Juliano Bernarde e Olavo Ferreira - Direitos fundamentais em espécie Flashcards

1
Q

O que são direitos individuais de expressão coletiva?

A

São direitos de titularidade individual, mas cujo exercício pressupõe a atuação convergente de uma pluralidade de pessoas. Exemplos: o direito de reunião e de associação; o direito de votar e de ser votado.

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2
Q

Em que momento se inicia a proteção conferida pelo direito constitucional à vida?

A

Na ADIn 3.510\DF, ao apreciar a constitucionalidade do art. 5 da Lei de Biossegurança, o Plenário do STF considerou que a inviolabilidade constitucional do direito à vida diz respeito, exclusivamente, a indivíduos que sobreviveram ao parto. Ou seja, no âmbito de proteção do direito constitucional à vida não alcança embriões nem fetos, mas somente aqueles que nascem vivos. Para a Corte, “o embrião é o embrião, o feto é o feto, e a pessoa humana é a pessoa humana. Donde não existente pessoa humana embrionária, mas embrião de pessoa humana”. Contudo, o STF ressaltou que o princípio da dignidade da pessoa humana autoriza o legislador a transbordar a proteção contitucional à vida, para proteger momentos da vida humana anteriores ao nascimento, tal como preveem alguns dispositivos do Código Civil (direitos do nascituro), da Lei 9.434\97 (vedação à gestante de dispor de tecidos, órgãos ou partes de seu corpo vivo) e do Código Penal (criminalização do aborto). Por outro lado, no mesmo precedente, o STF acabou por fixar que a proteção ao feto é matéria de status infraconsticucional.

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3
Q

Qual a diferença entre eutanásia e ortotanásia? Constituem crime essas práticas?

A

Eutanásia é a palavra de origem grega cujo significado literal é “morte sem sofrimento”. Implica, portanto, redução intencional do período durante o qual a vida normalmente se prolongaria. No caso da chamada eutanásia terapêutica, a indução ou antecipação da morte é feita com o objetivo de estancar ou evitar sofrimento extremo de pessoa sem chance de recuperação. Exemplo: o uso de medicamente legal para induzir a morte de paciente terminal.

Já a ortotanásia (para alguns, eutanásia passiva) importa apenas em permitir que a vida do paciente terminal se esvaia em seu ritmo natural, sem intervenção para abreviá-la. Decorre ou da inércia em adotar algum tratamento que poderia prolongar a vida do paciente ou da simples interrupção dos tratamentos de saúde que o mantinham vivo. Exemplo: o desligamento dos aparelhos de respiração artificial de doente com falência dos órgãos cardiorrespiratórios. […]

No Brasil, não há dúvidas em que estão proibidos os procedimentos voltados à eutanásia ativa, já que enquadrados no tipo penal do homicídio doloso, ainda que sob a modalidade privilegiada (art. 121, § 1º, do CP). Mas é controversa a situação penal da ortotanásia. Para muitos penalistas, a ortotanásia constitui homicício privilegiado praticado por conduta omissiva (homicídio comissivo por omissão), pois o médico que assiste o doente teria a “responsabilidade” de empregar todos os meios disponíveis para evitar o resultado morte (art. 121, § 1º, c\c art. 13, § 2º, do CP). Melhor entender, contudo, que a ortotanásia não configura crime, pois o médico não possui obrigação de artificialmente prolongar o sofrimento de paciente em estado terminal, se essa não é a vontade dele próprio ou de seu representante legal. [vai nessa linha o Código de Ética Médica aprovado em 2009]

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4
Q

Para que fique caracterizada a invasão de domicílio praticada por agentes estatais, é necessária prova de resistência do particular, ou cabe aos agentes demonstrar a existência do consentimento?

A

O consentimento [quanto à exposição] há de ser livre e bem orientado, embora possa ser tácito ou até posterior. Nessa linha, considera-se tacitamante consentida publicidade, por exemplo, quanto a atos praticados em local público, sobretudo por pessoas que despertem interesse público à informação. Contudo, em geral, não se deve presumir o consentimento tácito em situações de grande assimetria de poder, tais como em certas buscas domiciliares feitas por agentes do Estado. STF: Diferentemente da posição defendida no texto acima, no HC 79.512\RJ, o Plenário do STF entendeu que a prova da prévia resistência do particular era necessária à caracterização da violação do domicílio por parte de agentes fazendários, pois a Constituição ressalva as hipóteses em que o ingresso domiciliar ocorre sob a permissão do morador.

STJ (2021):

Em julgamento realizado nesta terça-feira (2), a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que os agentes policiais, caso precisem entrar em uma residência para investigar a ocorrência de crime e não tenham mandado judicial, devem registrar a autorização do morador em vídeo e áudio, como forma de não deixar dúvidas sobre o seu consentimento. A permissão para o ingresso dos policiais no imóvel também deve ser registrada, sempre que possível, por escrito.

O colegiado estabeleceu o prazo de um ano para o aparelhamento das polícias, o treinamento dos agentes e demais providências necessárias para evitar futuras situações de ilicitude que possam, entre outros efeitos, resultar em responsabilização administrativa, civil e penal dos policiais, além da anulação das provas colhidas nas investigações.

Seguindo o voto do relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, a turma concedeu habeas corpus – requerido pela Defensoria Pública de São Paulo – ​para anular prova obtida durante invasão policial não autorizada em uma casa e absolver um homem condenado por tráfico de drogas. Os policiais alegaram que tiveram autorização do morador para ingressar na casa – onde encontraram cerca de cem gramas de maconha –, mas o acusado afirmou que os agentes forçaram a entrada e que ele não teve como se opor.

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5
Q

Há quebra de sigilo quando autoridades públicas, sem autorização judicial, mas autorizada por lei, acessam informações sigilosas dos cidadãos?

A

Quebra vs. transferência de sigilo: As restrições e intervenções admitidas em desfavor do direito à intimidade não implicam automática quebra de sigilo. Quando a Constituição e a leis asseguram a autoridades públicas o poder de acessar informações sigilosas, o interesse público a nortear a mitigação ao direito à intimidade justifica, via de regra, apenas a transferência do sigilo a ambiente diverso (em geral, ao ambiente das investigações policiais e dos processo judiciais). De modo que os dados sensíveis, embora licitamente acessados, seguem sigilosos em face de outros ambientes. A efetiva quebra do sigilo só ocorrerá quando for obrigatoriamente público o ambiente para o qual as informações sigilosas tiverem sido licitamente transferidas. (p. 54)

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6
Q

A proteção ao domicílio pode ser invocada para impedir o acesso do Fisco a estabelecimentos comerciais para examinar documentos úteis à atividade tributária do Estado?

A

É discutível se a proteção do domicílio, ao alcançar estabelecimentos comerciais, pode ser invocada para evitar o acesso do Fisco a documentos fiscais que ali se encontrem, arquivados ou não. Afinal, autoridades fiscais têm poderes para conferir e apurar a capacidade tributária e as atividades econômicas do contribuinte, nos “termos da lei” (art. 145, § 1º). E o art 195 do CTN afasta “quaisquer disposições legais excludentes ou limitativas” do direito do Fisco “de examinar mercadorias, livros, arquivos, documentos, papéis e efeitos comerciais ou discais, dos comerciantes industriais ou produtores, ou da obrigação destes de exibi-los” (art. 195 do CTN). Bem por isso, a 2 Turma do STF, vencido o Min. CELSO DE MELLO, já decidira que pessoa jurídica que exerce atividade tributável não pode invocar o sigilo domiciliar para evitar a fiscalização tributária nem a eventual apreensão de documentos fiscais, até porque os documentos foram apreendidos no “interior da sede da empresa, e não no domicílio de seu responsável legal” (trecho do voto vencedor da Min. ELLEN GRACIE, no HC 87.654\PR, j. em 7-3-2006). Porém, a jurisprudência da Corte parece consolidada no sentido contrário. Embora não se tratasse de diligência em face de documentos fiscais da titularidade da própria sociedade fiscalizada, mas de busca e apreensão de livros e documentos de outrem e que estavam arquivados em escritório de contabilidade não aberto ao público, a ementa HC 93.050\RJ (da lavra do mesmo Ministro que ficara vencido no HC 87.654\PR) foi além das dimensões do caso e aproveitou para acentuar que o atributo da autoexecutoriedade dos atos administrativos “não prevalece sobre a garantia constitucional da inviolabilidade domiciliar, ainda que se cuide de atividade exercida pelo poder público em sede de fiscalização tributária” (2 Turma, j. em 10-6-2008). Ver, ainda, HC 82.788\RJ, 2 Turma, j. em 12-4-2005.

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7
Q

Se fotografia revelando a prática de pedofilia são furtadas de seu autor e depois entregues a polícia, essa prova poderá ser utilizada contra o criminoso?

A

Consequências da inviabilidade domiciliar: […] No âmbito processo, a consequência mais relevante diz com a ilicitude e, portanto, a imprestabilidade das provas colhidas mediante invasão domiciliar, as quais deverão ser extirpadas do processo sem prejuízo da contaminação daí derivada em face de outros elementos probatórios. Reparar que a nulidade das provas assim obtidas se estende não somente àquelas colhidas diretamente por agentes do Estado, mas também por particulares. Nesse último sentido, aliás, o STF já reconheceu como ilícita a prova do crime do art. 241 do ECA (guarda de material pornográfico envolvendo menores de idade), pois as fotografias comprometedoras haviam sido furtadas “do interior de um cofre existente em consultório odontológico pertencente ao réu, vindo a ser utilizado pelo Ministério Público, contra o acusado, em sede de persecução penal, depois que o próprio autor do furto entregou à Polícia as fotos incriminadoras que havia subtraído” (RE 251.445\GO, decisão monocrática do Min. CELSO DE MELLO).

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8
Q

Sobre o sigilo de dados, aponte as correntes que tratam do tema, a posição da jurisprudência e as normas editadas pelo legislador.

A

Sobre a concorrência da proteção proporcionada pelo incisos X e XII do art. 5 da Constituição, alinham-se três posições básicas:

1) teoria da proteção ampla: o sigilo de dados está assegurado genericamente no inciso X e também, mais especificamente, no inciso XII do art. 5, que protege não só a comunicação de dados, como também os dados sigilosos em si, incluindos os bancários e fiscais. É a posição majoritária da doutrina. Posicionamento acolhido pelo Plenário do STF quanto aos dados bancários (RE 389.808\PR, entendimento hoje superado) e aos dados sigilosos constantes em processos judiciais (Rcl 9.428\DF). Com exceção dos dados cadastrais (referentes à qualificação pessoal, filiação e endereço), foi a teoria adotada pelo legislador acerca das informações sigilosas armazenadas pela Justiça Eleitoral, pelas empresas telefônicas, pelas instituições financeiras, pelos provedores de internet e pelas administradoras de cartão de crédito (ver art. 17-B da Lei 9.613\98, incluído pela Lei 12.683\2012, e art. 15 da Lei 12.850\2013).

2) teoria da proteção restrita: conforma vários precedentes do STF, o sigilo de dados só está protegido pelo inciso X, pois o inciso XII só se refere ao sigilo de comunicação\transparência de dados (fluxo de informações), e não aos dados propriamente ditos (resultado do fluxo das informações). Trata-se de posição doutrinária minoritária, mas dominante no STF (Plenário: RE 418.416\SC, QO na Pet 577\DF e ADIn 2.407\SC; 2 Turma: RE 219.780\PE). É também a teoria que torna desnecessária a observância da reserva absoluta da jurisdição em matéria de obtenção de dados telefônicos, bancários e fiscais por parte das CPIs (por todos, v. MS 23.652\DF, Plenário do STF). Adotada pelo TRFs da 1 e 4 Regiões, o que ao Ministério Público obter (sic), diretamente, dados telefônicos de pessoas sob investigação, sem confundir o assunto com a cláusula do inciso XII do art. 5. Teoria reafirmada pelo Plenário do STF, em 24-2-2016, no julgamento do RE 601.314 (com repercussão geral) e da ADIn 2.390\DF.

3) teoria intermediária: parte da doutrina defende que o inciso XII protege as comunicações pessoais, incluindo os dados delas resultantes. Porém, os “dados constantes dos arquivos pessoais ou privados (“não transmitidos”)”, a exemplo dos dados fiscais, bancários e telefônicos, só contam com proteção genérica do inciso X do art. 5 (NOVELINO, 2009, p. 400-404).

Atenção: (a) Com relação aos dados sigilosos armazenados pela Justiça Eleitoral, empresas telefônicas, instituições financeiras, provedores de internet e administradoras de cartão de crédito, o legislador adotou a teoria da proteção restrita, em matéria de dados cadastrais (qualificação pessoal, filiação e endereço), mas adotou a teoria da proteção ampla, quanto às demais informações sigilosas mantidas por tais entidades. Ver o art. 17-A da Lei 9.613\98, incluído pela Lei 12.683\2012, bem como art. 15 da Lei 12.850\2013.

(b) Quanto aos dados telefônicos em si, o art. 17 da Lei 12.850\2013 passa a impressão de que se trata de informações disponíveis também aos delegados de polícia e ao Ministério Público. Porém, o próprio dispositivo remete ao art. 15 da mesma lei, que torna imprescindível autorização judicial para acessá-los. Nada obstante, o § 4º do art. 13-B do CPP, com redação da Lei 13.344\2016, permite que delegados de polícia e órgãos do Ministério Público possam obter, diretamente das empresas concessionárias, dados telefônicos ou telemático (sinais, informações e outros) que permitam a localização da vítima ou dos suspeitos de crimes relacionados ao tráfico de pessoas. Contudo, essa previsão legal de acesso direito pressupõe prévio pedido à autoridade judicial, cuja resposta não tenha sido providenciada em até 12 horas.
(c) Com relação aos bancos de dados de reservas e registros de viagens arquivados em empresas de transporte, o legislador adotou a teoria da proteção restrita: tais informações podem ser diretamente acessadas, sem autorização judicial, pelo Ministério Público ou por delegados de polícia (art. 16 da Lei 12.850\2013).

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9
Q

É indispensável autorização judicial para restrição ao direito de privacidade? O sigilo bancário se insere no âmbito de proteção desse direito?

A

[…] Já no âmbito mais periférico [mais periférico que a esfera da publicidade] da proteção proporcionada pelo direito à privacidade está a esfera da privacidade. Tem a ver com aspectos da vida pessoal que, mesmo não abrangidos pela esfera da publicidade, são do conhecimento de pessoas sem grande intimidade com o titular do direito, tais como clegas de trabalho, vizinhos, prestadores de serviço em geral. Nesse âmbito incluem-se todos aqueles aspectos e dados sensíveis protegidos pelo direito geral à intimidade (Art. 5, X, da CF), cujo acesso não consentido pode ocorrer em condições menos rígidas que as exigidas para intervir nas duas outras esferas concêntricas. Daí por que, observados princípio do interesse público e a proporcionalidade, o legislador pode estabelecer restrições a esta esfera da privacidade, sem que a Constituição exija condicioná-las à reserva absoluta de jurisdição. Exemplos de aspectos que, protegidos pela esfera da privadade, podem ser acessados por certos órgãos públicos, independentemente de prévia autorização judicial: dados de registros telefônicos (informações sobre chamadas efetuadas e recebidas), os quais podem ser obtidos por CPIs ou pela agência reguladora do setor, bem como, em determinadas circunstâncias, pelo Ministério Público ou por autoridade policial (v. art. 13-A do CPP); as encomendas postais, cuja abertura é permitida em alguns casos previstos na Lei 6.539\79; os objetos sujeitos à verificação policial mediante buscas pessoais sem mandados judicial, nos termos do art. 244 do CPP; as informações patrimoniais e os dados cujo conhecimento seja necessário à administração e fiscalização tributárias podem ser acessados por agentes do Fisco (Constituição, art. 145, § 1º, c\c art. 195 do CTN). Incluem-se nessa esfera da privacidade os dados referentes aos sigilos fiscal e bancário. (p.50) […] As informações bancárias são dados sensíveis pertencentes à esfera da privacidade (inciso X do art. 5), e não propriamente à esfera da intimidade (inciso XII do art. 5). Logo, atendido o princípio da proporcionalidade, o legislador dispõe do poder de conformação\restrição do sigilo bancário em favor do interesse público, sem necessidade de monopólio judicial da primeira palavra (Reserva absoluta de jurisdição). (p. 69) [..] STF: No STF, no julgamento da QO na PET 577\DF (j. em 25-3-92), o Plenário manteve o entendimento do Min. CARLOS VELLOSO, segundo o qual o sigilo bancário estava protegido pela cláusula geral da privacidade (inciso X do art. 5 da Constituição), e não pelo inciso XII do art. 5- como defendia o voto vencido do Ministro MARCO AURÉLIO. […] essa distinção é altamente relevante. A se entender que o sigilo bancário está alcançado pela proteção especial do inciso XII do art. 5 (esfera da intimidade), só poderá ser acessado “por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal”. Nessa linha, toda quebra de sigilo bancário passaria a depender de ordem de juízo criminal, o que inviabilizaria não só o acesso direto desses dados por autoridades administrativas, incluindo CPIs, como também interditaria a obtenção de dados bancários para fins de processo cíveis, incluindo execuções em geral, ações populares, ações civis públicas e de improbidade administrativa. Algo inteiramente incompatível com o sistema normativo de qualquer país. (p. 71)

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10
Q

Quais disposições constitucionais visam a garantir o direito da intimidade da pessoa (não privacidade)?

A

[…] em relação à esfera da intimidade da pessoa, a Constituição Federal assegura proteção de nível intermediário. Essa esfera engloba tanto os ambientes reservados em que se desenvolvem os atos da vida privada (domicílio, escritório profissional e, eventualmente, até computadores, tablets e smartphones) quanto aquelas informações e dados sensíveis compartilhados somente por círculo bastante restrito de pessoas, tais como empregados do ambiente domiciliar (âmbito do sigilo domiciliar), amigos próximos (âmbito do sigilo da amizade), familiares (âmbito do sigilo familiar) e profissionais específicos (âmbito do sigilo profissional em sentido amplo) - v.v., médico, psicólogos, advogados, contadores, padres. No Brasil, a esfera da intimidade beneficia as pessoas em geral (incluindo as jurídicas) e alcança os bens jurídicos especialmente protegidos pela inviolabilidade do domicílio (Art. 5, XI), pelos sigilos profissionais em sentido amplo (e.g., arts. 5, XIV, e 53, § 6º) e pelas comunicações\transmissões de dados (Art. 5, XII). De modo que a proteção reforçada atribuída a essa esfera faz com que o acesso não consentido a tais aspectos sigilosos, quando admissível, além da presença de outros requisitos, dependa sempre de ordem judicial (reserva absoluta de jurisdição ou monopólio judicial da primeira palavra).

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11
Q

O TCU pode requisitar a quebra do sigilo bancário?

A

[…] no julgamento do MS 22.801\DF (Pleno), o STF não reconheceu ao TCU poderes para requisitar a quebra de sigilo bancário, dada a ausência de “determinação na lei específica que tratou do tema” (LC 105\2001), “não cabendo a interpretação extensiva”.

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12
Q

Quais são órgões a respeito dos quais não pairam dúvidas sobre a competência para requisitar transferência do sigilo bancário?

A

(a) órgãos do Poder Judiciário; (b) Plenário da Câmara dos Deputados; (c) Plenário do Senado Federal; (d) Plenário das Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs), incluindo as CPIs instraurdas por Assembleias Estaduais, Câmara Distrital e Câmas Municipais (STF, ACO 730\RJ)

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13
Q

O MP tem legitimidade para requisitar o afastamento do sigilo bancário?

A

Autores como ALEXANDRE DE MORAES e NELSON NERY JUNIOR defendem a possibilidade de afastamento do sigilo bancário por determinação do Ministério Público, com fundamento no poder requisitório previsto no inciso VI do art. 129 da Constituição, bem como no § 2º do art. 8º da LC 75\93 (LOMPU), e, relativamente ao Ministério Público dos Estados-membros, no art. 80 da Lei 8.625\93, que determina a aplicação subsidiária da LC 75\93. Todavia, antes mesmo do controverso (e hoje superado) RE 389.808\PR, a 1 Turma do STF já entendera que, a se ter “presente que o sigilo bancário é espécie de direito à privacidade, que a CF consagra, art 5, X, somente autorização expressa da Constituição legitimaria o Ministério Público a promover, diretamente e sem a intervenção da autoridade judiciária, a quebra do sigilo bancário de qualquer pessoa” (RE 215.301\CE). No mesmo sentido, AgRg no RE 318.136\RJ, 2 Turma. De outro lado, no MS 21.729\DF, o Plenário do STF decidiu não estarem protegidos pela direito à privacidade as informações bancárias referentes a financimantos e empréstimos concedidos com recursos públicos (no caso, tratava-se de recursos subsidiados pelo erário federal). Logo, nessa hipóteses, a Corte admite o levantamento do sigilo bancário por requisição do Ministério Público_. Esse poder requisitório do Ministério Público foi confirmado e ampliado no RHC 133.118\CE (j. em 26-9-2017), precedente em que a 2 Turma do STF entendeu não só que, diante da “existência de indícios da prática de ilícitos penais envolvendo verbas públicas, cabe ao MP, no exercício de seus poderes investigatórios (CF, art. 129, VIII), requisitar os registros de operações financeiras relativos aos recursos movimentados a partir de conta-corrente de titularidade da prefeitura municipal”, como também que tal “requisição compreende, por extensão, o acesso aos registros das operações bancárias sucessivas, ainda que realizados por particulares, e objetiva garantir o acesso ao real destino desses recursos públicos.”_ Por fim, ao confirmar que as autoridades fazendárias podem acessar informações bancárias sem autorização judicial (RE 601.314\SP e ADIn 2.390\DF), o STF decidiu pela licitude do repasse de tais informações sigilosas ao Ministérios Público, para fins de instauração de processo penal (1 Turma, RE 1.057.667\SE, j. em 12-12-2017). Na mesma linha, para o STJ, é “lícito o compartilhamento promovido pela Receita Federal, dos dados bancários por ela obtidos a partir de permissivo legal, com a Polícia e com o Ministério Público, ao término do procedimento administrativo fiscal, quando verificada a prática, em tese, de infração penal (AgRg no REsp 1.601.127\SP, 5 Turma).

