Hemoglobinopatias - 18m Flashcards
Qual a genética envolvida na gênese da doença falcêmica?
São 2 genes que codificam a globina beta das Hbs, havendo uma codominância. Quando a pessoa apresenta os genes beta normais, a Hb produzida é a HbA. Quando apresenta ambos os genes com betaS (“sickle”), ou seja, homozigoto SS, há a produçção de HbS SEM PRODUZIR HbA. Quando há heterozigose S, ou seja, apenas 1 gene betaS e 1 beta normal, são produzidas HbS e HbA.
Quais os espectros clínicos da doença falcêmica?
Anemia falciforme: quadro grave, homozigoto SS, ausência de produção de HbA (apenas HbS, HbA2 e HbF). Traço falcêmico: quadro leve, bom prognóstico, proteção contra malária, heterozigoto S, produção de HbS e HbA (além da HbA2 e HbF).
Como são produzidas as HbA2 e HbF?
HbA2: 2 cadeias alfa e 2 deltas. HbF: 2 alfa e 2 gamas - são produzidas até os 6m e são mais fáceis de produzir do que a HbA2.
Quais as características da HbS que promovem a fisiopatogenia da doença falcêmica?
A HbS possui baixa solubilidade (maior hidrofobicidade), fazendo com que ela se polimerize mais facilmente (afoiçando a hc e diminuindo sua deformabilidade). Essa polimerização é precipitada pela hipóxia (a forma HbS-desoxigenada é a que precipita), acidez (efeito Bohr - diminui afinidade da Hb pelo O2 - mais HbS-desox) e a desidratação celular. Além disso, a HbS apresenta instabilidade moelcular, favorecendo a oxidação das estruturas da hc.
Qual a relação das outras Hbs com a HbS?
A presença de outras Hbs dentro da hc diminuem a capacidade da HbS em se polimerizar, pois diminui a desoxigenação dela. Isso é especialmente importante no caso da HbF, em que essas Hbs possuem alta afinidade pelo O2 e permitem as HbS se manterem oxigenadas pela maior quantidade de O2 atraída pela HbF. Ou seja, as outras hbs (especialmente a HbF) são protetoras para a polimerização da HbS.
É possível reverter o afoiçamento das hcs? Explique.
Sim, uma vez corrigida a condição que promoveu a polimerização e o afoiçamento (hipóxia, acidose e/ou desidratação), a célula pode retornar a seu formato normal. Após um certo período, a hc se torna irreversivelmente em forma de foice.
Quais as consequências das modificações da HbS para a hemácia?
Além do afoiçamento dela, a produção constante de radicais livres (mesmo pelas hcs NÃO polimerizadas, mas com HbS) promove estresse oxidativo intracelular constante, promovendo alterações de MP (explica a irreversibilidade do afoiçamento após 15 dias), lise osmótica ou mecânica intravascular, desidratação celular e modificações antigênicas na MP (lesão endotelial, resposta inflamatória e destruição pelo baço).
Quais as consequências da HbS e das hcs com HbS para o organismo?
As hcs com HbS são “agentes do caos”: 1) Hemólise (intra e extravascular). 2) Disfunção endotelial. 3) Inflamação crônica (o falcêmico é constantemente inflamado). 4) Fenômenos vaso-oclusivos.
Onde e por que ocorre a hemólise na anemia falciforma (AF)?
Extravascular (2/3): presença de moléculas na MP reconhecidas por macrófagos (especialmente esplênicos) e hcs enfoiçadas são fagocitadas. Intravascular: ruptura da célula pelo estresse oxidativo constante.
Como ocorre a disfunção endotelial na AF?
Ocorre pela hemólise intravascular, que promove, principalmente, a depleção de NO (antitrombótico, anti-inflamatório e vasodilatador). Além disso, a própria alteração da MP promove uma resposta inflamatória sistêmica crônica, protencializando a disfunção endotelial.
Qual a consequência da disfunção endotelial?
Fibrose e hiperplasia dos vasos de maior calibre (favorece trombose in situ), hipercoagulabilidade (tromboses), fenômenos vaso-oclusivos (moléculas de adesão na hemácia alterada e no endotélio).
Por que ocorre a vaso-oclusão capilar na AF?
Adesão das hcs ao endotélio, lentificando o fluxo local, e impactação e empilhamento das hcs alteradas. A estase promove hipóxia e acidose, generalizando o afoiçamento, promovendo a obstrução microvascular.
Quais as consequências para o organismo da vaso-oclusão capilar da AF?
É o fator que promove os FENÔMENOS ÁLGICOS da AF. Porém, além disso, promove também disfunção orgânica lentamente progressiva (pequenos infartos teciduais progressivos).
Por que ocorre a inflamação sistêmica na AF?
Pela hemólise intravascular e pela isquemia tecidual. A inflamação sistêmica promove ativação e disfunção endotelial, que favorece fenômenos vaso-oclusivos, que infartam mais tecidos e aumentam ainda mais a inflamação (ciclo vicioso).
Quais as alterações laboratoriais da AF?
