Lei Penal Flashcards
Por quais preceitos é formada a lei penal incriminadora?
A lei penal incriminadora é formada por dois preceitos:
a) Preceito primário: define a conduta criminosa de forma genérica e abstrata. Por exemplo, “matar alguém” (art. 121 do CP);
b) Preceito secundário: define a pena em abstrato.
O Direito Penal brasileiro adota o sistema da proibição indireta?
O Direito Penal brasileiro segue a Teoria das Normas (sistema da proibição indireta), desenvolvida por Karl Binding, segundo a qual a lei penal é descritiva. Ou seja, o tipo penal descreve uma conduta criminosa, não proíbe determinadas condutas. Perceba que a proibição é indireta, pois quando o CP prevê uma pena para o crime de homicídio, indiretamente está afirmando que não se deve matar.
O que é lei penal incriminadora e não incriminadora?
1) Leis penais incriminadoras: São as leis que criam crime e cominam as respectivas penas, estão previstas na parte especial do Código Penal e na legislação extravagante. Assim, conclui-se que não há na parte geral do CP leis penais incriminadoras.
2) Lei penal não incriminadora: São as leis que não criam crimes e nem cominam penas.
Quais são as espécies de lei penal NÃO incriminadora?
1) Permissivas: São as normas que autorizam a prática de condutas típicas em determinadas situações, são as que excluem a ilicitude, previstas tanto na parte geral do CP (art. 23) como na parte especial do CP (art. 128 do CP) e na legislação extravagante.
2) Exculpantes: São aquelas que excluem a culpabilidade do agente.
3) Interpretativas: São aquelas que estabelecem o alcance e o significado de outras normas penais. Por exemplo, art. 327 do CP.
4) De aplicação ou finais: São aquelas que delimitam o campo de aplicabilidade da lei penal, a exemplo do art. 5º do CP.
5) Diretivas: São as normas que fixam os princípios de determinada matéria, a exemplo do art. 1º do CP.
6) Integrativas ou de extensão: São aquelas que complementam a tipicidade na tentativa (art. 14, II), na participação (art. 29, caput) e nos crimes omissivos impróprios (art. 13).
Classifique a lei penal quanto à completude:
1) Completas ou perfeitas: apresentam todos os elementos da conduta criminosa. Não é necessário nenhum complemento. Ex.: art. 155 do CP.
Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
2) Incompletas ou imperfeitas: dependem de complementação, pois a conduta criminosa é incompleta. A complementação será feita por uma lei, por um ato administrativo ou, ainda, pelo aplicador do direito. Quando o complemento for uma lei ou ato administrativo, teremos normas penais em branco. Quando o complemento for feito pelo aplicador do direito, teremos tipos penais abertos.
Em qual momento considera-se o crime praticado? Quais as teorias que versam sobre o assunto?
1) Teoria do resultado (teoria do evento ou teoria do efeito): considera-se praticado o crime no momento do resultado.
2) Teoria da ubiquidade/mista: o crime será considerado praticado no momento da conduta ou do resultado.
3) Teoria da atividade: considera-se praticado o crime no momento da conduta. É a Teoria adotada pelo Código Penal em seu art. 4º.
Art. 4º - Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado.
A Teoria da Atividade é importante para analisar as condições do autor e da vítima e para determinar a lei que se aplica ao caso.
Qual a teoria adotada pelo Código Penal para o início da contagem do prazo prescricional?
O CP adota a Teoria do Resultado (art. 111, I, do CP) para o início da contagem do prazo da prescrição da pretensão punitiva.
Art. 111 - A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, começa a correr:
I - do dia em que o crime se consumou;
Assim, podemos afirmar que o CP excepciona a Teoria da Atividade para fins de prescrição, para a qual adota a Teoria do Resultado.
Qual o tempo do crime na hipótese de crime continuado ou permanente?
Em relação ao tempo do crime para os crimes continuados e para os crimes permanentes, aplica-se a Súmula nº 711 do STF:
Súmula nº 711 do STF - A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência.
Assim, o tempo do crime é o momento de cessação da continuidade ou da permanência.
Qual a teoria aplicada no Direito Penal brasileiro quanto ao local do crime?
Em relação ao lugar do crime, o CP adota a Teoria da Ubiquidade, considerado como lugar do crime o local em que ocorreu a ação ou o local em que ocorreu o resultado, nos termos do art. 6º do Código Penal:
Art. 6º - Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado.
OBS.: o art. 6º do CP aplica-se apenas aos crimes à distância, também conhecidos como crimes de espaço máximo, em que a conduta e o resultado ocorrem em países diversos.
Qual a diferença entre crime à distância e crime plurilocal?
1) Crime à distância: Crime de espaço máximo. Conduta e resultado ocorrem em países diversos. Conflito internacional de jurisdição dos países envolvidos. Teoria da ubiquidade.
2) Crime plurilocal: Crime de espaço mínimo. Conduta e resultado ocorrem em comarcas diversas, mas dentro do mesmo país. Conflito interno de competência. Teoria do resultado (art. 70 do CPP), como regra geral. Como exceção, a Lei nº 9.099/1995 adota a teoria da atividade (art. 63). Tratando-se de crime doloso contra a vida, a jurisprudência adota a Teoria da Atividade, para fins probatórios.
Quais os vetores para a análise da lei penal no espaço?
Há dois vetores fundamentais para analisar a lei penal no espaço, quais sejam:
a) Territorialidade (art. 5º do CP): é a regra geral, aplica-se a lei penal brasileira aos crimes cometidos no território nacional.
b) Extraterritorialidade (art. 7º do CP): é a exceção, aplica-se a lei penal brasileira aos crimes cometidos no exterior.
O que é intraterritorialidade?
Intraterritorialidade é a aplicação da lei estrangeira a crimes cometidos no Brasil, a exemplo das imunidades diplomáticas e de chefes de governo estrangeiro.