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14
Q

O Banco Central precisa de autorização judicial para acessar informação bancária sigilosa?

A

As autoridades do Banco Central do Brasil dispõem de poder implícito para acessar dados bancários sigilosos, mas somente quando atuarem como órgãos de fiscalização do Sistema Financeiro Nacional. Fora dessas atribuições, decidiu a 1 Turma do STF, não têm poder de quebrar sigilo bancário, nem mesmo sob a invocação do ainda vigente art. 37 da Lei 4.595\64 (RE 461.366\DF)

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15
Q

No âmbito do legislativo, quais órgãos podem determinar a quebra do sigilo fiscal?

A

“No âmbito do Poder Legislativo, apenas as CPIS, nos termos do art. 58, § 3º, da CF, podem determinar a apresentação de declaração de bens ou informações sob sigilo fiscal” (ADIn 2.225\SC, j. em 21-8-2014, Inf. 755\2014).

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16
Q

Qual o regimento jurídico das interceptações ambientais?

A

No Brasil, as interceptações ambientais merecem o mesmo tratamento constitucional dado às interceptações telefônicas. Afinal, “a inteceptação ambiental é essencialmente semelhante à interceptação telefônica” (MARMELSTEIN, 2016, p. 151), até porque dizem respeito a conversas que se desenvolvem em viva-voz e tempo real. Assim, o simples fato de as conversas ambientais dispensarem o uso de aparelho telefônico não justifica tratamento diverso. Destarte, por analogia ao inciso XII do art. 5 da Constituição, a interceptação ambiental parece sujeitar-se a idênticos requisitos traçados para as interceptações telefônicas: a imprescindibilidade de autorização judicial prévia e finalidade, via de regra, restrita à produção de provas em investigação ou processo criminal. Daí a ilicitude de toda forma de interceptação ambiental obtida, clandestina ou sub-repticiamente, por “arapongas”, detetives particulares ou algo do gênero. […] Contudo, ao regulamentar o inciso XII do art. 5 da Constituição, a Lei 9.296\96 tratou apenas das interceptações telefônicas. Assim só há expressa previsão legal de interceptações ambientais para fins de persecução penal de organizações crimininosas ou terroristas (Lei 12.850\2013, que revogou a Lei 9.034\95). Outro problema: diferentemente da legislação revogada (art. 2 da Lei n. 9.034\95, com redação da Lei 10.217\2001), o art. 3, II, da Lei 12.850\2013 não fala mais na necessidade de “circunstanciada autorização judicial”. Todavia, até por aplicação direta do art. 5, XII, da CF\88, cabe manter-se a exigência de prévia permissão judicial. Embora o legislador só tenha regulamentado a interceptação ambiental nessas hipóteses de organizações criminais ou terroristas, parece possível estender-lhe o uso na persecução de outros crimes. Como se sustentou, o simples fato de as conversas ambientes prescindirem do uso de aparelho telefônico não torna a interceptação ambiental dependente de previsão legal específica. É justificável aplica, por analogia, a regulamentação genérica da Lei 9.296\96, que trata das interceptações telefônicas. Na jurisprudência dos Tribunais Superiores, entretanto, não consta haver precedentes nesse sentido. Em sentido contrário, aliás, no HC 253.696\RO, a 6 Turma do STJ afastou a pertinência da aplicação analógica da Lei 9.29696 às escutas ambientais, por entender que “tal lei tem por objeto a regulamentação do art. 5, inciso XII, parte final, da Constituição Federal, ou seja, a quebra de sigilo das comunicações telefônicas”.

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17
Q

Qual é o entendimento do STF a respeito das gravações sub-reptícias?

A

De início, o STF validou a utilização de gravações sub-reptícias, mas só excepcionalmente, quando havia alguma excludente de ilicitude da prova. Ou seja, a prova era considerada a princípio ilícita, mas poderia ser utilizada em razão da presença de excludentes de ilicitude. Assim, com base no direito alemão, num caso de escuta telefônica autorizada por um dos interlocutores para registrar crime praticado pelo outro interlocutor, a 1 Turma teve por afastada “a ilicitude de tal conduta - a de, por legítima defesa, fazer gravar e divulgar conversa telefônica ainda que não haja conhecimento do terceiro que está praticando o crime” (HC 74.678-SP). […] Nesse linha, a Corte considerou lícita até a divulgação televisiva de gravação não consentida realizada por um dos interlocutores a pedido de emissora de televisão, de pessoa que lhe exigia dinheiro para inserir falsa informação em documento público. Segundo o STF, a questão não envolvia a “inviolabilidade das comunicações, e sim da proteção da privacidade e da própria honra, que não constitui direito absoluto, devendo ceder em prol do interesse público” (HC 87.341-PR, 1 Turma). Posteriormente, o STF passou a dispensar até a presença de alguma excludente de ilicitude para reputar simplesmente lícitas as gravações\escutas sub-reptícias. No AgRg no RE 630.944\BA, por exemplo, a 2 Turma afirmou a licitude da prova “produzida a partir da gravação de conversa telefônica feita por um dos intelocutores, quando não existir causa legal de sigilo ou de reserva da conversação”. […] (p. 83)

Observação: O atual entendimento do STF ainda reserva algumas perplexidades. Se alguém tem o direito de gravar as próprias conversas, sem o conhecimento dos outros interlocutores, poderá também gravar e armazenar, somente para si, cenas de acontecimentos íntimos sem a anuência dos demais participantes? Essa simples pergunta demonstra que, para além das hipóteses de inocorrência de alguma causa legal de sigilo ou de reserva de conversação, segue em aberto o problema da eventual violação do direito à intimidade alheia (art. 5, X). Por isso, é preciso que a licitude da gravação sub-reptícia pressupunha não só a inexistência (a) de alguma causa legal de sigilo ou de reserva da conversação, como também de (b) certas “situações excepcionais em que, no fundo, prepondera a exigência da proteção da intimidade, ou se outra garantia da integridade moral da pessoa humana”, conforme anotou o Min. PELUZO no voto vencedor na QO no RE 583.937\RO.

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18
Q

O inciso XII do art. 5 da CF abrange os dados ou apenas sua comunicação?

A

[…] a melhora interpretação, adotada pelo STF, sustenta que a inviolabilidade assegurada pelo inciso XII do art. 5 só se volta contra a interceptação de correspodência ou de comunicações telegráficas, de dados e de conversa telefônica. Trata-se, portanto, de proteção contra a intervenção externa para a captação de informações ou conversas sigilosas durante o fluxo das correspondências\comunicações\trasmissões, e não pripriamente contra o acesso dos dados e conversas trasmitidos e recebidos pelo destinatário (resultados da comunicação em si), os quais contam com a proteção genérica do inciso X do art. 5.

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19
Q

CPI tem poder para quebrar sigilo de correspondência?

A

Embora o sigilo de correspondência tenha sido tratado de maneira aparentemente inexpugnável pelo inciso XII do art. 5, é possível relativizá-lo, mediante autorização judicial, pois o sistema constitucional não admite direitos fundamentais de natureza absoluta. […] Nesse sentido, após entender que o sigilo epistolar “não pode constituir instrumento de salvaguarda de prática ilícitas’, o STF já admitiu até que a administração penitenciária procedesse a interceptação de correspondências, sem autorização judicial, com base no art. 41 da LEP (HC 70.814\SP). Também quanto aos correios eletrônicos, o STJ já entendeu possível a interceptação, desde que autorizada judicialmente (HC 315.220\RS, 6 Turma). Via de regra, portanto, a quebra e a transferência do sigilo de correspondências, incluindos as eletrônicas, pressupõem ordem judicial devidamente fundamentada. Nem mesmo as CPIs dispõem de competência para decretar a quebra desse sigilo, pois o assunto se enquadra no círculo da intimidade, o que exige reserva absoluta de jurisdição. A violação não permitida do sigilo de correspondências implica crime tipificado nos artigos 151 e 152 do CP. (p. 87)

OBSERVAÇÃO: a proteção é só do fluxo de correspondências em geral. Assim, quanto a cartas e correspondências ainda não postadas, incluindo aquelas já recebidas pelo destinatário, não se aplica o sigilo específico do inciso XII. Incidirá ou o sigilo garantido pelo direito à intimidade (art. 5, XI), cujo âmbito de proteção é menor; ou então o sigilo do art. 5, XI, se estiverem guardadas em local protegido pela inviolabilidade do domicílio, caso em que necessária ordem judicial para busca e apreensão.

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20
Q

Se a pessoa entrega espontaneamente computador à autoridade policial, poderá esta acessar todos os dados nele contidos?

A

Há precedente da 1 Turma do STF no sentido de que, em caso de entrega espontânea de computadores, não cabe alegação de violação ao direito à intimidade, por se tratar de material disponibilizado, inclusive para o serviço público. Entendeu-se, ainda, não caracterizada quebra de sigilo de correspondência eletrônica, tampouco há quebra de troca de dados, mas sim acesso a dados registrado nos computadores (RHC 132.062).

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21
Q

Quais foram os fundamentos invocados pelo STF para chancelar a vedação a tratamentos diferenciados no âmbito do SUS, mediante contraprestação pecuniária paga pelo interessado?

A

Entendeu-se que possibilitar assistência diferenciada a pessoas numa mesma situação, dentro de um mesmo sistema público de saúde, vulneraria a isonomia e a dignidade humana. Para a Corte (RE 581.488\RS), embora a Constituição não vede o atendimento personalizado de saúde e ainda admita o sistema privado, os “atendimentos realizados pela rede pública, todavia, não devem se submeter à lógica do lucro, pro não ser essa a finalidade do sistema. Ainda que os supostos custos extras corressem por conta do interessado, a questão econômica ocupa papel secundário dentre os objetivos impostos ao ente estatal. A implementação de um sistema de saúde equânime é missão do Estado, que deve buscar a igualdade sempre que chamado a atuar”.

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22
Q

Conceitue, brevemente, o âmbito positivo do princípio da isonomia.

A

Se o princípio isonômico é concebido tanto no sentido formal quanto material, conclui-se que ele impõe, respectivamente, seja a igualdade na lei (“igualdade perante a lei”), seja a igualdade por intermédio da lei (“igualdade na lei”). Destarte, em seu âmbito negativo, o princípio da igualdade é encarado quer como exigência de tratamento igual, quer como proibição de tratamento desigual. Já no âmbito positivo, o princípio da isonomia representa o dever de favorecer e de criar pressupostos voltados à correção das distorções que atinjam aqueles menos favorecidos por quaisquer dos critérios (biológicos, sociais, econômicos, culturais, políticos) que possam dificultar o surgimento das mesmas “condições de partida” entre as pessoas. (p. 108)

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23
Q

“O princípio da isonomia, em seu sentido de igualdade formal, não admite o tratamento diferenciado entre indivíduos”. Certa ou errado?

A

Igualdade formal: igualdade perante a lei. Traduz-se como isonomia na fase de interpretação e aplicação de uma lei já elaborada, sem margem a invocação de critérios seletivos ou discriminatórios que não decorram claramente da própria lei. Destina-se ao intérprete e ao aplicador, que devem interpretar e aplicar a lei de forma igualitária, mesmo quando nela há discriminações. A afirmação já foi objeto de questionamento em concurso, e foi considerada errada. (p. 108 e 112)

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24
Q

Cotas raciais para ingresso em universidades públicas podem ser implementadas por atos infralegais?

A

[…] nos casos em que é materialmente constitucional a implantação de determinado sistema de ações afirmativas, nem por isso o Poder Público estará desonerado da exigência de observância do princípio da legalidade. Em razão da discriminação inversa inerente a toda ação afirmativa, parece que somente a lei poderá atenuar a garantia do caput do art. 5 e criar distinções entre indivíduos, ainda que mediante critérios absolutamente proporcionais e justificáveis do ponto de vista da isonomia material. Nada obstante, na ADPF 186\DF, o Pleno do STF não considerou essa linha argumentativa e reputou constitucional política de cotas criada por atos infralegais de universidade pública (resoluções e editais de vestibular). (p. 113)

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25
Q

Em que consiste a discriminação inversa?

A

Toda política de ação afirmativa acaba por discriminar, direta ou indiretamente, o segmento social que por ela não foi contemplado. Se a lei, mesmo que atendendo à Constituição, fixa determinada cota de cargos públicos a serem preenchidos por deficientes físicos, está consequentemente discriminando os demais candidatos que concorrerem aos mesmos cargos, e assim por diante. Daí se falar em discriminação inversa\reversa (ou discriminação positiva).

Porém, embora quaisquer políticas de ações afirmativas pressuponham alguma dose de disciminação inversa (positiva), nem por isso estarão indenes de eventuais excessos ou descios de finalidade. Nesse sentido, será indevida a discriminação inversa presente em alguma ação afirmativa quando implicar exorbitante desigualdade de tratamento em desfavor dos membros dos grupos majoritários por ela direta ou indiretamente prejudicados. Algo que se pode chamar de discriminação inverva\reversa (ou negativa). Afinal, também as ações afirmativas devem satisfazer critérios de proporcionalidade, pois são inconcebíveis discriminações inversas arbitrárias. […]

A ação afirmativa só será constitucional se os fatores discrimantens utilizados na identificação dos respectivos beneficiários foram condizentes com as dificuldades que a atuação estatal tenta atenuar ou remediar. Caso a desigualdade de “condições de partidas” advenha de motivações financeiras, por exemplo, não parece haver razões para privilegiar outras pessoas que não as portadoras de dificuldades econômicas, pois a medida se inadequada para atender à finalidade pretendida. É dizer, se a justificativa para reservar vagas em instituição públicas de ensino superior radicar na desigualdade entre aqueles que frequentaram e os que não frequentaram escolas particulares - sob a presunção de que a qualidade destas é melhor - ou entre os vestibulandos que trabalham e os que não trabalham para ajudar a família - daí se presumindo que estes últimos não tiveram o mesmo tempo útil de preparação para o vestibular -, não faz sentido atribuir cotas conforme critérios diversos (critérios exclusicamente raciais, por exemplo). Do contrário, a medida importaria em discriminação arbitrária que elevaria as mesmas dificuldades enfrentadas pelos vestibulandos trabalhadores e\ou egressos de escola pública, mas que não preenchessem os critérios raciais exigidos ao gozo das cotas. Ou seja, se eleger fator discriminante equivocado, a ação afirmativa poderá ser considerada inconstitucional.

STF: no exercício da presidência do STF, o Min. GILMAR MENDES confirmou o acórdão do TRF\4 Região que invalidara a criação de curso superior em instituição pública de ensino cujas vagas eram reservadas exclusivamente para assentados e parentes de assentados incluídos em programa de reforma agrária. Decidiu o Ministro que a instituição de curso especial, embora camuflada sob suposta “ação afirmativa”, no fundo, implicava violação ao princípio da proporcionalidade, já que o privilégio concedido a famílias de assentados não poderia prevalecer sobre os interesses contrapostos da titularidade das demais pessoas, bem como porque a discriminação inversa decorrente da medida vulnerava o princípio da universalidade do acesso ao ensino público (STA 233\RS). (p. 112-114)

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26
Q

É válida a exigência de altura mínima para o cargo de delegado?

A

[…] a despeito de reputar válida a exigência de altura mínima para o ingresso na carreira de delegado de polícia (RE 140.889\MS, 2 Turma), o STF reputou ilícita a mesma exigência acerca da “habilitação ao cargo de escrivão, cuja natureza é estritamente escriurária, mutio embora de nível elevado” (RE 150.455\MS, 2 Turma; e AgRg no RE 511.588\MG, 1 Turma).

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27
Q

O que diz a doutrina do impacto desproporcional, relativo ao princípio da isonomia? Responda dando um exemplo da jurisprudência pátria.

A

Originária do direito norte-americano, a doutrina do impacto desproporcional (“disparate impact doctrine”) advoga que medidas de particulares ou do Poder Público, embora aparentemente neutras do ponto de vista isonômico, poderão afrontar o princípio da igualdade caso a implementação delas gerar prejuízos desproporcionais a classes de pessoas que mereçam proteção especial. Ou seja, mesmo que não evidenciado algum intuito anti-isonômico na edição da medida, é preciso ainda analisar se da aplicação dela surgirão efeitos práticos discriminatórios. […] A teoria foi primeiramente adotada pela Suprema Corte americana a partir do caso Griggs vs Duke Power Co. (1971). Nesse precedente, entendeu-se que a eleição de testes de conhecimentos gerais como critério de promoção de empregados implicava em impactos desproporcionais em detrimento de trabalhadores negros, já que os empregados brancos teriam estudados em melhores escolas. Daí o raciocínio: a norma que proíbe discriminar proscreve não apenas a discriminação evidente, como também as práticas que se pareçam justas na forma, mas disciminatórias na operacionalização. No Brasil, em correlação ao princípio da isonomia, a doutrina do impacto desproporcional já foi utilizada pelo STF para declarar inconstitucional o art. 14 da EC 20\98 (ADInMC 1.946\DF). Tratava-se de norma que limitava em R$ 1,2 mil o valor mensal a ser pago pelo INSS - Instituto Nacional do Seguro Social durante o gozo de licença-maternidade. Contudo, entendeu a Corte que, ao recair sobre o próprio empregador o ônus da diferença entre a remunaração da empregada e o valor a ser pago pelo INSS, a emenda constitucional geraria discriminação e impactos desproporcionais à mulher trabalhadora. Conforme voto do Min. NELSON JOBIM: a “regra da EC 20\98, aparentemente neutra, produz discriminação não desejada pelo próprio legislador. As práticas de mercado passarão a responder com discriminação, quanto ao emprego da mulher”. (p. 118)

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28
Q

O que é o assim chamado “mercado livre de ideias”? É possível sua regulação?

A

A expressão “livre mercado de ideais” (“marketplace of ideas”) diz com o raciocínio de que a verdade surge da competição entre ideais em ambiente de livre e transparente discurso. Essa noção é atribuída, sobretudo, à obra clássica de JOHN STUART MILL (“On Liberty”, de 1859), entre cujos fundamentos consta: “embora a opinião silenciada possa estar errada, ela pode, o que muito comumente ocorre, conter uma parte da verdade; e uma vez que a opinião geral ou prevalecente em qualquer assunto é raramente ou nunca toda a verdade, é apenas pela colisão de opiniões divergentes que o restante da verdade tem alguma chance de ser preenchido”.

STF: Na Suspensão Liminar 1.178\PR (j. em 28-9-2018), o Min. LUIZ FUX consignou: “Sabe-se que o ‘mercado livre de ideias’, primeiramente referido por Oliver Wendell Holmes Jr, no caso Abrams v. United States, julgado pela Suprema Corte dos Estados Unidos em 1919, possui falhas tão deletérias ao bem-estar social quanto um mercado totalmente livre de circulação de bens e serviços. Admitir que a transmissão de informações seria impassível de regulação para a proteção de valores comunitários equivaleria a defender a abolição de regulações da economia em geral. Por essa razão, Richard Posner já defendia a necessidade de regulação da liberdade de expressão, sempre que remediar de forma eficiente os riscos de divulgação de informações nocivas (POSNER, Richard A. “Free speech in an Economic Perspective”. In: 20 Suffolk U. L. Rev. 1 [1986])”.

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29
Q

Por que motivo o STF rejeita a possibilidade de regulamentação da profissão jornalística?

A

[…] no “campo da profissão de jornalista, não há espaço para a regulação estatal quanto às qualificações profissionais. O art. 5, incisos IV, IX, XIV, e o art. 220, não autorizam o controle, por parte do Estado, quanto ao acesso e exercício da profissão de jornalista. Qualquer tipo de controle desse tipo, que interfira na liberdade profissional no momento do próprio acesso à atividade jornalística, configura, ao fim e ao cabo, controle prévio que, em verdade, caracteriza censura prévia das liberdades de expressão e de informação, expressamente vedade pelo art. 5, inciso IX, da Constituição. A impossibilidade do estabelecimento de controle estatais sobre a profissão jornalística leva à conclusão de que não pode o Estado criar uma ordem ou um ocnselho profissional (autarquia) para a fiscalização desse tipo de profissão. O exercício do poder de polícia do Estado é vedado nesse campo em que imperam as liberdades de expressão e de informação.” (p. 128)

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30
Q

As empresas mantenedoras de redes sociais podem filtrar o conteúdo postado por seus usuários?

