Jurisprudência STF - 2021 Flashcards

1
Q

É possível que uma emenda constitucional seja julgada formalmente inconstitucional se ficar demonstrado que ela foi aprovada com votos “comprados” dos parlamentares?

A

Resumo

Em tese, é possível o reconhecimento de inconstitucionalidade formal no processo constituinte reformador quando eivada de vício a manifestação de vontade do parlamentar no curso do devido processo constituinte derivado, pela prática de ilícitos que infirmam a moralidade, a probidade administrativa e fragilizam a democracia representativa.

Caso concreto: ADEPOL ajuizou ADI pedindo a declaração de inconstitucionalidade formal da EC 41/2003 e da EC 47/2005 sob o argumento de que elas foram aprovadas com votos “comprados” de Deputados Federais condenados no esquema do “Mensalão” (AP 470).

O STF afirmou que, sob o aspecto formal, as emendas constitucionais devem respeitar o devido processo legislativo, que inclui, entre outros requisitos, a observância dos princípios da moralidade e da probidade. Assim, é possível o reconhecimento de inconstitucionalidade formal no processo de reforma constituinte quando houver vício de manifestação de vontade do parlamentar, pela prática de ilícitos. Porém, para tanto, é necessária a demonstração inequívoca de que, sem os votos viciados pela ilicitude, o resultado teria sido outro.

No caso, apenas sete Deputados foram condenados pelo Supremo na AP 470, por ficar comprovado que eles participaram do esquema de compra e venda de votos e apoio político conhecido como Mensalão. Portanto, o número comprovado de “votos comprados” não é suficiente para comprometer as votações das ECs 41/2003 e 47/2005. Ainda que retirados os votos viciados, permanece respeitado o rígido quórum estabelecido na Constituição Federal para aprovação de emendas constitucionais, que é 3/5 em cada casa do Congresso Nacional. STF. Plenário. ADI 4887/DF, ADI 4888/DF e ADI 4889/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 10/11/2020 (Info 998).

Inteiro teor

Para o STF, em tese, é possível reconhecer a inconstitucionalidade com base nesse argumento?

Na teoria, sim.

Em tese, é possível o reconhecimento de inconstitucionalidade formal no processo constituinte reformador quando eivada de vício a manifestação de vontade do parlamentar no curso do devido processo constituinte derivado, pela prática de ilícitos que infirmam a moralidade, a probidade administrativa e fragilizam a democracia representativa. STF. Plenário. ADI 4887/DF, ADI 4888/DF e ADI 4889/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 10/11/2020 (Info 998).

Para que se tenha um “devido processo constituinte reformador”, é necessário que se respeite não apenas as exigências expressas no art. 60 da Constituição Federal, sendo indispensável também que se observem os princípios que legitimam a atuação das casas congressuais brasileiras.

Inclui-se, no devido processo legislativo, a observância dos princípios da moralidade e da probidade, voltados a “impedir que os dispositivos constitucionais sejam objeto de alteração através do exercício de um poder constituinte derivado distanciado das fontes de legitimidade situadas nos fóruns de uma esfera pública que não se reduz ao Estado”.

Nesse sentido, o vício de corrupção da vontade do parlamentar e de seu compromisso com o interesse público subverte o regime democrático e deliberativo adotado pela Constituição e ofende o devido processo legislativo por contrariar o princípio da representação democrática que deve, obrigatoriamente, nortear a produção de normas jurídicas.

Demonstrada a interferência ilícita na fase de votação pela prevalência de interesses individuais do parlamentar, admite-se o reconhecimento de inconstitucionalidade formal de emenda constitucional ou norma infraconstitucional.

Como se adota a presunção de legitimidade, deve-se comprovar o vício e sua influência na votação

Entretanto, de acordo com o princípio da presunção de inocência e da legitimidade dos atos legislativos, há de se comprovar que a norma tida por inconstitucional não teria sido aprovada, se não houvesse o grave vício a corromper o regime democrático pela “compra de votos”. Sem a demonstração inequívoca de que sem os votos viciados pela ilicitude o resultado do processo constituinte reformador ou legislativo teria sido outro, com a não aprovação da proposta de emenda constitucional ou com a rejeição do projeto de lei, não se há declarar a inconstitucionalidade de emenda constitucional ou de lei promulgada.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
2
Q

Decisões administrativas do CNJ devem ser cumpridas mesmo que exista decisão judicial em sentido contrário proferida por outro órgão judiciário?

A

Resumo

O art. 106 do Regimento Interno do CNJ prevê o seguinte:

Art. 106. O CNJ determinará à autoridade recalcitrante, sob as cominações do disposto no artigo anterior, o imediato cumprimento de decisão ou ato seu, quando impugnado perante outro juízo que não o Supremo Tribunal Federal.

O STF afirmou que essa previsão é constitucional e decorre do exercício legítimo de poder normativo atribuído constitucionalmente ao CNJ, que é o órgão formulador da política judiciária nacional.

Assim, o CNJ pode determinar à autoridade recalcitrante o cumprimento imediato de suas decisões, ainda que impugnadas perante a Justiça Federal de primeira instância, quando se tratar de hipótese de competência originária do STF. STF. Plenário. ADI 4412/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 18/11/2020 (Info 1000).

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
3
Q

Compete ao STF processar e julgar originariamente ações propostas contra o CNJ e contra o CNMP no exercício de suas atividades-fim?

A

Resumo

Nos termos do art. 102, I, “r”, da Constituição Federal, é competência exclusiva do STF processar e julgar, originariamente, todas as ações ajuizadas contra decisões do Conselho CNJ e do CNMP proferidas no exercício de suas competências constitucionais, respectivamente, previstas nos arts. 103-B, § 4º, e 130-A, § 2º, da CF/88. STF. Plenário. Pet 4770 AgR/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 18/11/2020 (Info 1000). STF. Plenário. Rcl 33459 AgR/PE, red. p/ o ac. Min. Gilmar Mendes, julgado em 18/11/2020 (Info 1000).

Inteiro teor

Competência para julgar demandas contra o CNJ e o CNMP

A CF/88 prevê, em seu art. 102, I, “r”:

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: (…) r) as ações contra o Conselho Nacional de Justiça e contra o Conselho Nacional do Ministério Público; (Incluída pela EC 45/2004)

Interpretação restritiva conferida pelo STF (superada)

Até bem pouco tempo, o STF conferia uma interpretação restritiva a esse dispositivo.

O STF dizia que ele somente seria competente para julgar as ações em que o próprio CNJ ou CNMP (que não possuem personalidade jurídica própria) figurassem no polo passivo. Seria o caso de mandados de segurança, habeas corpus e habeas data contra os Conselhos.

Na hipótese de serem propostas ações ordinárias para impugnar atos do CNJ e CNMP, quem irá figurar como ré no processo é a União, já que os Conselhos são órgãos federais. Logo, tais demandas, segundo essa interpretação restritiva, seriam julgadas pela Justiça Federal de 1ª instância, com base no art. 109, I, da CF/88:

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;

Esse entendimento estava pacificado no STF, existindo inúmeros julgados nesse sentido. Por exemplo: AO 1706 AgR, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 18/12/2013; AO 1894 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 07/08/2018; ACO 2148 AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 30/09/2016.

Mudança de entendimento

Ocorre que o STF mudou seu entendimento e abandonou a interpretação restritiva acima exposta.

Entendimento atual: compete ao STF processar e julgar originariamente ações propostas contra o CNJ e contra o CNMP no exercício de suas atividades-fim

Nos termos do art. 102, I, “r”, da Constituição Federal, é competência exclusiva do STF processar e julgar, originariamente, todas as ações ajuizadas contra decisões do Conselho CNJ e do CNMP proferidas no exercício de suas competências constitucionais, respectivamente, previstas nos arts. 103-B, § 4º, e 130- A, § 2º, da CF/88. STF. Plenário. Pet 4770 AgR/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 18/11/2020 (Info 1000). STF. Plenário. Rcl 33459 AgR/PE, red. p/ o ac. Min. Gilmar Mendes, julgado em 18/11/2020 (Info 1000).

O art. 102, I, “r”, da CF/88 não restringiu a competência para determinadas ações

A Constituição Federal determina que o STF julgue as ações propostas contra o CNJ e CNMP, não havendo, no art. 102, I, “r”, nenhuma restrição ou diferenciação quanto ao instrumento processual a ser utilizado.

Quando a CF/88 quis restringir a competência do STF para determinados tipos de “ação”, ela o fez expressamente, como é o caso do art. 102, I, “d”:

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: (…) d) o habeas corpus, sendo paciente qualquer das pessoas referidas nas alíneas anteriores; o mandado de segurança e o habeas data contra atos do Presidente da República, das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, do Tribunal de Contas da União, do Procurador-Geral da República e do próprio Supremo Tribunal Federal;

Na alínea “r” não houve, portanto, nenhuma restrição, razão pela qual não se deve fazer essa interpretação restritiva.

Isso não significa que o STF vá julgar toda e qualquer ação ordinária contra os Conselhos, mas apenas quando o CNJ ou o CNMP atuar no exercício de suas competências

Vimos acima que a alínea “r” é ampla, não diferenciando o tipo de ação. Logo, aquela distinção antiga que era feita entre o instrumento processual (se ação ordinária ou ação tipicamente constitucional), não faz sentido e foi abandonada.

A despeito disso, o STF afirmou que ele não irá julgar toda e qualquer ação ordinária contra atos daqueles conselhos constitucionais.

A regra de competência deve ser interpretada de acordo com os fins que justificaram a inclusão dessa alínea “r” pela EC 45/2004.

A competência do STF para julgar ações contra o CNJ e CNMP somente se justifica se o ato praticado tiver um cunho finalístico, estando relacionado com os objetivos precípuos que justificaram a criação dos conselhos, a fim de garantir uma proteção institucional a eles.

A outorga da atribuição ao Supremo para processar e julgar ações contra os Conselhos é mecanismo constitucional delineado pelo legislador com o objetivo de proteger e viabilizar a atuação desses órgãos de controle. A realização da missão constitucional ficaria impossibilitada ou seriamente comprometida se os atos por eles praticados estivessem sujeitos ao crivo de juízos de primeira instância.

Não raramente, a atuação do CNJ recai sobre questões locais delicadas e que mobilizam diversos interesses. O distanciamento das instâncias de controle jurisdicional é elemento essencial para o desempenho apropriado das funções. Ademais, o órgão de controle atua em questões de abrangência nacional que demandam tratamento uniforme e ação coordenada. Por essa razão, não poderiam ser adequadamente enfrentadas por juízos difusos.

A submissão de atos do CNJ à análise de órgãos jurisdicionais distintos do STF representaria a subordinação da atividade da instância fiscalizadora aos órgãos e agentes públicos por ele fiscalizados, o que subverte o sistema de controle proposto constitucionalmente. Deve ser mantida a higidez do sistema e preservada a hierarquia e a autoridade do órgão de controle.

Desse modo, compete ao STF julgar todas as ações ajuizadas contra decisões do Conselho CNJ e do CNMP (não importando se ações ordinárias ou writs constitucionais), mas desde que proferidas no exercício de suas competências constitucionais, o que está previsto nos arts. 103-B, § 4º, e 130-A, § 2º, da CF/88.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
4
Q

O que se entende por aviso prévio para os fins do direito de reunião do art. 5º, XVI, da CF/88? Esse aviso prévio é uma condição para o exercício da reunião? A reunião realizada sem esse aviso prévio é ilegal?

A

Resumo

O art. 5º, XVI, da CF/88 prevê o direito de reunião nos seguintes termos:

XVI - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente;

Qual é o sentido de “prévio aviso” mencionado pelo dispositivo constitucional?

O STF fixou a seguinte tese:

A exigência constitucional de aviso prévio relativamente ao direito de reunião é satisfeita com a veiculação de informação que permita ao poder público zelar para que seu exercício se dê de forma pacífica ou para que não frustre outra reunião no mesmo local. STF. Plenário. RE 806339/SE, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Edson Fachin, julgado em 14/12/2020 (Repercussão Geral – Tema 855) (Info 1003).

