CRIMES CONTRA A PESSOA - Aborto Flashcards
ABORTO
Aborto é a retirada da vida de um feto que se encontra na barriga da mãe. Tira-se a
perspectiva da vida de uma pessoa; por isso, esse crime é punido dentro do capítulo de crimes contra a vida (art. 124 a 126, Código Penal).
LEI SECA - COMENTADA
Aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento
Art. 124 - Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lhe provoque: (Vide ADPF 54)
Pena - detenção, de um a três anos.
Aborto provocado por terceiro
Art. 125 - Provocar aborto, sem o consentimento da gestante:
Pena - reclusão, de três a dez anos.
Art. 126 - Provocar aborto com o consentimento da gestante: (Vide ADPF 54)
Pena - reclusão, de um a quatro anos.
Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de quatorze anos, ou é alienada ou debil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência
Forma qualificada
Art. 127 - As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um terço, se, em consequência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte.
Art. 128 - Não se pune o aborto praticado por médico: (Vide ADPF 54)
Aborto necessário
I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante;
Aborto no caso de gravidez resultante de estupro
II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.
Aborto – artigos 124 a 128
- Objeto jurídico: vida humana
Obs.: objeto jurídico é aquilo que a lei visa proteger. Nos crimes de aborto, a lei visa proteger a vida humana. O feto tem a perspectiva de vida. Portanto, o objeto jurídico é a vida humana. - Objeto material: feto.
Obs.: objeto material é a pessoa ou coisa sobre a qual recai a conduta criminosa. No aborto, a
conduta criminosa recai sobre o feto. O objeto material é o feto. É preciso fazer apenas
uma ressalva. No art. 125, que dispõe sobre o aborto sem consentimento da gestante,
o sujeito passivo e objeto material serão a integridade física e psíquica da gestante. - Termo inicial da gravidez: fecundação.
Obs.: o momento é a fecundação. É o momento em que o espermatozoide se insere no
óvulo da mulher.
E as pílulas do dia seguinte e os métodos contraceptivos que atuam após a fecundação do
espermatozoide no óvulo da mulher?
A fecundação é o termo inicial da gravidez. A partir desse momento pode haver – e haverá – o crime de aborto se a mulher ou outra pessoa tiverem a intenção de retirar o feto. No entanto, no que concerne à pílula do dia seguinte e aos métodos contraceptivos que atuam após a fecundação, existe uma hipótese da exclusão da ilicitude: o exercício regular do direito. A lei permite. Em que pese já estar fecundado o óvulo, a lei permite o uso desses métodos contraceptivos. Ao ingerir uma pílula do dia seguinte, existe o fato típico do aborto; no entanto, não é ilícito, pois está presente a excludente da ilicitude do exercício regular do direito.
Portanto, o termo inicial da gravidez é a fecundação, de acordo com a maior parte da doutrina e da jurisprudência, mas, no que concerne a métodos contraceptivos que atuam após a fecundação, será exercício regular do direito (hipótese de excludente de ilicitude prevista no art. 23 do Código Penal).
ATENÇÃO!!!
O exercício regular de direito é o desempenho de uma atividade ou a prática de uma conduta autorizada por lei. Exemplos: O agente pratique uma conduta permitida pelo direito, tal conduta não será ilícita. Consiste na atuação do agente dentro dos limites conferidos pelo ordenamento legal.
É possível se falar no crime de aborto culposo?
O CP não prever a modalidade culposo no crime de aborto.
Ex.: Sabe-se que toda gestante é aconselhada a não fumar. Suponha que tenha uma gestante que fume e seja viciada. Imagine que, em razão do cigarro que ela fuma, o bebê é abortado. Ele perde o feto em razão do cigarro. Ela responde pelo crime? Não existe a possibilidade de aborto culposo. Essa mãe foi imprudente ao fumar cigarro.