A

[…] nos dias atuais, surgem quanto à licitude da censura a postagens na internet. A questão diz respeito, sobretudo, ao poder que as próprias empresas mantenedoras de redes sociais ou similares (também chamadas de “provedores de aplicação” têm para interferir na liberdade de expressão dos respectivos usuários. Daí a pergunta: empresas gigantes como o Facebook ou o Twitter podem, unilateralmente, remover conteúdos e suspender contas em razão de postagens que considerarem inadequadas por motivos de natureza política, ideológica ou artística? Em outras palavras: as regras contratuais de convivência na rede, ditadas pelas próprias empresas provedoras de redes sociais, podem prevalecer sobre a proibição constitucional geral à censura (art. 5, IX)? A resposta parece ser negativa. Certo, o Marco Civil da Internet já menciona a proibição geral à censura na rede (art. 19) e até se preocupa em demarcar a responsabilidade civil referente a conteúdos que infrinjam direitos autorais e da personalidade, incluindo a honra e a reputação. Porém, não disciplinou o poder das provedoras de aplicação para executar controle próprios de conteúdo das postagens. Nada obstante, na feliz expressão de VLADIMIR ARAS (2018), o ambiente das redes sociais equivale ao de “cidades virtuais”, em que as pessoas se relacionam, dialogam, expõem ideias, comercializam bens e serviços etc. Nessa linha, havendo inegável assimetria de poder na relação entre tais empresas provedoras de aplicação e os usuários respectivos, parece aplicável a teoria da eficácia horizontal dos direitos fundamentais, o que permite estender-lhes as diretrizes dos incisos IX e LV do art. 5 da Constituição, a despeito de eventuais disposições em contrário previstas em cláusulas contratuais. Assim, devem as provedoras de aplicação franquear aos usuários algum tipo de oportunidade efetiva de defesa ou recurso, bem como absterem-se de censurar, por motivos de natureza política, ideológica ou artística, a livre manifestação do pensamento em conteúdos postados na internet. Ressalvada, obviamente, a aplicação do regime clássico das limitações à liberdade de expressão, com possibilidade de exclusão de postagens, por exemplo, por conterem “fake news”, discursos de ódio, pornografia etc. (p. 129)

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31
Q

É constitucional o dispositivo da LOMAN que veda magistrado de emitir opiniões sobre processos pendentes?

A

Não parece ter sido recepcionada a norma da Lei Orgânica da Magistratura Nacional a proibir magistrado de se manifestarem, “por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças” (art. 36, III, da LC 35\79). É que, embora se tenha ressalvado a possibilidade de “crítica nos autos e em obras técnica ou no exercício do magistério”, a regra possui o claro objetivo imediato de bloqueio do próprio fluxo de ideias, sem justificativas plausíveis.

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32
Q

A lei pode proibir a utilização de aparelhos de sons perto de órgãos públicos?

A

Na ADInMC 1.969\DF foi considerado inconstitucional decreto do Governador do DF que proibira a utilização de utensílios sonoros nas manifestações públicas realizadas na Praça dos Três Poderes, na Esplanada dos Ministérios ou na Praça do Buriti. Entendeu-se que o ato normativo, a pretexto de zelar pelo bom funcionamento dos órgãos públicos, objetivava, na verdade, a impedir a livre expressão e o direito de reunião.

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33
Q

É constitucional a regra do ENEM relativa à anulação de redação desrespeitosa a direitos humanos?

A

Decisões monocrática da Ministra CÁRMEM LÚCIA (STA 864\DF e SL 1.127\DF) validaram decisão do TRF1 que suspendera a aplicação de regra do edital do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) quanto à anulação da redação desrespeitosa a direitos humanos. Para a Ministra, a decisão recorrida garantia o exercício do direito à liberdade de expressão e de opinião, constitucionalmente assegurado. Afinal, não “se desrespeitam direito humanos pela decisão que permite ao examinador a correção das provas e a objetivação dos critérios para qualquer nota conferida à prova. O que os desrespeitaria seria a mordaça prévia do opinar e do expressar do estudante candidato. Não se combate a intolerância social com maior intolerância estatal”. Ainda segundo a Ministra, o “que se aspira é o eco dos direitos humanos garantidos, não o silêncio de direitos emudecidos. Não se garantem direitos fundamentais eliminando-se alguns deles para se impedir possa alguém insurgir-se pela palavra contra o que a outro parece instigação ou injúria. Há meios e modos para se questionar, administrativa ou judicialmente, eventuais excesso. E são estas formas e estes instrumentos que asseguram a compatibilidade dos direitos fundamentais e a convivência pacífica e harmoniosa dos cidadãos de uma República”.

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34
Q

É possível estabelecer-se, por via judicial, restrições a priori à liberdade de imprensa?

A

[…] nos casos de colisão com outros diretos fundamentais, sobretudo com aqueles previstos no § 1º do art. 220, o problema diz com a possibilidade e o momento em que se podem estabelecer outras restrições à liberdade de impensa. Há, basicamente, duas teorias a respeito:

1) teoria da ponderação simples: na hipótese de colisão com os direitos ressalvados pelo § 1º do art. 220, e desde que atendidas diretrizes ligadas ao princípio da proporcionalidade, a liberdade de imprensa poderá sofrer restrições em casos concretos, incluindo a eventual proibição de publicações consideradas abusivas;

2) teoria da relativização somente “a posteriori”: a liberdade de imprensa e a livre circulação de ideias não podem ser restringidas a priori, nem mesmo pelo Judiciário, mas isso não impede a aplicação, a posteriori, de medidas contra os excessos cometidos, tais como a garantia do direito de resposta e a responsabilização civil e penal. […]

Por sua vez, a legislação civil optou, explicitamente, pela teoria da ponderação simples. O artigo 20 do CC admite a proibição da própria “divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa” - salvo se autorizadas ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública. E o artigo seguinte do mesmo CC prevê que o juiz, “a requerimento do interessado”, poderá adotar as providências necessárias também para impedir - e não só para fazer cessar - atos contrários à inviolabilidade da vida privada da pessoa natural.

Na mesma linha, mais recentemente, em adesão à teoria da ponderação simples, a legislação processual civil previu o cabimento de medida cautelar, em ação civil pública, para evitar dano “à honra e à dignidade de grupos raciais, étnicos ou religiosos” (Art. 5 da Lei 7.347\85, com redação da Lei 13.004\2014). De outro lado, a legislação eleitoral adota a teoria da relativização somente “a posteriori”. Basta notar a Lei 9.504\97, que terminantemente veda a censura prévia “sobre o teor dos programas a serem exibidos na televisão, no rádio ou na Internet” (art. 41, § 2º), bem como “cortes instantâneos ou qualquer tipo de censra prévia nos programas eleitorais gratuitos” (art. 53, caput).

[…] Pois bem. A despeito dessa indefinição legislativa, parece mais correta a linha adotada pelo Ministro BARROSO em decisão monocrática tomada na RclMC 18.638\CE (j. em 14-9-2014). Para ele, embora a liberdade de expressão possua natureza preferencial (i.e., deve preponderar na maior parte dos casos), não se pode excluir, ainda que em termos absolutamente excepecionais, a possibilidade “da proibição prévia de publicações, reservando-se essa medida aos raros casos em que não seja possível a composição posterior do dano que eventualmente seja causado aos direitos da personalidade”.

Contudo, na ementa da ADInMC 4.451\DF, em que se discutia dispositivo da legislação eleitoral que proibia emissoras de rádio e televisão de veicularem programas que degradassem ou ridicularizassem candidato, partido ou coligação (Art. 45, II, da Lei 9.504\97), o Min. AYRES BRITTO voltou a consignar, em obiter dicta, que a “crítica jornalística em geral, pela sua relação de inerência com o interesse público, não é aprioristicamente suscetível de censura”. Ademais, na ADIN 4.815 (j. em 16-10-2015), em que se questionava a necessidade de prévia autorização para publicar obras biográficas, o Plenário do STF deu interpretação conforme a constituição aos artigos 20 e 21 do Código Civil e declarou inexigível o consentimento de pessoa biografada. Nesse precedente, conquanto a questão não versasse proppriamente sobre a liberdade de imprensa, e sim o direito genérico à liberdade de expressão e manifestação do pensamento, prevaleceu a teoria da relativização somente “a posteriori”. Entendeu a Corte que qualquer interveção jurisdicional, em relação a eventuais abusos cometidos pelo autor da biografia no exercício da liberdade de expressão, terá de incidir após a publicação da obra.

Esse o quadro, a despeito da legislação e dos precedentes importantes em sentido contrário, a tendência atual da jurisprudência do STF parece aderir à ideia segundo a qual a liberdade de expressão só pode ser restringida a posteriori, sobretudo no que diz respeito aos órgão de comunicação social.

DIZER DIREITO 2018: Rcl 223328\RJ, Rel. Min. Barroso (Info 893). “[…] prefência por sanções a posteriori, que não envolvam a proibição prévia da divulgação: o uso abusivo da liberdade de expressão pode ser reparado por mecanismos diversos, que incluem a retificação, a retratação, o direito de resposta, a responsabilização civil ou penal e a proibição da divulgação. Somente em hipóteses extremas se deverá utilizar a última possibilidade. Nas questões envolvendo honra e imagem, por exemplo. como regra geral será possível obter reparação satisfatória após a divulgação, pelo desmentido - por retificação, retratação ou direito de resposta - e por eventual reparação do dano, quando seja o caso”.

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35
Q

Leis que vedam o uso de máscaras em manifestações encontram amparo na vedação ao anonimato?

A

Tais lei […] parecem não passar pelo teste de constitucionalidade. É que estabelecem proibições desconectadas do contexto e da finalidade em que estabelecida a vedação constitucional ao anonimato. E o direito à liberdade de reunião não traz proibição semelhante. Como sintetiza GEORGE MARMELSTEINS, “o mero fato de usar máscara em uma manifestação não pode ser considerado como um ato ilícito. A ilicitude está em praticar violência durante as manifestações e esconder-se sob o manto do anonimato para não ser responsabilizado (2016, p. 122). Ademais, mesmo que se entendesse justificável a medida em razão do princípio da ordem e segurança públicas, a matéria seria da competência privativa do legislador federal (CF, art. 22, I). Assim, a proibição geral ao uso de máscaras em manifestações, sobretudo quando não veiculada por lei federal, é inconstitucional. Sem prejuízo da eventual identificação de responsáveis concretos pela prática de infrações penais, nos termos do art. 6 do CPP. Porém, a Corte Especial do TJRJ já declarou a constitucionalidade da Lei 6.528\2013, ao argumento de que se tratava da regulamentação do artigo 23 da Constituição Estadual, que dispõe sobre o direito de reunião. Nada obstante, a questão será decidida pelo STF, que já reconheceu a repercussão geral da discussão (ARE 905.149\RJ).

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36
Q

O discurso de ódio é crime no Brasil?

A

No Brasil, a despeito de o constituinte não haver reproduzido preceito da Constituição anterior segundo o qual a liberdade de manifestação de pensamento não tolerava “preconceitos de religião, raça ou de classe” (quarta parte do § 8º do art. 153), prevalece a tese de que os discursos de ódio não contam com a proteção jurídica. A Constituição repudia o racismo expressamente (art. 4, VIII; e inciso XLII do art. 5) e há normas infraconstitucionais que penalizam os atos de indução, incitação, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. (A lei 7.716\89 proíbe não só qualquer publicação de discursos de ódio, inclusive pelos meios de comunicação social como a própria fabricação, comercialização, distribuição ou veiculação de símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo (Art. 20, § 1º). […] No Plenário do STF, em precedente a discutir o caráter criminoso de publicação literária preconceituosa e antissemita, venceu a posição pela antijuridicidade dos discursos de ódio. Para a Corte, o “preceito fundamental de liberdade de expressão não consagra o ‘direito à incitação ao racismo’, dado que um direito individual não pode constituir-se em salvaguarda de condutas ilícitas, como sucede com os delitos contra a honra”. Considerou-se que a “edição e publicação de obras escritas veiculando idéias anti-semitas” eram equivalentes “à incitação ao discrímen com acentuado conteúdo racista, reforçadas pelas consequências históricas dos atos em que se baseiam” (HC 82.424\RS, caso ELLwanger).

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37
Q

Quais as condições elencadas pelo STF para que um discurso religioso seja considerado discriminatório?

A

No RHC 134.682\BA, a 1 Turma decidiu: “No que toca especificamente à liberdade de expressão religiosa, cumpre reconhecer, nas hipóteses de religiões que se alçam a universais, que o discuso proselitista é da essência de seu integral exercício. De tal modo, a finalidade de alcançar o outro, mediante persuasão, configura comportamente intrínseco a religiões de tal natureza. Para a consecução de tal objetivo, não se revela ilícito, por si só, a comparação entre diversas religiões, inclusive com explicitação de certa hierarquização ou animosidade entre elas. 5. O discurso discriminatório criminoso somente se materializa após ultrapassadas três etapas indispensáveis. Uma de caráter cognitivo, em que atestada a desigualdade entre grupos e\ou indivíduos; outra de viés valorativo, em que se assenta suposta relação de superioridade entre ele e, por fim; uma terceira, em que o agente, a partir das fases anteriores, supõe legítima a dominação, exploração, escravização, eliminação, supressão ou redução de direitos fundamentais do diferente que compreende inferior”.

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38
Q

A reunião fortuita e não organizada de pessoas está garantida pelo direito constitucional de reunião? Quais as condições para que se possa falar em direito de reunião?

A

Conforme ensina PEDRAZZOLI (2015), a doutrina tradicional costuma dizer que a garantia constitucional do direito de reunião pressupõe a caracterização dos seguintes elementos: (a) pessoal: é preciso o envolvimento de mais de uma pessoa. Trata-se, necessariamente, de direito fundamental de expressão coletiva, pois ninguém se reúne consigo mesmo; (b) espacial: deve haver aproximação física de pessoas. Mas, atualmente, é possível defender que o direito à reunião estende-se, ainda, a ambientes virtuais, como no caso de “reunião” em comunidades da Internet; (c) temporal: a garantia não subsiste após a aproximação das pessoas se desfazer no tempo; (d) organizacional: a aglomeração de pessoas carece de um mínimo de “organização interna”, ainda que sem maiores formalidades, pois o direito constitucional de reunião não se caracteriza quando pessoas se reúnem de forma fortuita ou desordenada; e (e) teleológico: o direito de reunião pressupõe certa finalidade que, relacionada à manifestação, à troca ou à defesa de ideias (de natureza política, cultural, social, religiosa etc.), seja compartilhada pela interação das pessoas que se reúnem, ainda que mediante a mera presença silenciosa. No que se diferencia, v.g., dos espetáculos de diversão coletiva, em que a presença do público se justifica por questões econômicas, uma vez que cada indivíduo, em tese, poderia assisti-lo isoladamente (pela televisão, assistindo a um vídeo, ouvindo um disco etc.). Assim, “excluem-se da proteção constitucional do direito de reunião as situações em que pessoas estão em um mesmo espaço físico, mas sem estabelecer qualquer relação ou comunicação entre si”, situação protegida pelo direito de ir e vir (PEDRAZOLI, 2015, . 872). Inclui-se no elemento teleológico, pois, o caráter tanto não ocasional quanto voluntário da aglomeração de pessoas. Nessa linha, com base em PONTES DE MIRANDA, pode-se dizer que liberdade de reunião não abrange o ajuntamento ocasional de curiosos diante de um acidente de trânsito, por exemplo; tampouco a compulsória convocação de conscritos para participarem de um desgile militar.

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Q

Em que locais pode ser exercido o direito de reunião? Há algum em que ele é proibido? Admite-se reunião com armas?

A

Diferentemente da Constituição de 1937, a atual não restringiu o direito de reunião aos locais “a céu aberto”. A Assembleia Constituinte optou pela expressão “locais abertos ao público” e ainda rejeitou várias propostas que obstariam o exercício do direito caso interferisse no fluxo normal de pessoas e veículos. Ademais, ao contrário do regime constitucional de 1967\1969 (art. 153, § 27), não há previsão de lei a predeterminar locais de reunião. Daí não ter sido recepcionado o art. 3 da Lei 1.207\50, que atribuía à autoridade policial poderes para fixar lista de praças aptas à realização de reuniões.

Assim, pela CF\88, o direito de reunião pode ser exercido em todo o logradouro inserido no conceito de bens públicos de uso comum do povo, tais como parques, praias, praças públicas, bem como as vias de tráfego. Contudo, a liberdade constitucional não alcança os bens públicos de uso especial onde se prestem serviços públicos específicos (escolas, prédios, repartições públicas etc.). Destarte, o direito de reunião não serve de base para justificar invasões\ocupações em locais desse tipo, sobretudo quando neles se prestarem “atividades essenciais” ou o “atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade”, circunstâncias nas quais o constituinte restringe até mesmo o direito de greve dos próprio servidores\empregado que ali trabalharem (art. 9, § 1).

Observação:

[…] certas condicionantes do inciso XVI do art. 5 da Constituição não se aplicam às reuniões em locais privados e fechados ao público. Nesses ambientes, ressalvadas as exceções constitucionais (v.g, art. 5, XI; 136, § 1, I “b”; e 139, IV), é ainda mais ampla a liberdade de reunião, em virtude da proteção advinda da concorrência de outros direitos fundamentais, tais como a inviolabilidade dodomicílio, o direito de propriedade, a liberdade de culto e de associação (sobre a concorrência de direitos fundamentais, v. Tomo I, Parte III, item 91). Daí se admitir que, em edifício privado, indendentemente de licença ou aviso prévio a alguma autoridade, se reúnam até pessoas armadas (munidas de permissão própria, claro), como no caso de reunião de policiais civis na sede da respectiva associação.

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40
Q

Qual a consequência da falta de aviso da realização de reunião em local proíbido?

A

[…] a exigência de prévio aviso à autoridade competente não se confunde com algum tipo de pedido de autorização. A intenção do constituinte foi apenas evitar que se frustre a realização de outra reunião igualmente convocada para mesmo local e horário. Logo, a falta de aviso ou a comunicação intempestiva, embora possam importar na eventual responsabilização dos organizadores e\ou participantes por ilícitos decorrentes da negligência, não tornam ilegítima a reunião, nem permitem ao Poder Público dissolvê-la só por isso. Daí a inconstitucionalidade, por exemplo, do art. 4 da Lei 6.528\2013, do Estado do Rio de Janeiro, na parte em que autoriza a dissolução de reunião que não tenha sido previamente comunicada à autoridade policial.

[…]

Avisada previamente, caberá à autoridade tormar as providências necessária a assegurar o exercício do direito de reunião, especialmente aquelas ligadas à segurança pública (policiamente, interdição de vias públicas etc.). Trata-se do aspecto prestacional do direito de reunião, algo ligado à perspectiva objetiva dos direitos fundamentais. E para garantir a segurança pública do evento, extrai-se, implicitamente, que o aviso prévio deverá indicar a qualificação dos organizadores, o local e o eventual percurso da manifestação, além de data e horário de início e término do evento, incluindo a previsão do número de pessoas aguardadas. Autores como PAULO BRANCO defendem, ainda, ser “indispensável que o aviso indique o objetivo da reunião” (2008, p. 398).

DIZER O DIREITO:

E por que existe esse aviso prévio?

A exigência de aviso prévio existe unicamente para permitir que o poder público zele para que o exercício do direito se dê de forma pacífica e que não frustre outra reunião no mesmo local.

Assim, esse prévio aviso deve ocorrer sempre que possível, mas, se não existir, não se pode falar em reunião ilegal.

Conforme explicou o Min. Dias Toffoli:

“(…) o ‘prévio aviso à autoridade competente’, nos termos do art. 5º, inciso XVI, da Constituição, não constitui condicionante ao exercício do direito de reunião e de manifestação, mas formalidade a ser cumprida, sempre que possível, a fim de propiciar que o direito de reunião e de livre manifestação seja exercido de maneira pacífica, ordeira e segura (…)”

Como deve ocorrer essa notificação? Exige-se alguma formalidade especial?

NÃO. Basta que a notificação seja efetiva, isto é, que permita ao poder público realizar a fiscalização da segurança da manifestação ou reunião.

O STF afirmou que as autoridades públicas devem adotar uma postura ativa, ou seja, diante de uma reunião que esteja sendo anunciada publicamente ou que já esteja ocorrendo, as autoridades não podem simplesmente alegar que não foram previamente notificadas.

Afinal de contas, manifestações espontâneas (sem estarem previamente organizadas) não são proibidas nem pelo texto constitucional, nem pelos tratados de direitos humanos. Assim, repito, a inexistência de notificação não torna ipso facto (por si só) ilegal a reunião.

De igual modo, não se depreende do texto constitucional qualquer exigência relativamente à organização. A liberdade de expressão e reunião pode, com efeito, assumir feição plural e igualitária, não sendo possível estabelecer, como regra, uma organização prévia.

Em outras palavras, a reunião não precisa ter um organizador que faça a prévia comunicação.