Inteiro teor

[…]

Primeira pergunta: esse aviso prévio é uma condição para o exercício da reunião? A reunião realizada sem esse aviso prévio é ilegal?

NÃO. Deve-se afastar qualquer interpretação que condicione a exigência de “prévio aviso” à realização de uma manifestação. Em outras palavras, a exigência constitucional de prévia notificação não pode se confundir com a necessidade de autorização prévia.

Não é possível interpretar a exigência constitucional como uma condicionante ao exercício do direito. A interpretação segundo a qual é ilegal a reunião se não precedida de notificação afronta o direito previsto no art. 5º, XVI, da Constituição Federal.

Logo, a ausência de notificação, por si só, não pode acarretar a imposição de multa ou outras sanções aos organizadores da reunião.

E por que existe esse aviso prévio?

A exigência de aviso prévio existe unicamente para permitir que o poder público zele para que o exercício do direito se dê de forma pacífica e que não frustre outra reunião no mesmo local.

Assim, esse prévio aviso deve ocorrer sempre que possível, mas, se não existir, não se pode falar em reunião ilegal. Conforme explicou o Min. Dias Toffoli:

“(…) o ‘prévio aviso à autoridade competente’, nos termos do art. 5º, inciso XVI, da Constituição, não constitui condicionante ao exercício do direito de reunião e de manifestação, mas formalidade a ser cumprida, sempre que possível, a fim de propiciar que o direito de reunião e de livre manifestação seja exercido de maneira pacífica, ordeira e segura (…)”

Como deve ocorrer essa notificação? Exige-se alguma formalidade especial?

NÃO. Basta que a notificação seja efetiva, isto é, que permita ao poder público realizar a fiscalização da segurança da manifestação ou reunião. Assim, por exemplo, é possível que a reunião seja convocada ou divulgada nas redes sociais, sem que exista uma notificação formal aos órgãos públicos.

O STF afirmou que as autoridades públicas devem adotar uma postura ativa, ou seja, diante de uma reunião que esteja sendo anunciada publicamente ou mesmo que já esteja ocorrendo, as autoridades não podem simplesmente alegar que não foram previamente notificadas.

Afinal de contas, manifestações espontâneas (sem estarem previamente organizadas) não são proibidas nem pelo texto constitucional, nem pelos tratados de direitos humanos. Assim, repito, a inexistência de notificação não torna ipso facto (por si só) ilegal a reunião.

De igual modo, não se depreende do texto constitucional qualquer exigência relativamente à organização. A liberdade de expressão e reunião pode, com efeito, assumir feição plural e igualitária, não sendo possível estabelecer, como regra, uma organização prévia.

Em outras palavras, a reunião não precisa ter um organizador que faça a prévia comunicação.

Assim, não há como exigir-se que a notificação seja pessoal ou de algum modo registrada, porque implica reconhecer como necessária uma organização que a própria Constituição não impôs.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
5
Q

O direito de reunião pode ser restringido ou mesmo suspenso?

A

SIM, em casos de estado de defesa e estado de sítio:

Art. 136 (…) § 1º O decreto que instituir o estado de defesa determinará o tempo de sua duração, especificará as áreas a serem abrangidas e indicará, nos termos e limites da lei, as medidas coercitivas a vigorarem, dentre as seguintes: I - restrições aos direitos de: a) reunião, ainda que exercida no seio das associações; (…)

Art. 139. Na vigência do estado de sítio decretado com fundamento no art. 137, I, só poderão ser tomadas contra as pessoas as seguintes medidas: (…) IV - suspensão da liberdade de reunião;

 (Auditor TCE/PA 2016 CEBRASPE) A norma constitucional que consagra a liberdade de reunião é norma de eficácia contida, na medida em que pode sofrer restrição ou suspensão em períodos de estado de defesa ou de sítio, conforme previsão do próprio texto constitucional. (certo)

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
6
Q

O Poder Público pode determinar a vacinação obrigatória?

A

Resumo

O STF julgou parcialmente procedente ADI, para conferir interpretação conforme à Constituição ao art. 3º, III, “d”, da Lei nº 13.979/2020. Ao fazer isso, o STF disse que o Poder Público pode determinar aos cidadãos que se submetam, compulsoriamente, à vacinação contra a Covid-19, prevista na Lei nº 13.979/2020.

O Estado pode impor aos cidadãos que recusem a vacinação as medidas restritivas previstas em lei (multa, impedimento de frequentar determinados lugares, fazer matrícula em escola), mas não pode fazer a imunização à força. Também ficou definido que os Estados-membros, o Distrito Federal e os Municípios têm autonomia para realizar campanhas locais de vacinação.

A tese fixada foi a seguinte:

(A) A vacinação compulsória não significa vacinação forçada, por exigir sempre o consentimento do usuário, podendo, contudo, ser implementada por meio de medidas indiretas, as quais compreendem, dentre outras, a restrição ao exercício de certas atividades ou à frequência de determinados lugares, desde que previstas em lei, ou dela decorrentes, e

(i) tenham como base evidências científicas e análises estratégicas pertinentes,
(ii) venham acompanhadas de ampla informação sobre a eficácia, segurança e contraindicações dos imunizantes,
(iii) respeitem a dignidade humana e os direitos fundamentais das pessoas;
(iv) atendam aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade, e
(v) sejam as vacinas distribuídas universal e gratuitamente; e

(B) tais medidas, com as limitações acima expostas, podem ser implementadas tanto pela União como pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, respeitadas as respectivas esferas de competência. STF. Plenário. ADI 6586, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 17/12/2020

Inteiro teor

[…]

Essas medidas restritivas somente podem ser impostas pela União?

NÃO. Tanto a União, como os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, observadas as respectivas esferas de competência, poderão estabelecer medidas indiretas para implementação da vacinação compulsória.

A competência do Ministério da Saúde para coordenar o Programa Nacional de Imunizações e definir as vacinas integrantes do calendário nacional de imunização não exclui a dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios para estabelecer medidas profiláticas e terapêuticas destinadas a enfrentar a pandemia decorrente do novo coronavírus, em âmbito regional ou local, no típico exercício da competência comum para “cuidar da saúde e assistência pública” (art. 23, II, da CF/88).

A defesa da saúde compete a qualquer das unidades federadas, seja por meio da edição de normas legais, seja mediante a realização de ações administrativas, sem que, como regra, dependam da autorização de outros níveis governamentais para levá-las a efeito, cumprindo-lhes, apenas, consultar o interesse público que têm o dever de preservar.

O federalismo cooperativo, longe de ser mera peça retórica, exige que os entes federativos se apoiem mutuamente, deixando de lado eventuais divergências ideológicas ou partidárias dos respectivos governantes, sobretudo diante da grave crise sanitária e econômica decorrente da pandemia desencadeada pelo novo coronavírus. Bem por isso, os entes regionais e locais não podem ser alijados do combate à Covid19, notadamente porque estão investidos do poder-dever de empreender as medidas necessárias para o enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do alastramento incontido da doença.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
7
Q

É legítima a recusa dos pais à vacinação compulsória de filho menor por motivo de convicção filosófica?

A

Resumo

É constitucional a obrigatoriedade de imunização por meio de vacina que, registrada em órgão de vigilância sanitária, (i) tenha sido incluída no Programa Nacional de Imunizações ou (ii) tenha sua aplicação obrigatória determinada em lei ou (iii) seja objeto de determinação da União, estado, Distrito Federal ou município, com base em consenso médico-científico.

Em tais casos, não se caracteriza violação à liberdade de consciência e de convicção filosófica dos pais ou responsáveis, nem tampouco ao poder familiar. STF. Plenário. ARE 1267879/SP, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 16 e 17/12/2020 (Repercussão Geral – Tema 1103) (Info 1003).

Inteiro teor

Realmente, o direito à liberdade de consciência e de crença é objeto de especial proteção pelo texto constitucional (art. 5º, VI e VIII), que destaca o pluralismo como um dos valores essenciais do Estado brasileiro (art. 1º, V). Todavia, em certas hipóteses, a liberdade de crença e de convicção filosófica precisa ser ponderada com outros direitos, entre os quais a vida e a saúde.

A obrigatoriedade de tomar vacinas testadas, aprovadas e registradas pelas autoridades competentes é uma dessas situações.

No caso em que estiverem em jogo direitos fundamentais de terceiros ou de toda a coletividade, a decisão do indivíduo de se submeter ou não a uma medida sanitária não produz efeitos apenas sobre a sua esfera jurídica, mas também sobre a de outras pessoas, que não necessariamente compartilham das mesmas ideias.

Embora a Constituição Federal proteja o direito de cada cidadão de manter suas convicções filosóficas, religiosas, morais e existenciais, os direitos da sociedade devem prevalecer sobre os direitos individuais.

Com isso, o Estado pode, em situações excepcionais, proteger as pessoas, mesmo contra sua vontade - como, por exemplo, ao obrigar o uso de cinto de segurança.

Não são legítimas as escolhas individuais que atentem contra os direitos de terceiros. A vacinação em massa é responsável pela erradicação de uma série de doenças, mas, para isso, é necessário imunizar uma parcela significativa da população, a fim de atingir a chamada imunidade de rebanho.

[…]

Fundamentos pelos quais a vacinação é obrigatória

Ademais, diversos fundamentos justificam a legitimidade do caráter compulsório de vacinas quando existentes consenso científico e registro nos órgãos de vigilância sanitária, entre os quais:

a) o Estado pode, em situações excepcionais, proteger as pessoas mesmo contra a sua vontade (dignidade como valor comunitário);
b) a vacinação é importante para a proteção de toda a sociedade, não sendo legítimas escolhas individuais que afetem gravemente direitos de terceiros (necessidade de imunização coletiva); e
c) o poder familiar não autoriza que os pais, invocando convicção filosófica, coloquem em risco a saúde dos filhos (melhor interesse da criança).

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
8
Q

É constitucional lei estadual que reduziu o valor das mensalidades escolares durante a pandemia da Covid-19?

A

É inconstitucional a legislação estadual que estabelece a redução obrigatória das mensalidades da rede privada de ensino durante a vigência das medidas restritivas para o enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do novo Coronavírus.

Essa lei viola a competência privativa da União para legislar sobre Direito Civil (art. 22, I, da CF/88).

Ao estabelecer uma redução geral dos preços fixados nos contratos para os serviços educacionais, a leis alterou, de forma geral e abstrata, o conteúdo dos negócios jurídicos, o que as caracteriza como norma de Direito Civil.

Os efeitos da pandemia sobre os negócios jurídicos privados, inclusive decorrentes de relações de consumo, foram tratados pela Lei federal nº 14.010/2020. Ao estabelecer o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET) para o período, a norma reduziu o espaço de competência complementar dos estados para legislar e não contém previsão geral de modificação dos contratos de prestação de serviços educacionais. STF. ADI 6575, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 18/12/2020 (Info 1003).

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
9
Q

É constitucional lei estadual que obriga a concessão de descontos a idosos na compra de medicamentos?

A

Resumo

É formalmente inconstitucional lei estadual que concede descontos aos idosos para aquisição de medicamentos em farmácias localizadas no respectivo estado. STF. Plenário. ADI 2435/RJ, Rel. Min. Cármen Lúcia, redator do acórdão Min. Gilmar Mendes, julgado em 18/12/2020 (Info 1003).

Inteiro teor

[…]

A comercialização de medicamentos no Brasil é submetida a uma regulação restrita, que não só impõe o preço máximo de fábrica, ou seja, o valor máximo que fabricantes e distribuidores podem vender para as farmácias e drogarias (PF), como também o preço máximo de comercialização de medicamentos aos consumidores (PMC), e a margem de lucro permitida para ser acrescida ao preço de revenda pelos estabelecimentos farmacêuticos.

Essa regulamentação foi realizada por sucessivas medidas provisórias, que resultaram na aprovação da Lei nº 10.213/2001. Mais a frente, ela foi revogada pela Lei nº 10.742/2003, que, atualmente, rege o tema. Desse modo, os preços dos medicamentos são fixados e reajustados todos os anos com base em critérios previstos na Lei federal nº 10.742/2003.