No entanto, o Código penal não prevê a modalidade culposa no crime de aborto;
logo, essa mãe não poderá ser responsabilizada pelo crime de aborto. Ela não teve o dolo voltado para a perda do feto. Ela não teve a intenção de abortar. Ela agiu de maneira culposa. Pode-se até falar que foi uma culpa previsível, mas, mesmo assim, não será atribuído o crime de aborto a essa mãe. Para que o crime de aborto seja atribuído a um determinado agente, o elemento subjetivo deve ser o dolo (ou, pelo menos, o dolo eventual).
Portanto, não é possível se falar em crime de aborto culposo.
É possível a prática do crime de aborto por omissão?
Sim.
Essa omissão é a omissão do art. 13, § 2º, Código Penal (aquele que tem o dever legal de agir, aquele que é o garante, aquele que deve atuar em razão de ingerência). É a omissão imprópria.
… … … … … … … … … …
Art. 13 - O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
§ 2º - A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem:(Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado. (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
… … … … … …
É possível a prática do crime de aborto por omissão. Exemplo: suponha que uma mãe
queira abortar. Ela sabe que, caso ela não se alimente por cinco dias, ela perderá o feto. Ela
passa cinco dias sem comer. Ela está praticando uma inação, uma conduta omissiva. Ela
está deixando de cuidar e de agir para proteger o feto. Ela para de se alimentar e, em razão
disso, perde o filho (aborta o feto). Ela teve o dolo voltado para o aborto. Ela agiu de maneira
dolosa. Em vez de agir de maneira comissiva (praticando uma ação positiva, uma manobra
abortiva), ela simplesmente parou de comer. Por meio de uma omissão imprópria, ela praticou o crime de aborto e será responsabilizada porque essa foi sua intenção e ela buscou
esse resultado por meio da sua inação, da sua omissão. É uma hipótese de crime omissivo
impróprio, também chamado de CRIME COMISSIVO POR OMISSÃO.
Aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento
Art. 124. Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque:
Pena – detenção, de um a três anos.
> > São crime de mão própria.
Obs.: o art. 124 apresenta duas condutas distintas. Em comum entre os dois, pode-se dizer
que são crimes de mão-própria. Os crimes de mão-própria são aqueles cuja conduta
não pode ser delegada a outra pessoa. O crime de provocar aborto em si mesma
só pode ser praticado pela mãe; no crime de consentimento para o aborto, a única
pessoa que pode consentir é a mãe. Logo, são crimes de mão-própria, conforme
entendimento majoritário da doutrina.
> > Não admitem coautoria, pois só podem ser praticados pela mãe, mas admitem a
Ex.: Exemplo: a gestante quer abortar, fala ao namorado, que concorda. A gestante faz uma pesquisa na internet e pede que o namorado compre alguns remédios para abortar.
O namorado compra os remédios. Ela praticou autoaborto (art. 124, Código Penal). O namorado foi um partícipe, prestou auxílio material para que a gestante praticasse a conduta do art. 124.
> > No caso de “consentimento para o aborto”, entende-se que é uma exceção pluralística.
Trata-se de concurso de pessoas.
O Código Penal brasileiro adota a teoria monista ou unitária.
Quando um, duas ou vinte pessoas concorrem para a prática de um crime, todas elas respondem pelo mesmo crime. Existem raras hipóteses de exceções pluralísticas. Exemplo: existem
dois ou mais agentes concorrendo e buscando determinado resultado. Eles estão buscando o
mesmo resultado, mas, nessas exceções, eles respondem por crimes distintos. Imagine que
uma gestante queira abortar e procure uma clínica clandestina. Ela fala ao “cara que pratica
aborto” e diz que quer abortar. Ele realiza manobras para que a mulher aborte. A gestante praticou o crime do art. 124, segunda parte (ela consentiu que outra pessoa provocasse o aborto).
Será uma exceção pluralística porque o cara que praticou o aborto não pode responder pelo
art. 124. Foi ele quem realizou as manobras abortivas; logo, ele não pode ser considerado um
mero partícipe do consentimento da gestante. Ele praticou um crime descrito no art. 126 do
Código Penal (provocar o aborto com o consentimento da gestante). A pena é mais grave para aquele que executa o aborto do que para a gestante que consente para o aborto.