Assim, não há como exigir-se que a notificação seja pessoal ou de algum modo registrada, porque implica reconhecer como necessária uma organização que a própria Constituição não impôs.

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41
Q

A presença de pessoas armadas na renião autoriza sua dissolução?

A

A Constituição proíbe reuniõe que não tenham caráter pacífico, bem como a presença de armas (brancas ou de fogo), ainda estejam em poder de pessoas com permissão para portá-las. Todavia, a liberdade de reunião é direito de natureza individual, embora de “expressão coletiva”. Logo, se os objetivos da reunião em si não forem belicosos, a ocorrência de pessoa armada ou com propósito e\ou atitude individualmente belicosas não tolhe o direito das demais. Assim, a polícia não poderá dissolver a reunião só por isso. “Cabe-lhe desarmar tal pessoa ou, então, afastá-la da reunião, que prosseguirá normalmente com os demais participantes que não estejam armados” (MELLO FILHO, 1986, p. 474).

Porém, como adverte PONTES DE MIRANDA (1971, p. 604), é “possível que se formem ‘grupos armados’, grupos compactos em que, algum ou alguns estando armados, a arma ou armas são de todos os do grupo, como unidade ofensiva. Aí, sim, não há direito de reunião quanto a todos os que fazem parte do grupo armado”.

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42
Q

Admite-se reunião cujo objetivo seja manifestar-se contra a ordem constitucional? O grupo que se reúne tem o direito de impedir que pessoa que não comungam do ideário que anima a reunião dela participem?

A

[…] a liberdade de expresão do pensamento nas reuniões, desde que manifestada de forma pacífica e sem incitação à violência, protege manifestações contra determinada norma constitucional (a proibição da pena de morte, v.g.) ou até favoráveis a uma nova constituição, incluindo aquelas posições contraditórias ao próprio regime democrático, como a defesa de intervenção militar ou alguma excrescência do gênero. De outro lado, também os que não participem da reunião\manifestação têm o dever a priori de tolerá-la e de evitar provocações com os manifestantes, o que ilustra a eficácia horizontal do direito de reunião (PAULO BRANCO). Afinal, “o direito de reunião em espaço aberto pode ser exercido mesmo em oposição a outras pessoas” e o “grupo que se reúne tem o direito de impedir que pessoas que não comungam do ideário que anima a reunião dela participem” (BRANCO, 2008, p. 400). Nesse sentido, o TJSP confirmou ordem judicial de retirada de outdoors que, trazendo mensagens bíblicas contrárias ao homossexualismo, haviam sido afixados no percurso da “Parada do Orgulho LGBT” que se realizaria alguns dias depois […]

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43
Q

A CF\88 admite associações sem registro em órgão competente?

A

Via de regra, as associações são pessoas jurídica privadas, constituídas conforme a lei civil, que só adquirem personalidade após inscritas no registro civil de pessoas jurídicas. Todavia, autores como BERNARDO GONÇALVES FERNANDES e JOSÉ CRITELLA JÚNIOR entendem que o direito constitucional protege ainda as associações juridicamente despersonalizadas. Raciocínio que permite incluir os chamados movimentos sociais, que funcionam sem registro civil.

Diferentemente do que previu em relação aos sindicatos (art. 8, I), a Constituição não exige registro no “órgão competente” como pressuposto de funcionamento das associações. O direito de associação é livre, ainda que exercido secretamente, desde que possua finalidades lícitas, sem caráter paramilitar. Contudo, o próprio constituinte deixa claro que o registro associativo é exigência para o pleno exercício dos direitos próprios da associação. Basta notar que o art. 5, LXX, letra “b”, restringe somente à “associação legalmente constituída” e “em funcionamento há pelo menos um ano” o direito à impetração do mandado de segurança coletivo. […] Com essa discrepância de tratamento, tenta-se estimular a legalização das associações despersonalizadas, até para evitar sejam usadas irresponsável ou temerariamente. Afinal, pelas mesmas motivações por que a Constituição veda o anonimato, as entidades associativas despersonalizadas não podem servir de escudo contra eventual responsabilização civil, penal ou administrativa. E, ao optarem por mantê-las à margem de registro constitutivos, as pessoas que as dirigem assumem, por conta e risco próprios, a responsabilidade solidária e subsidiária por ilícitos imputáveis à entidade despersonalizada, sem prejuízo da responsabilização pessoal dos infratores.

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44
Q

O Poder Executivo pode suspender por conta própria as atividades de associação destinada a fins ilícitos?

A

Embora o Estado não possa, em princípio, interferir nos assuntos associativos (art. 5, XVIII), uma vez constatada a existência de associações (de fato ou de direito) com finalidade ilícita ou caráter paramilitar, elas “poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trânsito em julgado (art. 5, XIX). Contudo, “somente o Poder Judiciário, por meio de processo regular, poderá decretar a suspensão ou a dissolução compulsória das associações”, de modo que atos “emanados do Executivo ou do Legislativo, que provoquem a compulsória suspensão ou dissolução de associações, mesmo as que possuam fins ilícitos, serão inconstitucionais” (STF, ADIn 3.045\DF). Daí não ter sido recepcionado o Decreto-Lei 8\66, que permitia ao Presidente da República suspender o funcionamento de associação que desenvolvesse “atividade contrária à ordem pública ou à segurança nacional”.

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45
Q

Quais pessoas podem ser sujeitos passivos da ação de desapropriação?

A

[…] os sujeitos passivos são normalmente os particulares, mas é também possível que um entidade federativa de nível superior desaproprie bens daquela situada em nível inferior, após autorização legislativa (art. 2, § 1º, do DL 3.365\41). Para melhor doutrina, é ainda possível desapropriar bens que, localizados no território nacional, sejam da propriedade de pessoas jurídica de direito público internacional, tais como Estados estrangeiros e organismos internacionais. Assim, somente os bens da União não são passíveis de desapropriação.

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46
Q

Qual a natureza jurídica do instituto previsto no art. 1.228, § 4º, do CC?

§ 4 o O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante.

A

Parte da doutrina viu nesse § 4º a criação de nova espécie de usucapião. Porém, a doutrina majoritária entende cuidar-se de modalidade de desapropriação judicial. Parece, contudo, tratar-se de outra figura: um caso de alienação compulsória de imóvel.

Com efeito, não se trata mesmo de usucapião, pois a efetiva perda da propriedade deve ser antecedida de indenização equivalente ao “preço” do imóvel. Nesse sentido, o § 5º do art. 1.228 determina ao juiz a fixação de “justa indenização devida ao proprietário”, bem como estabelece que o registro do imóvel, em nome dos possuidores, pressupõe o pagamento do preço fixado. Ademais, ao contrário da típica sentença de cunho declaratório de usucapião, a regra dá origem a sentença do tipo “constitutivo”: o ato judicial só terá eficácia translativa de domínio após o pagamento da indenização.

De outro lado, como já se sustentou (BERNARDES, 2003), não parece correto confundir o instituto com algum tipo de desapropriação, ainda que judicial, pois o registro da propriedade se dá em favor de particulares. Assim, falta-lhe a característica mais singela da desapropriação: a transferência compulsória da propriedade particular (ou pública de entidade de grau inferior para superior) para o Poder Público ou a agentes delegados. Não bastasse, outras objeções parecem contradizer a doutrina majoritária: (a) não é o Poder Público quem deva suportar a despesa com o pagamento do preço; (b) já existe hipótese de interesse público para desapropriação em caso muito semelhante (art. 2, IV, da Lei 4.132\62); e (c) pela antiga tradição brasileira, não compete ao Judiciário decidir sobre a oportunidade e conveniência de desapropriações (art. 9º do DL 3.365\41).

Enfim, ao contrário da doutrina majoritária, os §§ 4º e 5º do art. 1.228 do CC não parecem regular caso de desapropriação judicial, mas de alienação compulsória de imóvel. O que fez o legislador foi conceder poderes para que o juiz da ação reivindicatória, uma vez presentes o pressupostos legais, supra a vontade do proprietário e permita que possuidores de boa-fé adquiram a propriedade do imóvel, de forma onerosa, a despeito da aquiescência do titular.

De qualquer forma, a alienação forçada há de ser considerada forma originária de aquisição da propriedade, o que torna o imóvel após registrado em nome dos possuidores, liberado de quaisquer ônus anterior, além de insuscetível de reivindicação. Aos eventuais credores do antigo proprietário, caberá somente a sub-rogação no preço fixado para o imóvel, embora garantidas à Fazenda Pública as prefências legais.

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47
Q

A expropriação-sanção prevista no art. 243 da CF alcança a totalidade do imóvel, ou apenas as áreas utilizadas para o cultivo ilegal de plantas psicotrópicas?

A

EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. EXPROPRIAÇÃO. GLEBAS. CULTURAS ILEGAIS. PLANTAS PSICOTRÓPICAS. ARTIGO 243 DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. INTERPRETAÇÃO DO DIREITO. LINGUAGEM DO DIREITO. LINGUAGEM JURÍDICA. ARTIGO 5º, LIV DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. O CHAMADO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. 1. Gleba, no artigo 243 da Constituição do Brasil, só pode ser entendida como a propriedade na qual sejam localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas. O preceito não refere áreas em que sejam cultivadas plantas psicotrópicas, mas as glebas, no seu todo. 2. A gleba expropriada será destinada ao assentamento de colonos, para o cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos. 3. A linguagem jurídica corresponde à linguagem natural, de modo que é nesta, linguagem natural, que se há de buscar o significado das palavras e expressões que se compõem naquela. Cada vocábulo nela assume significado no contexto no qual inserido. O sentido de cada palavra há de ser discernido em cada caso. No seu contexto e em face das circunstâncias do caso. Não se pode atribuir à palavra qualquer sentido distinto do que ela tem em estado de dicionário, ainda que não baste a consulta aos dicionários, ignorando-se o contexto no qual ela é usada, para que esse sentido seja em cada caso discernido. A interpretação/aplicação do direito se faz não apenas a partir de elementos colhidos do texto normativo [mundo do dever-ser], mas também a partir de elementos do caso ao qual será ela aplicada, isto é, a partir de dados da realidade [mundo do ser]. 4. O direito, qual ensinou CARLOS MAXIMILIANO, deve ser interpretado “inteligentemente, não de modo que a ordem legal envolva um absurdo, prescreva inconveniências, vá ter a conclusões inconsistentes ou impossíveis”. 5. O entendimento sufragado no acórdão recorrido não pode ser acolhido, conduzindo ao absurdo de expropriar-se 150 m2 de terra rural para nesses mesmos 150 m2 assentar-se colonos, tendo em vista o cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos. 6. Não violação do preceito veiculado pelo artigo 5º, LIV da Constituição do Brasil e do chamado “princípio” da proporcionalidade. Ausência de “desvio de poder legislativo” Recurso extraordinário a que se dá provimento.

(RE 543974, Relator(a): Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 26/03/2009, DJe-099 DIVULG 28-05-2009 PUBLIC 29-05-2009 EMENT VOL-02362-08 PP-01477 RTJ VOL-00209-01 PP-00395)

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48
Q

Um ente político pode requisitar de outro ente político a utilização de bens ou serviços?

A

[…] Referido inciso II do art. 22 evidencia, ainda, a possibilidade de requisições em tempo de guerra, circunstância em que não estão circunscritas a objeto da propriedade “privada” - diferentemente da previsão genérica do inciso XXV do art. 5 - e poderão atingir, por exemplo, bens ou serviços das demais unidades federativa ou até de Estado ou organismos internacionais. Todavia, o poder requisitório para situações de guerra é originariamente reservado a autoridades federais, pois compete à União tanto declarar a guerra (art. 21, II) quanto prover os recursos e instrumentos necessários para sustentá-la (v. artigos 148, I, e 154, II).

XXV - no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano;

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

III - requisições civis e militares, em caso de iminente perigo e em tempo de guerra;

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49
Q

A importação ilegal de mercadorias gera o perdimento do veículo utilizado em seu transporte?

A

[…] nos termos do art. 5, XLIV, da Constituição é válida a lei penal que estabelece pena de perdimento de bens em caso de condenação criminal (art. 91, II, do CP), sem que se possa invocar a proibição do confisco.

No entanto, com base na proibição do confisco e no princípio da proporcionalidade, a jurisprudência tem mitigado as hipóteses de perdimento administrativo de veículo utilizados para importação ilegal de mercadorias (DL 37\66. art. 104, V). Conforme dezenas de precedentes, “se o valor das mercadorias apreendidas não guardar qualquer relação com o valor do veículo que as transporta, a pena de perdimento deste deve ser anulada para evitar que se caracterize o confisco” (STJ, REsp 111.127\RS, 2 Turma). Também quanto à pena de perdimento administrativo de “veículos de qualquer natureza” utilizados na prática de infrações ambientais (Lei 9.605\98, art. 25, § 4º, e 72, IV), além do raciocínio ligado à exigência de proporcionalidade entre o dano ambiental e o valor do veículo (TRF\4 Região, AC 13.548\RS, 3 Turma), há acórdãos a condicionar a aplicação da penalidade à existência de “provas sobre o uso específico e exclusivo do veículo para a prática delituosa” (v.g., TRF\1 Região, REOMS 0001977-82.2002.4.01.3301\BA, 5 Turma).

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50
Q

Para o Min. EROS GRAU, a atribuição pelo Legislativo ao Executivo ou Judiciário para, no exercício de função normativa, definir a obrigação de fazer ou não fazer que se imponha aos particulares implica violação ao princípio da legalidade?

A

Numa interpretação bastante controvertida do inciso II do art. 5 da Constituição, o Min. EROS GRAU fez consta da ementa do HC 85.060\PR (1 Turma):

HABEAS CORPUS. PENAL, PROCESSUAL PENAL E CONSTITUCIONAL. FORMAÇÃO DE QUADRILHA E GESTÃO FRAUDULENTA DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. COMPETÊNCIA. ESPECIALIZAÇÃO DE VARA POR RESOLUÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO. OFENSA AO PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL E À RESERVA DE LEI [CONSTITUIÇÃO DO BRASIL, ARTIGOS 5º, INCISOS XXXVII E LIII; 22, I; 24, XI, 68, § 1º, I e 96, II, ALÍNEAS a e d]. INOCORRÊNCIA. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE E PRINCÍPIOS DA RESERVA DA LEI E DA RESERVA DA NORMA. FUNÇÃO LEGISLATIVA E FUNÇÃO NORMATIVA. LEI, REGULAMENTO E REGIMENTO. AUSÊNCIA DE DELEGAÇÃO DE FUNÇÃO LEGISLATIVA. SEPARAÇÃO DOS PODERES [CONSTITUIÇÃO DO BRASIL, ARTIGO 2º]. 1. Paciente condenado a doze anos e oito meses de reclusão pela prática dos crimes de formação de quadrilha (CP, art. 288) e gestão fraudulenta de instituição financeira (Lei n. 7.492/86). 2. Inquérito supervisionado pelo Juiz Federal da Subseção Judiciária de Foz do Iguaçu, que deferiu medidas cautelares. 3. Especialização, por Resolução do Tribunal Regional da Quarta Região, da Segunda Vara Federal de Curitiba/PR para o julgamento de crimes financeiros. 4. Remessa dos autos ao Juízo competente. 5. Ofensa ao princípio do juiz natural [artigo 5º, incisos XXXVII e LIII da Constituição do Brasil] e à reserva de lei. Inocorrência. 6. Especializar varas e atribuir competência por natureza de feitos não é matéria alcançada pela reserva da lei em sentido estrito, porém apenas pelo princípio da legalidade afirmado no artigo 5º, II da Constituição do Brasil, ou seja, pela reserva da norma. No enunciado do preceito — ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei — há visível distinção entre as seguintes situações: [i] vinculação às definições da lei e [ii] vinculação às definições decorrentes — isto é, fixadas em virtude dela — de lei. No primeiro caso estamos diante da reserva da lei; no segundo, em face da reserva da norma [norma que pode ser tanto legal quanto regulamentar ou regimental]. Na segunda situação, ainda quando as definições em pauta se operem em atos normativos não da espécie legislativa — mas decorrentes de previsão implícita ou explícita em lei — o princípio estará sendo devidamente acatado. 7. No caso concreto, o princípio da legalidade expressa reserva de lei em termos relativos [= reserva da norma] não impede a atribuição, explícita ou implícita, ao Executivo e ao Judiciário, para, no exercício da função normativa, definir obrigação de fazer ou não fazer que se imponha aos particulares — e os vincule. 8. Se há matérias que não podem ser reguladas senão pela lei — v.g.: não haverá crime ou pena, nem tributo, nem exigência de órgão público para o exercício de atividade econômica sem lei, aqui entendida como tipo específico de ato legislativo, que os estabeleça — das excluídas a essa exigência podem tratar, sobre elas dispondo, o Poder Executivo e o Judiciário, em regulamentos e regimentos. Quanto à definição do que está incluído nas matérias de reserva de lei, há de ser colhida no texto constitucional; quanto a essas matérias não cabem regulamentos e regimentos. Inconcebível a admissão de que o texto constitucional contivesse disposição despiciente — verba cum effectu sunt accipienda. A legalidade da Resolução n. 20, do Presidente do TRF da 4ª Região, é evidente. 9. Não há delegação de competência legislativa na hipótese e, pois, inconstitucionalidade. Quando o Executivo e o Judiciário expedem atos normativos de caráter não legislativo — regulamentos e regimentos, respectivamente — não o fazem no exercício da função legislativa, mas no desenvolvimento de função normativa. O exercício da função regulamentar e da função regimental não decorrem de delegação de função legislativa; não envolvem, portanto, derrogação do princípio da divisão dos poderes. Denego a ordem.

(HC 85060, Relator(a): Min. EROS GRAU, Primeira Turma, julgado em 23/09/2008, DJe-030 DIVULG 12-02-2009 PUBLIC 13-02-2009 EMENT VOL-02348-02 PP-00363 RTJ VOL-00209-03 PP-01119)

51
Q

O STF tem admitido RE’s baseados em violação ao princípio da legalidade?

A

Pela jurisprudência histórica do STF, sempre se entendeu que a má interpretação da legislação infraconstitucional não implica violação direta ao princípio da legalidade e, portanto, não pode ser reparada pela via do RE (por todos, v. AgRg no AI 161.396\SP). Ver súmula 636 do STF (“Não cabe recurso extraordinário por contrariedade ao princípio constitucional da legalidade, quando a sua verificação pressuponha rever a interpretação dada a normas infraconstitucionais pela decisão recorrida”).

Porém, no RE 638.115\CE (j. em 19-3-2015), o Plenário do STF baserou-se no princípio da legalidade para reavaliar o que se deve entender por “questão constitucional”. Endendeu-se que a não observância do direito infraconstitucional pode configurar ofensa ao próprio direito constitucional. Assim, decisão ou ato judicial sem fundamento lgeal ou contrário ao direito ordinário violaria o princípio da legalidade. Conforme voto-vencedor do Min. GILMAR MENDES, contudo, para evitar que o STF se transformasse em simples “tribunal de revisão” de decisões judiciais, seria adequado adotar os seguintes critérios restritivos, à semelhança do direito alemão. O cabimento do RE - fundamentado na ofensa ao princípio da legalidade por parte de decisões judiciais - dependeria da demonstração de que (a) na interpretação e aplicação do direito, o juiz tenha desconsiderado “por completo ou essencialmente a influência dos direitos fundamentais”; ou (b) a decisão seja “manifestamente arbitrária na aplicação do direito ordinário”. ou, ainda, que (c) a decisão tenha ultrapassado “os lmites da construção jurisprudencial”. Todavia, embora o RE 638.115\CE tenha sido conhecido, essa proposta de redefinição do que seja “questão constitucional” só foi acolhida por mais três Ministros (DIAS TOFOLLI, MARCO AURÉLIO e LEWANDOWSKI). Já o voto do Min. CELSO DE MELLO, embora pela não admissão do RE, ressaltou que: “caracterizada interpretação judicial obviamente arbitrária de determinado preceito legal, justificar-se-ia a configuração, no caso, de transgressão ao postulado da legalidade.”

52
Q

O princípio da retroatividade de norma penal mais benéfica aplica-se a entendimentos jurisprudenciais?

A

STF:

[…] “o princípio da retroatividade de norma penal mais benéfica aplica-se às leis penais, e não a entendimentos jurisprudenciais. Seria possível, contudo, que certo posicionamento tivesse efeitos retroativos apenas se dissesse respeito à tipicidade ou não de determinada conduta, mas, no caso, se cuidaria da legitimidade ativa para exercício da ação penal. Ainda que essa legitimidade pudesse influir na punibilidade, não se poderia sustentar que alguém tem o direito subjetivo de não ser punido porque, no momento em que praticado o fato, entendia-se que a titularidade da ação penal pertencia a outrem, de acordo com a orientação jurisprudencial dominante à época” (HC 123.971\DF). Na ementa do caso em tela, temos típico caso de derrotabilidade”: “Se o STF vier a considerar, no presente habeas corpus, que não é admissível a ação penal pública, a consequência seria a total desproteção da menor e a impunidade do crime. 5. À vista da excepcionalidade do caso concreto, o art. 227 da CF\88 paralisa a incidência do art. 225 do Código Penal, na redação originária, e legitima a propositura da ação penal pública. Aplicação do princípio da proibição da proteção deficiente” (grifo nosso). O Min. Barroso salientou: “Portanto, eu estou produzindo um solução que vale para este caso concreto, porque tem uma situação peculiaríssima”.