Discorra sobre o princípio da territorialidade.
É a regra no Brasil, conforme disposto no art. 5º do CP.
Art. 5º - Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional.
É fruto da soberania, comum a todos os países.
Ressalta-se que o Brasil adota uma territorialidade temperada ou mitigada, pois o próprio art. 5º afirma que será aplicado sem prejuízo a convenções, tratados e regras de direito internacional.
Qual o conceito de território nacional?
1) Sentido jurídico: é o espaço sujeito à soberania do Estado.
2) Sentido material, efetivo ou real: abrange a superfície terrestre (solo e subsolo), as águas interiores, o mar territorial e o espaço aéreo correspondente.
3) Território por extensão/flutuante: previsto no art. 5º, §1º, do CP.
Art. 5º, § 1º - Para os efeitos penais, consideram-se como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar.
Discorra sobre o princípio da personalidade.
Também chamado de princípio da nacionalidade. Considera-se, para aplicação da lei penal, a personalidade ou a nacionalidade. Divide-se em:
1) Personalidade ativa: se o autor do delito é brasileiro, ele será punido de acordo com a lei brasileira, independentemente da nacionalidade do sujeito passivo (vítima) e do bem jurídico ofendido.
CP. Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro:
I - os crimes: d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil;
II - os crimes: b) praticados por brasileiro;
2) Personalidade passiva: leva em conta a vítima do crime, que deverá ser brasileira.
CP. Art. 7º, § 3º - A lei brasileira aplica-se também ao crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil, se, reunidas as condições previstas no parágrafo anterior: (…)
O que dispõe o princípio do domicílio?
Determina que o agente deve ser julgado pela lei do país em que é domiciliado, pouco importando a sua nacionalidade (parte final do art. 7º, I, d, do CP).
CP. Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro:
I - os crimes: d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil;
Por exemplo, um francês que reside no Brasil pratica um genocídio na Somália. Será aplicada a lei brasileira, local de seu domicílio.
Discorra sobre o princípio da defesa.
Princípio da defesa, real ou da proteção.
Aplica-se a lei nacional ao crime cometido fora do território pátrio, visando à tutela de um bem jurídico nacional. Ou seja, o crime ofende um bem jurídico brasileiro, de modo que seu autor será punido pelo Direito Penal do Brasil, pouco importando a nacionalidade do agente e o local do delito,
Previsto no art. 7º, I, a, b, c, do CP.
Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro:
I - os crimes:
a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da República;
b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público;
c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço;
Discorra sobre o princípio da justiça universal.
Também chamado de justiça cosmopolita ou justiça mundial.
Está relacionado à cooperação penal internacional, segundo a qual todos os países podem punir os autores de determinados crimes (cuja punição interessa a todos os países da comunidade internacional) que se encontrem em seu território. Nesse caso, pouco importa a nacionalidade do agente ou o local do crime.
CP. Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro:
II - os crimes: a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir;
Discorra sobre o princípio da representação.
Chamado também de princípio do pavilhão ou da bandeira. Está previsto no art. 7º, II, c do CP.
CP. Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro: II - os crimes: c) praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, quando em território estrangeiro e aí não sejam julgados.
OBS.: quando o crime for praticado em uma aeronave ou embarcação pública brasileira ou a serviço do Governo brasileiro, não se aplicam os princípios acima, pois se trata de território brasileiro por extensão.
O que é extraterritorialidade?
É a aplicação da lei brasileira aos crimes (não se aplica para contravenções penais) cometidos fora do Brasil, são as exceções ao princípio da territorialidade.
Quais são as hipóteses de extraterritorialidade incondicionada?
Previsto no inciso I do art. 7º do CP:
Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro:
I - os crimes:
a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da República;
b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público;
c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço;
d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil;
§ 1º - Nos casos do inciso I, o agente é punido segundo a lei brasileira, ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro.
Quais são as hipóteses de extraterritorialidade condicionada?
São as hipóteses do inciso II, do art. 7º:
Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro:
II - os crimes:
a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir;
b) praticados por brasileiro;
c) praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, quando em território estrangeiro e aí não sejam julgados.
Quais as condições para que a lei brasileira seja aplicada às hipóteses de extraterritorialidade condicionada?
Art. 7º, § 2º - Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes condições:
a) entrar o agente no território nacional;
b) ser o fato punível também no país em que foi praticado;
c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição;
d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena;
e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável.
Quais são as hipóteses de extraterritorialidade hipercondicionada e quais as condições para a sua aplicação?
Art. 7º, § 3º - A lei brasileira aplica-se também ao crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil, se, reunidas as condições previstas no parágrafo anterior:
a) não foi pedida ou foi negada a extradição;
b) houve requisição do Ministro da Justiça.
Qual o foro competente para julgar os casos em que há extraterritorialidade da lei penal brasileira?
É o foro da capital do Estado em que ele mora ou morou o acusado. Se ele não mora ou nunca morou no Brasil, será a Capital da República, conforme o art. 88 do CPP.
CPP. Art. 88. No processo por crimes praticados fora do território brasileiro, será competente o juízo da Capital do Estado onde houver por último residido o acusado. Se este nunca tiver residido no Brasil, será competente o juízo da Capital da República.
A sentença estrangeira poderá ser homologada no Brasil para produzir quais efeitos?
Art. 9º - A sentença estrangeira, quando a aplicação da lei brasileira produz na espécie as mesmas conseqüências, pode ser homologada no Brasil para:
I - obrigar o condenado à reparação do dano, a restituições e a outros efeitos civis;
II - sujeitá-lo a medida de segurança.
A sentença condenatória estrangeira irá gerar reincidência?
A sentença condenatória estrangeira irá gerar reincidência, independentemente de ter sido homologada pelo STJ. Portanto, basta a prova da existência de uma sentença condenatória no estrangeiro para que haja reincidência.
