Teoria Geral da Prova Flashcards
Discorra sobre o princípio da inadmissibilidade das provas obtidas por meios ilícitos.
Constituição Federal, em seu art. 5º, LVI, veda a admissibilidade de provas obtidas por meios ilícitos.
A vedação de provas ilícitas está amparada no Estado Democrático de Direito, pois não é admissível que o Estado tenha uma postura delituosa para tão somente produzir provas contra determinada pessoa. Agindo assim, o Estado, estaria se nivelando ao próprio criminoso.
Quais são os fundamentos da proibição das provas obtidas por meios ilícitos?
1) Proteção aos direitos fundamentais: de nada adiantaria a Constituição prever direitos fundamentais se ela própria não resguardasse esses direitos. Ex.: não faria sentido proteger o domicílio se fosse permitido a entrada sem mandado para fazer buscas.
2) Forma de dissuasão à adoção de práticas probatórias ilegais: A vedação às provas ilícitas constrange os agentes estatais à adoção de práticas probatórias legais, já que sabem, antecipadamente, que as provas produzidas ilicitamente serão nulas futuramente.
Qual a diferença entre prova ilícita e prova ilegítima?
O CPP não diferencia provas ilícitas de ilegítimas. De fato, o art. 157, caput, do CPP conceituou “provas ilícitas” como as: “obtidas em violação a normas constitucionais ou legais”.
Todavia, parte da doutrina faz a seguinte diferenciação:
1) Prova ilícita: é a prova produzida com violação a regra de direito material. Em regra, é produzida antes do processo (extraprocessual). Ex.: confissão obtida mediante tortura. Por serem inadmissíveis, deverão ser excluídas (desentranhadas) do processo, nos termos do art. 157, §3º, do CPP.
2) Prova ilegítima: é a prova produzida com violação à regra de direito processual. Em regra, é produzida dentro do processo (endoprocessual). Ex.: exame cadavérico feito por apenas um perito não oficial (deveriam ser dois). Nesse caso, poderá haver nulidade (absoluta ou relativa), aplicando-se a Teoria das Nulidades.
Qual o recurso cabível contra a decisão que reconhece a ilicitude de prova?
O ideal é que a decisão de inadmissibilidade da prova seja proferida em decisão interlocutória, sendo cabível o RESE (art. 581, XIII, do CPP).
Art. 581. Caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença:
XIII - que anular o processo da instrução criminal, no todo ou em parte;
Caso a ilicitude da prova seja reconhecida na sentença, caberá apelação (ainda que se queira questionar apenas a ilicitude da prova).
Qual a medida cabível contra a decisão do juiz que reconhece a licitude da prova?
Salienta-se que, se o juiz proferir uma decisão reconhecendo a licitude da prova, caberá habeas corpus, quando em risco a liberdade de locomoção, ou mandado de segurança, caso ausente o risco.
O que se entende por descontaminação do julgado?
Importante fazer referência ao art. 157, §5º, do CPP, que trata da descontaminação do julgado, segundo o qual, o juiz que teve contato com a prova ilícita deveria ser afastado do processo.
CPP. Art. 157, § 5º O juiz que conhecer do conteúdo da prova declarada inadmissível não poderá proferir a sentença ou acórdão.
Por mais que o juiz determine o desentranhamento e a inutilização da prova, o mero contato com a prova ilícita já possui o condão de prejudicar o julgamento, já que terá produzido uma influência no magistrado, de forma consciente ou não.
Todavia, o Min. Fux suspendeu a regra que previu a descontaminação do julgado. Segundo o ministro, a norma é “extremamente vaga” e pode “gerar inúmeras dúvidas” sobre sua aplicação.
Discorra sobre a teoria da prova ilícita por derivação.
Provas ilícitas por derivação são meios probatórios que, não obstante lícitos em sua essência, decorrem de prova anteriormente obtida por meios ilícitos, restando, dessa forma, contaminados pela ilicitude originária.
