HEPATO Vol 2 - Cirrose hepática e suas causas Flashcards
Cirrose hepática e suas causas
2 – Mulher, 50 anos, queixa-se de fadiga excessiva, sem
explicação aparente, além de prurido generalizado no último ano. Há dois meses notou icterícia. Exame físico: hiperpigmentação cutânea, xantelasma, edema de membros inferiores e hepatoesplenomegalia. Exames laboratoriais: elevação marcante de fosfatase alcalina e gama GT; hiperbilirrubinemia (10 mg/dl) com 7 mg/dl de conjugada e aminotransferases com discreto aumento. Pode-se afirmar que, para este quadro, o exame histopatológico deve mostrar:
a) Infiltração gordurosa de hepatócitos perivenulares.
b) Proliferação de canalículos biliares e diminuição do número de ductos biliares.
c) “Piecemeal” necrose e necrose periportal.
d) Necrose e fibrose intralobular.
O quadro descrito é nada menos que clássico de Cirrose Biliar Primária (CBP). Mulher de meia-idade, com queixa de fadiga e prurido, evoluindo com icterícia à custa de bilirrubina direta (conjugada) e grande aumento de fosfatase alcalina e gama GT, com aumento proporcionalmente mais baixo das aminotransferases. Outro achado clássico é a presença de xantelasmas (“manchas de colesterol” na pele), achado que indica a existência de importante dislipidemia (dado não fornecido pelo enunciado). Esta paciente, na realidade, já deve estar em uma fase avançada de CBP, pois há francos indícios de cirrotização hepática (bilirrubina total ≥ 10 mg/dl — sinal de mau prognóstico nessa doença, indicativo de necessidade de transplante hepático; hepatoesplenomegalia, síndrome edemigênica). O diagnóstico pode ser confirmado pela demonstração de positividade (e títulos elevados) para o autoanticorpo antimitocôndria IgM (presente na imensa maioria dos casos). A biópsia hepática também corrobora o diagnóstico, em vista das alterações histopatológicas típicas, sendo útil também para o estadiamento da doença. Na CBP, espera-se a presença de um infiltrado inflamatório dentro do espaço porta, acompanhado de destruição progressiva dos ductos biliares. Em resposta a essa destruição, os canalículos biliares proliferam, porém, tal reação regenerativa do tecido não é capaz de restaurar a integridade do sistema biliar intraparenquimatoso, e o doente evolui assim, invariavelmente, para destruição completa do sistema biliar intra-hepático e cirrose hepática.
A letra A se refere à lesão observada na doença
hepática alcoólica, a letra C se refere à lesão da hepatite autoimune e a letra D se refere a uma lesão inespecífica, encontrada, por exemplo, em hepatites virais ou tóxicas.
Resposta certa: B.
3 – Homem, 22 anos, apresenta icterícia, ascite e esplenomegalia, exibindo, ao exame oftalmológico, anéis de Kayser-Fleischer. O exame laboratorial necessário para o diagnóstico desse caso é:
a) Índice de saturação de transferrina/ferritina.
b) Pesquisa de mutação C282Y.
c) Cobre excretado na urina de 24 horas.
d) Alfa-1-antitripsina.
e) Pesquisa da mutação H63D.
A questão nos traz um caso de doença de Wilson, que devemos suspeitar pela presença de uma hepatopatia crônica com provável cirrose (sinais de hipertensão porta — ascite, esplenomegalia) em um paciente jovem com anéis de Kayser-Fleischer. Esses anéis são formados pelo acúmulo de cobre na córnea, que
adquirem a forma verde-dourada, indicando excesso de
cobre, geralmente já associado a dano cerebral. A doença de Wilson é um distúrbio autossômico recessivo caracterizado pelo acúmulo tóxico de cobre no organismo, sendo suas principais manifestações clínicas a hepatopatia inexplicada, anemia hemolítica Coombs negativo, síndrome parkinsoniana (lesão dos gânglios da base) e distúrbios psiquiátricos em pacientes jovens. Seu diagnóstico pode ser confirmado pela dosagem de ceruloplasmina reduzida, excreção urinária de cobre em 24 horas aumentada e biópsia hepática com concentração aumentada de cobre (padrão-ouro).
Resposta: C.
4 – Mulher, com 32 anos, refere ganho de peso progressivo nos últimos 5 anos, após parar atividade física, associada a oligomenorreia. Possui diagnóstico prévio de hipertrigliceridemia e encontra-se em uso de anticoncepcional oral há 7 meses. Ingere meia taça de vinho ao dia. Ao exame, apresenta pelos grossos e escuros em face, abdome inferior e face interna das coxas. PA = 140 x 90 mmHg; IMC = 33,6 kg/m2; cintura abdominal = 120 cm. Fígado palpável a 2 cm do RCD. Exames laboratoriais com elevação discreta das transaminases e glicemia de jejum = 104 mg/dl. Qual a causa mais provável do aumento das transaminases e a provável relação dos níveis séricos de AST/ALT?
a) Esteato-hepatite alcoólica; relação > 2.
b) Hepatite medicamentosa; relação < 1.
c) Doença hepática gordurosa não alcoólica; relação < 1.
d) Hepatite medicamentosa; relação > 2.
e) Doença hepática gordurosa não alcoólica; relação > 2.
A história é de uma paciente com critérios para a síndrome metabólica (HAS, obesidade abdominal,
hiperglicemia e dislipidemia) e provavelmente síndrome
dos ovários policísticos (oligomenorreia e uso de ACO). Nesses casos, pensaremos obrigatoriamente na Doença Hepática Gordurosa Não Alcoólica (DHGNA), cuja presença de esteatose guarda semelhanças com a doença hepática alcoólica, mas que difere desta na relação das aminotransferases. Na DHGNA, a TGP (ALT) costuma estar mais elevada que a TGO (AST), em uma relação AST/ALT < 1. Na prática, esta costuma ser, além da história de ingestão etílica, uma boa pista para o diagnóstico diferencial entre elas.
Resposta: letra C.
5 – Um senhor de 40 anos vai ao atendimento médico
por redução na libido e potência sexual. Nega etilismo.
Apresenta história familiar positiva para diabetes mellitus. Ao exame físico: peso = 72 kg, altura = 1,75 m,
circunferência da cintura = 88 cm, pressão arterial =
120 x 80 mmHg. Exames laboratoriais (sangue): TSH =
1,0 mU/L (normal: 0,4-4,0); T4 livre = 1,1 ng/dl (normal:
0,8-1,8); glicose = 130 mg/dl; hemoglobina glicada =
7,5%; colesterol = 200 mg/dl; triglicerídeos = 150 mg/dl;
colesterol-HDL = 45 mg/dl; aspartato aminotransferase = 60 UI/L (normal: 12-38); alanina aminotransferase =
80 UI/L (normal: 7-41); ferritina: 1.100 microgramas/litro
(normal: 24 a 155); sorologias para hepatite B e C negativas. Assinale o diagnóstico mais provável:
a) Hemocromatose com glicemia de jejum alterada (pré-
- diabetes).
b) Hemocromatose com diabetes mellitus secundário.
c) Esteatose hepática não alcoólica, glicemia de jejum alterada (pré-diabetes).
d) Esteatose hepática não alcoólica com diabetes mellitus tipo 2.