Como ocorre a contagem do prazo no Direito Penal?
O Direito Penal afeta a liberdade do cidadão, colocando em risco o seu direito de ir e vir. Por isso, com o intuito de favorecer o réu, inclui-se na contagem do prazo o dia do começo e exclui-se o último dia.
CP. Art. 10 - O dia do começo inclui-se no cômputo do prazo. Contam-se os dias, os meses e os anos pelo calendário comum.
O que é lei penal cega?
Toda lei incriminadora possui um preceito primário (definição da conduta criminosa) e um preceito secundário (pena cominada). Na norma penal em branco (cega ou aberta ou imperfeita ou incompleta) o preceito secundário é completo, mas o preceito primário é incompleto, dependendo de uma complementação.
Franz Von Liszt afirma que as normas penais em branco são como corpos errantes em busca de alma. Ou seja, na norma penal em branco existe o corpo físico, mas não pode ser aplicada porque não existe uma alma (um complemento).
O que é normal penal em preto?
Norma penal em preto é aquela que não exige nenhuma complementação.
Quais as espécies de lei penal em branco?
a) Homogênea ou lato sensu: é aquela que possui como complemento um ato de igual natureza jurídica da norma penal a ser complementada. Em suma, o complemento é uma outra lei. Divide-se em:
a1) Homovitelina: a norma penal e o seu complemento estão contidos no mesmo diploma legislativo.
a2) Heterovitelina: a norma penal e o seu complemento estão previstos em diplomas legislativos diversos.
b) Heterogênea ou stricto sensu ou fragmentária: a norma penal em branco é complementada por um ato administrativo.
A norma penal em branco heterogênea ofende o princípio da reserva legal?
Não há ofensa ao princípio da reserva legal, uma vez que, para que este seja satisfeito, basta que a lei penal descreva o conteúdo mínimo da conduta criminosa.
Ex.: o crime de tráfico de drogas, previsto no art. 33 da Lei 11.343/2006, descreve as condutas, mas não traz a definição de quais substâncias são consideras drogas. A relação de drogas consta em portaria da ANVISA.
Norma penal em branco se confunde com tipo penal aberto?
Norma penal em branco não se confunde com tipo penal aberto, pois neste o complemento está na valoração do operador do direito.
O que é norma penal em branco ao avesso ou inversa?
É aquela em que o preceito primário é completo, mas o preceito secundário necessita de complementação. Em suma, falta a pena do crime. Ex.: o crime de uso de documento falso (art. 304 do CP).
Art. 304 - Fazer uso de qualquer dos papéis falsificados ou alterados, a que se referem os arts. 297 a 302:
Pena - a cominada à falsificação ou à alteração.
Importante salientar que o complemento OBRIGATORIAMENTE será feito por outra lei, tendo em vista o princípio da reserva legal (penas devem ser previstas em lei). Ou seja, não se admite o complemento por ato administrativo.
O que é norma penal em branco de fundo constitucional?
É aquela em que o complemento está previsto na própria Constituição Federal.
Como exemplo, cita-se o homicídio contra integrantes dos órgãos de segurança pública (art. 121, §2º, VII, do CP).
Art. 121, § 2° Se o homicídio é cometido:
VII – contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição.
O que é norma penal em branco ao quadrado?
É aquela em que o complemento da norma penal depende de complementação. Há, portanto, uma dupla complementação. Ex.: o art. 38 da Lei 9.605/98.
Art. 38. Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção:
Pena - detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.
O conceito de floresta, considerada de preservação permanente, está previsto no art. 6º do Código Florestal.
Art. 6º Consideram-se, ainda, de preservação permanente, quando declaradas de interesse social por ato do Chefe do Poder Executivo, as áreas cobertas com florestas ou outras formas de vegetação destinadas a uma ou mais das seguintes finalidades: (…)
Por sua vez, o Código Florestal pode ser complementado por um decreto do Chefe do Poder Executivo.
O que é abolitio criminis?
CP. Art. 2º - Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória.
Ocorre quando a nova lei torna atípico o fato que, até então, era considerado criminoso. Ou seja, o fato perde o caráter penal.
Destaca-se que os efeitos extrapenais (civis, administrativos, eleitorais) da sentença condenatória permanecem intactos, pois o CP é claro ao afirmar que cessam a execução e os efeitos penais da sentença condenatória.
Qual a natureza jurídica da abolitio criminis?
A natureza jurídica é dada pelo art. 107, III, do CP, trata-se de causa extintiva de punibilidade. Ou seja, o Estado perde o direito de punir.
CP. Art. 107 - Extingue-se a punibilidade:
III - pela retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso;
Cleber Masson e doutrinadores modernos criticam a opção do legislador, uma vez que a abolitio criminis seria, em verdade, uma causa de exclusão de tipicidade. Ou seja, a punibilidade é excluída porque o fato torna-se atípico.
Quais os requisitos para que haja a abolitio criminis?
Requisitos (cumulativos):
- Revogação formal do tipo penal;
- Supressão material do fato criminoso.
Ex.: o art. 240 do CP, que tratava do crime de adultério, foi revogado em 2005. O adultério deixou de interessar ao Direito Penal. Observe que os dois requisitos foram preenchidos, pois houve a revogação formal do tipo penal e a supressão material, já que nenhum outro dispositivo tipifica o crime de adultério.
O que novatio legis in mellius?
Também conhecida como lex mitior.
É a nova lei que favorece o agente. Aqui, o fato continua sendo crime, mas a situação do agente é de qualquer modo favorecida, nos termos do art. 2º, parágrafo único, do CP, motivo pelo qual a nova lei deve retroagir.
Art. 2º, Parágrafo único - A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.
Havendo dúvida sobre qual é a lei mais favorável ao agente, se a antiga ou a nova, como se deve proceder?
1ª Corrente: compete ao juiz, titular do poder jurisdicional, decidir analisando o caso concreto (majoritária).