> > O crime do art. 124 é um crime de médio potencial ofensivo e admite a suspensão condicional do processo. Para a gestante, a pena é de detenção.
Aborto provocado por terceiro
Art. 125. Provocar aborto, SEM o consentimento da gestante: Pena – reclusão, de três a dez anos.
> > Nesse artigo também admite e entende-se que é uma exceção pluralística. Trata-se de concurso de pessoas.
> > No art. 125, a pena é bem maior (reclusão, de três a dez anos); logo, crime de elevado
potencial ofensivo.
> > O crime do art. 125 tem uma dupla subjetividade passiva. Isso significa que há dois sujeitos passivos no crime, duas vítimas. As duas vítimas são o feto e a gestante.
> > É um crime comum, qualquer pessoa pode vir a praticar o crime de aborto sem o consentimento da gestante.
Exemplo: em um casal de namorados, a menina ficou grávida e queria ter o filho, mas
ele não. Ele dissolveu remédios abortivos na bebida dela. Quando ele bebeu, ela perdeu o
feto. No hospital, explicaram sobre os remédios e ficou provado que o namorado havia dado
os remédios. É mais um exemplo de aborto sem o consentimento da gestante. O namorado
responderia pelo crime de aborto por terceiro sem o consentimento dela.
Aborto provocado por terceiro
Art. 126. Provocar aborto COM o consentimento da gestante: Pena – reclusão, de um a quatro anos.
Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de quatorze anos, ou é alienada ou débil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência.
> > Nesse artigo também admite e entende-se que é uma exceção pluralística. Trata-se de concurso de pessoas.
> > Esse artigo é um crime de médio potencial ofensivo. O parágrafo único deixa claro que o consentimento deve ser válido. O Código Penal tem diversos exemplos mostrando que menores de 14 anos não podem consentir a nada. Caso um
menor de 14 anos pratique ato sexual, será um estupro de vulnerável com quem ele pratica. Portanto, se o aborto for praticado em uma gestante menor de 14 anos, ainda que ela tenha consentido, esse consentimento não é válido. Aquele que tiver executado um aborto em um menor de 14 anos débil mental, mediante fraude, grave ameaça ou violência responderá pelo art. 125 (aborto sem o consentimento da gestante).
Forma qualificada
Art. 127. As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um terço, se, em
consequência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte.
> > Houve um equívoco da lei em dizer que é uma forma qualificada do crime de aborto, na verdade, trata-se de CAUSA DE AUMENTO DE PENA.
> > Pena aumentada de 1/3: a gestante sofre lesão corporal de natureza grave em sentido amplo, ou seja, lesão grave (art.129 § 1º) ou gravíssima (art.129 §2º).
> > Pena dobrada (2x): morte da gestante.
> > São hipóteses preterdolosas, ou seja, há dolo na conduta e culpa no resultado (dolo no antecedente e culpa no consequente).
O dolo é voltado para o aborto, mas,
mediante culpa, acaba sendo gerada uma lesão corporal grave ou a morte da vítima. São
hipóteses preterdolosas porque o dolo da conduta é voltado unicamente para gerar aborto,
mas, em razão da manobra abortiva, por culpa (negligência, imprudência, imperícia), acaba
gerando lesão corporal grave ou gravíssima ou a morte da vítima.
> > O art. 127 é aplicável ainda que o aborto não seja consumado.
A gestante que provoca o aborto, responderá pelos casos de aumento de pena, em caso de lesão de natureza grave?
NÃO!
Ela responde pelo aborto ou tentativa de aborto, mas não responde em razão da lesão corporal grave que causou em sim mesmo, pois isso contrariaria o princípio da alteridade.
Hipóteses em que o aborto não é crime
Art. 128. Não se pune o aborto praticado por médico:
> > ATENÇÃO: Ultimamente, o que mais tem sido cobrado em prova é o art. 128.
> > São causas especiais de exclusão de ilicitude.