Inicialmente, devemos tentar definir a etiologia do quadro, cujos dados fornecidos se afastam da hipótese de doença hepática gordurosa não alcoólica. Reparem que o paciente não é obeso, é normotenso e, apesar da hiperglicemia, não tem perfil lipidêmico clássico para a síndrome de resistência à insulina. Ou seja, trata-se de uma questão sobre hemocromatose, nome dado de forma genérica para as condições marcadas pelo aumento progressivo dos estoques de ferro, com deposição
desse metal no fígado, coração, hipófise, gônadas,
pâncreas e outros órgãos. A marca desta doença é o
aumento da ferritina e do índice de saturação da transferrina. Cerca de 30 a 60 % dos pacientes com hemocromatose avançada possuem diabetes mellitus (70% são insulinodependentes) e a presença de diabetes piora o prognóstico.
Resposta: letra B.
6 – Paciente de 50 anos apresenta febre, icterícia e dor
abdominal há 3 dias. Tem história de tabagismo e etilismo
desde os 15 anos. Ao exame físico, tem hepatomegalia e
aranhas vasculares. São solicitados exames laboratoriais
que apresentam os seguintes resultados: TGO = 350 UI/L;
TGP = 100 UI/L; bilirrubina total = 3,0 mg/dl e bilirrubina direta = 2,0 mg/dl. Com esse quadro clínico e esses exames, o diagnóstico CORRETO é:
a) Hepatite alcoólica.
b) Colangiocarcinoma.
c) Colangite.
d) Colecistite.
e) Hepatite viral.
A tríade hepatomegalia dolorosa, icterícia e febre, em um paciente etilista com aumento moderado de aminotransferases, apresentando o achado peculiar
de relação AST/ALT > 2, até prova em contrário, significa a presença de hepatite alcoólica aguda, uma forma de lesão hepática potencialmente muito grave, que pode requerer corticoterapia sistêmica (por isso devemos calcular o índice de função discriminante de Maddrey, que se ≥ 32, indica o uso de prednisolona por 1 mês). Em uma hepatite viral, o aumento de aminotransferases seria muito exuberante, geralmente > 10x o LSN (com ALT > AST). Na colecistite aguda, o quadro seria de febre e dor no hipocôndrio direito, a princípio sem icterícia (exceto na síndrome de Mirizzi).
De qualquer forma, não se espera a presença de lesão
hepatocelular no hepatograma, muito menos com um
padrão de predomínio da AST sobre a ALT. O hepatograma na síndrome de Mirizzi revelaria a presença de aumento mais pronunciado das enzimas canaliculares o que sequer foi citado pelo enunciado (D errada). O diagnóstico de colangite é sugerido pela tríade apresentada (febre, icterícia e dor abdominal), porém, nestes casos, o hepatograma também apresenta um padrão de lesão “colestática”, e não “hepatocelular”
(C errada). No colangiocarcinoma ocorre colestase
indolor e sem febre (a presença de dor ou febre sugerem complicações da colestase crônica, como a colangite- B errada).
Resposta certa: A.
7 – Um homem com 46 anos de idade procura a unidade básica de saúde queixando-se de “mal-estar súbito”, na véspera da consulta, que o impossibilitou de comparecer ao trabalho. Relata já ter se ausentado outras vezes do trabalho por essa mesma razão e visa obter atestado médico. Queixa-se de problemas com sua chefia imediata e diz correr o risco de perder o emprego. Informa que, no momento, está separado de sua esposa. Queixa-se de insônia quase todas as noites, dor de estômago ocasional, diarreia eventual, dormência nos pés e tremores nas mãos. À ectoscopia, mostra-se cansado, apresenta olhos hiperemiados, parótidas de volume aumentado e telangiectasias no nariz. A ausculta cardíaca e pulmonar pulmonar
não apresentam anormalidades. Pressão arterial =
140 x 90 mmHg; frequência cardíaca = 100 bpm; fígado
palpável a 2 cm do rebordo costal direito; leve edema
perimaleolar bilateral. Assinale a alternativa em que é
apresentado o conjunto de alterações em exames laboratoriais compatível com esse caso clínico.
a) Leucocitose no hemograma; amilase e lipase séricas
elevadas.
b) Policitemia no hemograma; alfafetoproteína sérica baixa e hipoxemia.
c) Hipocromia no hemograma; tiroxina e triiodotironina séricas aumentadas.
d) Macrocitose no hemograma; gama GT e transaminases séricas aumentadas.
A questão descreve um paciente que em sua história e exame clínico apresenta algumas pistas semiológicas que devem nos fazer pensar na possibilidade de abuso de álcool. Chama especial atenção o sinal de hipertrofia de parótidas, clássico do alcoolismo crônico. Parestesia distal nos membros também pode ser consequência da neurotoxicidade pelo álcool, assim como o tremor, que pode ser um dos sinais da crise de abstinência. Nesse contexto, não é difícil imaginar que provavelmente ele teve um episódio de libação alcoólica que o impediu de ir ao trabalho e gerou a busca pelo atestado médico (fora que isso também deve ter influenciado
em seu divórcio e no problema com o chefe no
trabalho). No alcoolismo crônico, é comum observar a
macrocitose das hemácias, assim como aumento de gama GT e aminotransferases, com predomínio da TGO (Transaminase Glutâmico-Oxalacética). Uma relação TGO/TGP > 2 é bastante característica da doença hepática alcoólica, não aparecendo em outras formas de hepatopatia crônica não cirrótica.
Assim, a melhor resposta é a letra D.
8 – Em uma investigação de hepatopatia crônica em paciente feminino, 25 anos, são critérios diagnósticos imunológicos que falam a favor de hepatite autoimune, EXCETO:
a) Anticorpo antimúsculo liso.
b) Anticorpo antinúcleo.
c) Anticorpo antimitocôndria.
d) Anticorpo antimicrossomo fígado/rim 1.
e) Anticorpo citoplasmático antineutrofílico perinuclear.
A hepatite autoimune é mais comum em mulheres
entre os 10 e 30 anos e as de meia-idade. A hepatite autoimune tipo I tem como característica a presença do FAN positivo (padrão homogêneo) na maioria dos pacientes e o anticorpo antimúsculo liso também pode ser encontrado. A hepatite autoimune tipo II se caracteriza pela presença do anticorpo antimicrossomo
fígado/rim 1 (anti-LKM-1) e, de forma menos característica, do anticorpo anticitosol fígado 1 (anti-LCl). O antígeno que elicita a resposta imune é uma enzima, a citocromo monoxigenase P-450IID6, expressa
na superfície da membrana do hepatócito. O anticorpo antimúsculo liso e o FAN estão ausentes; a IgA sérica pode estar baixa. Vamos resumir os principais anticorpos encontrados nesses dois tipos:
• Tipo 1: - Anticorpo antinúcleo (FAN); - Anticorpo antimúsculo liso; - Anticorpo antiactina; - Anticorpo citoplasmático antineutrofílico perinuclear (p-ANCA); - Anti-SLA/LP.