2º Corrente: o juiz deve ouvir o réu, que será atingido pelos efeitos da norma penal (tese da defensoria).
Qual é o órgão jurisdicional competente para aplicar a lei penal mais benéfica?
A competência para aplicação da lei benéfica depende do momento em que se encontra a persecução penal:
- Primeira instância: será o juiz de primeiro grau;
- Tribunal: será aplicado pelo tribunal respectivo;
- Após o trânsito em julgado: será o juízo da execução, pouco importando a origem da condenação.
Súmula nº 611 do STF – Transitada em julgado a sentença condenatória, compete ao juízo das execuções a aplicação de lei mais benéfica.
É possível aplicar a lei penal mais benéfica no período de vacatio legis?
Ex.: é editada uma lei penal mais benéfica, mas ela é revogada antes de entrar em vigor. Nesse caso, ela poderá ser aplicada para beneficiar o réu?
Há, na doutrina, duas correntes acerca da possibilidade de aplicação da lei penal benéfica no período de vacância:
1ª Corrente: sim, tendo em vista que a medida se destina a favorecer o réu (Rogério Greco).
2ª Corrente: Não, nenhuma lei pode ser aplicada enquanto está no período de vacância, não há lógica (não se sabe até quando uma lei estará em vigor, por exemplo, o CP/69 nunca entrou em vigor). É a corrente majoritária.
O que novatio legis incriminadora?
A novatio legis incriminadora (neocriminalização) é uma nova lei que cria um crime, até então, inexistente. Aplica-se apenas aos casos futuros, ou seja, não retroage.
O que é novatio legis in pejus?
A novatio legis in pejus (lex gravior) prejudica, de qualquer modo, a situação do agente. Nesse caso, o crime já existia. Aplica-se apenas aos casos futuros, ou seja, não retroage para prejudicar o réu.
O que é lei penal intermediária?
É necessário, pelo menos, três leis penais.
Imagine que o fato foi praticado na vigência da Lei A. A sentença, por sua vez, foi proferida na vigência da Lei C. Durante a vigência da Lei B, a mais benéfica das três, tramitou a ação penal. Nesse caso, é possível aplicar a Lei B (lei penal intermediária).
O STF, no RE 418.876, entendeu que é possível aplicar a lei intermediária, desde que seja a mais benéfica das três leis. Perceba que a lei intermediária possui retroatividade (aplica-se a fato passado) e, ao mesmo tempo, possui ultratividade, uma vez que será aplicada após ter sua vigência cessada.
O que é “lex tertia”?
Também chamado de Lei Híbrida ou combinação de leis penais.
Ocorre quando partes da lei antiga são mais benéficas ao réu e partes da lei nova também são benéficas. Nesses casos, parte da doutrina passou a defender a possibilidade de combinação dessas leis, formando-se uma terceira lei para favorecer o réu.
É possível a combinação de leis penais?
Historicamente, formaram-se duas posições acerca do assunto:
- 1ª Posição (Nelson Hungria): não se admite a combinação de leis penais, uma vez que haveria violação ao princípio constitucional da separação dos poderes (o Poder Judiciário estaria legislando ao criar a lei tertia). Assim, o juiz Poderá aplicar toda a lei nova ou toda a lei antiga, mas não partes de cada uma. É chamada, em Portugal, de Teoria da Ponderação Unitária ou Global. É a posição do STF.
- 2ª Posição (José Frederico Marques): é possível a combinação de leis penais. Não haverá violação ao princípio da separação dos poderes, uma vez que o juiz não está criando uma lei, mas transitando dentro dos limites previamente estabelecidos pelo legislador. É chamada, em Portugal, de Teoria da Ponderação Diferenciada.
O Plenário do STF, no julgamento do RE 600.817, proibiu a combinação de leis penais, sob pena de violação aos princípios da legalidade, da anterioridade da lei penal e da separação de poderes.
Súmula nº 501 do STJ - é cabível a aplicação retroativa da Lei 11.343/2006, desde que o resultado da incidência das suas disposições, na integra, seja mais favorável ao réu do que o advindo da Lei 6.368/1976, sendo vedada a combinação de leis.
O que é lei temporária e lei excepcional?
- Lei Temporária: é aquela que possui vigência predeterminada no tempo. Ou seja, possui prazo de validade expresso. Ex.: Lei nº 12.663/2012 (Lei da Copa).
Lei 12.663/2012. Art. 36. Os tipos penais previstos neste Capítulo terão vigência até o dia 31 de dezembro de 2014. - Lei excepcional: é aquela que vigora somente durante uma situação de anormalidade. Ex.: a Lei nº 13.979/2020, que dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do coronavírus.
Leis temporárias e excepcionais são ultrativas?
Tanto a lei temporária quanto a lei excepcional possuem ultratividade, pois serão aplicadas mesmo depois de revogadas, caso o fato tenha sido praticado na sua vigência.
CP. Art. 3º - A lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência.
A revogação ou a alteração do complemento exclui o crime tipificado na norma penal em branco?
Primeiramente, é necessário identificar se o complemento foi editado em uma situação de normalidade ou de anormalidade.
- Se a exclusão ocorreu em um período de normalidade, por uma questão de política criminal, haverá a exclusão do crime e a norma mais benéfica vai retroagir para beneficiar o réu.
Ex.: Miguel foi preso em flagrante e condenado por vender maconha. Por uma questão de política criminal, a maconha é retirada da portaria da ANVISA que traz as substâncias proibidas no Brasil. Ocorreu uma descriminalização da maconha. Nesse caso, a exclusão da maconha da portaria da ANVISA exclui o crime de tráfico e drogas praticado por Miguel.
- Se o complemento foi editado em uma situação de anormalidade, ele será dotado de ultratividade. Logo, a autorrevogação do complemento não excluirá o crime. Aqui, vale a mesma regra da lei temporária e da lei excepcional.