A forma de cálculo do percentual de ajuste é a seguinte: VPP = IPCA – (X + Y + Z)

VPP = variação percentual do preço do medicamento

IPCA = inflação

X = fator de produtividade repassado ao consumidor

Y = fator de ajuste de preços entre setores.

Z = fator de ajuste de preços intrassetor.

Esse índice é calculado pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), sendo publicado em março de cada ano, para valer a partir de abril.

A CMED é um órgão interministerial ligado à Anvisa.

Ao determinar a concessão de desconto de até 30% nas medicações destinadas aos idosos com idade superior a 60 anos, a lei estadual violou a regulação do setor estabelecida pela lei federal, porque alterou a linha condutora do equilíbrio do mercado farmacêutico traçado pela política pública de preços e acesso a medicações desenhada pela União. Desse modo, embora a finalidade social da norma seja louvável, por buscar conferir acessibilidade a medicações necessitadas pela população idosa daquele Estado, conferindo maior grau de dignidade humana e maior efetivação do direito à vida e à saúde, ela termina por gerar um desequilíbrio mais amplo na política pública formulada pela União para a fixação de preços de medicamentos e regulação da margem de lucros do mercado farmacêutico nacional, contrariando, portanto, as normas federais que regem a regulação desse setor.

Nesses termos, a lei estadual extrapolou a sua competência supletiva e invadiu a competência da União para legislar sobre normas gerais de proteção e defesa da saúde, direito econômico e proteção do consumidor (art. 24, XII, da Constituição Federal), estabelecendo política pública voltada à saúde, mas que vai de encontro ao planejamento e à forma de cálculo estabelecida pela União para definição do preço de medicamentos em todo o território nacional e para a formação de um equilíbrio econômico-financeiro no mercado farmacêutico.

Por isso, a norma impugnada se mostra formalmente inconstitucional, uma vez que invade a competência da União para legislar sobre a matéria.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
10
Q

É admissível a reeleição de presidente das casas dos legislativo federal?

A

Não é possível a recondução dos Presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal para o mesmo cargo na eleição imediatamente subsequente, dentro da mesma legislatura.

Por outro lado, é possível a reeleição dos Presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal em caso de nova legislatura.

[…]

O fundamento para isso está no art. 57, § 4º da CF/88: § 4º Cada uma das Casas reunir-se-á em sessões preparatórias, a partir de 1º de fevereiro, no primeiro ano da legislatura, para a posse de seus membros e eleição das respectivas Mesas, para mandato de 2 (dois) anos, vedada a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subsequente.

Havia uma tentativa de se dar interpretação conforme e dizer que o § 4º do art. 57 da CF/88 foi derrogado pela Emenda Constitucional nº 16/97, que permitiu uma reeleição para os cargos do Poder Executivo. O STF, contudo, não concordou com a alegação e manteve a literalidade do art. 57, § 4º. STF. Plenário. ADI 6524, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 14/12/2020 (Info 1003).

Inteiro teor

[…]

“A cláusula proibitória constitucional limita-se a proibir a recondução na mesma legislatura. Um deputado, para iniciar sua segunda legislatura, tem de reeleger-se, o que implica obter um mandato novo. Se se fosse dar tratamento diferente para os reeleitos, estar-se-ia discriminando, sem legitimidade alguma, entre novos e ‘velhos’ deputados. Cada eleição, portanto, gera um novo direito de ocupar cargo na Mesa, por uma legislatura. É o que expressamente dispõe o regimento interno da Câmara (parágrafo 1º do art. 5º): ‘Não se considera recondução a eleição para o mesmo cargo em legislaturas diferentes, ainda que sucessivas’.

O mesmo, no fundo, ocorre com o Senado, com a única diferença de que aqui o mandato já traz o direito de ocupar uma segunda legislatura, e o surgimento desta faz ressurgir seu direito de ser regulado pelo parágrafo 4º, do que advém o direito a novo cargo na Mesa, esteja o senador na primeira parte da legislatura ou na segunda.” (BASTOS, Celso Ribeiro. Interpretação correta das normas. Folha de São Paulo, São Paulo, 5,12, 1998, p.3).

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
11
Q

É constitucional lei estadual que limita ligações de telemarketing?

A

Mudança de entendimento! Atualize o Info 822-STJ

Normas estaduais que disponham sobre obrigações destinadas às empresas de telecomunicações, relativamente à oferta de produtos e serviços, incluem-se na competência concorrente dos estados para legislarem sobre direitos do consumidor. STF. Plenário. ADI 5962/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 25/2/2021 (Info 1007).

Inteiro teor

A referida lei estadual não criou obrigações nem direitos relacionados à execução contratual da concessão de serviços de telecomunicações. O que a lei buscou foi apenas ampliar os mecanismos de tutela da dignidade dos usuários — “destinatários finais”, na dicção do art. 2º do CDC, a prever cadastro de usuários contrários ao recebimento de ofertas de produtos ou serviços. Tem-se, dessa forma, manifestação do exercício da competência concorrente dos estados para legislar sobre direitos do consumidor, nos termos do art. 24, V, da CF/88:

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:

(…) V - produção e consumo;

Vale ressaltar que se trata de uma mudança de entendimento considerando que o STF possuía julgado em sentido contrário: STF. Plenário. ADI 3959/SP, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 20/4/2016 (Info 822).

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
12
Q

A União pode requisitas serigas adquiridas por outros ente políticos?

A

Resumo

É incabível a requisição administrativa, pela União, de bens insumos contratados por unidade federativa e destinados à execução do plano local de imunização, cujos pagamentos já foram empenhados.

A requisição administrativa não pode se voltar contra bem ou serviço de outro ente federativo. Isso para que não haja indevida interferência na autonomia de um sobre outro. STF. Plenário. ACO 3463 MC-Ref/SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 8/3/2021 (Info 1008)

Inteiro teor

Em regra, a União não pode requisitar bens dos Estados, DF e Municípios

A requisição administrativa não pode se voltar contra bem ou serviço de outro ente federativo. Isso para que não haja indevida interferência na autonomia de um sobre outro.

Em regra, a União não pode requisitar bens integrantes do patrimônio público estadual e municipal. A CF/88 só autorizou que isso ocorra em caso de estado de defesa (art. 136, § 1º, II, da CF/88) e estado de sítio (art. 139, VII):

Art. 136 (…) § 1º O decreto que instituir o estado de defesa determinará o tempo de sua duração, especificará as áreas a serem abrangidas e indicará, nos termos e limites da lei, as medidas coercitivas a vigorarem, dentre as seguintes:

(…)

II - ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos, na hipótese de calamidade pública, respondendo a União pelos danos e custos decorrentes.

Art. 139. Na vigência do estado de sítio decretado com fundamento no art. 137, I, só poderão ser tomadas contra as pessoas as seguintes medidas:

(…) VII - requisição de bens.

Além disso, a competência da União, por meio do Ministério da Saúde, de coordenar o Programa Nacional de Imunização (PNI) e de definir as vacinas integrantes do calendário nacional de imunizações não exclui a competência dos estados, do Distrito Federal e dos municípios para adaptá-los às peculiaridades locais, no típico exercício da competência comum de que dispõem para cuidar da saúde e assistência pública (art. 23, II, da CF/88).

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
13
Q

É constitucional lei que obriga cinemas brasileiros a exibirem filmes nacionais durante um número mínimo de dias por ano?

A

Resumo

São constitucionais a cota de tela, consistente na obrigatoriedade de exibição de filmes nacionais nos cinemas brasileiros, e as sanções administrativas decorrentes de sua inobservância.

A denominada “cota de tela” promove intervenção voltada a viabilizar a efetivação do direito à cultura, sem, por outro lado, atingir o núcleo dos direitos à livre iniciativa, à livre concorrência e à propriedade privada, apenas adequando as liberdades econômicas à sua função social. STF. Plenário. RE 627432/RS, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 18/3/2021 (Repercussão Geral – Tema 704) (Info 1010).

Inteiro teor

A chamada cota de tela, ou seja, a obrigatoriedade de que os cinemas brasileiros exibam filmes nacionais durante um número mínimo de dias por ano, não viola a Constituição Federal.

Vejamos os argumentos expostos pelo STF para chegar a essa conclusão.

Mercado audiovisual é como se fosse um oligopólio

O mercado audiovisual é muito concentrado, ou seja, dominado por poucos e grandes grupos empresariais, que, por essa razão, determinam o que chega aos cinemas, dificultando a inserção de obras que não fazem parte do mainstream, ou seja, da corrente dominante. É uma espécie de oligopólio.

Livre iniciativa deve se pautar de acordo com a justiça social e com a função social da propriedade

O caput do art. 170 assegura a livre iniciativa. O inciso IV garante a livre concorrência. No entanto, esses princípios devem ser lidos em conjunto com a “justiça social” e com a “função social da propriedade”, também mencionadas no mesmo dispositivo:

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

(…) III - função social da propriedade;

IV - livre concorrência; (…)

Além disso, um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil é a garantia do desenvolvimento nacional (art. 3º, II). As liberdades econômicas, portanto, devem ser resguardadas, mas sempre em leitura conjunta com os limites traçados pela própria Constituição Federal.

Aspectos social e econômico da cota de tela

A chamada cota de tela tem um propósito social e econômico.

Sob o aspecto social, ela se revela como uma das diversas medidas voltadas à ampliação da competitividade entre as indústrias do setor.

Também possui uma importância do ponto de vista econômico, estratégico, uma vez que o domínio internacional na exibição de filmes implica constante drenagem de recursos para fora do país.

Proteção à cultura nacional

A par da proteção à ordem econômica, o sistema de cota de tela representa um importante mecanismo de fomento à cultura nacional, com relevante papel na promoção da identidade cultural nacional.

A Constituição Federal, nos seus arts. 215, 216 e 261-A, revela a preocupação de se proteger a cultura nacional: […]

É muito vasta a proteção à cultura nacional, pois, mais do que apenas resguardar as manifestações culturais nacionais, o constituinte verdadeiramente preocupou-se em promovê-las e difundi-las, tendo disposto que o Estado garantiria a todos o acesso às fontes da cultura nacional e que a lei estabeleceria incentivos para a produção e o conhecimento de bens e valores culturais.

Tamanha é a relevância da cultura nacional que seu quadro protetivo foi reforçado pela Emenda Constitucional 71/2012, por meio da qual se instituiu verdadeira política de valorização e difusão das manifestações culturais, as quais pretendeu universais, com reforço, inclusive, da atuação estatal, por meio do Sistema Nacional de Cultura, em um processo de gestão e promoção conjunta de políticas públicas de cultura, democráticas e permanentes, pactuadas entre os entes da Federação e a sociedade.

A obrigação mostra-se proporcional

Por outro lado, a obrigatoriedade de exibição de obras cinematográficas brasileiras de longa-metragem é encargo que não atinge de modo desarrazoado as empresas proprietárias, locatárias ou arrendatárias de salas, espaços ou locais de exibição pública comercial, como demonstram dados coletados pelos órgãos oficiais.

Diante disso, por meio da técnica de ponderação de valores, se justifica a intervenção na esfera jurídica das empresas proprietárias, locatárias ou arrendatárias de salas, espaços ou locais de exibição pública comercial para que outros preceitos de estatura constitucional sejam observados: o acesso dos indivíduos às fontes da cultura nacional e a defesa e a valorização do patrimônio cultural brasileiro.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
14
Q

É constitucional a exigência editalícia de percentuais mínimos e máximos para a exibição da programação especial de produção local em processos seletivos de outorga dos serviços de radiodifusão?

A

Resumo

São constitucionais os procedimentos licitatórios que exijam percentuais mínimos e máximos a serem observados pelas emissoras de rádio na produção e transmissão de programas culturais, artísticos e jornalísticos locais, nos termos do art. 221 da Constituição Federal. STF. Plenário. RE 1070522/PE, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 18/3/2021 (Repercussão Geral – Tema 1013) (Info 1010).