• Tipo 2: - Anticorpo antimicrossomo fígado/rim 1 (anti-LKM-1); - Anticorpo anticitosol fígado 1 (anti-LC1); - Anti-SLA/LP.
Apesar de eventualmente ser encontrado na hepatite
autoimune, o anticorpo antimitocôndria (AMA) encontra-se presente em 90 a 95% dos pacientes (em títulos > 1:40) com cirrose biliar primária sendo muito mais característico desta doença. Títulos > 1:80 são altamente sugestivos da doença e o subtipo AMA-M2 é altamente específico.
Resposta: C.
9 – Menino, 2 anos de idade, encaminhado para investigação de hepatoesplenomegalia assintomática, detectado por pediatra em consulta de rotina. Os pais são saudáveis, negam doenças infectocontagiosas e negam consanguinidade. Ao exame: peso P90 e estatura P10, ictérico +/4, ausência de spiders ou eritema palmar, fígado palpável a 4 cm do RCD algo endurecido e baço a 3 cm. Trouxe alguns exames de triagem: ALT = 80 U/L (normal < 41); AST = 90 U/L (normal < 38); gama GT = 55 U/L (normal
< 50); INR e albumina normais. Qual etiologia pode ser
descartada com estes dados?
a) Deficiência de alfa-1-antitripsina.
b) Esteato-hepatite não alcoólica.
c) Doença de Wilson.
d) Hepatite crônica pelo vírus B.
Sabe por que o diagnóstico de doença de Wilson pode ser, pelo menos a princípio, afastado neste caso? Por um motivo muito simples: tal condição — caracterizada por um acúmulo de cobre no organismo, lesando principalmente fígado e SNC — leva anos para se manifestar clinicamente, quer dizer, é muito pouco provável que a doença apareça em um paciente com apenas 2 ANOS DE IDADE. Na realidade, a maioria dos portadores recebe o diagnóstico na faixa etária entre 5-35 anos, com casos relatados de diagnóstico somente aos 70 anos de idade. A esteato-hepatite não alcoólica pode aparecer neste pequeno paciente “mais pra gordo” (peso no percentil 90, estatura no percentil 10 — em que percentil deve estar seu IMC? ). Deficiência de alfa-1-antitripsina é uma doença genética que pode se manifestar clinicamente desde muito cedo, a hepatite B crônica pode ser adquirida na vida intrauterina ou através do canal de parto, causando hepatite ativa já em idades tão precoces quanto 2 anos.
Resposta certa: C.
10 – Na cirrose biliar primária, o sintoma ou sinal mais precoce é:
a) Icterícia.
b) Melanose.
c) Glossite.
d) Prurido.
e) Dor em cólica.
A principal forma de expressão clínica da CBP (agora denominada Colangite Biliar Primária) é a síndrome de colestase, porém, um de seus componentes sintomáticos merece destaque especial nessa doença: o PRURIDO. Curiosamente, o prurido costuma ser proeminente e precoce na CBP, representando uma das principais queixas que pioram a qualidade de vida do paciente. Sua gênese parece estar relacionada ao acúmulo cutâneo de certos sais biliares pruridogênicos, por conta da colestase intra-hepática. O paciente, de tanto se coçar, pode desenvolver escoriações, endurecimento da pele e até mesmo melanose (escurecimento), porém, tais alterações, é óbvio, serão menos frequentes que o prurido em si, já que constituem COMPLICAÇÕES de um quadro de
prurido crônico. Icterícia é sinal tardio e de mau prognóstico, ausente na maior parte dos pacientes no início do quadro.
Resposta certa: D.
11 – Quais são os critérios de Child-Turcotte modificados
por Pugh para prognosticar a cirrose hepática?
a) TAP, albumina, bilirrubinas, ascite e encefalopatia.
b) AST, ALT, GGT, TAP e fosfatase alcalina.
c) Ascite, síndrome hepatorrenal, GGT, TAP e bilirrubinas.
d) Encefalopatia, TAP, albumina, bilirrubinas e ALT.
Os 5 critérios que compõem a classificação de Child-Turcotte-Pugh, utilizada para o estadiamento e estratificação prognóstica da cirrose hepática em geral, são facilmente relembrados através de nossa regra mnemônica: “BEATA” (Bilirrubina; Encefalopatia; Albumina; TAP e Ascite).
Resposta correta: A.
12 – Considere as assertivas abaixo sobre a cirrose alcoólica:
I - Nos testes laboratoriais, os níveis de AST geralmente
são mais elevados do que os de ALT;
II - Plaquetopenia é um achado incomum, ocorrendo principalmente nas fases avançadas da doença;
III - Ao exame físico, é frequente o aparecimento de “aranhas vasculares”, mas raramente ocorre eritema palmar, o que ajuda na diferenciação entre etiologia alcoólica ou viral.
Quais são CORRETAS?
a) Apenas I.
b) Apenas II.
c) Apenas III.
d) Apenas I e III.
e) I, II e III.
É clássico o conceito de que na Doença Hepática Alcoólica — em todas as suas fases, isto é, mesmo na ausência de cirrose — a relação AST/ALT costuma ser ≥ 2. Para todas as demais hepatopatias esta relação costuma ser menor que 1, exceto quando o doente
desenvolve cirrose, momento em que a relação AST/ALT fica ≥ 2 (independentemente da causa básica da hepatopatia).
A explicação para esta peculiaridade da Doença Hepática Alcoólica (DHA) é a seguinte: alcoólatras desnutridos e portadores de DHA costumam ter deficiência hepática de piridoxal-5-fosfato, o que reduz a atividade enzimática da ALT. Como os testes que “dosam” enzimas hepáticas na realidade avaliam a atividade dessas enzimas, os valores de ALT tornam-se consequentemente muito reduzidos na carência de seu cofator. O piridoxal-5-fosfato, por outro lado, não é cofator para a atividade da AST, logo, seus níveis
são mantidos (afirmativa I certa). A plaquetopenia é achado esperado nas hepatopatias avançadas já complicadas com cirrose (neste contexto as plaquetas caem devido ao hiperesplenismo). No entanto, novamente na DHA as plaquetas podem cair mesmo em fases mais precoces, e a explicação é o efeito mielotóxico do álcool, que reduz a síntese de plaquetas na medula óssea, assim como pode provocar anemia macrocítica (afirmativa II errada). Alguns dos estigmas vasculares da cirrose hepática (como aranhas
vasculares e eritema palmar) possuem o mesmo mecanismo fisiopatogênico: o hiperestrogenismo (o excesso de estrogênio exerce efeito vasodilatador). Logo, a afirmativa III não faz sentido, pois quem faz aranhas vasculares faz também o eritema palmar.
Resposta certa: A.