Obs.: o art. 128 dispõe sobre causas especiais de exclusão da ilicitude. Existem as causas
genéricas da excludente de ilicitude, como estado de necessidade, legítima defesa, estrito cumprimento do dever legal, exercício regular do direito. Além dessas, existem as causas específicas, especiais. Nessas causas especiais, há a previsão de situações em que o aborto não é considerado crime.
> >
Hipóteses em que o aborto não é crime
Art. 128. Não se pune o aborto praticado por médico:
Aborto necessário/ terapêutico
I – se não há outro meio de salvar a vida da gestante;
REQUISITOS:
> > Vida da gestante em risco. Pode ser um risco atual ou futuro.
Obs.: a doutrina também chama o aborto necessário de aborto terapêutico. Há o conflito
entre dois valores fundamentais: de um lado, a vida da gestante; de outro lado, o feto que tem perspectiva de vida. A lei entende que, nesse caso, é preciso priorizar a vida da gestante. Portanto, para que haja essa causa de excludente de ilicitude, é preciso que haja dois requisitos: vida da gestante em risco; não há outro meio de salvá-la.
O risco não precisa ser presente, atual. Pode ser que o médico constate que, caso a gravidez prossiga, a gestante irá morrer no parto. É um risco futuro. É possível se antecipar e realizar o aborto antes de chegar à situação de risco.
> > Não há outro meio de salvar a gestante.
> > Não é possível provocar o aborto em razão da saúde da gestante. A lei deixa claro que, se há um risco para a vida da gestante, o aborto pode ser provocado. No entanto, caso seja um risco para a saúde (exemplo: a gestante tende a desenvolver diabetes durante a gestação), não é possível realizar o aborto; caso haja risco de vida, é possível.
> > ATENÇÃO: Não se pune o aborto praticado por médico.
Uma mulher gestante não pode ir a uma clínica clandestina, consentir para o aborto e alegar posteriormente que fez isso somente pois
havia risco de vida. Ela também não pode ingerir remédios abortivos porque existe risco a
sua vida. Esse aborto, obrigatoriamente, deve ser praticado por um médico (I e II).
Hipóteses em que o aborto não é crime
Art. 128. Não se pune o aborto praticado por médico:
Aborto no caso de gravidez resultante de estupro
II – se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou,
quando incapaz, de seu representante legal.
> > A doutrina chama esse tipo de aborto de aborto humanitário, sentimental, ético.
> > Há dois requisitos:
1) a gravidez precisa resultar de estupro (inclui estupro de vulnerável);
2) consentimento válido.
> > ATENÇÃO: Nessa segunda hipótese, o aborto é resultante de uma gravidez de estupro.
> > Não exige autorização judicial para se realizar o aborto.
> > Não exige a condenação do autor para se realizar o aborto.
> > Para realizar o aborto, o médico precisa de provas de que o aborto realmente foi praticado mediante um estupro. Às vezes, para isso, é possível usar: boletim de ocorrência, oitiva da vítima, caso notório.
Hipóteses em que o aborto não é crime
Art. 128. Não se pune o aborto praticado por médico:
3ª) Interrupção da gravidez de feto anencéfalo (anencefalia)
> > Anencefalia é quando não é gerada a caixa craniana. Não tem cérebro, em ditos populares, o feto. O STF entendeu que, em razão dessa condição, não há expectativa
de vida. É direito da mãe aborta o feto, pois não há expectativa de vida e não atinge
o bem jurídico tutelado pela norma penal.
> > Na ADPF 54/DF, o STF decidiu que a interrupção da gravidez de feto anencéfalo é conduta atípica.
Fundamentos:
1) De acordo com o Conselho Federal de Medicina, o anencéfalo é um natimorto cerebral, portanto é um feto inviável. Nesse entendimento, o anencéfalo não possui vida humana
– perspectiva do feto.
2) Dignidade da pessoa humana – perspectiva da gestante.
Obs.: a hipótese acima é pacífica na jurisprudência. Portanto, o feto anencéfalo pode sofrer aborto. Não é considerado crime de aborto a gestante que aborta um feto com
anencefalia.