Aula 4 - Valvopatias e endocardite Flashcards
Quais os tipos de comprometimentos valvares que temos em relação à abertura a ao fechamento das valvas cardíacas?
- Estenose
- Insuficiência (regurgitamento ou incompetência)
Essas alterações podem coexistir em uma única valva, condição denominada “dupla lesão”.
Defina estenose valvar
É a incapacidade da valva de se abrir completamente (estenose = redução do lúmen).
Portanto, ela resulta em uma dificuldade de passagem do sangue “para frente” (alteração a favor do sentido do fluxo), o que aumenta a pressão na câmara anterior à valva danificada.
Ex: uma estenose da valva tricúspide dificulta a passagem do sangue do AD para o VD.
Defina insuficiência valvar.
É a incapacidade da valva de se fechar completamente.
Portanto, ela resulta em um retorno de sangue para a câmara de onde saiu (alteração contra o sentido do fluxo), levando ao acúmulo de sangue na câmara anterior.
Ex: uma insuficiência da valva tricúspide faz o sangue do VD, ao ser bombeado para as artérias pulmonares durante a sístole, retornar ao AD.
O que é a dupla lesão valvar?
É a associação de estenose e insuficiência da valva.
Na verdade, toda lesão valvar é dupla, mas uma lesão predomina sobre a outra, o que a caracteriza.
Quais as consequências clínicas das valvopatias?
Dependem da valva envolvida, do tipo de lesão, do grau da lesão, do ritmo de progressão da doença e dos mecanismos compensatórios.
Exemplos:
- Estenose: hipertrofia do miocárdio na câmara à montante (antes da valva), devido à sobrecarga de pressão.
- Insuficiência: hipertrofia dilatada da câmara à montante, pois há retorno de sangue, mais sangue na câmara.
Quais as alterações que ocorrem nas câmaras cardíacas na estenose das valvas mitral e aórtica?
Estenose mitral: o sangue não consegue fluir completamente do AE para o VE, levando à hipertrofia CONCÊNTRICA do VE.
Estenose aórtica: a pressão de saída vai estar muito elevada, levando à hipertrofia CONCÊNTRICA do VE para ter mais força para expulsar o sangue da câmara para a aorta.
Ambas essas lesões levaram à sobrecarga de pressão nas câmaras à montante, que modificaram suas estruturas de forma compensatória.
Obs: Essas alterações ocorrem da mesma forma no lado direito do coração (valvas tricúspide e pulmonar), mas acometendo as outras câmaras à montante.
Quais as alterações que ocorrem nas câmaras cardíacas na insuficiência das valvas mitral e aórtica?
Insuficiência da valva mitral: o sangue que deveria ser empurrado do VE para a aorta na sístole está voltando para o AE. Ocorre, assim, uma sobrecarga de volume e, portanto, uma hipertrofia DILATADA no AE.
Insuficiência da valva aórtica: o sangue empurrado para a aorta durante a sístole, causando uma hipertrofia DILATADA no VE.
Ambas essas lesões levaram à sobrecarga de volume nas câmaras à montante, que modificaram suas estruturas de forma compensatória.
Obs: Essas alterações ocorrem da mesma forma no lado direito do coração (valvas tricúspide e pulmonar), mas acometendo as outras câmaras à montante.
Quais as principais causas de estenoses mitral e aórtica e insuficiências mitral e aórtica?
Estenose mitral: febre reumática.
Estenose aórtica: febre reumática, endocardite infecciosa e, principalmente, calcificação da valva aórtica.
Insuficiência mitral: endocardite infecciosa, ruptura do músculo papilas/cordas tendíneas e, principalmente, prolapso da valva mitral.
Insuficiência aórtica: febre reumática e principalmente, dilatação da aorta ascendente por HAS ou envelhecimento.
Como podemos perceber, através de um exame físico, um defeito valvar?
Por meio da ausculta cardíaca, na qual é possível perceber sopros cardíacos.
Sopro sistólico em foco aórtico: estenose aórtica.
Sopro diastólico em foco aórtico: insuficiência aórtica.
Sopro sistólico em foco mitral: insuficiência mitral.