Como qualquer outra anemia hemolítica, a hemólise crônica promove anemia, reticulocitose, aumento de BI e LDH e queda na haptoglobina. Pode haver aumento do VCM pela reticulocitose. Pela inflamação crônica sistêmica, espera-se leucocitose e trombocitose, além de aumento do PCR.
Qual a relação da VHS com a AF?
A VHS está sempre baixa nesses pacientes, mesmo com inflamação sistêmica exacerbada, pis as hemácias falciformes promovem isso.
Quais os achados do esfregaço de sangue periférico da AF?
Hemácias afoiçadas, policromasia, corpúsculos de Howell-Jolly (sinal de asplenia) e hcs em alvo.
Como confirmar o dx de AF?
Eletroforese de hb.
Como e quando fazer o rastreio pré-natal para AF?
Através da bx de vilo coriônico em ambos os pais com traço falcêmico ou ambos com homozigose SS.
Como fazer o rastreio neonatal para AF? Quais os significados de cada padrão?
Através do teste do pezinho. Normal: FA. Traço falcêmico: FAS. Anemia falciforma: FS.
Perfil de distribuição das Hbs na AF e principais variantes falcêmicas.
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Qual o QC da AF? Quando se inicia?
Hemólise crônica + múltiplas disfunções orgânicas: crises álgicas recorrentes (fenômenos vaso-oclusivos). Os principais órgãos alvo são baço, rins, ossos, cérebro, pulmões, pele e coração. O quadro se inicia quando os níveis de HbF começam a diminuir (após 6m de vida).
Quais condutas são capazes de alterar a morbimortalidade da AF (terapia modificadora de doença)?
Profilaxia contra pneumococo, reativação da síntese de HbF, hemotransfusão e uso de quelantes de ferro. São as modalidades de tto crônico.
Qual a principal causa de óbito em crianças falcêmicas?
A sepse por germes encapsulados (especialmente o pneumococo).
Qual a conduta para evitar/diminuir a morbimortalidade pelo pneumococo?
Vacinação antipneumocócica e uso profilático de penicilina.
Em quais casos eu vou fazer a profilaxia para pneumococo?
Em TODOS os casos de AF.
Como fazer a vacinação para pneumococo?
< 2a: vacina 13-valente em 3 doses com intervalos de 6-8 semanas à partir do 2° mês de vida (2-4-6° meses) com reforço as 12m. Aos 2 e 7 anos aplica-se a vacina 23-valente.
Como fazer a antibioticoprofilaxia para pneumococo?
Penicilina V oral iniciada no 2° mês de vida. Em pacientes s/ sepse ou esplenectomia cx, eu paro com 5 anos. Agora caso sepse ou esplenecto, profilaxia ad eternum.
Por que é feita reativação da produção de HbF na AF e como é feito isso?
Pois os níveis de HbF são inversamente proporcionais à gravidade da AF (lembrar que a HbF diminui o afoiçamento das hcs). É feita com hidroxiureia.
Como fazer a hemotransfusão na AF?
2 formas: simples e de troca parcial (exsanguineotransfusão parcial).
Quando fazer a simples e quando fazer a de troca parcial?
Ambas podem ser realizadas pontualmente (episódica), porém para tranfusão crônica, usar apenas a exsanguineotransfusão parcial pelo menor risco de sobrecarga por ferro.
Como a transfusão simples altera a Hb?
1 bolsa em adultos aumenta a Hb em 1 g/dl. Devo visar um máximo de Hb = 10 e Ht = 30%, pois mais que isso aumenta muito a viscosidade sanguínea.
O que é feito na transfusão de troca parcial?
Parte das hcs falcêmicas é remoovida da circulação em troca de hcs normais.
Quais as principais complicações transfusionais?
Aloimunização (reação hemolítica tardia), sobrecarga de ferro e infecções virais hemotransmissíveis (HIV, HBV, HCV e HLTV).
Por que é feito quelantes de ferro no paciente com AF?
Pois as transfusões contínuas promovem maior risco de acúmulo de ferro (hemocromatose secundária) com suas respectivas complicações (cirrose, miocardiopatia dilatada, insuf pancreática). São eles: deferoxamina (EV) e deferasirox (VO).
Quando indicar cada terapia modificadora da AF?
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Quais outras terapias podem ser realizadas no paciente com AF?
Reposição de folato (hemólise crônica - fazer em TODO falcêmico 1 mg/dia) e outras vitaminas, flebotomias (para hiperviscosidade sanguínea), Epo, transplante de MOV (mais eficaz em < 16a).
Qual o tto das manifestações AGUDAS da AF?
Hidratação (EVITAR a hiperidratação), O2 (quando SaO2 < 92% - EVITAR a hiperoxigenação), analgesia (incluindo opioides) e ATB (que cubra germes encapsulados - beta lactâmicos -, podendo ou não associar macrolídeos).
Quando fazer ATB na crise aguda de AF?
Febre ≥ 38,5, baixa PA, Hb < 5, leuco > 30.000 e SEMPRE que houver síndrome torácica aguda.
Quais as complicações agudas da AF?
Crises álgicas (sd mão pé, crise óssea), crises anêmicas (sequestro esplênico, crise megaloblástica, aplásica), sd torácica aguda (STA) e AVE.