?
- Em pacientes graves, com disfunção orgânica. Por exemplo, em pacientes com pancreatite necro-hemorrágica
- Para investigar complicações locais e sistêmicas associadas à piora clínica (paciente vinha bem, porém piorou ou desenvolveu sintomas de gravidade)
- Dúvida diagnóstica
Estadiamento
- Dados do exame físico ou laboratoriais de importância para avaliar gravidade:
–> Gasometria arterial (PaO2 < 60, déficit de base > 5, lactato elevado e pH < 7,3)
–> Creatinina
–> Aumento de ureia nitrogenada > 2 (BUN - blood urea nitrogen)
–> Aumento de glicose
–> Aumento de LDH
–> Aumento de AST ou TGO > 250
–> Queda de hematócrito ≥ 10% após 48 h da admissão (hemoconcentração fala a favor de gravidade)
–> Leucocitose 16.000-18.000, PCR ≥ 150 mg/dl
–> HIPOCALCEMIA (p/ Ranson < 8 após 48 h)
–> Relação PaO2/FiO2 - investigar presença de SDRA
–> Pressão arterial (PAS < 90 mmHg, principalmente quando não houver resposta à reposição volêmica)
- Consenso de Atlanta revisado:
–> Leve
Mais comum forma de pancreatite (graças ao bom Deus)
Ausência de falência orgânica
Ausência de complicações locais (necrose, pseudocisto)
–> Moderadamente grave
Complicações locais (necrose, pseudocisto) ou sistêmicas/falência orgânica < 48 h
–> Grave
Franca disfunção orgânica e/ou complicações locais e sistêmicas que persistem (lesão renal aguda, SDRA, sepse)
*Classificação de Petrov:
É um escore de gravidade de pancreatite aguda necrosada! Define que uma pancreatite aguda CRÍTICA apresenta NECROSE INFECTADA + DISFUNÇÃO ORGÂNICA PERSISTENTE (> 48 H OU REFRATÁRIA ÀS MEDIDAS INCIAIS) –> mortalidade em torno de 40%
Tratamento
- Internação + jejum* ou suporte nutricional + hidratação com ringer lactato e correção de eventuais distúrbios hidroeletrolíticos (hipocalcemia) + analgesia potente (tramadol + ondasentrona)
*Para casos leves: dieta oral precoce HIPOCALÓRICA (< 30% de lipídeos), se presença de fome, alívio da dor, RHA+ e flatos presentes
*Para casos moderadamente graves: dieta enteral precoce em < 72 h, seja com SNG, seja com sonda nasojejunal
*Para casos graves COM ÍLEO PARALÍTICO PROLONGADO: INICIAR NPT COM LIPÍDEOS EM BAIXA QUANTIDADE - Indicações de CPRE:
–> Na vigência de cálculo impactado no ducto colédoco (coledocolitíase - presença de icterícia obstrutiva).
CUIDADO! Aqui a conduta é dar suporte ao tratamento da pancreatite. Após a resolução do quadro e o paciente estiver evidenciando sinais clínicos de melhora, proceder à CPRE. NO ENTANTO, se o paciente apresentar colangite, fazer CPRE em até 48 h. Em casos de colangite grave, realizar CPRE de emergência. - Colecistectomia videolaparoscópica:
–> MANDATÓRIA, seja na mesma internação, seja em caráter eletivo
–> De preferência, deve-se operar na mesma internação
–> Casos moderados a graves, opta-se por realizar colecistectomia em caráter eletivo (esperar 6 semanas)
Complicações da pancreatite aguda
- Complicações agudas (< 4 semanas)
–> Complicação fluida estéril:
Coleções fluidas peripancreáticas e HOMOGÊNEAS
–> Complicação fluida infectada:
Coleções ao redor do pâncreas com sinal gasoso (“pontinhos pretos”), indicativo da presença de bactérias fermentadoras
–> Necrose estéril:
Toda coleção que INVADE O PARÊNQUIMA PANCREÁTICO, ou seja, destruição do parênquima pancreático. Tem característica HETEROGÊNEA ou sólida-mista
–> Necrose infectada:
Destruição do parênquima pancreático + presença de gás na TC - Complicações crônicas (> 4-6 semanas):
–> Pseudocisto:
Toda coleção fluida que evoluiu para uma organização encapsulada e HOMOGÊNEA, que pode ou não estar infectada (indicada pela presença de gás e componente misto na TC). O paciente apresenta-se na maior parte das vezes assintomático!
–> Walled-off-necrosis:
Coleção necrótica organizada e heterogênea, BEM DELIMITADA, com componente sólido-misto. Pode estar ou não infectado (de novo, infectado = presença de conteúdo gasoso).
Tratamento das complicações
- O tratamento é suportivo na maior parte dos casos
- Coleções fluidas: acompanhamento clínico incial.
Se o paciente não apresentar sinais de melhora apesar da terapêutica instituída, proceder à punção percuntânea por radiointervensão e cultura do conteúdo peripancreático. Se estéril, seguir clinicamente. Se houver infecção, iniciar antibioticoterapia com imipenem (esquema preferencial para pancreatites infectadas). - Necrose: suporte clínico intensivo inicial
O mesmo esquema aplicado para as coleções fluidas infectadas, pode ser replicado no caso de necrose infectada: punção percutânea + cultura do conteúdo –> cresceu bactéria –> considerar necrose infectada e tratar com DRENAGEM PERCUTÂNEA** + IMIPENEM
**Step-up-approach:
Nas necroses pancreáticas infectadas, normalmente estamos diante de um paciente crítico com disfunção orgânica. Introduzir o antibiótico adequado (imipenem) e o suporte clínico intensivo são as abordagens iniciais. Procede-se à drenagem percutânea via radiointervenção das coleções ou videolaparoscópica, com ou sem colocação de drenos deve ser a conduta preferencial antes de indicar a necrosectomia.
A necrosectomia é apenas feita após 4 semanas de tratamento intensivo, tendo o paciente condições clínicas para tal
Em resumo, step-up-approach para necrose pancreática infectada:
Suporte intensivo + imipenem + drenagem das coleções via radiointervenção ou videolaparoscopia retroperitoneal ———-> necrosectomia aberta após 4 semanas de tratamento adequado.
CUIDADO! Indicação de antibiótico: APENAS NA PRESENÇA DE COLEÇÕES INFECTADAS!!!!!!!!!!!!
- Pseudocisto e Walled-off-necrosis:
Maioria dos pacientes são assintomáticos. A conduta é conservadora com observação a partir da repetição de exames de imagem.
Se o paciente apresentar sintomas (p.ex., plenitude pós-prandial), proceder à drenagem por radiointervenção ou endoscópica
Em caso de infecção (lembrar do gás!), antibioticoterapia com imipenem + drenagem por qualquer meio.