Sopro diastólico em foco mitral: estenose mitral.
O que são lesões valvares degenerativas?
Surgem geralmente em pacientes idosos, decorrentes do uso contínuo das valvas, pelo desgaste. Fatores genéticos estão envolvidos nessas doenças.
Exemplos de lesões degenerativas:
- estenose aórtica calcificada
- calcificação do anel mitral
- prolapso mitral
O que é a estenose aórtica calcificada?
- Também chamada de calcificação aórtica senil ou calcificação aórtica isolada do idoso
- É a anormalidade valvar mais comum de todas que ocorre, geralmente, após os 70 anos
- Esse tipo de alteração leva à estenose pura da valva aorta (ou seja, sem dupla lesão, pois não há retração ou fusão das comissuras valvares, que costumam levar à insuficiência também)
- A etiopatogênese é desconhecida, tendo fatores relacionadas à idade e à hiperlipidemia (hipertensão, inflamação), mas há controvérsias se é uma variante ou não da aterosclerose.
Quais os aspectos morfológicos da estenose aórtica calcificada?
Macroscopia
- Massas calcificadas e amontoadas no interior das cúspides aórticas
- Distorção anatômica
- Pode haver ossificação metaplásica
Microscopia
Massa amorfa basofílica = grumos de material calcificado
Veja imagens nos slides
Qual a clínica da estenose aórtica calcificada?
Essa estenose leva à hipertrofia concêntrica do VE pela sobrecarga de pressão, o que causa:
- ICC(devido à IC descompensada)
- Síncope (redução do DC e, portanto, menos sangue para o SNC)
- Angina (o DC está tão baixo que nem a artéria coronária está sendo perfundida adequadamente, levando à isquemia do miocárdio)
- Qualquer lesão de valva vai lesar seu endocárdio, o que é um fator de risco para endocardite infecciosa, condição que predispõe trombos.
Obs: essa condição pode levar à BAV (bloqueio átrio ventricular) quando a calcificação se estende para o septo interventricular, mas isso é raro.
O que é a calcificação do anel mitral?
- Geralmente acomete mulheres acima de 60 anos
- Blocos grosseiros de calcificação no anel fibroso, onde a valva se insere
- Geralmente, não afeta a função valvar, já que acomete apenas o anel fibroso. Porém, pode afetá-la com o avanço da doença causando estenose ou insuficiência.
- Pode causar BAV, mas isso é raro.
- Fator de risco para endocardite infecciosa, condição que predispõe trombos.
O que é o prolapso mitral, também chamado de degeneração mixomatosa da valva mitral?
- Um ou mais folhetos da valva mitral estão frouxos, causando prolapso para o AE durante a sístole
- A patogênese é desconhecida na maioria dos casos, mas o que ocorre é um distúrbio do tecido conjuntivo, que causa alteração na síntese e na degradação de seus constituintes (acúmulo de proteoglicanos/muco)
- Mais comum em mulheres
Morfologia
- Abaulamento dos folhetos para o AE
- Folhetos aumentados e espessos
- Cordas tendíneas alongadas e/ou adelgaçadas, que podem se romper
Microscopia: deposição de material mucoso (mixoide) de coloração azulada, por isso chama-se degeneração mixomatosa
Qual a clínica do prolapso mitral (degeneração mixomatosa)?
- A maioria é assintomática (achado acidental no exame físico ou ecocardiograma)
- Complicações graves (minoria = 3%): endocardite infecciosa, insuficiência mitral (às vezes por ruptura de corda tendínea) e formação de trombos por embolização.
O que é a febre reumática?
É uma doença inflamatória aguda, de natureza imunitária, recorrente, secundária à faringite ou à escarlatina (pele) por Estreptococus Beta - hemolíticos do grupo A de Lancefield (Streptococcus pyogenes)
- Acomete principalmente crianças e adolescentes (5 a 15 anos)
- Tem evolução longa, sendo suas repercussões maiores ocorrendo em jovens ou na idade adulta
- Ligada à pobreza, devido à falta de saneamento básico
- Ela é uma complicação tardia não supurativa mediada por Ac da resposta imune do hospedeiro aos antígenos estreptococos B-hemolíticos do grupo A (reação cruzada com proteínas do hospedeiro).