53
Q

O que é o direito de resistência? É ele admitido pela CF\88?

A

Positivado pela primeira vez no art. 2 da Declaração de Direitos do Homem de 1789, o direito de resistência assegura ao indivíduo a faculdade de resistir às incursões ilegais de autoridades em sua esfera de liberdades, pois o agente público perde a qualidade estatal quando age ilegalmente, daí por que passa a se assemelhar a um privado qualquer (RUY BARBOSA).

A resistência pode ser individual ou coletiva. Além disso, conforme MARCELLO CAETANO, comporta as seguintes modalidade: (a) resistência passiva: simples recusa em cumprir o ato opressivo, enquanto ainda não houver coação para cumpri-lo; (b) resistência defensiva: repulsão da força pela força, num autêntico exercício do direito de defesa; (c) resistência agressiva: forma de rebelião ou revolução tendente a revogação do ato injusto ou à própria mudança do governo.

Encontra-se presente em algumas constituições, como a portuguesa (1976), mas não está previsto expressamente na Constituição de 1988. Todavia, pode-se sustentar que o direito à resistência tanto passiva quanto defensiva são implicitamente admitidos no direito brasileiro. Já a resistência agressiva não é tolerada. (p. 192)

54
Q

Os direitos sujeitos a termo ou condição também se consideram adquiridos no caso de superveniência de lei com ele incompatível?

A

Direitos de aquisição imperfeita: Trata-se do instituto regulado na parte final do § 2º do art. 6º da LINDB, segundo o qual se considera adquirido até mesmo o direito “cujo começo do exercício tenha termo pré-fixo, ou condição preestabelecida inalterável, a arbítrio de outrem”. Daí a subdivisão, respectivamente, em “direito a termo” e “direito condicional”, ambos os quais resguardáveis em face dos efeitos da lei nova, a despeito de o termo ou da condição se implementarem posteriormente.

Afinal, o direito não deixa de ser adquirido só porque submetido a algum termo prefixado. Em sendo certa a ocorrência do termo, o lapso anterior apenas suspende o exercício do direito, mas não sua aquisição.

Já quanto aos direitos condicionais, cujo exercício esteja sujeito a alguma condição, se esta for mesmo “inalterável ao arbítrio de outrem”, o legislador lhe atribuiu efeito retroativo, a partir da data em que ela se verificar. De modo a se reputar adquirido o direito ao tempo da celebração do ato ou do negócio a ela subordinado. Mas se a condição puder ser alterada ao arbítrio de outrem, o direito condicional sofrerá as consequências previstas pela lei em vigor na data de implemento da condicionante. Daí se falar que os “direito condicionais, no âmbito do direito público, são expectativa de direito” (SAMPOIO, 2005, p. 255).

Atenção:

As maiores discussões a respeito ocorrem quando alguma lei inovadora entra em vigor antes de verificada condição preestabelecida. Por exemplo: se um contrato firmado de acordo com a lei em vigor prevê uma obrigação quando um dos contratantes atingir certa idade, caso essa condição se verifique no futuro, o credor fará jus à obrigação correspondente, ainda que nesse meio-tempo surja uma lei a partir da qual a obrigação não pudesse mais ser exigida. Em sentido contrário, porém, decidiu a 3 Turma do STJ no REsp 809.329\RJ, ao considerar que o Estatuto do Idoso (Lei 10.741\2003) se aplicava aos contratos de plano de saúde firmados antes de sua vigência, de modo a suprimir a aplicação da cláusula contratual que permitia majorar a mensalidade do plano quando o beneficiário mudasse de faixa etária, conforme autorização expressa da Lei 9.656\98.

55
Q

A lei que modifica o regime dos efeitos do recebimento de recurso se aplica imediatamente?

A

No EI na ADIn 1.591\RS, o STF entendeu que a lei que modifica o regime dos efeitos do recebimento de recurso processual se aplica imediatamente, pois não há direito adquirido a respeito. Porém, a lei que extingue determinado tipo de recurso processual não pode aplicar-se em prejuízo do direito adquirido de interpor o recurso previsto na lei velha contra uma decisão judicial já proferida, mesmo que tal decisão não tenha sido ainda publicada.

56
Q

Servidores público têm direito a aumento concedido por lei com previsão de eficácia futura que venha a ser revogada antes de produzir efeitos?

A

[…] Já na ADIn 4.013\TO, contraditoriamente, o Plenário do STF reputou inconstitucional, por violação dos princípios da não retroatividade e da irredutibilidade de vencimentos, a lei que pretendia revogar legislação que concedera aumento com eficácia futura. Entendeu-se que as leis concessivas de aumento salarial já estavam em vigor quando editada a lei revogadora, muito embora os efeitos financeiros delas só seriam eficazes no futuro. Para a Corte, “desde a entrada em vigor das leis que estabeleceram o aumento daqueles subsídios dos servidores, com a publicação delas, a melhoria concedida fora incorporada ao patrimônio jurídico dos agentes públicos” (Inf. 819\2016). Nesse precedente, o STF parece ter confundido a vigência da lei com a implementação dos requisistos necessários à aquisição do direito.

57
Q

Com relação à distinção entre “estatutos contratuais” e “estatutos legais” para fins de aferição de existência de direito adquirido, como tem se posicionado o STF?

A

Nos RR. EE. 212.609\SP, 211.304\RJ e 222.140\SP (j. em 29-4-2015), o Plenário do STF fez distinção entre (a) situações jurídicas individuais, aquelas formadas por ato de vontade (especialmente os contratos) imunes a modificações legislativas supervenientes; e (b) situações institucionais ou estatuárias, as constituída segundo normas gerais e abstratas, de natureza cogente, em cujo âmbito os direitos só se consideram adquiridos quando inteiramente formado o suporte fático previsto na lei como necessário à respectiva incidência. Daí, concluiu que, nos contratos que incorporam cláusulas reguladas por lei, como as referente a correção monetária, não há direito adquirido a mantê-las em face de alterações legislativas supervenientes. De modo que as normas a implantar novo sistema monetário têm natureza institucional ou estatutária, o que lhes permite disciplinar cláusulas de correção monetária dos contratos em curso, sem violar o princípio da não retroatividade. (p. 200)

58
Q

O decreto legislativo editado para regular os efeitos de medidas provisórias não aprovada pode desconstituir decisões judiciais passadas em julgado?

A

Sim. “[…] como a rejeição de medida provisória tem efeitos ex tunc, o decreto legislativo que venha a regular os efeitos da medida provisória não aprovada (§ 3º do art. 62 da CF) poderá desconstituir retroativamente decisões judiciais, incluindo as passadas em julgado, que tivessem aplicado a medida provisória rejeitada.”

59
Q

Em que hipóteses admite-se a impetração de HC contra punições disciplinares militares?

A

Em razão de norma constitucional expressa (art. 142, § 2º), não cabe habeas corpus contra punições disciplinares militares.

Atenção:

Com apoio em doutrinadores como PONTES DE MIRANDA, a jurisprudência tem atenuado essa restrição, de modo a admitir habeas corpus quanto aos aspectos formais da decisão punitiva, quais sejam: (a) hierarquia; (b) poder disciplinar da autoridade; (c) relação de causalidade entre o fato e função; e (d) pena abstratamente aplicável.

60
Q

Qual é a posição do STF quanto ao status constitucional do princípio do duplo grau de jurisdição?

A

Princípio do duplo grau de jurisdição: O Plenário do STF entende não ser um princípio de status constitucional. Como decidido no RHC 79.785\RJ, por exemplo, “não é possível, sob as sucessivas Constituições da República, erigir o duplo grau em princípio e garantia constitucional, tantas são as previsões, na própria Lei Fundamental, do julgamento de única instância ordinária, já na área cível, já, particularmente, na área penal”.

Em matéria penal, contudo, o princípio do duplo grau de jurisdicição foi acolhido sem restrições por tratado internacional (Convenção Interamericana de Direito Humanos - Pacto de São José). Daí que, embora tal incorporação não implique superar as exceções ao duplo grau previstas na própria Constituição Federal, o entendimento do STF quanto à natureza supralegal dos tratados internacionais sobre direito humanos interfere no poder de conformação legislativa a respeito. Já em matéria cível, porém, não há impedimento a que o legislador torne irrecorríveis algumas decisões judiciais, mesmo que tomadas em única instância, desde que respeitadas as hipóteses recursais previstas na Constituição Federal.

Como o STF já enfrentou a questão:

No julgamento do AgRg no AI 601.832\SP, em caso de condenação criminal de magistrado detentor de foro especial no TRF, a Corte afastou a alegação de descumprimento do duplo grau de jurisdição assegurado pelo Pacto de São José da Corta Rica. Entendeu o STF que, “não obstante o fato de que o princípio do duplo grau de jurisdição previsto na Convenção Americana de Direitos Humanos tenha sido internalizado no direito doméstico brasileiro, isto não significa que esse princípio revista-se de natureza absoluta”. Daí, nos casos em que a própria Constituição estabelece hipóteses de foro especial por prerrogativa de função, não há defender-se a introdução de “nova modalidade de recurso inominado”, a pretexto de conferir eficácia ao duplo grau de jurisdição.

61
Q

É constitucional lei que condiciona o ajuizamento de ação à submissão da lide à Comissão de Conciliação Prévia?

A

“O Plenário do STF considerou ofensivo ao princípio do livre acesso ao Judiciário o art. 625-D da CLT (introduzido pelo art. 1 da Lei 9.958\2000), pelo qual se determinara que as demandas trabalhistas fosse antes submetidas à Comissão de Conciliação Prévia (ADInMC 2.160\DF)”.

62
Q

Exige-se a observância do contraditório em auditorias realizadas em órgãos públicos?

A

O princípio constitucional do contraditório não é aplicável aos simples procedimentos de investigação. Para o STF, a garantia constitucional do contraditório e da ampla defesa não incide em face de simples “procedimentos” ou peças informativas que não sejam verdadeiros “processos” destinados a decidir litígios, ainda que administrativamente. Por isso, o âmbito de proteção do inciso LV do art. 5 não se estende aos procedimentos de investigação pré-processual, sejam ou não alvo de acompanhamento judicial, tais como o inquérito policial, o inquérito civil público e as auditorias, tampouco aos pedidos judiciais de quebra de sigilo bancário ou fiscal destinados a servir de prova em tais procedimentos.

63
Q

O STF reconhece a existência do princípio do promotor natural?

A

SIM, embora haja controvérsia sobre a interpretação das decisões em que o princípio foi primeiro mencionado (p. 226).

“Além do princípio do juiz natural, o mesmo inciso LIII do art. 5 (“ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente”) permite extrair também, ainda que implicitamente, o chamado “princípio do promotor natural”. Trata-se da garantia a afastar a figura do acusador de exceção, o que impede designações casuísticas de membros do Ministério Público por parte dos respectivos Procuradores-Gerais.”

64
Q

Qual a diferença entre provas ilícitas e provas ilegítimas?

A

[…] embora a Constituição só tenha feito referência às provas “ilícitas”, a doutrina costuma diferenciar duas subcategorias de provas inadmissíveis:

a) provas ilícitas: são as obtidas com violação a normas de direito material (constitucionais e infraconstitucionais). Nesse caso, a nulidade surge no momento da captação da prova. Exemplo: as provas produzidas em desrespeito ao direito à intimidade (v.g., mediante buscas domiciliares ou escutas telefônicas sem ordem judicial) e à integridade física (com espancamento, afogamento, e.g.).
b) provas ilegítimas: aquelas incorporadas com afronta a normas de direito processual (constitucionais ou infraconstitucionais). Aqui, a nulidade se refere ao momento da introdução da prova no processo. Exemplo: documento relevante anexado fora do prazo legal.

65
Q

A prova emprestada pode ser recebida no processo com a mesma “natureza” que possuía no processo anterior?

A

[…] embora se admita o empréstimo de prova antes produzida em ação a envolver partes distintas, a prova daí emprestada será sempre do tipo documental. Ela só manterá sua “natureza originária” quando houver coincidência de partes em ambos os processos (JOSÉ MIGUEL G. MEDINA). Assim, por exemplo, em outra ação na qual litigam partes diversas, uma perícia anteriormente produzida poderá servir como prova emprestada, mas com valor de simples documento (prova documental), e não com aquele de sua natureza originária (prova técnica).

66
Q

Se o acordo de colaboração premiada vier a ser rescindido, as provas obtidas por meio dele poderão ser usadas contra o colaborador?

A

[…] a despeito de omissa a legislação, comprovado o descumprimento das condições previamente constantes do acordo homologado (inciso II do art. 6 da Lei 12.850\2013), o órgão ministerial poderá pleitear à Justiça a rescisão da colaboração. Em hipóteses tais, uma vez deferida a rescisão, embora o colaborador inadimplente possa até perder os benefícios advindos da colaboração rescindida, mantêm-se válidas as provas produzidas a partir da delação, a menos que incidente alguma causa de nulidade específica.

Afinal, ainda quando simples proposta de colaboração sejam recusadas, a legislação preserva a validade das provas coligidas durante a fase de negociação, ressalvadas apenas as provas autoincriminatórias que possam ser usadas “exclusivamente” em desfavor do colaborador (Art. 4, p. 10, da Lei 12.850\2013). Daí, a contrario sensu, excluídas quaisquer dúvidas quanto à validade das provas obtidas contra terceiros, ainda que durante a fase de simples negociação da colaboração, a impossibilidade legal de utilizar as provas autoincriminatórias, em face do próprio colaborador, só incide se o acordo não chegar a ser homologado. Após homologada a colaboração premiada, os elementos probatórios dela resultantes são válidos, incluindo aqueles a incriminar o próprio colaborador, mesmo que o acordo seja posteriormente rescindido.

67
Q

A doutrina divide o encontro fortuito de provas em duas espécies: a de primeiro grau e a de segundo grau. Conteitue-as e diga se há relevância nessa distinção para a jurisprudência.

A

Parte da doutrina, com base nas hipóteses legais de conexão e continência (CPP, art. 76-77), traça distinções entre dois tipos de encontro fortuito de prova. Nos encontros de primeiro grau, as provas obtidas dizem respeito a infrações com laços de conexão ou continência em face daquelas que determinaram as diligências iniciais. Já nos encontros de segundo grau, são detectados elementos probatórios sem conexão nem continência com as primeiras investigação. Assim, concluem autores como LUIZ FLÁVIO GOMES (2009), “em relação aos fatos não conexos (ou quando não haja continência), impõe-se falar em serendipidade ou encontro fortuito de segundo grau (ou em fatos que não estão na mesma situação histórica de vida do delito investigado). A prova produzida, nesse caso, não pode ser valorada pelo juiz.”

Contudo, essa tese desqualificante do valor das provas fortuitas costuma ser rejeitada pela jurisprudência. Como já decidiu o STF, a “validade da investigação não está condicionada ao resultado, mas à observância do devido processo legal. Se o emprego de método especial de investigação, como a interceptação telefônica, foi validamente autorizado, a descoberta fortuita, por ele propriciada, de outros crimes que não os inicialmente previstos não padece de vício, sendo as provas respectivas passíveis de ser consideradas e valoradas no processo penal” (HC 106.152\MS, 1 Turma). Mais recentemente, no âmbito da “Operação Lava-Jato”, mesmo após reconhecer a inexistência de conexão ou continência em face dos fatos originalmente investigado, o Plenário do STF validou provas fortuitas encontradas contra membro do Senado Federal (QO no Inq 4.130\PR).

68
Q

Cite alguns exemplos de aplicação do princípio da pessoalidade da pena que não se refiram à esfera penal.

A

[…] a 1 Turma do STF reputou que, embora o adquirente\sucessor seja responsável pelo tributos relativos ao fundo de comércio ou estabelecimento comercial adquirido (Art. 133 do CTN), não responde pela respectivas multas tributárias de caráter punitivo (RE 82.754\SP). Na mesma linha, já na vigência da CF\88 e com expressa alusão ao princípio da intranscendência, o Plenário do STF impediu que sanções administrativas, decorrentes da inscrição de autarquias estaduais e distritais em cadastros federais de indimplência, pudessem atingir os respectivos Estado-membros e o Distrito Federal (QO na AgRg na AC 1.033\DF, Pleno). E o STJ, em matéria de responsabilidade civil, utilizou o princípio para elevar o valor da indenização decorrente do assassinato de reeducando em estabelecimento penitenciário. Entendeu a Corte que o direito da ex-esposa do falecido à indenização “por danos morais proporcional ao dano (CF\88, art. 5, V e X) não pode ser prejudicado em razão da gravidade do crime cometido pela vítima, sob pena de se lhe transferir, indiretamente, os efeitos da condenação criminal do marido, o que viola o princípio constitucional da intranscendência da pena (CF\88, art. 5, XLV)” (REsp 704.873\SP, 1 Turma).

OBSERVAÇÃO

Súmula 554 do STJ: “Na hipótese de sucessão empresarial, a responsabilidade da sucessora abrange não apenas os tributos devidos pela sucedida, mas também as multas moratórias ou punitivas referentes a fatos geradores ocorridos até a data da sucessão”.

69
Q

Veículo adquirido por meio de arrendamento mercantil pode ser apreendido e expropriado no caso de verificação de importação irregular de mercadorias por meio dele?

A

Com base implícita no princípio da intranscendência da pena, entendia o STJ somente ser cabível o perdimento de veículo utilizado na importação irregular de mercadorias quando houvesse demonstração da responsabilidade do proprietário na prática da infração. Assim, essa hipótese de perdimento acabava por não atingir veículos objeto de alientação fiduciária ou arrendamento mercantil (leasing), já que a propriedade do bem remanescia com instituições financeiras que não participaram da importação irregular (v. ArGr no REsp 1.313.331\PR, 2 Turma). Contudo, a Corte mudou de entendimento e, sem se atentar para o princípio constitucional da intransmissibilidade da pena, passou a reputar válido o perdimento do veículo em casos tais, independentemente da boa-fé do proprietário (credor fiduciário\arrendante). Para tanto, o STJ tem entendido que o contrato de propriedade resolúvel firmado entre o possuidor direto e o titular do domínio do veículo não pode ser invocado contra o Fisco (Art. 123 do CTN). Ver AgRg no Resp 1.528.519\PR, 2 Turma.

70
Q

Cite hipóteses em que o STF seguiu uma linha menos garantista e não interpretou a presunção de inocência como uma regra, mas como um princípio.

A

[…] o STF decidiu: (b.1) no RE 568.030\RN, embora não houvesse sequer sentença condenatório de 1 grau, reputou-se sem capacitação moral, para o exercício da atividade policial, pessoa submetida ao cumprimento das exigências decorrentes da suspensão condicional do processo (Lei 9.099\95, art. 89); (b.2) que não atenta contra “a garantia constitucional da chamada presunção de inocência o afastamento do cargo de magistrado contra o qual é recebida denúncia ou queira”, por se tratar de medida “aconselhável de resguardo ao prestígio do cargo e à própria respeitabilidade do juiz” (Inq. 2.424\DF); (b.3) inexistitr violação do “princípio da presunção da inocência (CF\1988, art. 5, LVII) no fato de a lei não permitir a inclusão de oficial militar no quadro de acesso à promoção em razão de denúncia em proceso criminal” (AgRg no RE 459.320\PI); (b.4) pela constitucionalidade da Lei 9.840\99, na parte em que modificara a Lei 9.504\97, abrindo possibilidade de execução imediata da decisão judicial que cancela registro ou diploma de candidato condenado por captação ilícita de sufrágio (“compra de votos”), independentemente do trânsito em julgado (ADIn 3.592\DF e MS 25.458\DF); (b.5) pela validade da chamada “Lei da Ficha Limpa” (LC 135\2010, que alterou a LC 64\90), na parte em que torna inelegíveis, em determinadas hipóteses, pessoas condenadas por órgãos judiciais colegiados, independentemente do trânsito em julgado (Plenário, ADC 29\DF, ADC 30\DF e ADIn 4.578\DF).

71
Q

É cabível ação penal privada subsidiária da pública em crime cometido contra a administração pública?

A

[…] conforme a doutrina processual, a ação privada subsidiária da pública só pode ser intentada pela vítima ou por seu representante legal. Todavia, numa interpretação sistemática, é possível defender que todos cidadão tenha legitimidade para propor ação penal privada subsidiária nas hipóteses de crime cuja vítima seja o Estado (ou entidade de que este participe), sempre que atingidos os bens protegidos pelo inciso LXIII do art. 5 da CF. Nesse sentido, o TSE já admitiu ação penal privada subsidiária da pública, em matéria de crime eleitoral, a despeito da ausência da condição de “vítima” do querelante, por considerar que o tema é de interesse público (REsp 21.295\SP).

72
Q

A responsabilidade do Estado por erro judiciário é objetiva?

A

[…] no RE 505.393\PE, a 1 Turma do STF decidiu que o inciso LXXV NÃO: (a) veio para aditar pressupostos subjetivos à regra geral da responsabilidade fundada no risco administrativo” (art. 37, p. 6); (b) exige configuração de “dolo ou culpa do magistrado”; (c) “impede a lei, nem impede eventuais construções doutrinárias que venham a reconhecer a responsabilidade do Estado em hipóteses que não a de erro judiciário stricto sensu, mas de evidente falta objetiva do serviço público da Justiça”.