Ex.: na década de 80, em razão da hiperinflação criou-se a política de tabelamento de preços (complemento da norma penal em branco). O agente que vendesse acima ou abaixo da tabela cometia crime contra a economia popular. Após um período, a economia ficou estável e revogou-se a tabela de preços. Neste caso, a revogação do complemento não exclui o crime.
O que é conflito aparente de normas penais?
É o instituto que se verifica quando, a um único fato praticado pelo agente, duas ou mais normas se revelam, aparentemente, aplicáveis. Haverá um conflito entre qual norma deve ser aplicada. Contudo, não passa de um conflito aparente, pois é facilmente superado com a interpretação das normas em conflito.
Quais os princípios usados para solucionar o conflito aparente de normas?
Para solucionar o conflito aparente de normas, a doutrina e a jurisprudência apontam os seguintes princípios:
1) Princípio da especialidade;
2) Princípio da subsidiariedade;
3) Princípio da consunção;
4) Princípio da alternatividade (minoritário).
OBS.: ficar atento ao que a prova pedir. Havendo os quatro, marcar como certa. Caso a prova traga apenas os três primeiros em uma alternativa, marcar como correta.
Discorra sobre o princípio da especialidade.
De acordo com este princípio, a lei especial exclui a aplicação da lei geral. Não há a revogação da lei geral pela lei especial, ambas continuam vigentes, apenas, no caso concreto, será excluída a aplicação da lei geral.
Lei especial: contém todos os elementos previstos na lei geral e, também, outros elementos, chamados de especializantes.
Ex.: o homicídio (norma geral – matar alguém) e o infanticídio (norma especial – matar alguém + mãe em estado puerperal que mata o filho).
Este princípio se estabelece no plano em abstrato, ou seja, as normas em abstrato são comparadas, independentemente da gravidade do caso concreto. Assim, a norma especial será aplicada independentemente se mais grave ou mais benéfica do que a norma geral.
Discorra sobre o princípio da subsidiariedade.
Segundo o princípio da subsidiariedade, a lei primária exclui a aplicação da lei subsidiária.
- Lei Primária: é aquela que define o crime mais grave.
- Lei Subsidiária: é aquela que define um fato menos grave.
A análise é feita no caso concreto, ou seja, primeiro tenta-se aplicar a lei que prevê o crime mais grave em detrimento da norma penal que prevê o menos grave. Não sendo possível, aplica- se a norma subsidiária que, no dizer de Nelson Hungria, funciona como um soldado de reserva.
Quais as espécies de subsidiariedade?
a) Subsidiariedade expressa ou explícita: a própria norma penal se declara subsidiária, ou seja, diz que somente será aplicada se o fato não constituir crime mais grave. Ex.: art. 163, parágrafo único, II, do CP.
Art. 163 - Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia:
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.
Dano qualificado
Parágrafo único - Se o crime é cometido:
II - com emprego de substância inflamável ou explosiva, se o fato não constitui crime mais grave;
b) Subsidiariedade tácita ou implícita: a norma penal não se declara subsidiária, mas esta circunstância é extraída da análise do caso concreto. Ex.: a denúncia trata de roubo. Na instrução fica comprovado que se trata de furto. Perceba que a norma primária (mais grave) é o roubo, mas como não foi possível aplicá-la, utiliza-se a norma menos grave (o furto).
Discorra sobre o princípio da consunção ou absorção. Cite suas hipóteses.
De acordo com o princípio da consunção, a lei consuntiva exclui a aplicação da lei consumida.
- Lei consuntiva: é aquela que prevê o fato mais amplo (o todo);
- Lei consumida: é aquela que prevê o fato menos amplo (a parte).
Punindo “o todo” estar-se-á punindo “a parte”.
Hipóteses:
a) Crime progressivo;
b) Progressão criminosa;
c) Fatos não puníveis.
O que é crime progressivo?
Ocorre quando, para chegar ao crime final, o agente deve, obrigatoriamente, passar por um crime menos grave (delito de passagem). Ex.: para praticar o homicídio, o agente deve, obrigatoriamente, passar pelo delito de lesão corporal. Não há como matar sem ferir. Punindo-se o homicídio pune-se a lesão corporal.
No crime progressivo, o agente desde o início de sua conduta possui a intenção de alcançar o resultado mais grave, de modo que seus atos violam o bem jurídico de forma crescente.
O que é progressão criminosa?
É caracterizado pela mudança do dolo (substituição do dolo).
A intenção do agente era praticar um crime menos grave, porém, após iniciar a execução do delito, ele resolve praticar um crime mais grave. Ex.: inicialmente, o agente queria praticar uma lesão corporal. Depois, resolve praticar um homicídio.
O agente produz o resultado pretendido, mas, em seguida, resolve (substituição do dolo) progredir na violação do bem jurídico e produz um resultado mais grave que o anterior. O fato inicial fica absorvido.
A diferença entre crime progressivo e progressão criminosa é o dolo. No crime progressivo o dolo não se alterou, desde o início era o mesmo. Por outro lado, na progressão criminosa há uma mudança de dolo após a prática do primeiro crime.
O que são fatos impuníveis?
São aqueles fatos não punidos em razão da punição de um fato principal. Os fatos impuníveis podem ser:
- Anteriores (antefactum): funcionam como fase de preparação ou de execução de um fato principal. Ex.: furto no interior de uma residência, para praticar o furto, há uma violação de domicílio.
- Simultâneos: são aqueles que ocorrem concomitantemente ao fato principal, como meio de execução. Ex.: ao cometer um estupro, em via pública, o agente pratica um ato obsceno. Expor as partes íntimas é um meio para realizar o estupro.
- Posteriores (postfactum): é o fato posterior ao fato principal e que funciona como mero desdobramento desde. Ex.: após furtar um celular, por não conseguir usar o parelho, o agente o destrói (crime de dano).