13 – Paciente de 54 anos apresenta 2 semanas de evolução de dor em hipocôndrio direito, icterícia, colúria e mal-estar geral. História de tabagismo e etilismo pesados. Ao exame, apresenta-se confuso, com flapping, dor à palpação de hipocôndrio direito, hepatomegalia e macicez móvel. Bilirrubinas totais = 15,2 mg/dl, bilirrubina direta = 11,3 mg/dl, AST = 245 U/L, ALT = 102 U/L, gama GT = 142 U/L. Realizou ultrassonografia de abdome que não evidenciou sinais de obstrução extra-hepática. Considerando a hipótese diagnóstica mais provável, é CORRETO afirmar que:
a) O uso de inibidor do TNF como a pentoxifilina pode ser
útil em casos severos da doença.
b) O paciente apresenta falência hepática fulminante e é
candidato a transplante imediato do fígado.
c) Anticorpos monoclonais que neutralizam o TNF podem
ser utilizados como tratamento de segunda linha.
d) O uso de corticosteroides deve ser evitado em casos
severos da doença pelo risco aumentado de morte.
e) Mesmo casos severos têm baixa mortalidade com abstinência alcoólica.
Este paciente apresenta um quadro muito sugestivo de hepatite alcoólica grave.
Perceba que ele tem:
1) História de etilismo pesado.
2) Hepatite aguda (hepatomegalia dolorosa há 2 semanas, acompanhada de icterícia e aumento de aminotransferases, que apresentam a típica relação AST/ALT > 2, aumento de GGT).
3) Sinais de falência hepática, como encefalopatia hepática (confusão + flapping) e ascite.
Como abordar estes casos? Bem, em primeiro lugar, que
fique clara a contraindicação ao transplante de fígado:
para poder realizar o transplante é pré-requisito manter
abstinência alcoólica por pelo menos 6 meses (sabemos
que a hepatite alcoólica aguda é deflagrada pela ingestão de bebidas alcoólicas, logo, este paciente deve ter bebido nas últimas semanas) - B ERRADA.
Em segundo lugar, vamos relembrar que a taxa de mortalidade da hepatite alcoólica aguda é alta, mesmo com o tratamento adequado, que inclui suporte nutricional, corticoterapia e abstinência alcoólica (cerca de 34% nos primeiros meses, com 20% no primeiro mês) - E ERRADA.
A letra D está ERRADA porque a base do tratamento farmacológico é a corticoterapia, indicada para os pacientes com índice de função discriminante de Maddrey > 32 ou franca encefalopatia hepática (a droga de escolha é a prednisolona 32 mg/dia VO). O uso de anticorpos monoclonais contra o TNF-alfa (ex.: infliximabe) apresenta resultados desapontadores, não sendo indicado na prática (C ERRADA). A única droga que pode substituir o corticoide em pacientes com hepatite alcoólica grave e intolerância ou contraindicação ao tratamento padrão é a pentoxifilina, cujo mecanismo de ação parece envolver, entre outros fatores, a diminuição dos níveis de TNF-alfa.
Resposta certa: A.
14 – Com relação às doenças hepáticas, assinale a
INCORRETA:
a) A doença de Wilson é um distúrbio no metabolismo do
cobre de origem genética.
b) A lesão hepática por acetaminofeno parece ter efeito
dose-resposta nítido e mais raramente é idiossincrática.
c) A hepatite autoimune tende a ser mais grave no início
do que as hepatites B ou C crônicas, geralmente progressivas, e leva à doença terminal se não tratada com
imunossupressores.
d) Os pacientes com hepatite B crônica típica têm HBsAg,
HBeAg, DNA do VHB, HBcAg no fígado positivos.
e) A tomografia computadorizada é mais sensível que a
ultrassonografia para detecção de esteatose hepática.
Vamos analisar as alternativas dessa questão separadamente:
a) A doença de Wilson consiste em uma desordem autossômica recessiva que resulta da mutação do gene ATP7B, localizado no cromossomo 13, responsável pela codificação de uma proteína transportadora de cobre. Esta mutação leva a um comprometimento da incorporação do cobre à apoceruloplasmina e da excreção de cobre na bile, ocasionando o acúmulo
de cobre dentro dos hepatócitos (CORRETA).
b) A lesão hepática pelo acetaminofeno (paracetamol) ocorre, basicamente, por um efeito tóxico direto da droga sobre o hepatócito, estando diretamente relacionada à dose ingerida. No entanto, acredita-se que pacientes etilistas crônicos estão sob risco de lesão hepática pelo acetaminofeno após repetidas doses terapêuticas, o que denotaria a presença de um componente idiossincrático (CORRETA).
c) A hepatite autoimune realmente costuma evoluir mais
rapidamente do que as hepatites virais crônicas, levando à doença hepática terminal, caso não seja identificada e tratada adequadamente (CORRETA).
d) Pacientes com hepatite B crônica em fase replicativa terão um HBsAg positivo (por mais de 6 meses), HBeAg positivo (marcador de replicação), DNA do VHB positivo e também um anti-HBc IgG positivo (vale lembrar que o HBcAg não é detectável no soro) (CORRETA).
e) A ultrassonografia apresenta uma sensibilidade superior em relação à tomografia do abdome para a avaliação diagnóstica da esteatose hepática (INCORRETA).
Resposta: letra E.
15 – Dentre os fármacos abaixo, qual é o que tem um
efeito tóxico direto sobre os hepatócitos?
a) Paracetamol.
b) Clorpromazina.
c) Halotano.
d) Isoniazida.
e) Rosuvastatina.
Doses tóxicas de acetaminofeno (ou paracetamol, como é mais conhecido no Brasil), induzem a saturação das vias bioquímicas de sulfatação e glicuronidação da droga, desviando grande quantidade do medicamento que assim passa a ser metabolizado pelo citocromo P450 CYP2E1, formando NADPQI em excesso. Quando os estoques do glutation são depletados em aproximadamente 70%, o NADPQI começa a reagir com os constituintes celulares, provocando injúria hepática
direta. As demais drogas citadas nas opções de B a E são hepatotóxicas, mas o mecanismo de hepatotoxicidade é semelhante ao observado nas hepatites virais, ou seja, inflamação hepática imunomediada, mas sem efeito tóxico direto da droga sobre o hepatócito.
Resposta certa: A.
16 – Na doença de Wilson:
a) O sinal do anel de Kayser-Fleischer é patognomônico e quando presente indica comprometimento neurológico.
b) A presença de sintomas psiquiátricos é rara e, quando
presentes, devem indicar uma gravidade maior da doença, com pior prognóstico.
c) O acúmulo de ferro está presente nos gânglios da base,
levando a sintomas parkinsonianos e sendo responsável
também pelo comportamento hepático.
d) O comprometimento sistêmico de rins, ossos, coração
e glândulas antecede os sintomas neurológicos e hepáticos em até cinco anos.
Vamos analisar as afirmativas
sobre a doença de Wilson e determinar qual está
CORRETA:
a) Aproximadamente 98% dos pacientes com
manifestações neurológicas da doença de Wilson possuem os chamados anéis de Kayser-Fleischer (depósitos de cobre na membrana de Descemet da córnea), sendo este patognomônico desta desordem (CORRETA).
b) As manifestações psiquiátricas não são infrequentes, sendo mais comumente observadas nos pacientes com doença neurológica do que naqueles com comprometimento hepático. A depressão, por exemplo, chega a estar presente em 20–30% dos pacientes! Vale lembrar, que as manifestações psiquiátricas podem, inclusive, anteceder o reconhecimento da doença hepática e neurológica (INCORRETA).
c) Na doença de Wilson temos acúmulo de COBRE e
não de ferro! (INCORRETA). d) O comprometimento sistêmico de rins, ossos, coração e glândulas, costuma ocorrer numa fase mais tardia da doença, na qual as manifestações hepáticas e neurológicas já encontram-se presente (INCORRETA).