73
Q

O crime de injúria racial está sujeito à prescrição?

A

[…] a 6 Turma do STJ considerou que os crimes de racismo alcançados pelo inciso XLII do art. 5 não se restringem somente aos tipos penais previstos na Lei de Racismo (Lei 7.716\89). Daí ter sido também considerado imprescritível o crime de injúria racial incluído posteriormente ao CP (§ 3º acrescentado ao art. 140, com redação atual da Lei 10.741\2003). Para o STJ, a introdução legislativa do tipo penal da injúria racial implicou a criação de “mais um delito no cenário do racismo, portanto, imprescritível, inafiançável e sujeito à pena de reclusão.”

74
Q

Pode o Poder Público cobrar taxa para expedição de certidões voltadas à prestação de informações de interesse coletivo ou geral?

A

Na ADIn 3.278\SC, o Plenário do STF entendeu que a imunidade de taxas para emissão de certidão em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal (Art. 5, XXXIV, “b”), não alcança “a expedição de certidões voltadas à prestação de informações de interesse coletivo ou geral (Art. 5, XXXIII)”.

75
Q

Pode-se questionar, em mandado de segurança, a proporcionalidade da pena aplicada a servidor na esfera administrativa?

A

No RMS 33.666\DF, a 1 Turma ratificou a jurisprudência da Corte quanto à impossibilidade de apreciação, na via do mandado de segurança, da proporcionalidade da pena aplicada administrativamente ao servidor, pois o problema exige a reapreciação de aspectos fáticos da causa, ressalvadas as hipóteses em que a “demissão estiver fundada na prática de ato de improbidade de natureza culposa, sem a imputação de locupletamente ilícito do servidor”.

76
Q

Admite-se a habilitação de herdeiros no MS?

A

O STF não admite, no procedimento do mandado de segurança: (a) a intervenção de terceiros, em razão de vedação da lei que regulamente o writ; (b) a intervenção de amicus curiae, já que isso comprometeria a celeridade processual e a vedação à intervenção de terceiros; (c) a habilitação de herdeiros, por entender ser de natureza personalíssima o direito em disputa na ação (MS 22.355\DF e AgRg no RE 445.409\AM). Porém, a Corte Especial do STJ tem lúcido precedente a admitir a habilitação de herdeiro em processo que já esteja em fase de execução de sentença (EDcl no AgRg em EDcl no MS 16.567\DF). Afinal, sujeitam-se ao direito sucessório os eventuais direitos patrimoniais em sede de execução do título judicial formado com a procedência do pedido do mandado de segurança.

77
Q

Admite-se a desistência do MS mesmo após a prolação de sentença de mérito?

A

Pela jurisprudência história do STF, a parte impetrante poderá desistir do mandado de segurança, independentemente da anuência da autoridade impetrada. Contudo, havia precedentes pelos quais a desistência só poderia ser homologada se formulada antes da sentença de mérito. Então, no RE 669.367\RJ (j. em 2-5-2013), o Plenário da Corte entendeu que o impetrante poderá desistir do mandado de segurança a qualquer tempo, a despeito da anuência da parte contrária, mesmo que já tenha sido proferida decisão que lhe seja favorável. Porém, no AgRg nos ED nos ED no MS 29.093\DF (j. em 14-4-2015), a 2 Turma, por unanimidade, recursou-se a homologar a desistência do mandado de segurança, ao argumento de que já havia sido proferida decisão de mérito, em sentido desfavorável ao impetrante, o que era alvo de sucessivos recursos. Entendeu a Corte que a desistência teria como finalidade secundária renovar a discussão da matéria, em ação ordinária perante a Justiça comum, o que não poderia ser admitido (ver Info. 781\2015).

Obs: No concurso para Juiz do TJAM (2016\Cesp), foi considerada incorreta a afirmação: “Não se admite que o impetrante desista da ação de MS sem aquiescência da autoridade apontada como coatora ou da entidade estatal interessada, após prolação de sentença de mérito”.

78
Q

A legitimidade passiva do MS é da autoridade coatora ou da pessoa jurídica?

A

Muito se discute se o polo passivo da relação processual no mandado de segurança é ocupado pela autoridade coatora ou pela pessoa jurídica a que ela se vincula. Prevalece a tese segundo a qual a legitimidade passiva do writ recai sobre a pessoa jurídica, ainda que representada pelo agente ou autoridade competente.

Vários são os dispositivos da Lei 12.016\2009 que ratificam esse posicionamento, tais como: a exigência de a petição inicial identificar a pessoa jurídica a que a autoridade coatora está integrada (Art. 6); a necessidade de dar ciência ao representante legal da pessoa jurídica interessada acerca do conteúdo da petição inicial (art. 7, II), bem como do conteúdo da sentença concessiva do writ (art. 13).

Por outro lado, como a competência para o julgamento do mandado de segurança é fixada de acordo com a autoridade impetrada, a impetração deve ser dirigida não à pessoa jurídica em si, mas à própria autoridade coatora.

79
Q

A errônea indicação da autoridade coatora induz à extinção do MS sem julgamento do mérito?

A

A errônea indicação da autoridade coatora conduz à extinção do processo sem julgamento do mérito, pois não compete ao órgão judicial, na falta de iniciativa da parte autora, proceder à substituição de autoridade apontada pelo impetrante (STF, RMS 21.382\DF, Pleno).

Porém, já ganha corpo no STJ o entendimento segundo o qual o juiz pode determinar a notificação da autoridade correta, quando ambas as autoridades pertencerem à mesma pessoa jurídica (v. RMS 17.889\RS e AgRg no REsp 1.222.348\BA, ambos da 1 Turma). Ademais, é possível revelar a erronia da inicial em caso de encampação do ato coator por parte de alguma autoridade de nível hierárquico superior àquela que deveria ter sido indicada coatora.

80
Q

Cabe MS contra ato de representante de partido político?

A

[…] a Constituição admite mandado de segurança não somente contra autoridades públicas, mas também em face de agentes de pessoa jurídica de direito privado, desde que no exercício de atribuições do Poder Público (art. 5, LXIX). Em razão disso, para fins de impetração de mandado de segurança, o legislador equiparou às autoridades públicas:

a) os representantes ou órgãos de partidos políticos;

b) os administradores de entidades autárquicas; e
c) os dirigentes de pessoas jurídicas e\ou as pessoas naturais no exercício de atribuições do Poder Público, mas apenas no que disser respeito a essas atribuições. Daí a Súmula 510 do STF, a reputar cabível mandado de segurança contra agente no exercício de “competência delegada” do Poder Público.

81
Q

De quem é a competência para julgar ato praticado por colegiado presidido por Ministro de Estado?

A

Atos praticados por órgão colegiado: considera-se autoridade coatora o agente que o preside (STF, RMS 21.560\DF), mas isso não desloca a competência para o julgamento da ação, ainda que se trate o presidente do órgão colegiado de autoridade cujos atos próprios desafiem MS da competência originária do tirbunais. Daí, v.g., ser o STJ incompetente para processar e julgar, originariamente, MS contra ato de órgão colegiado presidido por Ministro de Estado (Súmla 177 do STJ).

82
Q

Como se define a competência para o MS no caso de atos complexos?

A

Considera-se autoridade coatora aquela que intervém para o aperfeiçoamente final do ato. Esse é o fundamento da Súmula 627 do STF, segundo a qual, no MS contra a nomeação de magistrado atribuída ao Presidente da República, este é considerado autoridade coatora, ainda que a impetração ataque nulidade ocorrida em fase anterior do procedimento.

83
Q

Em alguma hipótese, cabe MS contra decisão judicial contra a qual foi interposto recurso recebido sem efeito suspensivo?

A

[…] excepcionalmente, o STJ admite MS contra atos judiciais sujeitos a recurso recebido sem efeito suspensivo, seja nos casos em que a lei não prevÊ tal efeito, seja nas hipóteses em que a parte não o tenha obtido (AgRg no MS 10.252\DF e AgRg no MS 17.857\DF):

1) nas hipóteses de decisão teratológica, que importa em violação frontal de norma jurídica (ROMS 13.547\SP);
2) nos casos em que a ação é impetrada por terceiro, que deveria ser litisconsorte necessário e não participou do processo (STJ, Súmula 202), para evitar que incidam os efeitos da decisão atacada sobre o impetrante (ROMS 6.317\SP). Esse último entendimento também se aplica a MS contra a coisa julgada (THEODORO JÚNIOR, 2009, p. 460).

84
Q

Cabe MS para controlar a constitucionalidade de atos do Poder Público?

A

SIM. “[…] o MS pode ser utilizado não somente para questionar a ‘ilegalidade’, como também para controlar a constitucionalidade de atos do Poder Público”.

85
Q

Segundo a Súmula 266 do STF, não cabe MS contra ato normativo em tese. Cite os casos em que o STF tem flexibilizado esse entendimento.

A

[…] No STF, contudo, há vários precedente a considerar também como MS contra lei em tese aquele impetrado em face de ato normativo que exija a edição de algum outro ato, medida ou atitude concretos para dar aplicação às consequência previstas em lei. Assim, por exemplo, não seria cabível MS para atacar lei que estabelecesse determinada penalidade sem que antes alguma autoridade pública já tenha lavrado, concretamente, o auto de infração exigido pela lei.

Contudo, esse posicionamento esquece que a impetração pode ocorrer de modo preventivo e que, frequentemente, a edição de atos concretos - e eventualmente lesivos - é decorrência automática da edicação do ato normativo genérico e abstrato. Basta lembrar a entrada em vigor de uma lei a determinar que o Fisco cobre um novo tributo. Embora genérica e abstrata essa lei, o contribuinte já se torna automaticamente sujeito aos efeitos delas, a despeito de edição do ato administrativo concreto (lançameno tributário), sobretudo porque as autoridade fiscais estão vinculadas ao dever de arrecadar o tributo recém-criado.

Bem por isso, a atual tendência do STF é afastar a Súmula 266 quando o MS atacar ato normativo que já possa alcançar, de “maneira direta e imediata”, a posição jurídica do impetrante. Daí o entendimento segundo o qual é “inteiramente supérfluo o aguardo de novo ato administrativo para que a impugnação se viabilze” (decisão monocrática do Min. GILMAR MENDES na MC no MS 26.325\DF). Nessa linha, v. 26.595\DF, Plenário.

De qualquer modo, como tem decidido o STJ, o MS preventivo não pode ser utilizado para obter provimento genérico e aplicável a todos os casos futuros (v. REsp 1.064.434\SP e 1.594.374\GO).

GILMAR MENDES:

” Impõe-se, todavia, num primeiro momento, tecer algumas considerações a respeito do cabimento do presente mandado de segurança, impetrado contra Resolução que possui, indiscutivelmente, natureza eminentemente normativa, por ser dotado dos atributos de generalidade, abstração e impessoalidade.

Não se desconhece a orientação do Supremo Tribunal Federal, cristalizada na Súmula 266, no sentido do não-cabimento de mandado de segurança contra lei ou ato normativo em tese, uma vez que ineptos para provocar lesão a direito líquido e certo. Segundo esse entendimento, a concretização de ato administrativo com base na lei poderá viabilizar a impugnação, com pedido de declaração de inconstitucionalidade da norma questionada.

Embora seja uma medida compreensível no contexto do sistema difuso, é certo que o sistema de proteção jurídica sofreu profunda alteração com o advento da Constituição de 1988. Assim, é de se indagar se ainda subsistem razões para a mantença dessa orientação restritiva, pelo menos em relação àquelas leis das quais decorrem efeitos diretos e imediatos para as diversas posições jurídicas.

No âmbito da Corte Constitucional alemã tem-se mitigado o significado do princípio da subsidiariedade aplicável ao recurso constitucional (Verfassungsbeschwerde) para admitir a impugnação de leis que afetem posições jurídicas de forma direta, desde que não se afigure razoável aguardar a exaustão das instâncias. Reconhece-se, por outro lado, que leis que alteram a denominação de cargos ou proíbem o exercício de uma profissão no futuro são dotadas de eficácia imediata e mostram-se aptas para afetar direito subjetivo e, por isso, podem ser impugnadas diretamente. Assim, em tais casos, afigura-se razoável a superação da súmula referida ou, pelo menos, que se adote um distinguishing para afirmar que as leis que afetam posições jurídicas de forma imediata poderão ser impugnadas em mandado de segurança.

Entendo ser exatamente o caso dos presentes autos. Nele, tem-se um ato normativo que, ao dirigir expressa proibição aos membros do Parquet, alcançou, de maneira direta e imediata, a posição jurídica do impetrante, promotor de justiça e ocupante do cargo de Secretário de Estado do Poder Executivo amapaense. Mostra-se inteiramente supérfluo o aguardo de novo ato administrativo para que a impugnação se viabilize, uma vez que a Resolução contestada, por si só, tem força suficiente para impor ao impetrante as vedações nela contidas. Por essas razões, conheço do presente writ.”

86
Q

A interposição de recurso administrativo impede a fluência do prazo decadencial do MS?

A

Conforme legislação que regulamento o writ, o direito de requerer MS sujeita-se ao prazo decadencial de 120 dias, contados a partir “da ciência, pelo interessado, do ato impugnado” (art. 23 da Lei 12.016\2009).

[…] Contudo, a contagem dos 120 dias só se inicia a partir do momento em que o interessado tiver como saber que o ato é capaz de lhe gerar lesão. Por tal motivo, considera-se que a interposição de recurso administrativo com efeito suspensivo impede o início da contagem do prazo de decadência.

OBS: o Plenário do STF já considerou tempestiva a impetração ocorrida dentro dos 120 dias, porém perante juízo incompetente, a despeito da data de remessa dos autos ao juízo competente (MS 21.325\DF).

87
Q

No MS coletivo, pode associação defender interesses de apenas parte dos associados?

A

Sim. É o teor do Súmula 630 do STF.

Obs: Há acórdão a entender pela ilegitimidade ativa do substituto processual a patrocinar a defesa de somente parte dos interesses dos membros ou associados, quando em colisão com os interesses de outra parte destes (v. ROMS 23.868\ES, 6 Turma do STJ).

88
Q

Membros que passem a integrar a associação após a impetração por este de MS coletivo podem se beneficiar dos efeitos desse remédio constitucional?

A

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. SÚMULA 284/STF. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. DESCABIMENTO. SERVIDOR PÚBLICO.
AÇÃO DE COBRANÇA. DIFERENÇAS REMUNERATÓRIAS. PARCELAS ANTERIORES À IMPETRAÇÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO. LEGITIMIDADE ATIVA.
PRESCRIÇÃO. PRAZO. TERMO INICIAL. TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO PROFERIDA NO WRIT. JUROS DE MORA. TERMO A QUO. NOTIFICAÇÃO DA AUTORIDADE NA AÇÃO COLETIVA.
1. “É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia” (Súmula 284/STF).
2. Inviável a análise, no recurso especial, de matéria decidida com enfoque exclusivamente constitucional.
3. A associação, no mandado de segurança coletivo, atua na condição de substituto processual. Desse modo, a decisão ali proferida beneficia todos os seus associados, independentemente da data de filiação, descabendo o cumprimento das exigências descritas no art.
2º-A da Lei n. 9.494/1997, aplicáveis apenas às ações ordinárias.
4. A impetração do mandado de segurança, mesmo coletivo, interrompe a prescrição da pretensão de cobrança das parcelas referentes ao quinquênio que antecede a propositura daquele. Nesses casos, o prazo prescricional somente voltará a fluir após o trânsito em julgado da decisão proferida no writ. Precedentes.
5. O termo inicial dos juros de mora, nas ações de cobrança de parcelas pretéritas à impetração do mandado de segurança, é a data da notificação da autoridade coatora no writ.
6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido.
(REsp 1841301/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/12/2019, DJe 04/02/2020)

Art. 2o-A. A sentença civil prolatada em ação de caráter coletivo proposta por entidade associativa, na defesa dos interesses e direitos dos seus associados, abrangerá apenas os substituídos que tenham, na data da propositura da ação, domicílio no âmbito da competência territorial do órgão prolator.

Parágrafo único. Nas ações coletivas propostas contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas autarquias e fundações, a petição inicial deverá obrigatoriamente estar instruída com a ata da assembléia da entidade associativa que a autorizou, acompanhada da relação nominal dos seus associados e indicação dos respectivos endereços.

89
Q

É cabível a impetração de MI para regulamentação de norma programática?

A

Um dos requisitos do MI é a “existência de norma constitucional que, desprovida de aplicabilidade imediata, consagre direitos, liberdades e prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania”.

“O parâmetro de controle utilizado pelo MI acaba reduzido às normas constitucionais de princípio institutivo, de aplicabilidade mediata e eficácia limitada, mas somente quando ‘impositivas’, e não apenas ‘facultativas’. Isso porque, tratando-se de normas constitucionais de aplicabilidade imediata e eficácia plena ou mesmo contida, não há utilidade no MI, pois já são juridicamente efetivos os direitos, as liberdades e as prerrogativas por elas assegurados. E se a norma constitucional for de aplicabilidade mediata e de eficácia limitada, mas programática, tampouco caberá MI. Como ensina JORGE HAGE (1999, p. 226), normas desse naipe “não conferem direito, e não dependem, portanto, apenas de regulamentação”. (p. 299)

90
Q

O MI serve para forçar a edição de norma que não seja legislativa?

A

Não é necessário que se trate de norma “legislativa”, pois o dever constitucional de editar a regulamentação pode incluir normas de outra natureza ou status hierárquico.

OBS: Não cabe MI quando o déficit de efetividade do direito, da liberdade ou da prerrogativa resultar da mera falta de ações ou medidas administrativas, e não propriamente de normas regulamentares (ROBERTO PFEIFFER).

Comentários qconcursos:

Segundo Alexandre de Moraes “As normas constitucionais que permitem o ajuizamento do mandado de injunção assemelham-se às da ação direta de inconstitucionalidade por omissão e não decorrem de todas as espécies de omissões do Poder Público, mão tão-só em relação às normas constitucionais de eficácia limitada de princípio institutivo de caráter impositivo e das normas programáticas vinculadas ao princípio da legalidade, por dependerem de atuação normativa ulterior para garantir sua aplicabilidade. Assim, sempre haverá a necessidade de lacunas na estrutura normativa, que necessitarem ser colmatadas por leis ou atos normativos.”

91
Q

Cabe MI quando já existe norma regulmanetadora, embora insuficiente?

A

Antes da Lei 13.300\2016, entendia a jurisprudência do STF, se já tivesse sido editada a norma regulamentadora, não caberia MI, ainda que se ssustentasse a insuficiência do ato normativo para viabilizar o exercício dos direitos, liberdades e prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania (MI 60\DF, Plenário). É dizer, para o STF, o MI só poderia ser usado contra omissões totais, com exclusão das omissões inconstitucionais do tipo parcial.

Entretanto, esse raciocínio foi superado pela Lei 13.300\2016, cujo artigo 2 prevê o cabimento de MI também quando se sustenta a insuficiência da norma regulamentar. Logo, com a nova legislação, passou a ser cabível MI contra omissões parciais.

92
Q

A edição da norma cujo suprimento da falta era busca em MI prejudica esse remédio constitucional?

A

[…] nos MIs 943\DF, 1.010\DF, 1.074\DF e 1.090\DF, decidira o STF que, durante a tramitação do writ (i.e., no curso da ação, mesmo que após iniciado o julgamento, ou na fase de execução do julgado), a eventual edição da legislação reclamada não impedia a apreciação do mérito da causa, que deveria ser decidida mediante a aplicação, ao caso concreto, dos parâmetros normativos retirados da legislação superveniente. Para o STF, como as normas aprovadas no curso do processo não surtem efeitos retroativos, não havia que se falar em perda do objeto do MI, já que subsistiria interesse de agir quanto ao período anterior.

Contudo, esse último entendimento também parece comprometido diante da recente regulamentação do instituto. Nos termos do art. 11, parágrafo único, da Lei 13.300\2016, considera-se prejudicado o MI caso a norma regulamentadora seja editada antes da decisão final. Hipótese em que o processo deverá ser extinto, sem resolução do mérito, independentemente da questão relativa ao período anterior à edição da norma.

“Efetivada a integração normativa necessária ao exercício da disciplinação normativa, exaure-se a função jurídico-constitucional para a qual foi concebido (e instituído) o remédio constitucional do mandado de injunção” (ED no MI 1.194\DF).

93
Q

Com relação à finalidade do MI, cite e explique as teorias existente.

A

a) Corrente não concretista: defendida por autores como FERREIRA FILHO e HELY LOPE MEIRELLES, sustenta que o Judiciário não pode invadir a competência institucional dos demais Poderes para suprir a omissão inconstitucional, nem sequer para editar uma norma individual que viabilizasse o exercício concreto de direitos, liberdades ou prerrogativas comprometidos pela inércia estatal. Em observância ao princípio da separação dos Poderes, a concessão do MI deve limitar-se ao reconhecimento da omissão inconstitucional, seguido da simples comunicação, aos órgãos responsáveis, para que corrijam o problema, a exemplo da sistemática da queixa constitucional alemã.

b) Corrente concretista: adotada pela doutrina majoritária, advoga que o MI é uma ação do tipo “mandamental”. Assim, após o reconhecimento da inconstitucionalidade omissiva do Poder Público, o Judiciário deve conceder a ordem da injunção e, então, “concretizar” (i.e., editar ou pelo menos identificar) a norma a ser aplicada a fim de viabilizar o exercício dos direitos, liberdades constitucionais e prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania.