Qual a diferença entre antefactum impunível e o crime progressivo?
Importante diferenciar o antefactum impunível e o crime progressivo. Inicialmente, destaca-se que ambos são hipóteses do princípio da consunção, mas no crime progressivo o crime-meio é obrigatório para a realização do crime-fim (não há como matar sem antes ferir a vítima). Já no antefactum impunível o crime-meio não é obrigatório (por exemplo, nem todo furto depende de violação de domicílio).
É possível a absorção de crime mais grave por crime menos grave?
Sim, nos termos da Súmula nº 17 do STJ.
Súmula nº 17 do STJ – Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido.
O estelionato possui pena de 1 a 5 anos (crime contra o patrimônio) e o crime de falsidade de documento público possui penal de 2 a 6 anos (crime contra a fé-pública).
Discorra sobre o princípio da alternatividade.
Este princípio não é unanime no Brasil para solucionar o conflito aparente de normas. De fato, a maioria da doutrina não o aceita.
O princípio da alternatividade subdivide-se em:
a) Alternatividade Própria: ocorre nos tipos mistos alternativos (ação múltipla ou conteúdo variado), são aqueles que possuem dois ou mais núcleos e se o agente realizar mais de um núcleo, contra o mesmo objeto material, estará realizado um único crime. Ex.: tráfico de drogas (possui 18 núcleos).
Críticas: não há conflito aparente de normas. O conflito é interno, dentro dos núcleos da norma penal.
b) Alternatividade Imprópria: ocorre quando a mesma conduta criminosa é disciplinada por dois ou mais tipos penais.
Crítica: é uma situação clara de falta de técnica legislativa.
O que são imunidades diplomáticas?
Trata-se de uma prerrogativa de direito público internacional de que desfrutam:
a) Os chefes de governo ou de estado estrangeiro, sua família e membros de sua comitiva;
b) Embaixador e sua família;
c) Funcionários do corpo diplomático e sua família;
d) Funcionários das organizações internacionais quando em serviço.
Salienta-se que a Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, em seus arts. 31 e seguintes, regula as imunidades diplomáticas.
Assim, os agentes diplomáticos devem obediência ao preceito primário do país em que se encontram. Contudo, escapam da sua consequência jurídica (punição – preceito secundário), permanecendo sob a eficácia da lei penal do Estado a que pertencem (intraterritorialidade). Ex.: o diplomata deve obediência ao art. 121 do CP, que prevê o crime de homicídio. Contudo, caso realize a conduta descrita no tipo penal “matar alguém” não estará sujeito ao preceito secundário (pena de 6 a 20 anos), mas sim será punido de acordo com a lei de seu Estado.
Qual a natureza jurídica das imunidades diplomáticas?
Há, na doutrina, duas correntes acerca da natureza jurídica das imunidades diplomáticas:
- 1ª Corrente (prevalente): trata-se de uma causa pessoal de isenção de pena.
- 2ª Corrente (Luís Flávio Gomes): consiste em uma causa impeditiva da punibilidade.
A imunidade diplomática impede a investigação policial?
A imunidade diplomática não impede investigação policial, principalmente para preservar o flagrante, isto é, a materialidade do delito.
Os agentes consulares gozam de imunidade?
Os agentes consulares gozam de imunidade funcional relativa, ou seja, são imunes nos crimes cometidos em razão de sua função. Já o Embaixador será imune tanto nos crimes comuns (fora de sua função) quanto nos crimes funcionais.
O diplomata pode renunciar à imunidade?
Ao diplomata não é dado o direito de renunciar à imunidade, tendo em vista que a imunidade é do cargo e não da pessoa.
Destaca-se que o país que ele representa pode renunciar à imunidade do diplomata, ou seja, retirar sua imunidade, nos termos do art. 32 da Convenção de Viena (Decreto 56.435/1965). A retirada da imunidade deve ser sempre expressa.
O que são imunidades parlamentares?
Inicialmente, destaca-se que as imunidades parlamentares possuem previsão constitucional. Não consistem em privilégios, são prerrogativas necessárias ao desempenho independente da atividade parlamentar e à efetividade do Estado Democrático de Direito, marcado pela representatividade dos cidadãos-eleitores.
A imunidade parlamentar pode ser absoluta (material) ou relativa (formal).
Discorra sobre a imunidade parlamentar absoluta.
A imunidade parlamentar absoluta, também chamada de imunidade material, imunidade substancial, imunidade real, inviolabilidade ou indenidade (Zaffaroni), encontra- se prevista no art. 53, caput, da CRFB:
Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.
Para o STF, a imunidade material exclui a responsabilidade criminal, civil e administrativa.
Ainda segundo o STF, a imunidade parlamentar absoluta tem natureza jurídica de causa excludente de tipicidade, motivo pelo qual ela deve ser estendida aos coautores e partícipes não parlamentares (Nucci e Luís Flávio Gomes).
Portanto, a Súmula nº 245 do STF refere-se apenas à imunidade formal.
Súmula nº 245 do STF - A imunidade parlamentar não se estende ao co-réu sem essa prerrogativa.
Quais os limites para a aplicação da imunidade material?
A aplicação da imunidade material exige nexo funcional, ou seja, o fato deve ter sido praticado no exercício ou em razão das funções parlamentares.
A doutrina entende que, para a palavra desonrosa proferida nas dependências do Congresso, o nexo funcional é presumido (presunção absoluta). Tratando-se de palavra desonrosa proferida fora do congresso, a imunidade será mantida, mas não mais se presume o nexo funcional que deverá ser comprovado (presunção relativa).
Nesse sentindo, entende o STF:
A imunidade parlamentar material, que confere inviolabilidade, na esfera civil e penal, a opiniões, palavras e votos manifestados pelo congressista (CF, art. 53, caput), incide de forma absoluta quanto às declarações proferidas no recinto do Parlamento. Os atos praticados em local distinto escapam à proteção absoluta da imunidade, que abarca apenas manifestações que guardem pertinência, por um nexo de causalidade, com o desempenho das funções do mandato parlamentar” (STF, Tribunal Pleno, Inq. 2.813, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe 24/05/2011).