Letra A: CORRETA.
17 – Paciente do sexo masculino, de 42 anos, dá entrada em pronto-socorro apresentando icterícia há três dias, prurido generalizado, dor e desconforto abdominal, edema de MMII e, nas últimas 24 horas, desenvolvimento de quadro de bradilalia e agitação psicomotora. Familiares relataram antecedente de uso de drogas endovenosas e ingesta de cerca de 200 gramas de etanol/dia há 20 anos. Exames laboratoriais
mostraram: Hb = 11,2; leucócitos totais = 16.800;
plaquetas = 105.000; bilirrubina total = 9,8 (BD = 6,0);
AST = 510; ALT = 80; gama GT = 1.240; anti-HCV negativo; anti-HIV negativo; anti-HAV IgG reagente; HBsAG negativo; anti-HBc IgG reagente; anti-HBs > 1.000. Qual é a principal hipótese diagnóstica e qual a medicação recomendada?
a) Hepatite A aguda e interferon peguilado.
b) Hepatite B crônica agudizada e lamivudina.
c) Colestase extra-hepática e ácido ursodesoxicólico.
d) Hepatite alcoólica e corticosteroide.
Temos aqui um paciente com icterícia à custa da fração direta e aumento de aminotransferases com AST > ALT. Considerando ainda a importante história etílica (com elevação de gama GT revelando a manutenção do hábito) e a sorologia negativa para hepatites virais agudas ou crônicas (apenas contato prévio com vírus A e B), a hipótese que se impõe é a de hepatite alcoólica.
Neste caso, fica indicado o tratamento com corticosteroides para aqueles com índice de função discriminante (Maddrey) acima de 32 ou encefalopatia.
Resposta: letra D.
18 – Paciente de 15 anos, do sexo masculino, se apresenta ao médico com icterícia, emagrecimento discreto e astenia. Exames mostram bilirrubina total de 5 mg/dl, à custa de bilirrubina direta, aminotransferases em torno de 1.000 UI/ml e discreta esplenomegalia. Seus exames mostram anticorpos contra hepatite A classe IgG positivos, antígeno de superfície da hepatite B negativo, anticorpos contra hepatite C negativos, FAN positivo 1:320 padrão pontilhado fino, albumina de 3,6 mg/dl, globulinas de 4,7, gamaglobulina de 3,2. Anticorpos antimúsculo liso e antimitocôndria negativos. Biópsia hepática mostra fibrose em ponte, esboçando nódulos e infiltrado inflamatório linfoplasmocitário portal e periportal invadindo a placa limitante. O provável diagnóstico é:
a) Hepatite A aguda.
b) Hepatite autoimune.
c) Hepatite C aguda no período de “janela imunológica”.
d) Cirrose biliar primária.
Diante de um paciente jovem com quadro de hepatite (aminotransferases em torno de 1.000 + hiperbilirrubinemia) com FAN positivo, hipergamaglobulinemia e biópsia hepática mostrando fibrose em ponte esboçando nódulos e infiltrado inflamatório linfoplasmocitário PORTAL E PERIPORTAL invadindo a placa limitante, a principal hipótese diagnóstica — dado o conjunto de características típicas — é de HEPATITE AUTOIMUNE! A presença de um IgG positivo para hepatite A é compatível com imunidade (vacinal ou infecção prévia), o que descarta a letra A. Já a hepatite C aguda não costuma cursar dessa forma tão exuberante, o que torna a letra C muito pouco provável. Para finalizar, a colangite biliar primária é uma doença que acomete geralmente mulheres com mais de 40 anos, e se caracteriza clinicamente e laboratorialmente pela presença de colestase, sendo o autoanticorpo antimitocôndria presente em 95% dos casos.
Alternativa B: CORRETA.
19 – Em relação à hemossiderose, é CORRETO afirmar que:
a) Há depósito de ferro, com dano tecidual, em diversos
órgãos e estruturas, incluindo coração e suprarrenais.
b) Há depósito de ferro, sem dano tecidual, no sistema
reticuloendotelial.
c) Há um defeito congênito na mucosa intestinal, com aumento na absorção do ferro ingerido.
d) Manifesta-se clinicamente na quarta ou quinta década
da vida.
Parece ter havido um erro de digitação no enunciado. Todo mundo viu esse erro, menos a banca examinadora do Revalida! Veja bem: a hemocromatose é um distúrbio genético da absorção intestinal de ferro, que faz com que um excesso de ferro seja constantemente
absorvido. Como não existe uma via natural para a eliminação de ferro no organismo, o resultado é que
todo aquele ferro absorvido por esses doentes se acumula dentro do corpo, causando lesão em diversos órgãos e tecidos. Estruturas como coração, pâncreas, suprarrenais e órgãos do sistema reticuloendotelial (ex.: fígado, baço) acabam sendo lesadas. As manifestações, no entanto, tendem a aparecer de forma relativamente tardia, por volta da quarta ou quinta década de vida, quando o acúmulo de ferro foi grande o suficiente para provocar lesões graves e irreversíveis. Logo, todas as opções estão CORRETAS exceto a letra B (gabarito oficial), o que nos faz pensar que talvez o autor quisesse perguntar qual a opção INCORRETA.
No entanto, não houve anulação após os pedidos de recurso! Lamentável.
20 – Com relação ao tratamento de um paciente com hepatite alcoólica aguda, assinale a alternativa INCORRETA:
a) O uso de prednisolona mostrou-se capaz de reduzir a
mortalidade em pacientes com função discriminante de
Maddrey acima de 32.
b) O uso de pentoxifilina reduz a incidência de síndrome
hepatorrenal, e, consequentemente, a mortalidade, em
pacientes com formas graves da doença.
c) O transplante hepático é modalidade terapêutica de indicação controversa nesses casos, pois não obedece ao
período mínimo de seis meses de abstinência alcoólica
usualmente exigido.
d) Caso não ocorra resposta significativa após uma semana de terapia com prednisolona, seu uso deve ser interrompido.
e) A N-acetilcisteína tem-se mostrado superior à terapia padrão com corticoides na redução da mortalidade, por desencadear menos frequentemente complicações infecciosas.