A prova ilícita por derivação é uma aplicação da teoria americana da árvore dos frutos envenenados (“fruits of poisonous tree theory”), segundo a qual o defeito existente no tronco contamina os frutos.
O que são os Miranda’s Rights? Eles são reconhecidos no Brasil?
No julgado americano Miranda v. Arizona, surgem os chamados Miranda’s Rights (ou Miranda warnings) ou Avisos de Miranda. Para a Suprema Corte Americana nenhuma validade pode ser conferida às declarações feitas pela pessoa à polícia, a não ser que antes tenha sido informada de:
- Tem o direito de não responder;
- Tudo que disser pode ser usado contra ele;
- Tem o direito à assistência de defensor escolhido ou nomeado.
No Brasil, ao julgar o HC 80.949, o STF considerou ilícita uma gravação, feita por policiais, de confissão do acusado sem que houvesse advertência formal quanto ao direito ao silêncio.
O Brasil adota a teoria dos frutos da árvore envenenada?
Essa Teoria já era adotada jurisprudencialmente, porém, com a reforma do CPP, tornou- se texto legal (art. 157, §1º, do CPP).
CPP. Art. 157, § 1º São também inadmissíveis AS PROVAS DERIVADAS DAS ILÍCITAS, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras.
Exemplo: a Testemunha “A” presta depoimento perante o juiz, esclarecendo fatos do crime. Posteriormente, descobre-se que essa testemunha foi encontrada apenas em decorrência de uma interceptação telefônica ilegal. Logo, seu testemunho é contaminado e considerado inadmissível.
Quais são as teorias que visam limitar a teoria dos frutos da árvore envenenada?
Com o passar dos anos, a Suprema Corte Americana entendeu que a Teoria da Prova Ilícita por Derivação não poderia ser aplicada de forma ilimitada. Diante disso, surgiram teorias que visam mitigar a teoria da prova ilícita por derivação. São elas:
1) Teoria da fonte independente;
2) Teoria da descoberta inevitável;
3) Limitação da mancha purgada;
Discorra sobre a teoria da fonte independente.
Ela é adotada no Brasil?
Essa teoria tem origem no direito americano (The Independent Source Limitation) no caso Bynum X US, em que o cidadão foi preso ilegalmente, e com essa prisão fizeram uma identificação datiloscópica. Com a identificação (ilegal por derivação) acharam suas digitais na cena do crime. Pela ilegalidade a Corte exclui essa identificação. No entanto, posteriormente, verificaram que já existia uma identificação no sistema do FBI, de forma independente, o que possibilitou o processo e a condenação do Bynum.
Segundo Renato Brasileiro, “se o órgão da persecução penal demonstrar que obteve, legitimamente, novos elementos de informação a partir de uma fonte autônoma de prova, que não guarde qualquer relação de dependência, nem decorra da prova originariamente ilícita, com esta não mantendo vínculo causal, tais dados probatórios são admissíveis, porque não contaminados pela mácula da ilicitude originária”.
A Teoria da Fonte Independente já era adotada pelo STF (RHC 90.376 e HC 83921), vindo a ser positivada no art. 157, §1º, do CPP.
Discorra sobre a teoria da descoberta inevitável.
Ela é adotada no Brasil?
Essa teoria também tem origem no direito norte-americano (The Inevitable Discovery Limitation) no julgado Nix X Williams II (1984). O cidadão era suspeito de matar alguém, porém o cadáver não era localizado. Ele foi coagido e confessou onde estava o cadáver, que foi apreendido (prova ilícita por derivação). No entanto, no caso concreto, duzentos voluntários da cidade já estavam fazendo uma varredura atrás do cadáver. A Suprema Corte então decidiu: Realmente o cadáver foi descoberto por meio ilícito, porém, na situação concreta, como os 200 moradores já estavam nas imediações do cadáver, a descoberta seria inevitável, portanto, a apreensão do cadáver foi lícita. Cuidado: Não é possível se valer dessa teoria com base em dados meramente especulativos, sendo indispensável a existência de dados concretos que demonstrem que a descoberta seria inevitável. Segundo Renato Brasileiro, “se restar demonstrado que a prova derivada da ilícita seria produzida de qualquer modo, independentemente da prova ilícita originária, tal prova deve ser considerada válida”. O STJ (HC 52.995) foi o primeiro Tribunal Superior a adotar a Limitação da Descoberta Inevitável. O STF possui alguns precedentes (HC 91.867) também adotando a referida teoria. Para muitos doutrinadores, essa teoria teria sido adotada pelo legislador no art. 157, §2º, do CPP: Art. 157, § 2o Considera-se fonte independente* (descoberta inevitável) aquela que por si só, seguindo os trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou instrução criminal, seria capaz de conduzir ao fato objeto da prova.