Inteiro teor

Trata-se de medida que cuida da articulação entre a disponibilidade dos serviços de radiodifusão e o exercício do direito coletivo de acesso à cultura nacional (art. 215, da CF/88).

O conceito de programação especial de produção local (art. 16, § 1º, do Decreto nº 52.795/63) é compatível com o art. 221 da CF/88, que preceitua os princípios norteadores da produção e da programação das emissoras de rádio e televisão:

Art. 221. A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios:

I - preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas;

II - promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação;

III - regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei;

IV - respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.

A CF/88 eleva à condição de princípios a “promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação” (art. 221, II) e a “regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei” (CF, art. 221, III).

A divulgação do modo de vida, dos costumes e dos acontecimentos locais fortalece o senso de pertencimento dos cidadãos aos municípios.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
15
Q

Cabe ADPF para sanar omissão inconstitucional?

A

A arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) é instrumento eficaz de controle da inconstitucionalidade por omissão.

A ADPF pode ter por objeto as omissões do poder público, quer totais ou parciais, normativas ou não normativas, nas mesmas circunstâncias em que ela é cabível contra os atos em geral do poder público, desde que essas omissões se afigurem lesivas a preceito fundamental, a ponto de obstar a efetividade de norma constitucional que o consagra. STF. Plenário. ADPF 272/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 25/3/2021 (Info 1011).

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
16
Q

É constitucional lei estadual que obriga que as escolas e bibliotecas públicas tenham um exemplar da Bíblia?

A

Resumo

A imposição legal de manutenção de exemplares de Bíblias em escolas e bibliotecas públicas estaduais configura contrariedade à laicidade estatal e à liberdade religiosa consagrada pela Constituição da República de 1988. STF. Plenário. ADI 5258/AM, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 12/4/2021 (Info 1012).

Inteiro teor

Princípio da laicidade

O art. 19, I, da CF/88 prevê a laicidade estatal. Segundo esse princípio, o Estado deve manter uma relação de neutralidade em relação às religiões.

Assim, pode-se dizer que, em matéria confessional*, compete ao Estado manter-se neutro justamente para preservar, em favor dos cidadãos, a integridade do direito fundamental à liberdade religiosa, ou seja, para garantir que todas as religiões recebam semelhante tratamento.

Ao determinar que escolas e bibliotecas públicas mantenham exemplares da Bíblia em seus acervos, a norma estadual impugnada estimula e promove certos tipos de crenças e dogmas religiosos em detrimento de outros. Dessa forma, ofende os princípios da laicidade estatal, da liberdade religiosa e da isonomia entre os cidadãos.

Assim, ao obrigar que as escolas e bibliotecas mantenham exemplar somente da Bíblia, a lei amazonense desprestigia outros livros sagrados.

Confira trecho da manifestação da Procuradoria-Geral da República:

“Não se afirma que seja ilícito a escolas públicas a aquisição da Bíblia, do Corão, da Torá, dos épicos Maabárata e Ramáiana, do Bagavadguitá, da Codificação Espírita de Allan Kardec, dos Vedas ou de outros livros sagrados, pois todos são objetos culturais, além de obras de culto. Tê-los ao dispor dos alunos e usuários de suas bibliotecas é plenamente compatível com o acesso a obras relevantes que bibliotecas não especializadas devem promover. Inconstitucionalidade há, todavia, na imposição normativa de compra de apenas um desses livros tidos como sagrados, por parte da administração pública, com evidente privilégio a determinada manifestação religiosa.”

17
Q

É constitucional a imposição, por decreto, de restrições à realização de cultos presenciais, como medida para conter o avanço da pandemia da Covid-19?

A

Resumo

É compatível com a Constituição Federal a imposição de restrições à realização de cultos, missas e demais atividades religiosas presenciais de caráter coletivo como medida de contenção do avanço da pandemia da Covid-19. STF. Plenário. ADPF 811/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 8/4/2021 (Info 1012).

Inteiro teor

Constitucionalidade formal do decreto

Sob o prisma da constitucionalidade formal, a imposição de restrições à realização de cultos religiosos por meio de decretos municipais e estaduais está em conformidade com decisões recentes do STF sobre a temática, dentre as quais destaca-se a ADI 6341, na qual se assentou que todos os entes federados possuem competência para legislar e adotar medidas sanitárias voltadas ao enfrentamento da emergência de saúde pública.

O STF reafirmou o dever que todos os entes políticos têm na promoção da saúde pública e, coerente ao federalismo cooperativo adotado na CF/88, assentou a competência dos Estados e dos Municípios, ao lado da União, na adoção de medidas sanitárias direcionadas ao enfrentamento da pandemia.

Constitucionalidade material do decreto

Sob o aspecto material, a medida sanitária em análise mostra-se adequada, necessária e proporcional, bem como em consonância com as diretrizes científicas propostas pela Organização Mundial da Saúde.

É possível afirmar que há um razoável consenso na comunidade científica no sentido de que os riscos de contaminação decorrentes de atividades religiosas coletivas são superiores aos riscos de outras atividades econômicas, mesmo aquelas realizadas em ambientes fechados.

Essa noção geral — sobre o elevado risco de contaminação das atividades religiosas coletivas presenciais — foi complementada por um exame de fatos e prognoses subjacente à edição do decreto estadual impugnado.

As medidas restritivas, dessa forma, foram resultantes de análises técnicas relativas ao risco ambiental de contágio pela Covid-19 conforme o setor econômico e social, bem como de acordo com a necessidade de preservar a capacidade de atendimento da rede de serviço de saúde pública.

18
Q

É constitucional lei estadual que proibe o corte de energia elétrica durante a pandemia da Covid-19?

A

Resumo

São constitucionais as normas estaduais, editadas em razão da pandemia causada pelo novo coronavírus, pelas quais veiculados a proibição de suspensão do fornecimento do serviço de energia elétrica, o modo de cobrança, a forma de pagamentos dos débitos e a exigibilidade de multa e juros moratórios.

As normas objetivam regulamentar a relação entre o usuário do serviço e a empresa concessionária, tratando-se, portanto, essencialmente de normas sobre defesa e proteção dos direitos do consumidor e da saúde pública.

STF. Plenário. ADI 6432/RR, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 7/4/2021 (Info 1012)

Inteiro teor

Inexistência de violação à competência privativa da União

Não há se falar em invasão da competência legislativa privativa da União para legislar sobre energia elétrica. Isso porque a lei estadual impugnada não atinge de forma direta a relação contratual estabelecida entre a concessionária e o Poder Público concedente, titular do serviço.

A lei também não fere o núcleo de atuação das empresas voltadas à prestação de serviços de fornecimento de energia elétrica, uma vez que não se constata que possa gerar desequilíbrio contratual ou afetar políticas tarifárias, especialmente porque as medidas impostas são excepcionais e transitórias, limitadas ao tempo da vigência do plano de contingência adotado pela Secretaria estadual de saúde em decorrência da pandemia de Covid-19.

Legislação está fundamentada na dignidade da pessoa humana e em outros direitos fundamentais

A não interrupção dos serviços públicos de energia elétrica relaciona-se à satisfação das necessidades básicas da população, pelo que a continuidade do serviço é considerada essencial para a adoção de medidas de contenção do novo coronavírus.

O fornecimento de energia elétrica é direito fundamental relacionado à dignidade humana, ao direito à saúde, à moradia, à alimentação, à educação e à profissão, constituindo-se em serviço público essencial e universal, que deve estar disponível a todos os cidadãos, especialmente no complexo contexto pandêmico vivenciado.

19
Q

É constitucional lei estadual que autoriza o Poder Executivo a cobrar um valor das concessionárias de energia elétrica pela utilização das faixas de domínio e das áreas adjacentes às rodovias estaduais e federais delegadas?

A

Resumo

É inconstitucional norma estadual que onere contrato de concessão de energia elétrica pela utilização de faixas de domínio público adjacentes a rodovias estaduais ou federais. Isso porque a União, por ser titular da prestação do serviço público de energia elétrica (art. 21, XII, “b” e art. 22, IV, da CF/88), detém a prerrogativa constitucional de estabelecer o regime e as condições da prestação desse serviço por concessionárias, o qual não pode sofrer ingerência normativa dos demais entes políticos. STF. Plenário. ADI 3763/RS, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 7/4/2021 (Info 1012).

Inteiro teor

[…] a União é a titular da prestação do serviço público de energia elétrica. Ela detém a prerrogativa constitucional de estabelecer o regime e as condições da prestação desse serviço por concessionárias, o qual não pode sofrer ingerência normativa dos demais entes políticos.

Não é possível que os Estados-membro, o DF ou os Municípios, por meio de leis locais, interfiram nas relações jurídico-contratuais entre Poder concedente federal e as empresas concessionárias, especialmente com relação às condições que foram estipuladas em contrato de concessão de serviços públicos, sob regime federal.

Nesse sentido, ao examinar o RE 581.947 (Tema 261), o STF concluiu ser inconstitucional a cobrança de taxa pela instalação de equipamentos de transmissão e distribuição de energia elétrica por concessionária em área de domínio público de município […]

20
Q

O STF pode determinar ao Executivo a implementação de programa de renda básica de cidadania previsto em lei?

A

Resumo

A Lei nº 10.835/2004 instituiu um programa denominado “renda básica de cidadania”.

Segundo esse programa, todas as pessoas residentes no Brasil, não importando a sua condição socioeconômica, deverão receber um benefício cujo valor deve ser fixado pelo Poder Executivo.

O pagamento do benefício deverá ser de igual valor para todos, e suficiente para atender às despesas mínimas de cada pessoa com alimentação, educação e saúde. Como esse programa ainda não havia sido implementado, em 2020 o Defensor Público-Geral Federal ajuizou mandado de injunção contra o Presidente da República.

O STF decidiu que, como está presente estado de mora inconstitucional, deve ser fixado o valor da renda básica de cidadania para o estrato da população brasileira em condição de vulnerabilidade socioeconômica — pobreza e extrema pobreza — a ser efetivado, pelo Presidente da República, no exercício fiscal seguinte ao da conclusão do julgamento de mérito (2022).

STF. Plenário. MI 7300/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Gilmar Mendes, julgado em 26/4/2021 (Info 1014).

Inteiro teor

Lei nº 10.835/2004

A Lei nº 10.835/2004 instituiu um programa denominado “renda básica de cidadania”.

Segundo esse programa, todas as pessoas residentes no Brasil, não importando a sua condição socioeconômica, deverão receber um benefício cujo valor deve ser fixado pelo Poder Executivo.

O pagamento do benefício deverá ser de igual valor para todos, e suficiente para atender às despesas mínimas de cada pessoa com alimentação, educação e saúde.

Confira o que diz a Lei:

Art. 1º É instituída, a partir de 2005, a renda básica de cidadania, que se constituirá no direito de todos os brasileiros residentes no País e estrangeiros residentes há pelo menos 5 (cinco) anos no Brasil, não importando sua condição socioeconômica, receberem, anualmente, um benefício monetário.

§ 1º A abrangência mencionada no caput deste artigo deverá ser alcançada em etapas, a critério do Poder Executivo, priorizando-se as camadas mais necessitadas da população.

§ 2º O pagamento do benefício deverá ser de igual valor para todos, e suficiente para atender às despesas mínimas de cada pessoa com alimentação, educação e saúde, considerando para isso o grau de desenvolvimento do País e as possibilidades orçamentárias.

§ 3º O pagamento deste benefício poderá ser feito em parcelas iguais e mensais.

§ 4º O benefício monetário previsto no caput deste artigo será considerado como renda nãotributável para fins de incidência do Imposto sobre a Renda de Pessoas Físicas.

[…]

Cabe mandado de injunção, neste caso?

Ele pode ser impetrado contra o Presidente da República? SIM. Cabe mandado de injunção em face da ausência de fixação do valor da renda básica de cidadania, instituída pela Lei nº 10.835/2004, cuja omissão é atribuída ao Presidente da República. A ausência de fixação do valor é forma de esvaziar o mandamento constitucional de combate à pobreza, além de fazer letra morta ao disposto no referido diploma legal.