O tratamento da hepatite alcoólica aguda possui algumas particularidades que são frequentemente
abordadas nas provas de residência médica, sendo a indicação do início da corticoterapia o tópico mais
cobrado. O escore de Maddrey é usado para estimar a
gravidade e predizer a mortalidade de um paciente com
hepatite alcoólica, empregando duas variáveis em seu
cálculo: bilirrubina e tempo de protrombina. Atualmente,
o tratamento farmacológico com prednisolona (32 mg VO por 1 mês, seguido de desmame progressivo) é reservado para pacientes com hepatite alcoólica grave, definida por um Maddrey ≥ 32. Uma alternativa ao uso da prednisolona, seria a pentoxifilina, que apesar de ser inferior à prednisolona (basicamente por possuir menos evidências que apoiem o seu uso), estaria indicada para os pacientes com doença grave e contraindicação ao uso de corticoides sistêmicos, como naqueles com risco aumentado de sepse. A pentoxifilina reduz a ocorrência de síndrome hepatorrenal, mas uma metanálise recente coloca em dúvida o seu impacto na redução de mortalidade. Após o início do tratamento farmacológico (com prednisolona ou pentoxifilina), caso não haja resposta após uma semana, o mesmo deve ser suspenso. O uso de N-acetilcisteína associado à prednisolona vem sendo estudado na abordagem
terapêutica dos pacientes com hepatite alcoólica
grave, no entanto, até o momento, não existem evidências que mostrem uma superioridade desta associação em relação à prednisolona isolada! Sabemos que os pacientes que não respondem ao tratamento farmacológico teriam como única chance a realização de um transplante, o que acaba desencadeando um dilema ético: como a hepatite
alcoólica aguda implica em um abuso recente de álcool,
por definição, esses pacientes não se tornam elegíveis
para o transplante (para receber um transplante hepático é preciso estar sem beber há pelo menos 6 meses).
Apesar da letra B não estar “completamente” CORRETA, visto que a redução na mortalidade com uso de pentoxifilina não é tão comprovada, vamos ficar com a letra E!
21 – Considere o caso: homem, com 18 anos de idade,
apresenta disartria, distonia, movimentos coreiformes,
marcha anormal, irritabilidade, alternância de depressão
e de ansiedade, hepatomegalia, sinais de hepatopatia crônica e presença de anéis de Kayser-Fleischer na córnea ao exame oftalmológico com lâmpada de fenda. O diagnóstico etiológico mais provável é:
a) Hemocromatose.
b) Tirosinemia.
c) Porfiria intermitente aguda.
d) Galactosemia.
e) Doença de Wilson.
Vamos lá: Quadro neuropsiquiátrico associado à hepatopatia em paciente jovem sempre tem que nos fazer pensar em doença de Wilson. Trata-se de uma doença genética de caráter autossômico recessivo,
diagnosticada em geral entre 5 e 30 anos de idade.
Devido aos baixos níveis de ceruloplasmina há elevação do cobre circulante, ocasionando o acúmulo deste elemento no sistema nervoso central, fígado e outros órgãos. Os anéis de Kayser-Fleischer são uma expressão deste depósito na membrana de Descemet da córnea, altamente sugestiva da doença. Não há outro diagnóstico no caso exposto. Fechamos o diagnóstico pela presença de anéis de Kayser-Fleischer + concentração de ceruloplasmina sérica < 20 mg/dl ou concentração de ceruloplasmina sérica < 20 mg/dl + concentração de cobre > 250 mcg/kg de peso seco em amostra de biópsia hepática.
Resposta: E.
22 – Em um doente de 15 anos com comprometimento
neurológico múltiplo, cujo exame ocular revela a existência do anel de Kayser-Fleischer, o diagnóstico que se impõe é o da doença de:
a) Graves.
b) Behçet
c) Wilson.
d) Alzheimer.
Os anéis de Kayser-Fleischer são formados por depósito granular de cobre na membrana de Descemet na córnea. Além disso, são caracterizados por formação anelar acastanhada ou verde-dourada em torno da íris. Dessa forma, são altamente sugestivos de doença de Wilson, mas não são específicos. Na presença de quadro neurológico ou psiquiátrico, são fortemente
indicativos de doença de Wilson, já que precedem esse
tipo de sintomas em virtualmente todos os pacientes com a doença. Pode ser utilizado como critério para firmar o diagnóstico em associação à concentração sérica de ceruloplasmina inferior a 20 mg/dl, sem a necessidade de realização de biópsia hepática. Portanto, resposta CORRETA, letra C.
23 – A.S.S., sexo masculino, 36 anos, ictérico há 5 dias,
tem exame físico normal e seus exames mostram os seguintes dados: Hb = 11,5 g/dl; leucograma = 36 x 10 (elevado a nove)/L; VCM = 106; vitamina B12 normal, assim
como taxa de folatos e gama GT de 250 UI, sem soropositividade para hepatite A, B ou C. Assinale a alternativa que apresenta o diagnóstico mais provável nesse caso:
a) Hepatite medicamentosa. d) Ascite.
b) Hepatite alcoólica. e) Pancreatite.
c) Icterícia colestática.
Temos um homem jovem, que se apresenta agudamente com icterícia; seu laboratório mostra uma reação leucemoide (36.000 leucócitos), uma
macrocitose discreta e elevação da gama GT. Então, vamos por partes. Em primeiro lugar, diante de uma icterícia de início agudo em um paciente jovem, sem outros sintomas que nos direcionem para uma determinada etiologia, temos que pensar em hepatite como nossa principal hipótese diagnóstica. Mas qual seria a etiologia desta hepatite? Podemos ver que nosso paciente possui marcadores virais negativos, o que torna a hepatite viral muito pouco provável.
Além disso, temos que lembrar que tanto a macrocitose
(na presença de níveis normais de folato e vitamina B12), quanto a elevação da gama GT (na ausência de aumento das demais enzimas de colestase), funcionam com indicadores indiretos de consumo crônico de álcool. Logo, a hepatite alcoólica deve figurar como nossa principal hipótese neste caso. Em tal contexto é válido lembrar que a leucocitose é muito comum, sendo geralmente moderada (< 20.000), podendo, no entanto, atingir valores compatíveis com reação leucemoide, o que inclusive confere um pior prognóstico ao paciente. Alternativa B CORRETA.
24 – Homem de 45 anos, assintomático, procura atendimento médico de rotina para exames preventivos, negando qualquer antecedente prévio, vícios e obesidade. Exame físico normal e exames complementares mostram: ultrassom do abdome com laudo sugestivo de esteatose hepática; TGO: 92 U/L; TGP: 76 U/L; gama GT: 26 U/L; bilirrubina total: 1,02 mg/dl; coagulograma normal; colesterol total: 196 mg/dl; triglicérides: 148 mg/dl; ferritina: 648 ng/ml. Qual é o diagnóstico mais provável desse paciente?
a) Esteatose hepática secundária à dislipidemia.
b) Hepatopatia crônica secundária ao vírus C.
c) Cirrose biliar primária.
d) Doença de Wilson.
e) Hemocromatose hereditária.