Discorra sobre a teoria da mancha purgada.
Ela é adotada no Brasil?
Essa teoria tem origem no Direito Americano (Teoria dos Vícios Sanados ou da Tinta Diluída ou da Mancha Purgada – “purge taint limitation” ou “atenuated connection limitation”).
Essa teoria foi adotada no caso Wong Sun v. United States (1963). Nesse caso, policiais da ‘delegacia de entorpecentes’ entraram num domicílio sem ‘causa provável’ e prenderam ilegalmente ‘A’, o qual, quase imediatamente depois, acusou ‘B’ de ter vendido a droga. Os policiais, em seguida, prenderam ilegalmente ‘B’, o qual, por sua vez, implicou ‘C’, que também foi preso ilegalmente. Vários dias mais tarde, depois de ‘C’ ter sido libertado, ‘C’ voluntariamente confessou oralmente aos policiais da delegacia de entorpecentes, durante seu interrogatório policial.
A Suprema Corte excluiu a apreensão da droga encontrada com ‘B’ e as declarações de ‘B’ por terem sido ‘frutos’ da entrada ilegal na sua casa e da sua prisão ilegal. Entretanto, rejeitou que a confissão de ‘C’ fosse fruto da sua prisão ilegal, pois, embora ‘C’ pudesse nunca ter confessado se ele jamais tivesse sido preso ilegalmente, sua ação voluntária de confessar, depois de ter sido solto e alertado de seus direitos, tinha tornado a conexão entre a prisão e a declaração tão atenuada que a ‘nódoa’ da ilegalidade tinha se dissipado.
Segundo Renato Brasileiro, “não se aplica a teoria da prova ilícita por derivação se o nexo causal entre a prova primária e a secundária for atenuado em virtude do decurso do tempo, de circunstâncias supervenientes na cadeia probatória, da menor relevância da ilegalidade ou da vontade de um dos envolvidos em colaborar com a persecução criminal. Nesse caso, apesar de já ter havido a contaminação de um determinado meio de prova em face da ilicitude ou ilegalidade da situação que o gerou, um acontecimento futuro expurga, afasta, elide esse vício, permitindo-se, assim, o aproveitamento da prova inicialmente contaminada”.
NÃO HÁ julgados no STF adotando essa teoria no Brasil. Todavia, o STJ, na AP 856, fez menção a essa teoria.
O que é serendipidade?
Fala-se em encontro fortuito de provas ou serendipidade quando a prova de determinada infração penal é obtida a partir de diligência regularmente autorizada para a investigação de outro crime.
A teoria do encontro fortuito ou casual de provas é utilizada nos casos em que, no cumprimento de uma diligência relativa a um delito, a autoridade policial casualmente encontra provas pertinentes à outra infração penal, que não estavam na linha de desdobramento normal da investigação.
Nesses casos, a validade da prova inesperadamente obtida está condicionada à forma como foi realizada a diligência: se houve desvio de finalidade ou abuso de autoridade, a prova não deve ser considerada válida; se o encontro da prova foi casual ou fortuito, a prova é válida.
Alguém mantém um tigre em casa. O IBAMA descobre. Pede-se ao juiz um mandado de busca e apreensão para o tigre. Na hora que a autoridade policial entra na casa, começa a abrir gavetas, destruir paredes etc. Nessa diligência, a autoridade encontra documentos que comprovam um crime tributário. Ela pode usar esse documento como prova?