Vale ressaltar, no entanto, que o mandado de injunção foi conhecido apenas quanto ao benefício para as pessoas em situação de vulnerabilidade

Como vimos acima, esse benefício deveria ser pago a todas as pessoas residentes no Brasil, independentemente da sua condição socioeconômica. Assim, pela lei, mesmo que a pessoa seja milionária, ela teria direito de receber o benefício em valor igual a uma pessoa miserável.

O STF afirmou que esse mandado de injunção ajuizado pelo Defensor Público-Geral deveria ser parcialmente conhecido. Para o STF, o mandado de injunção somente deveria ser conhecido no que tange à implementação do benefício para pessoas em situação de vulnerabilidade socioeconômica.

Em outras palavras, o STF afirmou que só iria analisar e determinar providências para garantir o benefício em favor das pessoas em vulnerabilidade socioeconômica. Qual foi o argumento jurídico do STF para isso?

Um dos objetivos da República brasileira é “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais” (art. 3º, III, da CF/88), cuja determinação é repassada a todos os níveis da Federação (art. 23, X), com auxílio da sociedade.

A assistência aos desamparados é direito social básico (art. 6º).

Assim, existem direitos constitucionais das pessoas em situação de vulnerabilidade que não estão sendo desempenhados pela falta da norma regulamentadora. Esse direito, contudo, não existe para as pessoas com boa situação econômica. Não se pode extrair, da Constituição Federal, o dever do Estado de pagar um benefício social para as pessoas com boa situação econômica.

O Estado não pode ser segurador universal e distribuir renda a todos os brasileiros, independentemente de critério socioeconômico. Na CF/88, não há qualquer determinação de atuação estatal nesse sentido.

Qual foi o argumento do STF para julgar procedente o MI no que tange às pessoas em situação de vulnerabilidade?

No Brasil verifica-se uma situação de proteção insuficiente no combate à pobreza. Isso precisa ser corrigido. É necessário que haja uma correção de rumos.

Os direitos fundamentais também podem ser traduzidos como proibições de proteção insuficiente ou imperativos de tutela.

Conforme o Decreto 5.209/2004, caracteriza-se renda familiar mensal em situação de pobreza e de extrema pobreza o valor per capita de até R$ 178,00 (cento e setenta e oito reais) e de até R$ 89,00 (oitenta e nove reais), respectivamente (Decreto 5.209/2004).

Nas atualizações ao longo do tempo, houve indiretamente diminuição real do valor limite para fins de enquadramento na linha de corte. Milhões de pessoas foram excluídas dele, embora estivessem abaixo da linha da pobreza, segundo critérios socioeconômicos mundiais. Como se não fosse o bastante, houve perda significativa do poder de compra em si dos benefícios — básico e variáveis — concedidos.

Diante de distorções verificadas, é caso de fazer-se apelo aos Poderes Legislativo e Executivo a fim de que reformulem os programas sociais de transferência de renda em vigor e atualizem as quantias do Programa Bolsa Família.

Conclusão

Presente estado de mora inconstitucional, deve ser fixado o valor da renda básica de cidadania para o estrato da população brasileira em condição de vulnerabilidade socioeconômica — pobreza e extrema pobreza — a ser efetivado, pelo Presidente da República, no exercício fiscal seguinte ao da conclusão do julgamento de mérito (ou seja, em 2022).

A inércia do Poder Executivo em implementar a renda básica ocasiona efeitos deletérios ao sistema de proteção social instituído pela CF/88.

Apesar de a Lei nº 10.835/2004 trazer uma determinação muito clara e mesmo já tendo se passado mais de dezessete anos de sua promulgação, o certo é que o Programa Renda Básica de Cidadania permanece desprovido de qualquer regulamentação.

Programas sociais de transferência de renda servem, fundamentalmente, para reduzir o fosso de desigualdade. A lacuna deve ser colmatada com o objetivo de atender à camada da população que necessita do auxílio estatal e não possui meios de autossubsistência.

A atuação do STF foi voltada à realidade econômica e social, na quadra atual vivenciada e agravada pelas consequências da pandemia do novo coronavírus (Covid-19). No mais, a essencialidade do sistema de proteção social não afasta o dever de consideração das possibilidades materiais e financeiras do Estado. Agrega-se a isso que o diploma legislativo impõe a necessidade de observância das condições econômicas do País e da Lei de Responsabilidade Fiscal. É preciso reconhecer que, em determinados casos, a implementação de políticas públicas unilateralmente pelo Poder Judiciário, em substituição ao crivo político dos representantes eleitos, pode conduzir a um estado de coisas ainda mais inconstitucional que a falta de norma regulamentadora. Evidentemente, eventual concessão da tutela invocada pelo impetrante, mediante fixação arbitrária dos valores da renda básica de cidadania e dos critérios de elegibilidade das primeiras etapas, fatalmente levaria ao desarranjo das contas públicas e, no limite, à desordem do sistema de proteção social brasileiro.

Dispositivo

O Plenário, por maioria, concedeu parcialmente a ordem em mandado de injunção, para:

a) determinar ao Presidente da República que, nos termos do art. 8º, I, da Lei nº 13.300/2016 (Lei do MI), implemente, no exercício fiscal seguinte ao da conclusão do julgamento do mérito (2022), a fixação do valor disposto no art. 2º da Lei nº 10.835/2004 para o estrato da população brasileira em situação de vulnerabilidade socioeconômica (extrema pobreza e pobreza — renda per capita inferior a R$ 89,00 e R$ 178,00, respectivamente — Decreto 5.209/2004), devendo adotar todas as medidas legais cabíveis, inclusive alterando o Plano Plurianual, além de previsão na Lei de Diretrizes Orçamentárias e na Lei Orçamentária Anual de 2022; e
b) realizar apelo aos Poderes Legislativo e Executivo para que adotem as medidas administrativas e/ou legislativas necessárias à atualização dos valores dos benefícios básico e variáveis do Programa Bolsa Família (Lei 10.836/2004), isolada ou conjuntamente, e, ainda, para que aprimorem os programas sociais de transferência de renda atualmente em vigor, mormente a Lei nº 10.835/2004, unificando-os, se possível. Vencidos os ministros Marco Aurélio (relator), Edson Fachin, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski.

21
Q

É constitucional lei que, para proteger a saúde da população contra radiação, veda a instalação de de infraestrutura de suporte para equipamentos de telecomunicações em alguma localidades (praças, parques, jardins)?

A

Resumo

É inconstitucional lei municipal que estabeleça limitações à instalação de sistemas transmissores de telecomunicações por afronta à competência privativa da União para legislar sobre telecomunicações, nos termos dos arts. 21, XI, e 22, IV, da Constituição Federal. STF. Plenário.

ADPF 732/SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 26/4/2021 (Info 1014).

Inteiro teor

Essa Lei é constitucional?

NÃO. Essa lei é formalmente inconstitucional porque adentrou na esfera de competência privativa da União.

Competência para legislar sobre telecomunicações é da União

O art. 21, XI, da CF/88 prevê que compete à União “explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os serviços de telecomunicações, nos termos da lei, que disporá sobre a organização dos serviços, a criação de um órgão regulador e outros aspectos institucionais”.

O art. 22, IV, por sua vez, afirma que compete privativamente à União legislar sobre “água, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão”.

Direito à saúde

O Município argumentou que a referida lei teria por objetivo proteger a saúde da população contra a radiação. A defesa da saúde é matéria de competência concorrente (art. 24, XII, da CF/88).

No entanto, esta Lei, a pretexto de proteger a saúde da população, traz regras sobre os serviços de telecomunicações.

A competência atribuída aos Municípios em matéria de defesa e proteção da saúde não pode se sobrepor ao interesse mais amplo da União no tocante à formulação de uma política de âmbito nacional para o estabelecimento de regras uniformes, em todo o território nacional, com a finalidade de proteger a saúde de toda população brasileira.

Desse modo, ainda que a questão envolva matéria relacionada à proteção de saúde, a regulamentação deve ser feita de forma homogênea no território brasileiro, de acordo com os valores fixados pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e pela Organização Mundial da Saúde (OMS), os quais são obtidos por meio de embasamento científico com a finalidade de proteger a população em geral e viabilizar a operação dos sistemas de telefonia celulares com limites considerados seguros.

Assim, diante do aumento da expansão dos serviços de telefonia móvel no País, da multiplicação na instalação de antenas para possibilitar a execução dos serviços e do fato de não haver estudos conclusivos acerca de malefícios causados à saúde pela emissão de radiação por essas antenas, a necessidade de se garantir a defesa e a proteção da saúde de todos constitui uma das atribuições da União, cujo enfoque há de ser necessariamente nacional.

Legislação federal tratou sobre o tema

Vale ressaltar, por fim, que a matéria já está disciplinada em nível nacional.

A Anatel, agência reguladora do setor, estabeleceu os critérios a serem observados em âmbito nacional.

A Anatel editou a Resolução 700/2018, que regulamenta os limites de exposição humana a campos elétricos, magnéticos e eletromagnéticos na faixa de radiofrequências entre 9 kHz (nove quilohertz) e 300 GHz (trezentos giga-hertz), que devem ser observados por todos que utilizem estações transmissoras de serviços de telecomunicações.

Ainda, no exercício de sua competência privativa para legislar sobre telecomunicações, a União editou a Lei nº 11.934/2009, a qual estabelece “limites à exposição humana a campos elétricos, magnéticos e eletromagnéticos, associados ao funcionamento de estações transmissoras de radiocomunicação, de terminais de usuário e de sistemas de energia elétrica nas faixas de frequências até 300 GHz (trezentos giga-hertz), visando a garantir a proteção da saúde e do meio ambiente” (art. 1º, caput).

De acordo com essa legislação, são adotados expressamente os limites recomendados pela Organização Mundial de Saúde – OMS, que por sua vez, seguem os limites da Comissão Internacional de Proteção Contra Radiação Não Ionizante – ICNIRP.

Posteriormente, foi editada a Lei nº 13.116/2015, “que estabelece normas gerais para a implantação e compartilhamento da infraestrutura de telecomunicações”, a qual objetiva, dentre outras coisas, a “precaução contra os efeitos da emissão de radiação não ionizante, de acordo com os parâmetros definidos em lei” (art. 2º, IV).

22
Q

Constituição Estadual pode preve hipótese de intervenção em município não prevista expressamente na Constituição Federal?

A

Resumo

A Constituição Estadual não pode trazer hipóteses de intervenção estadual diferentes daquelas que são elencadas no art. 35 da Constituição Federal. As hipóteses de intervenção estadual previstas no art. 35 da CF/88 são taxativas. STF. Plenário. ADI 6616/AC, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 26/4/2021 (Info 1014).

Inteiro teor

Seja federal ou estadual, a intervenção é mecanismo essencial e excepcional para o equilíbrio federativo. Ela consiste em procedimento que somente deve ser adotado nas hipóteses e condições taxativamente estabelecidas na CF, pelo seu papel limitador da atuação dos entes federados.

No tocante à intervenção estadual, salienta-se que as disposições do art. 35 da CF/88 consubstanciam preceitos de observância compulsória por parte dos estados-membros. As hipóteses excepcionais — pelas quais permitida a supressão da autonomia municipal e autorizada a intervenção — estão taxativamente nele previstas, sem possibilidade de alteração pelo legislador constituinte estadual, para ampliá-las ou reduzi-las.

Assim, a Constituição estadual não pode trazer outras situações de intervenção estadual diferentes daquilo que foi insculpido na CF/88 (STF. Plenário. ADI 336, Rel. Min. Eros Grau, julgado em 10/02/2010). Veja como o tema já foi cobrado em prova:

 (Procurador TCU 2015 CESPE) A intervenção em município localizado em estado-membro ocorrerá, em cada caso, conforme as hipóteses estabelecidas livremente na respectiva Constituição estadual, que definirá, entre outras coisas, os seus próprios princípios constitucionais de intervenção. (errado)

23
Q

É constitucional norma estadual que veda ao consumidor a possibilidade de abarter veículo em local diverso de posto de combustível?