Na hipótese de mensagens ofensivas divulgadas pelos meios eletrônicos a partir do gabinete do parlamentar, aplica-se a presunção de nexo funcional?
Na hipótese de utilização de meios eletrônicos (Facebook, Twitter, Instagram) para divulgar mensagens ofensivas à honra de alguém, deve haver vinculação com o exercício parlamentar para que seja afastada a responsabilidade, ainda que a mensagem tenha sido gerada dentro do gabinete. Entendimento diverso daria margem ao exercício abusivo desta prerrogativa que, como destacado, é da instituição e não do parlamentar.
Discorra sobre a imunidade parlamentar relativa.
Prevista nos parágrafos do art. 53 da CRFB, também chamada de imunidade formal. Divide-se em:
a) Imunidade relativa ao foro por prerrogativa de função;
b) Imunidade relativa à prisão;
c) Imunidade relativa ao processo;
d) Imunidade relativa à condição de testemunha.
Discorra sobre a imunidade relativa ao foro por prerrogativa de função.
É a imunidade relativa prevista no §1º do art. 53 da CRFB e que consagra o STF como foro especial, a partir da expedição do diploma, para julgamento dos Congressistas quando acusados pela prática de infração penal.
O STF entende que a prerrogativa de foro é cabível somente para as causas criminais e deve ser aplicada apenas aos crimes que tenham sido praticados durante o exercício do cargo e em razão dele (STF. Plenário. AP 937 QO/RJ, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 03/05/2018). Ademais, não abrange as ações cíveis, nem mesmo a ação de improbidade administrativa.
Com o fim do mandato, os autos são enviados para a primeira instância. Todavia, encerrada a instrução, mesmo que o parlamentar renuncie, o STF manterá sua competência para o processo e julgamento.
Após o final da instrução processual, com a publicação do despacho de intimação para apresentação de alegações finais, a competência para processar e julgar ações penais não será mais afetada em razão de o agente público vir a ocupar outro cargo ou deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja o motivo. (STF. Plenário. AP 937 QO/RJ, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 03/05/2018).
Discorra sobre a imunidade relativa à prisão.
Prevista no §2º do art. 53 da CRFB, também chamada pelo Supremo de incoercibilidade pessoal dos congressistas (freedom from arrest).
A imunidade parlamentar relativa à prisão inicia-se com a expedição do diploma e recai sobre a prisão provisória (temporária ou preventiva), salvo nos casos de prisão em flagrante pela prática de crime inafiançável, a exemplo do racismo. Salienta-se que a imunidade relativa à prisão não abrange a prisão definitiva (prisão pena), nos termos da jurisprudência do STF.
Nos casos em que o parlamentar (Senador ou Deputado Federal) é preso em flagrante por crime inafiançável, os autos devem ser remetidos no prazo de 24h para a Casa respectiva (Senado Federal ou Câmara dos Deputados), que irá decidir, por maioria de votos (abertos), acerca da manutenção ou não da prisão. Consigna-se que a deliberação acerca da prisão possui caráter político e não jurídico, ou seja, analisa-se conveniência e oportunidade.
É possível a prisão civil de parlamentar?
Em relação à prisão civil, há três correntes:
- 1ª Corrente (Uadi Bulos): o parlamentar poderá ser preso por dever alimentos. Portanto, a prisão civil não está abrangida pela imunidade relativa.
- 2ª Corrente (Gilmar Mendes): os congressistas não podem ser presos por dívidas relativas aos alimentos, estando abarcado na imunidade prevista do art. 53, §2º, da CRFB.
- 3ª Corrente (Rogério Sanches): tratando-se de alimentos provisórios ou provisionais, não se admite a prisão civil. Por outro lado, tratando-se de alimentos definitivos, em que já houve cognição exauriente, o parlamentar poderá ter sua prisão civil decretada.
Discorra sobre a imunidade relativa ao processo.
Encontra-se nos §§ 3º a 5º do art. 53 da CRFB. Abrange apenas os crimes praticados após a diplomação dos parlamentares. Autoriza a Casa Legislativa a sustar, a pedido de partido político, com representação no Legislativo Federal, o andamento da ação penal, pelo voto ostensivo e nominal da maioria absoluta de seus membros.
O pedido de sustação será apreciado pela Casa respectiva no prazo improrrogável de 45 (quarenta e cinco) dias do seu recebimento pela Mesa Diretora. A sustação do processo suspende a prescrição, enquanto durar o mandato.
A imunidade relativa ao processo pode ensejar a suspensão do inquérito policial?
A prerrogativa extraordinária da imunidade parlamentar prevista no art. 53, §§ 3º, 4º e 5º, não se estende e nem alcança os Inquéritos Policiais que tenham sido instaurados contra membros do Congresso Nacional.
Discorra sobre a imunidade relativa à condição de testemunha.
Prevista no §6º do art. 53 da CRFB.
Em regra, os parlamentares são obrigados a testemunhar, prestando compromisso, exceto:
- Sobre informações recebidas ou prestadas em razão do exercício do mandato;
- Sobre as pessoas que lhe confiaram ou deles receberam informações.
Destaca-se que embora a testemunha tenha o dever de comparecer quando intimada, o art. 221 do CPP prevê que deputados e senadores terão prerrogativa para ajustar o dia, a hora e o local em que irão prestar depoimento. Contudo, o abuso do direito poderá implicar na retirada de tal prerrogativa.
As imunidades parlamentares permanecem durante o estado de sítio?
CRFB. Art. 53, § 8º As imunidades de Deputados ou Senadores subsistirão durante o estado de sítio, só podendo ser suspensas mediante o voto de dois terços dos membros da Casa respectiva, nos casos de atos praticados fora do recinto do Congresso Nacional, que sejam incompatíveis com a execução da medida.