Este paciente de meia-idade apresenta ferritina bem acima do limite de normalidade, que é 200 ng/ml. Embora o laudo ultrassonográfico sugira esteatose, observe que o lipidograma é normal, o que fala contra esta condição. Sabemos que a esteatose pode levar ao aumento discreto da ferritina, porém, é realmente improvável que um paciente com lipidograma tão “inocente” apresente esteatose. Face ao exposto,
qual outra hepatopatia cursaria com aumento da ferritina sérica? A hemocromatose . A maioria dos pacientes sintomáticos têm entre 40 e 50 anos, e o início da doença é insidioso e caracterizado por sintomas inespecíficos (astenia, letargia, fadiga, artralgias, perda da libido ou impotência sexual entre os homens e amenorreia entre as mulheres). Hepatomegalia é a regra, presente em cerca de 95% dos pacientes sintomáticos e, geralmente, precede o desenvolvimento de sintomas ou alterações dos testes de função hepática. Após a suspeita diagnóstica, a confirmação da hemocromatose hereditária geralmente se inicia a partir da medida do IST e dos níveis de ferritina. IST > 45% e/ou ferritina elevada direcionam para realização de testes genéticos, sendo os genótipos C282Y +/+; C282Y/H63D e H63D+/+ os mais sugestivos e idealmente confirmados pela biópsia hepática.
25 – Com relação ao tratamento da hepatopatia alcoólica,
é INCORRETO afirmar que:
a) Mulheres com encefalopatia alcoólica são candidatas
ao uso de glicocorticoides.
b) Os glicocorticoides são indicados quando há sangramento gastrointestinal.
c) A abstinência ao álcool constitui o alicerce no tratamento.
d) A pentoxifilina é útil, determinando maior sobrevida.
A hepatite alcoólica pode se manifestar como um quadro assintomático identificado por anormalidades
das aminotransferases ou como um episódio
agudo de dor abdominal, náuseas, vômitos e febre.
Uma relação AST > ALT sugere hepatopatia alcoólica,
e quando AST/ALT > 2 há uma chance de 95% da hepatite ser devida ao álcool (isto é, trata-se de um achado bastante específico). O aumento de aminotransferases, em geral, é modesto, com valores menores que 300 U/L, e, quando os valores superam 500 U/L, outra causa deve ser procurada, como a doença viral e a isquêmica. A leucocitose é característica desses pacientes, incluindo desvio
para a esquerda e febre de até 39°C e pode aparecer sem infecção associada. O manejo inclui as seguintes medidas:
- A abstinência ao álcool, como a base do tratamento,
deve-se tratar os sintomas relacionados à síndrome
de abstinência.
- Manutenção do estado nutricional no
paciente com alteração do nível de consciência: introduzir dieta por via enteral.
- A gravidade pode ser estimada pelo Índice de Maddrey (IM): 4,6x (TP do paciente em segundos
- TP do controle em segundos) + bilirrubina total. Quando esse índice é superior a 32, podemos utilizar os corticosteroides e a pentoxifilina. Ambos os agentes são conhecidos por inibir a produção ou as atividades das citocinas pró-inflamatórias, bem como reduzir a mortalidade aguda em cerca de 50% dos pacientes.
O uso de corticosteroides seria especialmente útil nos
pacientes do sexo feminino e com encefalopatia, mas sem infecção, hemorragia, insuficiência renal ou pancreatite, o que limita a indicação.
Resposta: letra B.
26 – Uma mulher de 50 anos de idade vai a uma clínica
devido a testes hepáticos anormais. Ao exame físico: estatura - 160 cm; peso - 107 kg e índice de massa corporal de 43 kg/m². Relata excesso de peso durante a maioria de sua vida e nega uso de álcool. Foi diagnosticado diabetes mellitus insulinodependente. Exames laboratoriais: albumina - 3,5 g/dl; bilirrubina - 0,9 mg/dl; fosfatase alcalina - 148 U/L; AST - 99 U/L; ALT - 72 U/L; e gama GT - 359 U/L. Níveis de glicose variam de 110 a 260 mg/dl. Testes sorológicos para vírus negativos. Ultrassom de fígado - esteatose grau II. Assinale a alternativa INCORRETA:
a) Elevações de enzimas hepáticas devem ser investigadas, principalmente na ausência de doença hepática prévia, uso abusivo de álcool e medicamentos.
b) No caso da paciente acima, a obesidade e o diabetes
podem estar contribuindo no quadro de esteato-hepatite apresentada pela paciente.
c) A existência de uma entidade nosológica Esteato-Hepatite Não Alcoólica (NASH) pode ser diagnosticada na paciente acima, muito embora seja uma doença de exclusão.
d) Os achados histológicos de esteatose, infiltrado celular polimorfonuclear, necrose e fibrose na biópsia hepática, levam ao diagnóstico de NASH.
e) A redução de peso, o controle do diabetes, o tratamento da hiperlipidemia e a atividade física aeróbica, mostraram ser mais eficazes que o uso de medicamentos como o ácido ursodesoxicólico na redução das enzimas e na progressão para a cirrose.
Sabe por que a letra D está INCORRETA? Para CONFIRMAR o diagnóstico de NASH (esteato-hepatite não alcoólica ) é preciso obedecer a 3 requisitos:
(1) demonstrar a existência de esteatose hepática em exames de imagem ou na biópsia;
(2) excluir consumo significativo de álcool;
(3) excluir outras causas possíveis de esteatose (ex.: hepatite A, B, hemocromatose e hepatite autoimune).
Logo, a letra D – do modo como foi escrita – está absolutamente INCOMPLETA, pois não respeita o último
requisito que listamos. As demais estão CORRETAS e são conceituais.
Resposta certa: D.
27 – Assinale a alternativa INCORRETA em relação à hepatotoxicidade por fármacos:
a) As estatinas podem causar alterações discretas nas
aminotransferases, porém seu uso não é contraindicado
na doença hepática crônica.
b) A hepatotoxicidade do acetaminofeno tem caráter idiossincrásico.
c) A amiodarona está associada ao desenvolvimento de
esteatose macrovesicular.
d) A hepatotoxicidade de padrão colestático apresenta
maior risco para desenvolvimento de doença hepática crônica do que a de padrão hepatocelular.
e) O uso de anticoncepcionais orais está associado ao
desenvolvimento de neoplasias hepáticas benignas.
O termo “idiossincrasia” se refere a reações maléficas INESPERADAS e IMPREVISÍVEIS após exposição a determinado fármaco ou substância. Sabemos que a hepatotoxicidade do acetaminofeno é absolutamente previsível e esperada em função da dose ministrada. Logo, não há idiossincrasia nenhuma nesta que é justamente uma das principais formas de hepatotoxicidade encontradas na prática. As demais estão CORRETAS:
(1) um dos principais paraefeitos das estatinas é um discreto aumento das aminotransferases, que em geral não contraindica seu uso;
(2) a amiodarona pode afetar o fígado causando esteatose macrovesicular;
(3) as colestases intra-hepáticas costumam ter maior risco de hepatopatia crônica do que as lesões necroinflamatórias de padrão “hepatocelular”;
(4) os ACO se associam fortemente ao adenoma hepatocelular, uma neoplasia benigna primária do fígado que tem risco de crescer e romper com a exposição continuada ao hormônio.
Resposta certa: B.