A

Resumo

É inconstitucional norma estadual que vede ao consumidor, pessoa física, o abastecimento de veículos em local diverso do posto de combustível. STF. Plenário. ADI 6580/RJ, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 11/5/2021 (Info 1016).

Inteiro teor

Uma lei que trate sobre comercialização de combustíveis é uma norma que dispõe sobre “energia”, assunto que é de competência privativa da União, nos termos do art. 22, IV, da CF/88:

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: (…) IV - águas, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão;

Logo, a referida lei estadual é formalmente inconstitucional porque houve uma invasão à competência privativa da União.

Vale ressaltar que, com fundamento no art. 22, IV, da CF/88, o legislador ordinário federal editou a Lei nº 9.478/97, por meio da qual foram definidas as normas gerais sobre a política energética nacional, além de ter sido criada a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

O art. 9º dessa Lei federal afirma que cabe à ANP regulamentar a distribuição e revenda de derivados de petróleo e álcool.

A ANP editou, então, a Resolução 41/2013 que, em seu art. 21, VII, já trata sobre o assunto:

Art. 21. É vedado ao revendedor varejista de combustíveis automotivos: (…)

VII - comercializar e entregar combustível automotivo em local diverso do estabelecimento da revenda varejista e, para o caso de posto revendedor flutuante ou marítimo, em local diverso das áreas adjacentes ao estabelecimento da revenda varejista.

Veja que a disposição da ANP é até parecida com a lei estadual, no entanto, mesmo assim, a norma estadual continua sendo formalmente inconstitucional porque a União é quem tem competência para disciplinar o tema, impor multas e exigi-las.

Sobre esse assunto, é importante que você conheça também o art. 238 da CF/88, que diz o seguinte:

Art. 238. A lei ordenará a venda e revenda de combustíveis de petróleo, álcool carburante e outros combustíveis derivados de matérias-primas renováveis, respeitados os princípios desta Constituição.

Quando o art. 238 fala em lei, ele está se referindo à lei de caráter nacional, ou seja, editada pelo Congresso Nacional.

Logo, não havendo qualquer peculiaridade que exija tratamento diverso, a lei estadual, ao pretender regular matéria já disciplinada em lei federal e em regramento editado pela ANP, imiscuiu-se na competência legislativa da União, em invasão do campo constitucionalmente reservado ao ente central da Federação.

Com base nesse entendimento, o Plenário do STF, por maioria, julgou procedente o pedido formulado em ação direta para declarar a inconstitucionalidade da Lei 9.023/2020 do estado do Rio de Janeiro.

24
Q

Lei estadual pode proibir que instituições financeiras, correspondentes bancários e empresas de leasing façam propaganda de empréstimos para aposentados e pensionistas?

A

É constitucional a proibição — por lei estadual — de que instituições financeiras, correspondentes bancários e sociedades de arrendamento mercantil façam telemarketing, oferta comercial, proposta, publicidade ou qualquer tipo de atividade tendente a convencer aposentados e pensionistas a celebrarem contratos de empréstimo.

Essa lei trata sobre defesa do consumidor, matéria que é de competência concorrente (art. 24, V, da CF/88), servindo para suplementar os princípios e as normas do CDC e reforçar a proteção dos consumidores idosos, grupo em situação de especial vulnerabilidade econômica e social. STF. Plenário. ADI 6727/PR, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 11/5/2021 (Info 1016).

25
Q

É constitucional emenda à Constituição estadual que trate sobre normas gerais para a organização do Ministério Público e sobre atribuições dos órgãos e membros do Parquet?

A

Foi editada emenda à Constituição estadual afirmando que somente o PGJ poderia instaurar inquérito civil e propor ACP contra membros do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Tribunal de Contas, do Ministério Público e da Defensoria Pública.

Essa emenda padece de vícios de inconstitucionalidade formal e material.

A referida emenda é formalmente inconstitucional porque: a) usurpou a iniciativa reservada pela Constituição Federal ao Presidente da República para tratar sobre normas gerais para a organização do Ministério Público estadual (art. 61, § 1º, II, “d”, da CF/88); b) tratou sobre matéria que deve ser disciplinada por meio de lei complementar de iniciativa do chefe do Ministério Público estadual (§ 5º do art. 128 da CF/88).

Além disso, constata-se inconstitucionalidade material na norma impugnada por ofensa à autonomia e à independência do Ministério Público, asseguradas pelo § 2º do art. 127 e pelo § 5º do art. 128 da CF/88. STF. Plenário. ADI 5281/RO e ADI 5324/RO, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 11/5/2021 (Info 1016).

26
Q

Lei estadual pode proibir a suspensão de planos de saúde por inadimplência, mesmo durante a pandemia?

A

Resumo

Por usurpar a competência da União para legislar privativamente sobre direito civil e política de seguros, é formalmente inconstitucional lei estadual que estabelece a possibilidade de o Poder Executivo proibir a suspensão ou o cancelamento de planos de saúde por falta de pagamento durante a situação de emergência do novo coronavírus (Covid-19). STF. Plenário. ADI 6441/RJ, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 14/5/2021 (Info 1017).

Inteiro teor

Essa lei é constitucional?

NÃO. Essa lei estadual possui um vício formal porque tratou de tema que é de competência privativa da União. De acordo com o art. 22, I e VII, da CF/88, compete à União legislar sobre direito civil e política de seguros:

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho; (…)

VII - política de crédito, câmbio, seguros e transferência de valores.

A lei do Estado do Rio de Janeiro, ao possibilitar que o Poder Executivo pudesse proibir a suspensão ou o cancelamento de planos de saúde por falta de pagamento acabou interferindo no conjunto de normas nacionais vigentes sobre a matéria e que se referem ao cumprimento das obrigações contratuais securitárias.

O inciso VII fala em “seguros”; isso abrange também os planos de saúde?

SIM. O art. 22, VII, da CF/88 atribui à União competência para legislar sobre seguros. Essa previsão alcança também os planos de saúde, “tendo em vista a sua íntima afinidade com a lógica dos contratos de seguro, notadamente por conta do componente atuarial” (ADI 4.701, Rel. Min. Roberto Barroso, DJe de 25/8/2014).

Neste caso concreto, não seria possível dizer que a lei é constitucional, já que ela tratou sobre direito do consumidor, matéria que é de competência legislativa concorrente (art. 24, V e VIII, da CF/88)?

NÃO. O STF decidiu que a competência legislativa concorrente em matéria de defesa do consumidor (CF/88, art. 24, V e VIII) não autoriza os Estados-membros a editarem normas que interfiram nas relações contratuais, uma vez que essa atribuição está inserida na competência da União para legislar sobre direito civil (art. 22, I, da CF/88).

[…]

Veja o seguinte julgado com entendimento parecido com o que foi exposto acima:

É inconstitucional lei estadual que reduziu o valor das mensalidades escolares durante a pandemia da Covid-19

É inconstitucional a legislação estadual que estabelece a redução obrigatória das mensalidades da rede privada de ensino durante a vigência das medidas restritivas para o enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do novo Coronavírus.

Essa lei viola a competência privativa da União para legislar sobre Direito Civil (art. 22, I, da CF/88).

Ao estabelecer uma redução geral dos preços fixados nos contratos para os serviços educacionais, a lei alterou, de forma geral e abstrata, o conteúdo dos negócios jurídicos, o que a caracteriza como norma de Direito Civil.

Os efeitos da pandemia sobre os negócios jurídicos privados, inclusive decorrentes de relações de consumo, foram tratados pela Lei federal nº 14.010/2020. Ao estabelecer o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET) para o período, a norma reduziu o espaço de competência complementar dos estados para legislar e não contém previsão geral de modificação dos contratos de prestação de serviços educacionais. STF. ADI 6575, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 18/12/2020 (Info 1003).

Agora muito cuidado com esse outro julgado que pode ser utilizado para confundir você na prova:

É CONSTITUCIONAL lei estadual que obrigue plano de saúde a justificar recusa de tratamento

É constitucional lei estadual que obrigue os planos de saúde a fornecerem aos consumidores informações e documentos justificando as razões pelas quais houve recusa de algum procedimento, tratamento ou internação.

O Mato Grosso do Sul editou uma lei estadual prevendo que, se o plano de saúde recusar algum procedimento, tratamento ou internação, ele deverá fornecer, por escrito, ao usuário, um comprovante fundamentado expondo as razões da negativa.

O STF entendeu que essa norma não viola competência privativa da União, considerando que ela trata sobre proteção ao consumidor, matéria inserida na competência concorrente (art. 24, V, da CF/88). STF. Plenário. ADI 4512/MS, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 7/2/2018 (Info 890).

27
Q

É inconstitucional dispositivo da CE que confere autonomia financeira e orçamentária para a Universidade Estadual, assim como a criação de Procuradoria Jurídica própria e a escolha do reitor sem participação do chefe do Poder Executivo?

A

Resumo

É inconstitucional emenda à Constituição Estadual que confere autonomia financeira e orçamentária próprias de órgãos de Poder à universidade estadual.

É constitucional o repasse de recursos orçamentários para universidade estadual na forma de duodécimos.

Não pode o Estado-membro, por meio de sua Constituição ou legislação, instituir procuradoria jurídica própria para universidade estadual.

É inconstitucional dispositivo da Constituição Estadual que preveja que a Universidade Estadual escolherá seu reitor sem qualquer participação do Chefe do Poder Executivo no processo.

Também é inconstitucional dispositivo da Constituição Estadual que preveja iniciativa privativa da Universidade Estadual para propor projeto de lei que disponha sobre sua estrutura e funcionamento administrativo, bem como sobre suas atividades pedagógicas. STF. Plenário. ADI 5946/RR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 21/5/2021 (Info 1018).

Inteiro teor

É inconstitucional a previsão de autonomia financeira e orçamentária conferida à Universidade Estadual

A CF/88 assegurou autonomia às Universidades, dividindo-a em três campos de incidência: i) didáticocientífica; ii) administrativa; e iii) de gestão financeira e patrimonial. Confira:

Art. 207. As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.

Vejamos o que significa cada uma delas:

Autonomia didático-científica

É a essência da Universidade, que representa um espaço livre para pensar, discutir e rediscutir ideias e ideais, bem como para produzir conhecimento, fazer ciência e, assim, impulsionar a justiça social e o desenvolvimento nacional.

A autonomia didático-científica acarreta um duplo dever do Estado. De um lado, significa que o Poder Público não pode violar sua autonomia. De outro, representa o dever do Estado de garantir ações positivas que possibilitem recursos suficientes para a efetivação de suas garantias.

Autonomia administrativa

Como consequência e condição da autonomia didático-científica, as Universidades gozam de autonomia administrativa, isto é, a garantia de que as providências administrativas necessárias à concreção da liberdade acadêmica possam ser adotadas sem a interferência indevida do Estado.

Apesar disso, vale ressaltar que as Universidades públicas se submetem às regras presentes na Constituição e nas leis. Além disso, estão sujeitas ao controle dos órgãos de fiscalização, de modo que não estão livres dos limites constitucionais e legais impostos à Administração Pública.

Autonomia de gestão financeira e patrimonial

As universidades podem gerir os recursos postos à sua disposição, executar e reestruturar orçamentos, constituir patrimônio e dele livremente dispor. Embora trate-se de uma gestão vinculada às finalidades que orientam a existência da própria instituição, no caso das universidades públicas, essa autonomia permite certa discricionariedade quanto aos meios de execução do seu orçamento.

Com isso, a vinculação ao orçamento do Estado seria decorrência lógica da delegação para que, em nome do Estado, a universidade cumpra seus deveres constitucionais de promover a educação, o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológica.

Conclui que a autonomia didático-científica só se perfectibiliza com as garantias da autonomia administrativa e da autonomia de gestão financeira e patrimonial que, por sua vez, só serão de fato observadas se presentes recursos financeiros mínimos para assegurar seu funcionamento.