Ex: Após uma IVAS (infecção de via aérea superior), por exemplo, em uma pessoa com pré-disposição à febre reumática, ela produz Ac para a bactéria causadora 2 a 4 semanas depois. Esses Ac e células TCD4 vão ser direcionadas à proteína M dos estreptococos, que mimetizam muito algumas proteínas (autoantígenos) do coração e das articulações. Além disso, as células T produzem citocinas que recrutam macrófagos capazes de gerar respostas Th1, responsáveis por formar granulomas.
Descreva a fase aguda da febre reumática
A FR é uma pancardite (inflama os três folhetos cardíacos), mas o endocárdio é o mais prejudicado: endocardite valvar, sendo a mitral a mais acometida.
Morfologia:
- Coração: aumento do volume; ele fica flácido e globoso, tudo por causa da inflamação; no seu exterior, está uma pericardite fibrinosa (capa de fibrina no epicárdio/pericárdio).
- No endocárdio, na borda valvar, encontram-se as chamadas vegetações: são pequenas e róseo-acinzentadas, formadas pela deposição de fibrina, plaquetas e leucócitos.
Microscopia: Nódulos de Aschoff (lesão patognomômica), que são granulomas de macrófagos ativados (células epitelioides) e linfócitos rodeando um colágeno mais eosinofílico. Ele pode ser encontrado em qualquer parte do coração, mas é mais comum no miocárdio.
Veja as imagens nos slides
Descreva a fase crônica da febre reumática
A FR é uma doença de longa duração, caracterizada por surtos de inflamação aguda, os quais causam sequelas, e estas dão início à fase crônica, manifestada em pacientes mais velhos (jovens ou adultos)
- Vasculites com IIMN (infiltrado inflamatório mononuclear), neoformação vascular e fibrose
Na valva mitral:
- Espessamento fibroso e irregular dos folhetos
- Fusão das comissuras, dando aspecto de “folheto em boca de peixe”, que leva à estenose da valva mitral
- Ocorre também espessamento, fusão e encurtamento das cordas tendíneas
Veja as imagens nos slides
Quais as manifestações clínicas de FR utilizadas para o diagnóstico?
O diagnóstico é definido pelos critérios modificados de Jones (para a fase aguda): é necessário ter 2 critérios maiores ou 1 critério maior e 2 menores. É importante que você saiba pelo menos as manifestações maiores. São elas:
- Cardite
- Poliartrite migratória de grandes articulações (hora afeta uma grande articulação, hora afeta outra)
- Coreia de Sydenham (movimentação involuntária desconexa)
- Eritema marginado (manchas vermelhas irregulares na pele do tronco/extremiades)
- Nódulos subcutâneos (pouco comuns, em geral sobre as articulações): firmes, móveis, indolores e sem sinais flogísticos
Obs: apesar de se chamar febre reumática, a febre é um critério menor
Defina o prognóstico, as sequelas/complicações e o tratamento da doença.
O prognóstico depende da extensão do comprometimento cardíaco e da gravidade das lesões valvares.
Já as sequelas/complicações incluem IC por estenose ou insuficiência valvar, FA secundária ao aumento de volume do AE (predisposição a trombos) e endocardite infecciosa.
O tratamento consiste no uso de corticoides e medicamentos para ICC. Uso de antibióticos são utilizados para a prevenção de novos surtos. Para pacientes muitos sequelados, podem ser feitas valvoplastias, troca valvar ou transplante cardíaco.
Defina a endocardite infecciosa
- É uma das infecções mais graves do ser humano, pois consiste em uma infecção microbiana das valvas ou do endocárdio mural.
- Ela pode ser identificada por vegetações friáveis (esfarelentas) compostas por fragmentos trombóticos e microorganismos. Elas são capazes de destruir os tecidos cardíacos subjacentes.
- A maioria das endocardites são bacterianas, mas também podem ser fúngicas
- Um diagnóstico rápido, a identificação do agente e um tratamento eficaz são fundamentais para reduzir morbidades.