Nesse caso, como a autoridade destrói paredes e abre gavetas, ele está desviando a finalidade de buscar o tigre. Portanto, é prova ilícita. Se fosse o contrário, ou seja, procurando documentos e achasse o tigre por acaso, seria lícito.
A teoria do encontro fortuito de provas aplica-se ao mandado de busca e apreensão em escritório de advocacia?
De acordo com a Lei 8.906/94, com redação dada pela Lei 11.767/08, o mandado de busca e apreensão a ser realizado em escritório de advocacia deve ser ESPECÍFICO e PORMENORIZADO, a ser cumprido na presença de representante da OAB, sendo vedada a utilização de documentos e objetos pertencentes a clientes do advogado investigado, salvo se tais clientes também estiverem sendo investigados como partícipes ou coautores do advogado.
Nesse sentido: STJ. 6ª Turma. HC 227799-RS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 10/4/2012.
Ou seja, no cumprimento de mandado de busca e apreensão em escritório de advocacia não se aplica a teoria do encontro fortuito quanto a documentos não referentes ao investigado, pois estariam protegidos pelo sigilo, não fazendo parte do objeto da diligência. Seria, assim, configurado um desvio de finalidade da diligência, ocasionando a ilicitude das provas.
Imagine, por exemplo, que “A” é advogado. O escritório de “A” foi objeto de uma busca e apreensão porque “A” era suspeito de ter praticado o crime “X”. Durante a busca e apreensão foram apreendidos documentos relacionados a “B” (cliente de “A”), que não era investigado pelo crime “X”. Por conta desses documentos apreendidos, “B” foi denunciado pelo crime “Y”. A denúncia de “B” é legítima?
O STJ decidiu que a apreensão dos documentos relacionados a “B” e a instauração da ação penal com base neles foi ilegal.
Houve violação ao disposto nos §§ 6o e 7o do art. 7o da Lei n. 8.906/1994 (Estatuto do Advogado), segundo os quais documentos, mídias e objetos pertencentes a clientes do advogado investigado, bem como demais instrumentos de trabalho que contenham informações sobre clientes, somente poderão ser utilizados caso estes clientes também estejam sendo formalmente investigados como partícipes ou coautores pela prática do mesmo crime que deu causa à quebra de inviolabilidade. No caso, isso não aconteceu, porque “B” não era investigado juntamente com seu advogado “A” pela prática do crime “X”.
O que se entende por crime achado?
Segundo entendimento do STF (HC 129.678), crime achado é a infração penal desconhecida e não investigada até o momento em que se descobre o delito. Em caso concreto apreciado pelo referido órgão, apesar de ter sido autorizada para investigar um crime de tráfico de drogas, a interceptação telefônica acabou por revelar a prática de um delito de homicídio. Nesse caso, presentes os requisitos constitucionais e legais, a prova deve ser considerada lícita.
Diferencie serendipidade de primeiro e segundo grau.
a) Serendipidade de 1º Grau: quando os encontros fortuitos são de fatos conexos ou continentes com os fatos sob investigação. A legalidade da prova obtida resultante da serendipidade de primeiro grau é aceita pela doutrina e jurisprudência pátria de longa data.
b) Serendipidade de 2ª Grau: os fatos descobertos não guardam relação de conexão ou continência com os fatos sob investigação. Parte da doutrina compreende que, diante da serendipidade de segundo grau, a prova encontrada ao acaso pode servir apenas como “notitia criminis”. Todavia, o STF firmou o entendimento de que a prova obtida por serendipidade de segundo grau deve ser considerada lícita e pode ensejar a condenação do réu.
Diferencie serendipidade objetiva da subjetiva.
a) serendipidade objetiva: há um encontro fortuito de provas/indícios de outro fato criminoso;
b) serendipidade subjetiva: há um encontro fortuito de provas/indícios do envolvimento de outra pessoa que não estava sendo objeto da investigação.