O parlamentar que se licencia do cargo eletivo para exercer a função de Ministro de Estado mantém as imunidades parlamentares?
Caso o parlamentar se licencie do cargo para o qual foi eleito com o objetivo de exercer outro, não manterá sua imunidade, que não é pessoal, mas da função, cessando igualmente a prerrogativa de foro, a não ser que o cargo assumido também confira essa prerrogativa, como no caso de ministros de Estado.
Os deputados estaduais também gozam de imunidades parlamentares?
Em razão do princípio da simetria (art. 27, §1º, da CRFB), as imunidades previstas para deputados federais também devem ser aplicadas aos deputados estaduais.
CRFB. art. 27, § 1º. Será de quatro anos o mandato dos Deputados Estaduais, aplicando- sê-lhes as regras desta Constituição sobre sistema eleitoral, inviolabilidade, imunidades, remuneração, perda de mandato, licença, impedimentos e incorporação às Forças Armadas.
Segundo o STF:
São constitucionais dispositivos da Constituição do Estado que estendem aos Deputados Estaduais as imunidades formais previstas no art. 53 da Constituição Federal para Deputados Federais e Senadores. A leitura da Constituição da República revela, sob os ângulos literal e sistemático, que os Deputados Estaduais também têm direito às imunidades formal e material e à inviolabilidade que foram conferidas pelo constituinte aos congressistas (membros do Congresso Nacional). Isso porque tais imunidades foram expressamente estendidas aos Deputados pelo § 1º do art. 27 da CF/88. STF. Plenário ADI 5823 MC/RN ADI 5824 MC/RJ e ADI 5825 MC/MT, rel. orig. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Marco Aurélio, julgados em 8/5/2019 (Info 939).
Os vereadores gozam de imunidade parlamentar?
Por força do art. 29 da CRFB, os vereadores desfrutam somente de imunidade absoluta, desde que as suas opiniões, palavras e votos sejam proferidos no exercício do mandato (nexo material) e na circunscrição do Município (critério territorial).
Salienta-se que o STF já decidiu que a Constituição Estadual, caso entenda por bem, pode dar foro por prerrogativa de função aos Vereadores, que alcança apenas os crimes que tenham sido praticados durante o exercício do cargo e em razão dele. É o que ocorre, por exemplo, na Constituição Estadual do Rio de Janeiro e do Piauí.
O Tribunal do Júri é competente para julgar parlamentar?
O foro por prerrogativa de função, previsto na Constituição, prevalece sobre a competência constitucional do Tribunal do Júri, pois se trata da própria Constituição excepcionando-se. Esse entendimento se aplica aos parlamentares federais e estaduais.
Quanto aos vereadores, o Tribunal do Júri, como visto, está previsto na Constituição Federal. Por outro lado, o foro especial, quando houver, estará previsto na Constituição Estadual. Perceba que há um conflito entre a previsão constitucional e a norma da constituição estadual. Neste caso, a norma da CRFB deverá prevalecer, portanto, o vereador que pratica crime doloso contra a vida será julgado pelo Tribunal do Júri. Nesse sentido:
Súmula Vinculante nº 45 - A competência constitucional do Tribunal do Júri prevalece sobre o foro por prerrogativa de função estabelecido exclusivamente pela Constituição Estadual.
Contudo, segundo o atual entendimento do STF, a prerrogativa de função será aplicada apenas aos crimes que tenham sido praticados durante o exercício do cargo e em razão dele. Ocorre que dificilmente um crime contra vida será praticado nestas circunstâncias. Por isso, segundo Rogério Sanches, a tendência é que a Súmula Vinculante seja encarada como superada e que todos os parlamentares sejam julgados pelo Tribunal do Júri.
Quem julga, no Brasil, crime cometido por brasileiro no exterior e cuja extradição tenha sido negada?
Quem julga, no Brasil, crime cometido por brasileiro no exterior e cuja extradição tenha sido negada:
• STJ: Justiça Federal (pacífico)
• STF: Justiça Federal (é o que tem prevalecido)
Compete à Justiça Federal o processamento e o julgamento da ação penal que versa sobre crime praticado no exterior que tenha sido transferida para a jurisdição brasileira, por negativa de extradição.
STJ. 3ª Seção. CC 154.656-MG, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 25/04/2018 (Info 625).
Em se tratando de cooperação internacional em que o Estado Brasileiro se compromete a promover o julgamento criminal de indivíduo cuja extradição é inviável em função de sua nacionalidade, exsurge o interesse da União, o que atrai a competência da Justiça Federal para o processamento e julgamento da ação penal, conforme preceitua o art. 109, III, da Constituição Federal.
No caso dos autos, trata-se de imputação da prática dos crimes de homicídio triplamente qualificado, ocultação de cadáver e roubo, praticados por brasileiro em território português. Diante desse cenário, faz-se imperiosa a incidência do art. 5º, 1, da Convenção de Extradição entre os Estados Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, promulgada pelo Decreto 7.935/2013.
STF. 1ª Turma. RE 1270585 AgR, Rel. Alexandre de Moraes, julgado em 31/08/2020.
Crime de tortura praticado contra brasileiro no exterior configura qual hipótese de extraterritorialidade?
Crime de tortura praticado contra brasileiro no exterior: trata-se de hipótese de extraterritorialidade incondicionada (art. 2º da Lei 9.455?97).
No Brasil, a competência para julgar será da Justiça Estadual.
O fato de o crime de tortura, praticado contra brasileiros, ter ocorrido no exterior não torna, por si só, a Justiça Federal competente para processar e julgar os agentes estrangeiros. Isso porque a situação não se enquadra, a princípio, em nenhuma das hipóteses do art. 109 da CF/88.
STJ. 3ª Seção. CC 107397-DF, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 24/9/2014 (Info 549).