Autonomia financeira e orçamentária não foi conferida às Universidades pela CF/88

A emenda discutida ampliou a previsão do art. 207 da CF/88 e conferiu às universidades “autonomia financeira e orçamentária”. Para o STF, tal ampliação é inconstitucional.

A autonomia financeira e orçamentária não foi assegurada pela CF/88 às Universidades, tendo sido conferida apenas aos entes federados, aos poderes instituídos, ao Ministério Público e à Defensoria Pública.

Como vimos, o art. 207 mencionou apenas “autonomia de gestão financeira e patrimonial”, que consiste em liberdade para administrar os recursos e patrimônio que recebe, ou seja, a partir do momento em que “o dinheiro entra na sua conta”.

A autonomia financeira e orçamentária é mais ampla, portanto, permitindo aos poderes elaborar sua própria proposta orçamentária, dentro dos limites estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias, a qual será consolidada pelo Poder Executivo e encaminhada para votação pelo Poder Legislativo.

O Poder Constituinte decorrente (Assembleia Legislativa editando emendas à CE) não pode dar tratamento próprio de poder instituído às Universidades estaduais ou municipais, sob pena de afronta ao princípio da separação dos poderes.

As Universidades, embora autônomas, submetem-se à estrutura do Poder Executivo, que as criou. O poder de elaborar a proposta orçamentária, dentro dos limites legais e respeitadas as estruturas administrativas próprias, é conferido pela Constituição ao Chefe do Poder Executivo.

Da mesma forma, o poder constituinte dos Estados e Distrito Federal não pode, sob pena de violação ao princípio da separação dos poderes – norma de observância obrigatória pelo poder constituinte derivado e decorrente –, prever tal autonomia a órgãos ou entidades vinculadas ao poder executivo estadual, sob pena de usurpar competência própria de um poder, competência essa que não pode ser objeto de renúncia pelo atual ocupante da cadeira de chefia do poder executivo.

Nesse ponto, o STF entendeu que a emenda constitucional impugnada incorreu em inconstitucionalidade material por violação ao previsto no art. 2º da Constituição Federal, uma vez que subtrai poderes do Chefe do Poder Executivo e amplia a autonomia universitária (art. 207 da CF/88), de modo a conferir à Universidade estadual – fundação pública – as autonomias reservadas aos Poderes Executivo, Legislativo, Judiciário, ao Ministério Público e à Defensoria Pública.

28
Q

É constitucional lei estadual que reduz o valor das mensalidades escolares durante a pandemia da Covid-19?

A

Resumo

É inconstitucional lei estadual que estabeleça redução das mensalidades no âmbito da rede privada de ensino, enquanto perdurarem as medidas temporárias para o enfrentamento da pandemia da Covid-19. STF. Plenário. ADI 6445/PA, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Dias Toffoli, julgado em 28/5/2021 (Info 1019).

Inteiro teor

Inconstitucionalidade formal

A referida Lei, ao estabelecer desconto obrigatório nas mensalidades da rede particular de ensino em razão da pandemia causada pela Covid-19, tratou de tema relacionado com Direitos Civil e Contratual, usurpando, assim, a competência legislativa atribuída à União pelo art. 22, I, da Constituição Federal:

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho; (…)

A lei impugnada, ao determinar descontos nas mensalidades que haviam sido pactuadas entre as instituições de ensino e os estudantes, interfere na essência do contrato. Isso porque a lei interfere na vigência de cláusulas contratuais que estão no âmbito da normalidade dos negócios jurídicos onerosos.

Não se trata, portanto, de uma lei que disponha sobre direitos do consumidor contra abusos por parte dos prestadores de serviços educacionais.

A lei estadual, além de contrariar disciplina federal existente sobre o assunto, não tratou sobre nenhuma peculiaridade regional que pudesse justificar um regramento específico quanto aos efeitos da pandemia da Covid-19 em tais contratos.

O Código Civil possui regras específicas que regulamentam a ocorrência de eventos extraordinários e imprevisíveis que possam vir a causar desequilíbrio na execução dos contratos, como a pandemia, a fim de evitar que um dos contratantes seja excessivamente onerado.

Inconstitucionalidade material

Sob o aspecto material, a norma impugnada contraria a livre iniciativa e interfere de forma desproporcional em relações contratuais regularmente constituídas.

29
Q

É constitucional lei estadual que proibiu o corte de energia elétrica durante a pandemia da Covid-19?

A

Resumo

Atendida a razoabilidade, é constitucional legislação estadual que prevê a vedação do corte do fornecimento residencial dos serviços de energia elétrica, em razão do inadimplemento, parcelamento do débito, considerada a crise sanitária. STF. Plenário.

ADI 6588/AM, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 28/5/2021 (Info 1019).

Inteiro teor

Inexistência de violação à competência privativa da União

Não há se falar em invasão da competência legislativa privativa da União para legislar sobre energia elétrica. Isso porque a lei estadual impugnada não atinge de forma direta a relação contratual estabelecida entre a concessionária e o Poder Público concedente, titular do serviço.

A lei também não fere o núcleo de atuação das empresas voltadas à prestação de serviços de fornecimento de energia elétrica, uma vez que não se constata que possa gerar desequilíbrio contratual ou afetar políticas tarifárias, especialmente porque as medidas impostas são excepcionais e transitórias, limitadas ao tempo da vigência do plano de contingência adotado pela Secretaria estadual de saúde em decorrência da pandemia de Covid-19.

Legislação está fundamentada na dignidade da pessoa humana e em outros direitos fundamentais

A não interrupção dos serviços públicos de energia elétrica relaciona-se à satisfação das necessidades básicas da população, pelo que a continuidade do serviço é considerada essencial para a adoção de medidas de contenção do novo coronavírus.

O fornecimento de energia elétrica é direito fundamental relacionado à dignidade humana, ao direito à saúde, à moradia, à alimentação, à educação e à profissão, constituindo-se em serviço público essencial e universal, que deve estar disponível a todos os cidadãos, especialmente no complexo contexto pandêmico vivenciado.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, julgou improcedente pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada contra as Leis nº 5.143/2020 e nº 5.145/2020 do Estado do Amazonas, que proíbem o corte do fornecimento residencial de seus serviços por falta de pagamento de suas respectivas contas, enquanto perdurar o estado de emergência decorrente de situações de extrema gravidade social. Outro julgado no mesmo sentido:

São constitucionais as normas

estaduais, editadas em razão da pandemia causada pelo novo coronavírus, pelas quais veiculados a proibição de suspensão do fornecimento do serviço de energia elétrica, o modo de cobrança, a forma de pagamentos dos débitos e a exigibilidade de multa e juros moratórios.

As normas objetivam regulamentar a relação entre o usuário do serviço e a empresa concessionária, tratando-se, portanto, essencialmente de normas sobre defesa e proteção dos direitos do consumidor e da saúde pública.

STF. Plenário. ADI 6432/RR, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 7/4/2021 (Info 1012).

30
Q

É constitucional lei estadual que proíbe comercialização de produtos que tenham sido desenvolvidos a partir de testes em animais?

A

Resumo

É constitucional lei estadual que proíba a utilização de animais para testes de produtos cosméticos; a lei estadual, contudo, não pode proibir a comercialização de produtos que tenham sido desenvolvidos a partir de testes em animais

Não havendo norma federal disciplinadora, é constitucional lei estadual que proíba a utilização de animais para desenvolvimento, experimento e teste de produtos cosméticos, higiene pessoal, perfumes, limpeza e seus componentes.

É inconstitucional norma estadual que vede a comercialização de produtos desenvolvidos a partir de teste em animais, bem como a que determina que conste no rótulo informação acerca da não realização de testes em animais. STF. Plenário. ADI 5995/RJ, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 28/5/2021 (Info 1019).

Inteiro teor

Proteção à fauna

A Lei nº 7.814/2017, do Estado do Rio de Janeiro, ao proibir a utilização de animais para desenvolvimento, experimentos e testes de produtos cosméticos, de higiene pessoal, perfumes e seus componentes, não invadiu a competência da União.

Esse assunto está relacionado com “proteção da fauna”, matéria de competência legislativa concorrente, nos termos do art. 24, VI, da CF/88:

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: (…)

VI - florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;

A Lei federal nº 11.794/2008 autorizou a utilização de animais em atividades de ensino e pesquisas científicas, desde que sejam observadas algumas condições relacionadas aos procedimentos adotados, que visam a evitar e/ou atenuar o sofrimento dos animais.

No âmbito do Estado do Rio de Janeiro, o tema foi abordado de uma maneira mais restrita, pois a lei estadual proibiu a utilização de animais para o desenvolvimento, experimentos e testes de produtos cosméticos, de higiene pessoal e de perfumes, inclusive estipulando sanção pecuniária e administrativa no caso de descumprimento.

Então, não se pode dizer que a lei estadual violou as normas gerais fixadas pela União? A lei estadual não seria inconstitucional por essa razão?

O STF entendeu que não.

O Estado do Rio de Janeiro, por meio da norma impugnada, não proibiu toda e qualquer realização de testes em animais dentro de seu território, tendo apenas escolhido, dentro da sua competência legiferante, proibir a utilização de animais para o desenvolvimento, experimentos e testes de produtos cosméticos, de higiene pessoal e perfumes.

O legislador carioca optou por seguir um movimento mundial no sentido de proibir os experimentos e testes de cosméticos em animais, o que não torna censurável o exercício de sua competência concorrente para tratar do tema, visando à proteção da vida animal.

O STF possui o entendimento de que, em princípio, em regra, é possível que os Estados editem normas mais protetivas ao meio ambiente que as normas gerais da União, com fundamento em suas peculiaridades regionais e na preponderância de seu interesse, conforme o caso. Foi isso que a lei do Rio de Janeiro fez.

Desse modo, ante a inexistência de disciplina da matéria em nível federal, nos termos do art. 24, § 3º, da CF/88, é permitido aos Estados exercitar a competência legislativa plena.

Na hipótese, apesar da proximidade temática da norma impugnada em relação ao conteúdo da Lei federal 11.794/2008, esta possui objeto distinto, pois dispõe tão somente acerca do uso de animais para afins de atividade de ensino e pesquisa científica.

Portanto, não há, no caso, invasão da competência da União para editar normas gerais sobre fauna, conservação da natureza e proteção do meio ambiente (art. 24, VI, da CF/88).

[…]

Inconstitucionalidade da proibição do comércio interestadual

Por outro lado, o STF declarou a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 1º e do art. 4º da Lei 7.814/2017 do Estado do Rio de Janeiro, que previam o seguinte:

Art. 1º (…) Parágrafo único. Fica também proibida a comercialização dos produtos indicados no caput deste artigo, quando derivados da realização de testes em animais.

Art. 4º Nas embalagens de todos os produtos cosméticos, de higiene pessoal, perfumes e de limpeza comercializados no Estado do Rio de Janeiro deverá existir a seguinte informação aos consumidores: “De acordo com a Lei Estadual nº XXX/20XX, não foram realizados testes em animais para a elaboração deste produto.”

Parágrafo único. A exigência descrita no caput não se aplica aos produtos e substâncias testados e disponíveis para venda, ao tempo da publicação desta Lei.

O STF entendeu que tais dispositivos legais violam a competência legislativa da União para editar normas gerais sobre produção e consumo, e para legislar sobre comércio interestadual, respectivamente assim previstas na CF/88:

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: (…)

V - produção e consumo;

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:(…)

VIII - comércio exterior e interestadual;

A vedação imposta genericamente à comercialização de todo e qualquer produto sem distinção da sua respectiva origem invade a competência da União para legislar sobre comércio interestadual, nos termos do art. 22, VIII, da CF/88. Quanto ao dispositivo que exige a informação, no rótulo do produto, de que não houve testes em animais, essa previsão entraria na competência federal para legislar sobre produção e consumo, pois há diversas normas federais tratando da matéria.

Em suma:

É inconstitucional norma estadual que vede a comercialização de produtos desenvolvidos a partir de teste em animais, bem como a que determina que conste no rótulo informação acerca da não realização de testes em animais. STF. Plenário. ADI 5995/RJ, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 28/5/2021 (Info 1019).