Quais os fatores de risco para a endocardite infecciosa?
O principal fator de risco é uma valva previamente lesada, que gera fluxo turbulento, o que aumenta o contato dos microganismos com o endocárdio valvar quando o paciente está acometido por lguma infecção no sangue. Com isso, surgem vegetações na face da valva em que há maior impacto do fluxo sanguíneo (ex: face atrial da valva mitral, de onde vem o sangue durante o batimento cardíaco).
Outros fatores de risco:
- Idosos
- Usuários de drogas injetáveis, pacientes em hemodiálise e pacientes submetidos a procedimentos invasivos
- Imunossuprimidos
- Cardiopatia congênita (ex: alterações valvares)
As valvas mitral e aórtica são as mais acometidas, pois é no lado esquerdo que o fluxo sanguíneo é mais turbulento.
Descreva a patogênese da endocardite infecciosa
Ocorre quando há uma porta de entrada das bactérias para o sangue (ex: infecção cutânea, urinária, pulmonar, procedimentos invasivos, etc) atrelada aos fatores de risco.
Principais agentes causadores:
- Streptococcus viridans (50% a 60% de pacientes com lesões valvares)
- Staphylococcus aureus (10% a 30% de usuários de drogas injetáveis)
- Outros: Enterococcus, Haemophilus, Staphylococcus epidermidis…
- Fungos: 0,5% a 1% dos casos (imunossuprimidos)
Descreva a morfologia da endocardite infecciosa
Macroscopia:
- Presença de massas apardacentas e avermelhadas (vegetações com trombos) de tamanhos variáveis, muitas vezes com destruição tecidual na valva
- Ulcerações e perfurações de cúspides e folhetos valvares, além de ruptura de cordas tendíneas que também podem ocorrer
Microscopia:
- Vegetação = infiltrado inflamatório agudo (predomínio de PNM - polimorfonucleares) + fibrina + debris celulares (restos mortais) + microrganismos
- Pode haver trombo associado
- Na fase tardia, é possível ver fibrose
Veja nos slides
Quais as formas clínicas da endocardite infecciosa? Descreva-as.
FORMA AGUDA
- Evolução mais rápida (dias ou semanas)
- Valva normal infectada por organismos de alta virulência (ex: Staphylococcus aureus)
- Lesões necrosantes e destrutivas
- Difícil de tratar apenas com ATB, sendo às vezes necessário tratamento cirúrgico
- Mortalidade mais elevada
FORMA SUBAGUDA
- Curso mais lento (semanas a meses)
- Valva previamente lesada infectada por organismo de baixa virulência (ex: S. viridans)
- Menor destruição
- Tratamento com ATB geralmente mais eficaz
Sem tratamento, as duas formas são letais
Descreva o quadro clínico da endocardite infecciosa e como é feito o diagnóstico
É um quadro infecioso e geralmente septicêmico (sepse/sistêmico) de rápida instalação: febre, calafrios, cefaleia, emagrecimento, linfonodomegalia. Também podem ocorrem sopros cardíacos quando há defeito valvar.
Além disso, existem sinais periféricos causados por microêmbolos que, associados ao à semiologia do paciente, indicam infecção cardíaca:
- Nódulos de Osler: petéquias, nódulos ou pápulas eritematosas dolorosas nos dedos.
- Lesão de Janeway: hemorragias nas palmas das mãos e plantas dos pés.
- Manchas de Roth: hemorragias retinianas ovais com centro pálido.
Diagnóstico: hemocultura, ecocardiograma, biópsia valvar
Descreva as complicações da endocardite infecciosa
- Desprendimento do trombo acoplado à vegetação, causando: embolia séptica que pode desencadear necrose e infecções em outros órgãos; aneurisma micótico (nome impróprio), pois é uma vasculite aguda no local onde o êmbolo se alojou; embolia coronariana que causa um IAM
- Pode ocorrer falência cardíaca por insuficiência valvar, abscesso valvar, destruição de folhetos valvares/cordas tendíenas.
- Choque séptico, cardiogênico ou hipovolêmico (se houver hemorragia)