Essa corrente concretista comporta outras duas subdivisões. Em relação à necessidade de concessão prévia de prazo para que o órgão ou autoridade omisso resolva o problema, há duas posições:

b.1) posição concretista indireta: ao reconhecer a omissão inconstitucional, o Judiciário concederá ao órgão ou autoridade impetrados prazo para regulamentar a norma constitucional e, somente se persistir a inércia, após o decurso desse prazo, é que a norma será concretizada judicialmente;

b.2) posição concretisa direta: ao julgar procedente o pedido do MI, o Judiciário já pode concretizar a norma, diretamente, sem necessidade de assinalar prazos prévios ou aguardar que o órgão\autoridade inadimplente se disponha a corrigir a omissão inconstitucional.

Pour outro lado, em relação à eficácia da decisão judicial que concretiza a norma a viabilizar o exercício de direitos, liberdades ou prerrogativas, a corrente concretista bifurca-se em:

b.1) posição concretista geral (erga omnes): a decisão concessiva do mandado de injunção surte efeitos erga omnes, de modo que a concretização judicial da norma a viabilizar o exercício de direitos, liberdades ou prerrogativas valerá (genérica e abstratamente) para todos os que se incluírem na mesma situação decidida, até que a omissão inconstitucional seja corrigida pelo órgão ou autoridade competente para editar a normatização exigida pelo constituinte;

b.2) posição concretista individual (inter partes): a decisão a conceder MI concretiza a norma regulamentar aplicável ao caso, mas surte efeitos apenas inter partes - i.e., restritos à relação jurídica examinada em concreto. Nessa linha, o MI visa a “realizar concretamente, em favor do impetrante, o direito, a liberdade ou a prerrogativa”; porém, não serve para “obter a reulamentação prevista na norma constitucional”, pois “ não é sucedâneo da ação de inconstitucionalidade por omissão” (JOSÉ AFONSO DA SILVA, 1990, p. 399).

C) Corrente alternativa: uma vez reconhecido o “estado de mora constitucional”, a sentença concessiva do mandado de injunção não obriga o Poder Público a suprir a omissão, nem invade a competência institucional dos demais órgãos estatais. Contudo, serve para afastar a necessidade de aguardar a norma regulamentadora, propriciando a superação concreta da omissão, ainda que por meio de medidas compensatórias em favor do impetrante. Assim, conquanto a decisão judicial não supra a omissão inconstitucional, ela remove os obstáculos decorrentes da exigência da regulamentação como pressuposto para o gozo do direito, da liberdade ou da prerrogativa constitucional, abrindo a possibilidade, ainda que pelas vias processuais ordinárias, seja da preservação, seja da reparação dos direitos subjetivos cujo exercício estava antes inviaiblizado pela inércia do Poder Público.

Essa também a corrente apontada como alternativa por certo adeptos de corrente concretista. Para CELSO AGRÍCOLA BARBI, por exemplo, o Judiciário deve “criar” uma norma especial para o caso concreto “ou adotar uma medida capaz de proteger o direito do autor da demanda” (1990, p. 391).

OBS: o STF já adotou a corrente alternativa. “[…] no MI 232\RJ, ultrapassado o prazo previsto no art. 59 do ADCT para regulamentação da imunidade de que trata o pár. 7 do art. 195 da CF, o Plenário da Corte, além de declarar o “estado de mora” do Congresso Nacional, assinalou o prazo de seis meses para que a norma constitucional fosse regulamentada, “sob pena de, vencido esse prazo”, “passar o requerente a gozar da imunidade requerida”. Também em caso de mora qualificada, o Pleno do STF fixou prazo para regulamentação de dispositivo constitucional (art. 8, pár. 3, do ADCT) e ainda decidiu que, não observado tal prazo, ficava assegurada ao impetrante “a faculdade de obter, contra a União, pela via processual adequada, sentença líquida de condenação à reparação constitucional decida, pelas perdas e danos que se arbitrarem” (MI 283\DF). Ademais, em outro MI fundamentado no mesmo dispositivo, o STF deferiu parcialmente o pedido e assegurou ao impetrante o direito à imediata ação de liquidação do valor prometido pela norma não regulamentada, independentemente de sentença condenatória (MI 543\DF, Plenário).

94
Q

Qual a posição adotada pelo STF quanto ao MI?

A

[…] a partir de 2007, o Plenário do STF aderiu à corrente concretista. A “virada” de jurisprudência deu-se no julgamento de vários MI’s coletivos, nos quais se discutia a omissão em editar a lei que regulamentasse o direito de greves dos servidores públicos civis (art. 37, VII, da CF). Nesses precedentes, em entendimento contrário à corrente não concretista até então adotada como regra geral pela Corte, o Plenário determinou a aplicação das normas contidas na Lei 7.783\89, que disciplina o exercício do direito de greve na iniciativa privada, muito embora a Constituição exigisse “lei específica” para o tratamento da matéria. Num claro exemplo de ativismo judicial, o STF reconheceu até mesmo efeitos erga omnes às decisões concessivas desses MI’s coletivos (vencidos três Ministros votantes), o que sinalizou a adesão da maioria da Corte à polêmica corrente concretista direta geral.

Depois disso, em MI individual a discutir a ausência de regulamentação da aposentadoria especial dos servidores público (Art. 40, pár. 4, da CF), o Plenário da Corte, no MI 721\DF, ratificou a posição concretista e determinou fossem aplicadas ao caso as normas do regime geral de previdência social (art. 57 da Lei 8.213\91). Contudo, nesse precedente, o STF restringiu os efeitos do julgado só à parte impetrante, por entender que a decisão proferida no MI “possui eficácia considerada a relação jurídica nele revelada”. Ou seja, o STF adotou a corrente concretista direta individual.

95
Q

Qual a posição adotada pela Lei 13.300\2016 quanto à eficácia do Mandado de Injunção?

A

Com a regulamentação feita pela Lei 13.300\2016, o legislador adotou múltiplas correntes quanto à vocação processual do MI.

Nada obstante, a concessão do MI, via de regra, surte efeitos apenas inter partes. Pelo art. 9, a “decisão terá eficácia subjetiva limitada às partes”. Ademais, conforme o artigo 8, reconhecido o “estado de mora legislativa”, o deferimento da injunção deverá “determinar prazo razoável para que o impetrado promova a edição da norma regulamentadora” (inciso I).

Assim, regra geral, a legislação adotou a corrente concretista intermediária individual. É dizer: embora o Judiciário possa concretizar a norma aplicável inter partes, só poderá fazê-lo depois de esgotado o prazo inicialmente fixado para que o órgão ou a autoridade impetrada possam suprir a omissão inconstitucional. Mas o legislador previu algumas exceções à regra geral.

Com efeito, a Lei 13.300\2016 permite dispensar a fixação prévia de prazo ao órgão inadimplente, caso fique comprovado que a fixação de prazo semelhante, em impetração anterior, não tenha sido atendida (parágrafo único do art. 8). Trata-se, portanto, de previsão da corrente concretista direta.

[…] Por outro lado, o art. 9 da Lei 13.300\2016 permite que a concessão do mandado de injunção tenha efeitos ultra partes ou erga omnes, “quando isso for inerente ou indispensável ao exercício do direito, da liberdade ou da prerrogativa objeto da impetração” (pár. 1 do art. 9). Nessas hipóteses, a opção legislativa é, claramente, a corrente concretista geral.

Ademais, a lei prevê que o deferimento da injunlção consistirá, “se for o caso”, no estabelecimento das “condições em que poderá o interessado promover ação própria” para exercer os direitos, as liberdades ou as prerrogativas reclamados (inciso II do art. 8). Logo se vê, cuida-se de técnica decisória da chamada corrente alternativa.

Assim, mesmo que excepcionalmente, a lei permite decisões típicas das correntes concretista direta e concretista geral, e até da denominada corrente alternativa.

96
Q

Como se define o polo passivo do MI?

A

O polo passivo da relação processual do MI é ocupado pelo órgão, entidade ou autoridade a quem o constituinte deferiu o dever de regulamentar a norma constitucional cuja efetividade se pretende (v. art. 3 da Lei 13.300\16). Assim, por exemplo, se questionar a inércia em editar lei federal exigida pela Constituição, o MI deve ser dirigido contra o Presidente do Congresso Nacional.

Em se tratando de lei cujo projeto é de iniciativa reservada, a legitimidade passiva será da autoridade que detém esse poder de iniciar o processo legislativo, pelo menos até que apresentada a respectiva proposta normativa ao órgão legislativo competente. Exemplo: enquanto não remetida para o Congresso Nacional projeto de lei para regulamentar o direito de greve dos servidores públicos federais, o mandado de injunção a respeito deve ser proposto em face do Presidente da República, pois é dele o poder de iniciar o processo legislativo sobre o assunto (CF, art. 61, pár. 1, II, “c”).

Obs: não cabe litisconsórcio passivo entre as autoridade\órgãos impetrados e eventuais particulares que poderão ser obrigados a cumprir a norma regulamentadora (STF, ArGr no MI 323\DF, Pleno e MI 1.007\SE).

97
Q

É cabível liminar no bojo de MI?

A

Embora entendesse aplicável ao MI o procedimento do MS, a jurisprudência histórica do STF nunca admitira pedido de liminar.

Os precedentes nesse sentido baseram-se no seguinte racioncínio: não cabe liminar para suprir a omissão estatal, pois nem sequer o provimento final do writ poderá supri-la. Contudo, trata-se de reciocínio atrelado à posição não concretista que a Corte adotava. Por isso, não mais se justifica, já que o STF passou a adotar a posição concretista […]

Já a regulamentação dada pela Lei 13.300\2016 nada dispôs a respeito. Todavia, parte da doutrina tem defendido que poderá ser concedida, independente da omissão normativa, com fundamento no princípio da tutela jurisdicional efetiva (art. 5, XXXV da CF), já que não encontra vedação legal. A possibilidade de concessão de liminar, prestada no início da lide, evitará a demora de toda a tramitação processual para somente ao final ocorrer a concessão da prestação jurisdicional, em prejuízo da tutela jurisdicional célere que será efetiva, tal como determina a Lei Maior no citado artigo” (FERREIRA e CASTRO, 2016, p. 94 e 118).

98
Q

Como se dão os efeitos temporais da decisão do MI?

A

Em relação às repercussões temporais da concessão da injunção, adota-se a seguinte disciplina:

a) regra geral: a decisão produzirá efeitos até o advento a norma regulamentadora, que passará a reger a relação jurídica discutida no MI. Assim, a regulamentação superveniente não retroage nem atinge períodos anteriores, mas se aplica imediatamente (ex nunc), inclusive em face das sentenças já transitadas em julgado (coisa julgada com cláusula rebus sic stantibus). Ver caput do art. 9, c\c caput do art. 11 da Lei 13.300\2016.

b) exceção: se já transitado em julgado a sentença a estipular condições mais favorável aos beneficiário da injunção, a regulamentação superveniente não interferirá na relação jurídica. O exercício dos direitos, das liberdades ou das prerrogativas seguirá regido pelas regras estabelecidas na decisão transitada em julgado.

Obs: O artigo 10 da Lei 13.300\2016 prevê um tipo de ação revisional da injunção que poderá gerar repercussões quanto aos efeitos temporais da sentença anterior. Assim, ainda que transitada em julgado a sentença com condições mais favoráveis, a aplicação da regulamentação superveniente poderá ser obtida pela via judicial própria (ação revisional da ordem de injunção).

OBS: Fiquei em dúvida quanto ao tempo. Melhor pesquisar sobre a interpretação dos artigos 9, 10 e 11 da Lei 13.300\2016.

99
Q

O HD é cabível para obter certidão do Poder Público, negada administrativamente?

A

Não.

Descabe confundir o habeas data com o remédio ligado ao direito à informação (inciso XXXIII do art. 5 da CF). Enquanto o habeas data utiliza a via judicial para acessar ou retificar dados referentes ao próprio interessado, o direito à informação é exercido na via administrativa e está relacionado a interesse particular, coletivo ou geral. Por outro lado, conforme doutrina majoritária, é incabível a utilização de habeas data nos casos em que “sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado” (TERESA WAMBIER, 1998, p. 121). De modo que o direito à informação possui maior amplitude.

No concurdo para Procurador Federal (2010\Cespe), foi considerada errada a seguinte assertiva: “A CF assegura a todos, independentemente do pagamento de taxas, a obtenção de certidões em repartições públicas, para a defesa de direito e esclarecimento de situações de interesse pessoal. Nesse sentido, não sendo atendido o pedido de certidão, por ilegalidade ou abuso de poder, o remédio cabível será o habeas data.

100
Q

O HD é medida adequada para se postular o fornecimento da identidade dos autores de agressões e denúncias feitas contra o impetrante?

A

No RMS 24.617\DF, a 2 Turma decidiu ser caso de MS, e não de HD, a pretensão ao “fornecimento ao impetrante da identidade dos autores de agressões e denúncias que lhe foram feitas”.

101
Q

Quem tem legitimidade para impetrar HD?

A

Qualquer pessoa física ou jurídica, nacional ou estrangeira, poderá impetrar habeas data. Trata-se, porém, de direito personalíssimo, que só se transmite aos herdeiros ou ao cônjuge supérstite em caso de falecimento do titular dos dados.

102
Q

Cabe HD para postular acesso a dado detido por sociedade de economia mista exploradora de atividade econômica?

A

Ao julgar habeas data impetrado por ex-empregada do Banco do Brasil que tivera seu pedido de readmissão negado e pretendia obter informações sobre sua ficha funcional, a Corte considerou que o Banco do Brasil não tinha legitimidade passiva ad causam, vez que não confundia com alguma entidade governamental, e sim como explorador de atividade econômica, nem se enquadrava no conceito de registros de caráter público, já que a ficha funcional de empregado não é acessada por terceiros (RE 165.304\MG).

103
Q

Há custas e honorários no HD?

A

[…] o impetrante goza de isenção de custas e despesas processuais (inciso LXXVii do art. 5 da CF). Por analogia, aplicam-se as Súmula 512\STF e 105\STJ, que afastam a incidência de honorários advocatícios.

LXXVII - são gratuitas as ações de habeas corpus e habeas data, e, na forma da lei, os atos necessários ao exercício da cidadania.

Lei 12.016\2009: Art. 25. Não cabem, no processo de mandado de segurança, a interposição de embargos infringentes e a condenação ao pagamento dos honorários advocatícios, sem prejuízo da aplicação de sanções no caso de litigância de má-fé.

Súmula 512, STF: Não cabe condenação em honorários de advogado na ação de mandado de segurança.

Súmula 105, STJ: Na ação de mandado de segurança não se admite condenação em honorários advocatícios.

104
Q

A ação popular serve para defesa de direitos coletivos e individuais homogêneos?

A

Não.

“[…] o objeto da ação é a tutela dos direitos difusos ligados à preservação “da probidade, eficiência e moralidade na gestão da coisa pública e bem assim à tutela do meio ambiente e do patrimônio público em sentido amplo”. Já a finalidade da ação é desconstituir o ato lesivo e obter a “condenação dos responsáveis à reposição do status quo ante, permitida tutela cautelar”.

Contudo, a ação não é instrumento hábil à proteção de interesses coletivos ou individuais homogêneos, nem pode ser usada como “alternativa à não propositura de uma ação direta de inconstitucionalidade” (STF, ArGr na AO 1.725\DF).

105
Q

Cabe ação popular contra ato de conteúdo jurisdicional?

A

Também não podem ser alvo da ação popular os atos de conteúdo jurisdicional. Isso porque, como não possuem caráter administrativo, acham-se sujeitos a sistema específico de impugnação judicial, quer por via recursal, quer mediante utilização de ação rescisória (STF, AO 672\DF). Porém, ao tempo do CPC\73, a jurisprudência do STJ já admitia ação popular para desconstituir acordos judiciais homologados pelo Judiciário (ver CPC\2015, ART. 966, § 4o), quando se afigurassem lesivos aos bens jurídicos tutelados pelo inciso LXXIII do art. 5 da Constituição. Nesse caso, mesmo que incabível a ação rescisória, pode a ação popular ser utilizada para desconstituir o acordo (REsp 536.762\RS).

106
Q

A legitimação para propositura de ação popular é ordinária ou extraordinária?

A

[…] a natureza da legitimidade ativa para a ação popular é bastante peculiar. Para autores como JOSÉ AFONSO DA SILVA e RODOLFO MANCUSO, na que parece ser a doutrina majoritária, cuida-se de legitimidade ordinária. O cidadão age na defesa dos próprios direitos políticos de participação que a Constituição lhe reconhece no rol dos direitos fundamentais. Nesse sentido, embora o sucesso da ação beneficie outras pessoas por via reflexa, o autor da ação popular apenas exerce “sua quota-parte no direito geral a uma administração proba e eficaz” (MANCUSO, 1993, p. 109).

Contudo, para o Plenário do STF (Rcl 424\RJ), na linha da doutrina de FREDERICO MARQUES e de SEABRA FAGUNDES, trata-se de legitimidade extraordinária. Não há negar que o cidadão age, processualmente, em nome próprio, a partir dos direito políticos que a Constituição lhe atribui. Porém, ele o faz na defesa de pretensões materiais de outrem (i.e., da União, Estados, DF, Municípios ou respectivas autarquias). Afinal, a própria pessoa jurídicade direito público lesada poderia defender judicialmente a mesma pretensão, em nome próprio, ou até proceder à anulação administrativa do ato questionado. Logo, a legitimação do cidadão se dá em nome próprio, “mas na defesa do patrimônio público: caso singular de substituição processual”. No mesmo sentido. ED no MS 25.743\DF, da 1 Turma.

107
Q

O STF pode ser competente para julgamento de Ação Popular em alguma hipótese?

A

Excepcionalmente, haverá competência originária do STF nas seguintes hipóteses constitucionais:

(a) em que todos os membros da magistratura sejam direta ou indiretamente interessados na ação (art. 102, I, “n”, da Constituição) - ver QO na AO 506\AC; ou
(b) de conflito federativo estabelecido entre a União e Estado-membro ou Distrito Federal (art. 103, I, “f”, da Constituição). Entretanto, a despeito do art. 102,I, “r” (com redação da EC 45\2004), o STF é incompetente para julgar, originariamente, ação popular, ainda que promovida contra atos praticados pelo CNJ e pelo CNMP (Pet 3.674\DF e AO 1.531\RS).