Não confunda:

  • Lei estadual pode proibir a utilização de animais para desenvolvimento, experimentos e testes de produtos cosméticos;
  • Lei estadual não pode proibir a comercialização de produtos desenvolvidos a partir de teste em animais;
  • Lei estadual não pode determinar que conste no rótulo dos produtos informação acerca da não realização de testes em animais.
31
Q

O subsídio de deputados estaduais pode ser fixado, por decreto legislativo, em 75% do valor dos subsídio dos deputados federais?

A

Resumo

O subsídio dos deputados estaduais deve ser fixado por lei em sentido formal (art. 27, § 2º, da CF/88). A vinculação do valor do subsídio dos Deputados Estaduais ao quantum estipulado pela União aos deputados federais é incompatível com o princípio federativo e com a autonomia dos entes federados (art. 18, da CF/88). É vedada a vinculação ou a equiparação remuneratória em relação aos agentes políticos ou servidores públicos em geral. STF. Plenário. ADI 6437/MT, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 28/5/2021 (Info 1019).

Inteiro teor

Inconstitucionalidade formal

O art. 27, §2º da CF/88, depois da EC 19/98, passou a prever que o subsídio dos Deputados Estaduais deve ser fixado por meio de lei em sentido formal:

Art. 27 (…) § 2º O subsídio dos Deputados Estaduais será fixado por lei de iniciativa da Assembleia Legislativa, na razão de, no máximo, setenta e cinco por cento daquele estabelecido, em espécie, para os Deputados Federais, observado o que dispõem os arts. 39, § 4º, 57, § 7º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19/98)

Diante disso, o STF entende que o regime remuneratório dos agentes públicos se submete ao princípio da reserva de lei, reconhecendo como incompatível com o modelo constitucional vigente a modificação de padrões remuneratórios dos agentes políticos e servidores públicos realizada por meio de atos normativos que não se qualificam como lei em sentido formal, tais como as resoluções e decretos legislativos ou os atos regulamentares em geral.

Inconstitucionalidade material

Esse Decreto Legislativo possui também um vício de inconstitucionalidade material. Isso porque a lei que fixar o subsídio dos Deputados Estaduais não pode estabelecer uma vinculação automática com o subsídio dos Deputados Federais. Essa vinculação afronta o princípio federativo e a autonomia do Estado-membro.

A vinculação entre o subsídio dos Deputados Estaduais e dos Deputados Federais acarreta o esvaziamento da autonomia administrativa e financeira dos Estados-membros, pois destitui os entes subnacionais da prerrogativa de estipular o valor da remuneração de seus agentes políticos, impondo-lhes a observância do quantum definido pela União.

O Decreto Legislativo, ao fazer uma vinculação automática da remuneração dos Deputados Estaduais em relação aos Deputados Federais, viola a autonomia do Estado-membro. Isso porque, de forma indireta, quem estará fixando a remuneração dos Deputados Estaduais será o Congresso Nacional, já que todas as vezes em que ele aumentar o subsídio dos Parlamentares federais, haverá automática majoração em nível estadual.

A cada aumento efetuado no subsídio dos Deputados Federais, haveria repercussão, por via reflexa, no correspondente subsídio dos Deputados Estaduais em questão. Isso esvaziaria a autonomia administrativa e financeira dos Estados-membros, destituindo-os da prerrogativa de estipular o valor da remuneração de seus agentes políticos em detrimento da observância do quantum definido pela União.

O art. 37, XIII, da CF/88 veda a equiparação e a vinculação de quaisquer espécies remuneratórias para o efeito de remuneração de pessoal do serviço público:

Art. 37 (…) XIII - é vedada a vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para o efeito de remuneração de pessoal do serviço público; (Redação dada pela EC 19/98)

32
Q

É constitucional dispositivo de constituição estadual que preveja que a assembleia legislativa possa requisitar informações de dirigente de agência reguladora estatal, cominando com crime de responsabilidade não só a recusa, mas também o fornecimento de informações falsas?

A

Resumo

É incompatível com a Constituição Federal ato normativo estadual que amplie as atribuições de fiscalização do Legislativo local e o rol de autoridades submetidas à solicitação de informações

O art. 50, caput e § 2º, da CF/88 traduz norma de observância obrigatória pelos Estadosmembros que, por imposição do princípio da simetria (art. 25 da CF/88), não podem ampliar o rol de autoridades sujeitas à fiscalização direta pelo Poder Legislativo e à sanção por crime de responsabilidade.

STF. Plenário. ADI 5289/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 7/6/2021 (Info 1020).

Inteiro teor

A situação concreta foi a seguinte:

A Constituição do Estado de São Paulo previu que a Assembleia Legislativa poderia requisitar informações de diversas autoridades estaduais e que se tais autoridades não cumprissem a determinação ou apresentassem informações falsas, isso significaria a prática de crime de responsabilidade.

Veja a redação do dispositivo:

Artigo 20. Compete, exclusivamente, à Assembleia Legislativa: (…) XVI – requisitar informações dos Secretários de Estado, dirigentes, diretores e superintendentes de órgãos da administração pública indireta e fundacional, do Procurador-Geral de Justiça, dos Reitores das universidades públicas estaduais e dos diretores de Agência Reguladora sobre assunto relacionado com sua pasta ou instituição, importando crime de responsabilidade não só a recusa ou o não atendimento, no prazo de trinta dias, bem como o fornecimento de informações falsas;

ADI

O PGR ajuizou ADI contra essa previsão.

O autor argumentou que a fiscalização dos atos do Poder Executivo pelas assembleias legislativas deve seguir o mesmo modelo que é previsto na Constituição Federal para o Congresso Nacional.

Assim, com base no princípio da simetria, deve-se analisar o modelo federal e aplicá-lo, por simetria, em nível estadual.

Ocorre que o constituinte estadual ampliou o rol de autoridades que deverão prestar informações, sob pena de crime de responsabilidade. Com isso, o constituinte estadual extrapolou o modelo federal e, por isso, incidiu em inconstitucionalidade.

Além disso, o constituinte estadual acabou legislando sobre crime de responsabilidade, o que é de competência privativa da União (art. 22, I, da CF/88).

Os argumentos do PGR foram acolhidos pelo STF?

SIM. É incompatível com a Constituição Federal ato normativo estadual que amplie as atribuições de fiscalização do Legislativo local e o rol de autoridades submetidas à solicitação de informações. STF. Plenário. ADI 5289/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 7/6/2021 (Info 1020).

Princípio da simetria

O Poder Legislativo possui o poder de convocar determinadas autoridades, mas autoridades integrantes do Poder Executivo, e não do Poder Judiciário ou do Ministério Público. Esse poder convocatório está previsto no art. 50 da CF/88:

Art. 50. A Câmara dos Deputados e o Senado Federal, ou qualquer de suas Comissões, poderão convocar Ministro de Estado ou quaisquer titulares de órgãos diretamente subordinados à Presidência da República para prestarem, pessoalmente, informações sobre assunto previamente determinado, importando crime de responsabilidade a ausência sem justificação adequada. (…)

§ 2º As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal poderão encaminhar pedidos escritos de informações a Ministros de Estado ou a qualquer das pessoas referidas no caput deste artigo, importando em crime de responsabilidade a recusa, ou o não - atendimento, no prazo de trinta dias, bem como a prestação de informações falsas

33
Q

É constitucional lei estadual que estabeleça prazo máximo para que os planos de saúde autorizem solicitações de exames e procedimentos cirúrgicos?

A

É inconstitucional lei estadual que estabeleça prazo máximo de 24 horas para as empresas de plano de saúde regionais autorizarem ou não solicitações de exames e procedimentos cirúrgicos em seus usuários que tenham mais de 60 anos. Essa lei é inconstitucional por usurpar competência privativa da União para legislar sobre Direito Civil e política de seguros (art. 22, I e VII, da CF/88). STF. Plenário. ADI 6452/ES, Rel. Min. Edson Fachin, redator do acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgado em 11/6/2021 (Info 1021).

Cuidado para não confundir

É constitucional lei estadual que obrigue os planos de saúde a fornecerem aos consumidores informações e documentos justificando as razões pelas quais houve recusa de algum procedimento, tratamento ou internação.

O Mato Grosso do Sul editou uma lei estadual prevendo que, se o plano de saúde recusar algum procedimento, tratamento ou internação, ele deverá fornecer, por escrito, ao usuário, um comprovante fundamentado expondo as razões da negativa.

O STF entendeu que essa norma não viola competência privativa da União, considerando que ela trata sobre proteção ao consumidor, matéria inserida na competência concorrente (art. 24, V, da CF/88). STF. Plenário. ADI 4512/MS, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 7/2/2018 (Info 890).

34
Q

É constitucional lei estadual que obriga planos de saúde a atenderem os clientes com Covid-19 mesmo que eles estejam no período de carência contratual?

A

É inconstitucional legislação estadual que impeça as operadoras de planos de saúde de recusarem o atendimento ou a prestação de alguns serviços, no âmbito de seu território, aos usuários diagnosticados ou suspeitos de estarem com Covid-19, em razão de período de carência contratual vigente. Essa norma é inconstitucional por usurpar competência privativa da União para legislar sobre Direito Civil, Comercial e política de seguros (art. 22, I e VII, da CF/88). STF. Plenário. ADI 6493/PB, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 11/6/2021 (Info 1021)

35
Q

É cabível declarar-se inconstitucional uma lei por descumprimento de regras do regimento interno das casas do legislativo?

A

Resumo

O controle judicial de atos “interna corporis” das Casas Legislativas só é cabível nos casos em que haja desrespeito às normas constitucionais pertinentes ao processo legislativo (arts. 59 a 69 da CF/88).

Tese fixada pelo STF: “Em respeito ao princípio da separação dos poderes, previsto no art. 2º da Constituição Federal, quando não caracterizado o desrespeito às normas constitucionais pertinentes ao processo legislativo, é defeso ao Poder Judiciário exercer o controle jurisdicional em relação à interpretação do sentido e do alcance de normas meramente regimentais das Casas Legislativas, por se tratar de matéria ‘interna corporis’.” STF. Plenário. RE 1297884/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 11/6/2021 (Repercussão Geral – Tema 1120) (Info 1021).

Inteiro teor

O STF entende que não cabe a declaração de inconstitucionalidade formal de lei por ofensa apenas às normas regimentais das Casas Legislativas. Isso porque a intepretação do regimento interno do Poder Legislativo é considerado assunto interna corporis, não sujeito, portanto, ao controle judicial, sob pena de violação ao princípio da independência dos poderes:

A interpretação e a aplicação do Regimento Interno da Câmara dos Deputados constituem matéria interna corporis, insuscetível de apreciação pelo Poder Judiciário. STF. Plenário. MS 26.062/DF-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 4/4/2008.

Não é possível o controle jurisdicional em relação à interpretação de normas regimentais das Casas Legislativas, sendo vedado ao Poder Judiciário, substituindo-se ao próprio Legislativo, dizer qual o verdadeiro significado da previsão regimental, por tratar-se de assunto interna corporis, sob pena de ostensivo desrespeito à Separação de Poderes, por intromissão política do Judiciário no Legislativo.

A proteção ao princípio fundamental inserido no art. 2º da CF/1988, segundo o qual, são Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário, afasta a possibilidade de ingerência do Poder Judiciário nas questões de conflitos de interpretação, aplicação e alcance de normas meramente regimentais. STF. Plenário. MS 36.662 AgR, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe de 7/11/2019

36
Q

São constitucionais as restrições ao exercício da advocacia aos servidores do Poder Judiciário e do Ministério Público?

A

Sim.

São constitucionais as restrições ao exercício da advocacia aos servidores do Poder Judiciário e do Ministério Público, previstas nos arts. 28, IV, e 30, I, da Lei nº 8.906/94, e no art. 21 da Lei nº 11.415/2006 (atual art. 21 da Lei nº 13.316/2015). STF. Plenário. ADI 5235/DF, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 11/6/2021 (Info 1021).