28 – Paciente feminina, 35 anos, vem à consulta por ter
sido evidenciado em ecografia abdominal total um fígado
aumentado de tamanho e com infiltrado gorduroso. Exames realizados a seguir demonstraram tratar-se de esteato-hepatite não alcoólica. Dentre as afirmações abaixo, qual está CORRETA sobre este caso?
a) Aminotransferases séricas estão em geral elevadas
acima de dez vezes o valor de referência.
b) Mantém associação com o diabete melito tipo 2.
c) Se o paciente for obeso e com níveis acentuados de
bilirrubinas, pode acelerar a progressão para cirrose.
d) O uso de prednisolona 40 mg ao dia está indicado.
A esteato-hepatite não alcoólica é uma doença metabólica, sem indicação de corticoterapia em doses anti-inflamatórias (D errada).
Não há uma relação de “aceleração” da progressão para cirrose em função dos níveis de bilirrubina, ainda que quanto mais obeso for o paciente maior será o risco de dano hepático grave e cirrose (C errada).
As aminotransferases encontram-se cronicamente elevadas nessa doente e costumam ter comportamento “flutuante”, porém, tal aumento em geral fica entre 2-3x o LSN, e não > 10x, o que sugere outros diagnósticos como lesão hepática tóxica, hepatite viral ou isquemia (A errada).
Enfim, a grande causa da EHNA é a síndrome metabólica e, de um modo geral, esses pacientes também apresentam DM 2. Resposta certa: B.
29 – Mulher de 25 anos está em tratamento para acne com um retinoide (isotretinoína). Relata atividade sexual com 6 parceiros nos últimos 6 meses, sem preservativos. Não tem quaisquer sintomas. Ao exame físico apresenta – além de acne de face e tronco – teleangectasias esparsas, fígado palpável 3 cm abaixo do rebordo costal e discreta icterícia. Apresenta os seguintes exames: TGO = 950 U/L (normal até 40 U/L); TGP = 1.100 U/L (normal até 30 U/L); fosfatase alcalina = 80 (normal até 140 U/L); gamaglutamiltransferase
= 30 (normal < 36 U/L); proteína total = 10 g/dl; albumina
= 3,5 g/dl; alfa-1-globulina = 0,3 g/dl; alfa-2-globulina =
0,6 g/dl; betaglobulina = 1,2 g/dl; gamaglobulina = 4,4 g/dl (normal até 1,6 g/dl); fator antinuclear positivo 1:320 (padrão pontilhado fino); Anti-Sm, Anti-Ro, Anti-DNA, Anti-La, Antimúsculo liso negativos; bilirrubina total = 2,5 mg/dl (normal até 1,2 mg/dl); bilirrubina direta = 1,8 mg/dl; anti-HCV e RIBA (Recombinant Immunoblot Assay ) para HCV positivos; PCR para detecção de HCV negativo. HBsAG e anti-HBc total negativos. Após isso, foi solicitada biópsia hepática que evidenciou hepatite de interface. Qual o diagnóstico dessa paciente?
a) Hepatite autoimune.
b) Hepatite medicamentosa.
c) Hepatite crônica por vírus C.
d) Lúpus eritematoso sistêmico.
Mulher jovem com quadro de lesão hepatocelular (transaminases muito elevadas, enzimas de colestase tocadas), com FAN positivo, hipergamaglobulinemia
e histologia mostrando hepatite de interface, sugere
o diagnóstico de HEPATITE AUTOIMUNE! Um detalhe a
ser ressaltado é que a hepatite autoimune pode desencadear o que chamamos de “desarranjo imunológico”, podendo causar falsa positividade para algumas sorologias, como por exemplo, para hepatite C! CONTUDO, não é o caso da nossa paciente, pois a positividade para o RIBA (na presença de um RNA HCV negativo) é compatível com infecção prévia pelo vírus C, e não com resultado falso-positivo do anti-HCV. O mais importante para afastarmos a hepatite C crônica, neste caso, é que além do fato dos exames laboratoriais serem sugestivos de hepatite aguda, o HCV-RNA encontra-se negativo, o que torna uma hepatite C em atividade muito pouco provável. Em relação ao LES, a paciente em questão não apresenta critérios que permitam o seu diagnóstico.
Logo, resposta CORRETA: letra A.
30 – Cite o CORRETO dos abaixo que indica doença hepática por abuso de álcool: a) Relação TGO:TGP = 2.1. b) Baixos níveis de ureia. c) Glicemia alta acima de 140 mg. d) Trombocitose. e) Microcitose das hemácias.
Veja bem: é típico da doença hepática alcoólica uma relação AST/ALT ≥ 2. Cada uma dessas enzimas costuma estar elevada em até 5-7 vezes o LSN, geralmente não ultrapassando a marca de 400 U/l.
No entanto, quase sempre quem aumenta mais é a
AST (TGO), habitualmente o dobro do aumento da ALT
(TGP). Na doença hepática alcoólica, costuma coexistir
um estado de resistência periférica à insulina, justificando quadros disglicêmicos. Em geral, a hiperglicemia configura um quadro de glicemia de jejum alterada (glicose entre 100-125) ou intolerância à glicose (glicemia entre 140-180 após teste oral de tolerância). Franco diabetes mellitus não é característico deste cenário! Vale lembrar, ainda, que na doença hepática alcoólica avançada (com cirrose e falência hepática) o mais esperado é a ocorrência de hipoglicemia, pelo deficit metabólico do fígado doente. A banca deu como gabarito para essa questão a letra C, mas, a nosso ver, a melhor resposta aqui seria a letra A.
31 – Mulher, 54 anos, queixa-se de prurido e fadiga há alguns anos. Passou a apresentar icterícia discreta, xantelasmas, equimoses e dores ósseas. Ao exame físico apresenta hepatoesplenomegalia e a pesquisa de anticorpos antimitocondriais é positiva. Qual o diagnóstico mais provável?
a) Cirrose biliar primária.
b) Hemocromatose.
c) Esclerodermia.
d) Hepatite autoimune.
e) Hepatite C.
O anticorpo antimitocôndria positivo encerra 95% de especificidade para colangite biliar primária e este achado já deveria suscitar o diagnóstico desta condição.
Os achados clínicos da paciente, incluindo sexo e idade, com os xantelasmas e a hepatoesplenomegalia, corroboram a presença da doença. É doença autoimune, como vocês já devem ter suspeitado pela presença do autoanticorpo, caracterizada por um ataque autoimune aos pequenos ductos biliares, mediado por células T. O tratamento baseia-se no
controle das complicações (por exemplo, disabsorção de gorduras) e retardar a progressão da doença (com ácido ursodesoxicólico).
Resposta certa: letra A.
32 – Doença de Wilson está associada a distúrbio no metabolismo do (a):
a) Ferro.
b) Zinco.
c) Glicogênio-6-fosfatase.
d) Cobre.
e) Alfa-1-antitripsina.
A doença de Wilson, causada por um distúrbio metabólico que desencadeia formas hepática
e neuropsiquiátrica, é rastreada pela dosagem de ceruloplasmina, molécula transportadora do COBRE! Dentro dessa condição, a ceruloplasmina estará baixa no sangue e, se somada a um dos seguintes, sela o diagnóstico: fração livre do cobre elevada, cobre urinário alto e anel de Kayser-Fleischer. A biópsia hepática também pode ser realizada. O tratamento é feito com quelantes de cobre.
Resposta certa: letra D.