OBSERVAÇÃO SOBRE A COMPETÊNCIA DO STF PARA JULGAR AÇÕES RELATIVAS A ATOS PRATICADOS PELO CNJ:

Ementa: AGRAVO REGIMENTAL. RECLAMAÇÃO. ALEGAÇÃO DE USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL PARA PROCESSAR E JULGAR AÇÕES ORDINÁRIAS CONTRA ATOS DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. ARTIGO 102, I, “r”, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ATRIBUIÇÕES CONSTITUCIONAIS OUTORGADAS AO CNJ. OBSERVÂNCIA DA RELAÇÃO HIERÁRQUICA CONSTITUCIONALMENTE ESTABELECIDA. VOTO PELO PROVIMENTO DO AGRAVO INTERNO. 1. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) é órgão de controle da atividade administrativa, financeira e disciplinar da magistratura, exercendo relevante papel na racionalização, transparência e eficiência da administração judiciária. Criado pela Emenda Constitucional nº 45, de 8 de dezembro de 2004, tem o escopo de conferir efetividade às promessas constitucionais de essência republicana e democrática, notadamente os princípios da publicidade, moralidade, impessoalidade e eficiência, insculpidos no caput do artigo 37 da Constituição. 2. A singularidade da posição institucional do CNJ na estrutura judiciária brasileira resulta no alcance nacional de suas prerrogativas, que incidem sobre todos os órgãos e juízes hierarquicamente inferiores ao Supremo Tribunal Federal, salvo esta Suprema Corte, posto órgão de cúpula do Poder Judiciário pátrio (ADI 3.367, Rel. Min. Cezar Peluso, Tribunal Pleno, DJ de 17/3/2006). 3. O Conselho Nacional de Justiça, em perspectiva histórica, simbolizou verdadeira “abertura das portas do Judiciário para que representantes da sociedade tomem parte no controle administrativo-financeiro e ético-disciplinar da atuação do Poder, robustecendo-lhe o caráter republicano e democrático” (ADI 3.367, Ministro relator Cezar Peluso, Tribunal Pleno, DJ de 17/3/2006) e representa expressiva conquista do Estado democrático de direito, dotando de maior transparência os atos praticados pelos Tribunais e operando como um polo coordenador de políticas nacionais judiciárias. 4. A ratio iuris da criação do CNJ correspondeu à necessidade sociopolítica de um órgão nacional de controle das atividades judiciárias, nascedouro de um planejamento integrado em prol de maior eficiência e publicidade do sistema de justiça. 5. In casu, a controvérsia jurídico-constitucional reside em definir se esta Suprema Corte ostenta competência originária para processar e julgar ações ordinárias contra atos do CNJ de caráter normativo ou regulamentar, que traçam modelos de políticas nacionais no âmbito do Judiciário, nos termos do artigo 102, inc. I, alínea “r”, da Constituição Federal. 6. As cláusulas constitucionais que definem a competência originária do Supremo Tribunal Federal estão sujeitas à construção exegética de seu alcance e significado. É que a natureza expressa e taxativa das atribuições da Corte não afasta o labor hermenêutico para definir seu campo de incidência. Em outros termos, as competências insculpidas no art. 102 da Carta da República não consubstanciam molduras rígidas ou inflexíveis, mas espelham tipos normativos sujeitos à conformação por esta Suprema Corte. Precedentes: ADI 2.797, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Tribunal Pleno, DJ de 19/12/2006; AP 937 QO, Rel. Min. Roberto Barroso, Tribunal Pleno, DJe de 11/12/2018; ACO 1.048 QO, Rel. Min. Celso de Mello, Tribunal Pleno, DJ de 31/10/2007 e ACO 1.295 AgR-segundo, Rel. Min. Dias Toffoli, Tribunal Pleno, DJe de 2/12/2010. 7. A jurisprudência desta Corte, nada obstante predicar que a competência do STF para julgar demandas contra atos do CNJ se limita às ações de natureza mandamental, admitiu, no julgamento do agravo interno na petição 4.656, o conhecimento do mérito de ação ordinária ajuizada no STF contra decisão administrativa do CNJ, assentando que “a restrição do permissivo constitucional da al. r do inc. I do art. 102 da Constituição da República às ações de natureza mandamental resultaria em conferir à Justiça federal de primeira instância, na espécie vertente, a possibilidade de definir os poderes atribuídos ao Conselho Nacional de Justiça no cumprimento de sua missão, subvertendo, assim, a relação hierárquica constitucionalmente estabelecida” (Pet 4.656 AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe de 4/12/2017). 8. A competência do STF prescrita no artigo 102, I, “r”, da Constituição espelha um mecanismo assecuratório das funções do CNJ e da imperatividade de suas decisões, concebido no afã de que provimentos jurisdicionais dispersos não paralisem a eficácia dos atos do Conselho. Por essa razão, a competência originária desta Suprema Corte prevista no artigo 102, I, “r” da Constituição não deve ser interpretada com foco apenas na natureza processual da demanda, mas, antes, no objeto do ato do CNJ impugnado. Precedentes: Pet 4.656 AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe de 4/12/2017; Rcl 16.575 AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, Segunda Turma, DJe de 21/8/2015; Rcl 24.563 AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, Segunda Turma, DJe de 21/2/2017; Rcl 14.733, decisão monocrática, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 6/4/2015 e Rcl 15.551, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe de 14/2/2014. 9. A dispersão das ações ordinárias contra atos do CNJ nos juízos federais de primeira instância tem o condão de subverter a posição que foi constitucionalmente outorgada ao Conselho, fragilizando sua autoridade institucional e a própria efetividade de sua missão. Decerto, a submissão de atos e deliberações do CNJ à jurisdição de membros e órgãos subordinados a sua atividade fiscalizatória espelha um indesejável conflito no sistema e uma dilapidação de seu status hierárquico no sistema constitucional. 10. O design institucional do CNJ concebido pela Emenda Constitucional 45/2004 desautoriza que qualquer definição de âmbito nacional seja cassada por juiz de primeiro grau ou que políticas públicas nacionais moldadas pelo órgão sejam desconstituídas mediante a pulverização de ações nos juízos federais. 11. A Constituição Federal, quando pretendeu restringir a competência originária do STF a ações de natureza constitucional, o fez taxativa e especificamente nas alíneas “d”, “i” e “q” do inciso I do artigo 102, sendo certo que em outros dispositivos do artigo 102, I, v.g. nas alíneas “n” e “r”, a Carta Maior não impôs expressa restrição quanto ao instrumento processual a ser utilizado. 12. A exegese do artigo 102, I, “r”, da Constituição Federal, reclama a valoração (i) do caráter genérico da expressão “ações” acolhida no dispositivo; (ii) das competências e da posição institucional do CNJ no sistema constitucional pátrio; (iii) da natureza das atribuições constitucionais do STF e (iv) da hierarquia ínsita à estrutura do Poder Judiciário. 13. A hermenêutica sistemático-teleológica do artigo 102, I, “r”, da Constituição conduz a que somente sejam submetidas a processo e julgamento no STF as ações ordinárias que impugnam atos do CNJ de cunho finalístico, concernentes aos objetivos precípuos de sua criação, a fim de que a posição e proteção institucionais conferidas ao Conselho não sejam indevidamente desfiguradas. 14. As ações ordinárias contra atos do CNJ devem ser, em regra, processadas e julgadas na Justiça Federal e, somente excepcionalmente, para preservar a posição hierárquica e atuação finalística do Conselho, é que deve ser inaugurada a competência do STF. 15. Deveras, revela-se fundamental resguardar a capacidade decisória do STF, evitando a banalização da jurisdição extraordinária e preservando a própria funcionalidade da Corte. 16. A competência primária desta Corte alcança as ações ordinárias que impugnam atos do Conselho Nacional de Justiça (i) de caráter normativo ou regulamentar que traçam modelos de políticas nacionais no âmbito do Judiciário, (ii) que desconstituam ato normativo de tribunal local, (iii) que envolvam interesse direto e exclusivo de todos os membros do Poder Judiciário, consubstanciado em seus direitos, garantias e deveres, e (iv) que versam sobre serventias judiciais e extrajudiciais. 17. In casu, a ação originária questiona a Resolução 151, de 5/7/2012, do Conselho Nacional de Justiça e foi ajuizada com o objetivo de impedir a divulgação dos nomes e das remunerações individualizadas de servidores da Justiça Federal do Paraná e do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná. 18. À luz do ato do CNJ impugnado, verifica-se que a pretensão deduzida pela demanda consubstancia resolução de alcance nacional, fundamentada na Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/11), impondo reconhecer a competência desta Suprema Corte para processar e julgar a ação originária. 19. Ex positis, voto pelo PROVIMENTO do agravo regimental, para julgar procedente a reclamação e assentar a competência do Supremo Tribunal Federal para processar e julgar o feito, determinando-se a remessa dos autos.
(Rcl 15564 AgR, Relator(a): ROSA WEBER, Relator(a) p/ Acórdão: LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 10/09/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-242 DIVULG 05-11-2019 PUBLIC 06-11-2019)

108
Q

A inexigência de capacidade postulatória no HC se estende ao recurso ordinário?

A

A excepcional característica popular do remédio constitucional habilita o impetrante leigo a particar, ainda, todos os atos processuais no curso do HC, incluindo a possibilidade de arguir suspeição do julgador (STF, AgRg na AS 10\RN, Pleno), bem como a interposição de recursos ordinários (Precedente do STF: HC 73.455\DF, 2 Turma. No mesmo sentido, v AgRg no HC 102.836, 1 Turma; e RHC 108.822\GO, 2 Turma).

Em sentido contrário: 2 Turma do STF, RHC 121.722\MG, no qual se entendeu que “o recorrente deve possuir capacidade postulatória para interpor recurso ordinário em habeas corpus, ainda que tenha sido o impetrante originário, por trata-se de ato privativo de advogado.” Precedente que fez indevida remissão ao RHC 104.270 (também da 2 Turma), cujo julgamento versara não sobre a necessidade de capacidade postulatória para recurso em HC, mas sobre recurso subscrito por advogado com inscrição suspensa na OAB.

109
Q

O STF admite HC Coletivo? Se sim, diga se há alguma restrição ao remédio.

A

O STF também sempre rechaçara a tese do cabimento do HC Coletivo. Segundo exposto em decisão monocrática do Min. Celso de Mello, a impetração de HC em favor de um “coletividade anônima” não satisfaz as exigências do CPP (art. 654, § 1o , “a”). (§ 1o A petição de habeas corpus conterá: a) o nome da pessoa que sofre ou está ameaçada de sofrer violência ou coação e o de quem exercer a violência, coação ou ameaça;)

Todavia, em 20-2-2018, no HC 143.541\SP, por unanimidade (incluindo o min. CELSO DE MELLO), a 2 Turma do STF admitiu o processamento de HC coletivo em favor de “todas as mulheres submetidas à prisão cautelar no sistema penitenciário nacional, que ostentem a condição de gestantes, de puérpera ou de mães com crianças com até 12 anos de idade sob sua responsabilidade, e das próprias crianças”. Entretanto, a legitimidade ativa do HC coletivo foi “reservada aos atores listados no art. 12 da Lei 13.300\2016, por analogia ao que dispõe a legislação referente ao mandado de injução coletivo.”

Art. 12. O mandado de injunção coletivo pode ser promovido:

I - pelo Ministério Público, quando a tutela requerida for especialmente relevante para a defesa da ordem jurídica, do regime democrático ou dos interesses sociais ou individuais indisponíveis;

II - por partido político com representação no Congresso Nacional, para assegurar o exercício de direitos, liberdades e prerrogativas de seus integrantes ou relacionados com a finalidade partidária;

III - por organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos 1 (um) ano, para assegurar o exercício de direitos, liberdades e prerrogativas em favor da totalidade ou de parte de seus membros ou associados, na forma de seus estatutos e desde que pertinentes a suas finalidades, dispensada, para tanto, autorização especial;

IV - pela Defensoria Pública, quando a tutela requerida for especialmente relevante para a promoção dos direitos humanos e a defesa dos direitos individuais e coletivos dos necessitados, na forma do inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal .

Parágrafo único. Os direitos, as liberdades e as prerrogativas protegidos por mandado de injunção coletivo são os pertencentes, indistintamente, a uma coletividade indeterminada de pessoas ou determinada por grupo, classe ou categoria.

110
Q

Se o paciente se manifesta contrariamente à impetração do HC, o remédio deve ainda assim ser apreciado?

A

A princípio, não há necessidade de procuração ou autorização do paciente para impetrar HC, nem para recorrer da decisão que o indefere (v. HC 73.455\DF, 2 Turma do STF). Contudo, se houver manifestação em contrário do paciente, o pedido não deverá ter segmento (v. AgRg no HC 88.640\DF, Plenário do STF). Nesse sentido, o art. 470, pár. 1, do CPPM, bem como o pár. 3 do art. 192 do RISTF.

111
Q

A intimação para prestação de depoimento em CPI autoriza a impetração de HC?

A

[…] para fins de impetração do HC, a liberdade de locomoção é entendida de forma ampla, de modo a alcançar até aquelas situações em que o direito de ir e vir possa estar apenas ameaçado. Essa a razão por que se admite habeas corpus contra ilegalidade ou abuso de poder cometido: (a) na instauração de investigações criminais, incluindo atos de indiciamento policial; (b) no simples recebimento de denúncia para abertura de ação penal; (c) na mera notificação para colheita de provas, incluindo coleta de sangue para pesquisa de DNA (STF, HC 71.373\RS, Pleno); e (d) em intimação para prestar depoimento, ainda que perante CPIs (HC 80.240\RR e HC 80.539\PA, Pleno do STF).

112
Q

Cabe HC no caso de disputa por direito de visita de menor?

A

Não. AgRg no HC 99.369\DF, 2 Turma.

113
Q

Em que situações é possível a impetração de HC contra punições disciplinares militares?

A

[…] diz o § 2o do art. 142 da Constituição, não caberá “habeas corpus em relação a punições disciplinares militares.” Contudo, com base em doutrinadores como PONTES DE MIRANDA, a jurisprudência do STF tem interpretado essa disposição restritivamente. Para a Corte, mencionado § 2o só impede a análise do mérito da punição disciplinar (conveniência e oportunidade), e não o exame dos respectivos pressupostos formais, tais como (a) a hierarquia do órgão punitivo; (b) o poder disciplinar da autoridade coatora; (c) a relação de causalidade entre o fato imputado ao paciente e a função militar; e (d) a pena abstratamente aplicável à infração disciplinar (v. HC 70.648\RJ, reiterado no RE 338.840\RS).

114
Q

Qual é a regra geral para determinar a competência para o HC?

A

A competência para julgamento do HC é determinada, normalmente, pelos critérios utilizados para identificar o órgão judicante a quem compete julgar o crime imputado ao paciente.

Entretanto, como o julgamento do HC poderá surtir efeitos quanto à responsabilidade penal do impetrado, a competência para processar a ação é definida, ainda, de acordo com a eventual prerrogativa de foto especial reconhecida à autoridade impetrada. Nessas hipóteses, sobretudo a partir do RE 141.209\SP, o STF firmou jurisprudência seungo a qual, “em regra, a competência para o julgamento de habeas corpus contra ato de autoridade é do Tribunal a que couber a apreciação da ação penal contra essa mesma autoridade” (RE 418.852\DF, 1 Turma).

Assim, um HC a questionar inquérito policial instaurado por Delegado de Polícia para apurar crime de reclusão, por exemplo, será apreciado por um dos juízes com competência para julgar a infração supostamente cometida pela autoridade policial. Porém, o HC contra investigação penal conduzida por Promotor de Justiça será apreciado pelo tribunal competente para julgá-lo criminalmente (i.e., um dos TJS ou, se o Promotor for membro do MPDFT, o TRF1), mesmo que as infrações investigadas pela autoridade impetrada sejam da competência de juízes de 1 grau.

115
Q

O STF tem admitido, atualmente, a utilização do HC substitutivo?

A

[…] a jurisprudência sempre admitira o chamado habeas corpus substitutivo do recurso, expediente pelo qual o impetrante simplesmente impetra, perante autoridade judiciária superior, pedido de HC idêntico ou similar ao que fora recusado por autoridade inferior, a despeito de o mérito da primeira ação não ter sido ainda julgado. Ou seja, não era preciso seguir as etapas recursais previstas no sistema jurídica, pois a parte prejudicada pela negativa de um HC (mesmo que provisória), poderia livremente optar por impetrar um no habeas corpus à instância judicial superior.

Porém, a partir do voto vencedor do Min. MARCO AURÉLIO no HC 109.956\PR, a 1 Turma da Corte passou a entender pela inadequação de novo habeas corpus como instrumento substitutivo do recurso oridnário cabível contra o indeferimento de HC anteiror. Para a Turma, “a impetração de novo habeas corpus em caráter substitutivo escamoteia o instituto recursal próprio, em manifesta burla ao preceito constitucional” (AgRg no HC 148.218\AM, j. em 24-11-2017). De forma semelhante, a 2 Turma do STF já entendeu que o “habeas corpus não é substitutivo recursal” (HC 108.901\SP).

[…]

Nada obstante, a mesma 1 Turma, em acórdãos também relatados pelo Min. MARCO AURÉLIO, tem flexibilizado esse entendimento, para entender pela admissibilidade do habeas corpus substitutivo, “quando em jogo a liberdade de ir e vir do cidadão, já alcançada ou a ponto de o ser ante a existência de mandado de prisão” (HC 127.465\RS, j. 19-9-2017), especialmente nos casos em que o paciente foi preso (HC 137.693\PE, j. em 21-11-2017).

116
Q

Em que consiste o HC per saltum?

A

[…] para evitar a supressão de instância, o STF tampouco tem admitido o HC per saltum, ou seja, aquele impetrado antes do exame do mérito da mesma causa por órgão judicial inferior. Daí também a Súmula 691, segundo a qual não “compete ao STF conhecer HC impetrado contra decisão do relator que, em HC requerido a tribunal superior, indefere a liminar”.

[…]

Contudo, em casos considerados “teratológicos” ou de “flagrante ilegalidade”, a Corte tem igualmente atenuado essa restrição por meio da seguinte fórmula: embora o HC per saltum não seja conhecido, dada a tentativa de supressão de instância, a ordem poderá ser concedida de ofício, se houver fundamento. (referências à p. 343)

117
Q

O que são direitos políticos positivos e negativos?

A

Para JOSÉ AFONSO DA SILVA, direitos políticos positivos consistem no “conjunto de normas que asseguram o direito subjetivo de participação no processo político e nos órgão governamentais “ (1998a, p. 349). Já os direitos negativos são os que decorrem das normas que privam o cidadão, definitiva ou temporariamente, dos direitos políticos positivos, especialmente o direito de votar e de ser votado.

118
Q

Diferencie sufrágio, voto e escrutínio.

A

Segundo JOSÉ AFONSO DA SILVA, sufrágio é o direito. voto é o meio pelo qual se exerce tal direito; e escrutínio é o modo como que é exercido o direito de sufrágio.

119
Q

O voto obrigatório é cláusula pétrea?

A

Conforme art. 60, § 4o, II, da Constituição, não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir o voto direto, secreto, universal e periódico. Não é cláusula pétrea, portanto, o voto obrigatório.

120
Q

Explique e enumere as condições de elegibilidade absoluta e relativa.

A

a) absolutas: são as condições taxativamente expressa em normas constitucionais cujo descumprimento inviabiliza a capacidade eleitoral passiva em relação a todo cargo eletivo, o que impede a pessoa de disputar qualquer eleição, sem que haja prefixação de prazo quanto à cessações do impedimento. Nesse sentido, são absolutamente inelegíveis (art. 14, § 4o) as pessoas que: (a) não podem alistar-se; e (b) não são alfabetizadas.

Pode-se ainda sustentar que o inciso VI do § 3o do art. 14 da Constituição, ao fixar idades mínimas para elegibilidade dos cargos eletivos do Executivo e do Legislativo, acabou por estender a inelegibilidade absoluta aos maiores de 16 e menores de 18 anos, mesmo que alistáveis e alfabetizados. Afinal, a mais baixa idade exigidade no dispositivo constitucional é de 18 anos, referente ao cargo de Vereador.

b) relativas: as que só obstam a capacidade eleitoral passiva em face de alguns cargos eletivos, o que não impede o candidato de concorrer a outros cargos eletivos na mesma eleição. Vêm expressas em normas constitucionais específicas (v.g., art. 14, § 3o, VI, §§ 5o e 7o, com redação da EC 16\97), mas o legislador complementar poderá ampliá-las, desde que atendida a finalidade de “proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício da função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta” (§ 9o do art. 14, com redação da ECR 4\94).

§ 3º São condições de elegibilidade, na forma da lei:

a) trinta e cinco anos para Presidente e Vice-Presidente da República e Senador;
b) trinta anos para Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal;
c) vinte e um anos para Deputado Federal, Deputado Estadual ou Distrital, Prefeito, Vice-Prefeito e juiz de paz;
d) dezoito anos para Vereador.

§ 5º O Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido, ou substituído no curso dos mandatos poderão ser reeleitos para um único período subseqüente.

§ 6º Para concorrerem a outros cargos, o Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal e os Prefeitos devem renunciar aos respectivos mandatos até seis meses antes do pleito.

§ 7º São inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consangüíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição.

121
Q

Assertiva: “As condições de elegibilidade podem ser estabelecidas por simples lei ordinária federal, diferentemente das hipóteses de inelegibilidade, que são reservadas a lei complementar”. Certa ou errada.

A

Certa!

122
Q

A condenação por contravenção penal implica suspensão dos direitos políticos? O sursis afasta a suspensão dos direitos políticos?

A

Enquanto durarem os efeitos da condenação penal com trânsito em julgado, o sentenciado tem seus direitos políticos suspensos. Para o STF, a hipótese de suspensão abrange também as condenações pela prática de crimes culposos e contravenções penais. Ainda para o STF (Pleno, RE 179.502\SP), não afastam a suspensão dos direitos políticos os benefício que só impliquem suspender o cumprimento da pena (tais como o livramento condicional e o sursis). Ademais, uma vez extinta a pena, a suspensão dos direitos políticos deixa de vigorar, independentemente de reabilitação ou prova da reparação dos eventuais danos causados (Súmula 9 do TSE).

123
Q

Qual a via para que a pessoa nascida em território estrangeiro opte pela nacionalidade brasileira? São retroativos os efeitos da opção?

A

A obtenção do registro definitivo da nacionalidade brasileira pressupõe a formalização da opção de nacionalidade por meio de ação judicial (de jurisdição voluntária) a ser proposta na Justiça Federal. No entanto, como se trata de direito personalíssimo, a ação só pode ser ajuizada pelo próprio interessado, e somente após a maioridade, o que inviabiliza a representação judicial do menor por parte de seus genitores (RE 418.096\RS, 2 Turma do STF).

Deferido o pedido judicial, o registro definitivo da nacionalidade será então feito no cartório de pessoas naturais do 1 ofício do domicílio do optante (§ 4o do art. 32 da Lei 6.015\73). Assim formalizada a opção, a nacionalidade é adquirida com efeitos ex tunc (Pleno do STF, QO na AC 70;RS), a contar do nascimento do interessado (art. 215, § 2o, do Decreto 9.199\2017).

124
Q

Em relação a brasileiros natos que tenham perdido a nacionalidade pátria, o deferimento do pedido de reaquisição importará no restabelecimento da nacionalidade originária brasileira?

A

Sim. Ver art. 254, § 7o, do Decreto 9.199\2017.