Tema III: Desenvolvimento cognitivo em domínios específicos Flashcards
O que propõe a teoria do Core Knowledge, de Spelke?
Spelke (2000) defendeu que o ser humano possui estruturas específicas, nucleares e inatas, algumas partilhadas com outras espécies animais e outras exclusivas à nossa espécie, que funcionam de forma relativamente independente entre si e que nos permitem representar a realidade cognitivamente. Os sistemas nucleares correspondem a: objetos físicos, agentes e ações, numerosidades, geometria do espaço, categorização social, orientação espacial e numeracia.
Como se define o sistema de objetos físicos?
Os seres humanos desde pequenos compreendem a noção dos limites dos objetos e a permanência da sua forma, independentemente de ser parcial ou completamente visto. Contudo, esta capacidade ainda é limitada, como é ilustrado pelo facto de não compreenderem totalmente a sua constituição e só conseguirem pensar em pequenas partes do objecto de cada vez.
Como se define o sistema de agentes e ações?
As ações baseiam-se na noção das outras pessoas enquanto os agentes se baseiam no princípio da reciprocidade. Estes são identificados através da existência de movimento. As crianças conseguem compreender a distinção entre as ações realizadas por seres vivos e objetos inanimados, que por sua vez não buscam atingir nenhuma meta.
Como se define o sistema das numerosidades?
Este sistema possui limites únicos As representações numéricas são imprecisas (imprecisão que aumenta congruentemente com o número cardinal), são abstratas e aplicáveis a diversas coisas e podem ser comparadas e combinadas por operações como a soma e a subtração.
Como se define o sistema da geometria do espaço?
Este sistema está associado à nossa configuração de um contexto, ou seja, à nossa capacidade de representar distâncias, ângulos e relações espaciais entre superfícies.
Como se define o sistema nuclear de categorização social?
Permite-nos realizar uma distinção entre o in-group e o out-group.
Qual o efeito da interação dos sistemas nucleares com a linguagem?
A combinação destes sistemas e a sua interação com a linguagem permite flexibilidade e complexidade de aprendizagem e raciocínio, identificável na orientação espacial (Hermer & Spelke, 1994) e na numeracia (Spelke, 2000).
Na interação entre sistemas nucleares e a linguagem, o que nos apresentam os estudos de Hermer e Spelke (1994) e Shusterman e Spelke (2005)?
Num estudo de Hermer e Spelke (1994), utilizou-se um paradigma de desorientação com crianças de 2 anos com o objetivo de perceber se, numa situação em que estas perdem noção do seu posicionamento e direcção, estas são capazes de coordenar informações do sistema para pistas geométricas (geometria de espaço) e o sistema para pontos de referência (objetos) para eficazmente o recuperar e encontrar um objecto alvo. Neste paradigma, as crianças eram colocadas inicialmente numa sala retangular totalmente branca onde observavam um experimentador a esconder um objecto num dos seus cantos. Depois, estas eram desorientadas e era registado para que canto estas se dirigiam primeiro para procurar o objecto.
Neste cenário, verificou-se, à semelhança do que atesta quando se realiza esta experiência com adultos, que elas procuram no canto correto e no contrário aproximadamente com a mesma frequência – 40%. Contudo, contrariamente ao que se verifica com os adultos que ao terem uma linguagem mais sofisticada conseguem usar informação de mais sistemas, quando se colocaram as crianças exatamente na mesma situação experimental havendo uma alteração significativa – a existência duma parede vermelha na sala - as crianças foram incapazes de usar essa informação não geométrica a seu favor para se orientarem melhor, apresentando a mesma percentagem de acerto e erro.
Um estudo de Shusterman e Spelke (2005) permitiu corroborar esta explicação para os diferentes desempenhos entre adultos e crianças porque, ao ensinarem com sucessos conceitos de esquerda e direita a crianças de 4 anos, aumentaram a sua capacidade de interligar pontos de referência a informações geométricas espaciais e fizeram com que nesta subamostra 75% escolhessem o canto correto.
O que defende Spelke (2000) na interação do sistema da numeracia com a linguagem?
Spelke (2000) defendeu que as crianças se regem segundo um sistema para pequenas quantidades (objetos) e um sistema para grandes quantidades (numerosidades; conjuntos). Evidência desta afirmação prende-se em estudos como o de Xu e Spelke (2000), onde se ilustrou que as crianças pré-escolares são capazes de discriminar entre grandes quantidades de objetos se possuírem um rácio considerável, e como o de Feigenson, Carey e Hauser (2002), onde se provou que as crianças conseguem representar e comparar mentalmente objetos que tenham até 3 bolachas. Finalmente, é sabido que é a interligação entre estes dois sistemas, possibilitada pela linguagem, que permite o desenvolvimento de um pensamento matemático.
O que são teorias leigas?
Teorias leigas são conhecimentos intuitivos, baseados na experiência do dia-a-dia, acerca de fenómenos naturais que frequentemente divergem das explicações científicas universalmente aceites e que tendem a ser resistentes à mudança. Através da sua análise, é possível perceber como os seres humanos adquirem conhecimento lógico e racional em determinadas áreas.
Em que consiste o estudo realizado por Vosniadou e Brewer (1992) sobre teorias leigas na astronomia?
Vosniadou e Brewer (1992) realizaram um estudo cujo objetivo foi investigar a natureza dos conhecimentos intuitivos das crianças acerca do formato da Terra e compreender como estes mudam à medida que a criança é exposta à informação culturalmente aceite sobre a Terra ser esférica. Para tal, estes realizaram uma entrevista direta a crianças de aprox. 6 anos, 9 anos e 11 anos onde lhes fizeram perguntas diretas (e.g., “Qual é a forma da Terra?”) ou generativas (“Se andasses durante muitos dias numa linha reta, onde acabarias por ficar”? “Alguma vez serias capaz de chegar ao fim ou ao outro lado da Terra?”) sobre o assunto. Os resultados indicaram que das 60 crianças na amostra, apenas 23 tinham um modelo mental da Terra esférica, sendo que as restantes se encaixaram coerentemente em 5 modelos alternativos da Terra: 1) o modelo retangular, em que as crianças acreditavam que a Terra era plana e tinha a forma de retângulo; 2) o modelo tipo disco, em que as crianças conceptualizam a Terra como plana e redonda; 3) o modelo dual, em que as crianças acreditavam que há uma terra redonda que está lá em cima no céu e uma terra plana onde as pessoas vivem; 4) o modelo oco, em que as crianças acreditam que a Terra é esférica mas as pessoas vivem dentro duma esfera oca; 5) o modelo plano, em que as crianças acreditam que a Terra tem a forma de uma panqueca grossa, redonda dos lados mas plana no topo e em baixo. Estes modelos alternativos da Terra encontram-se constrangidos por pressupostos como 1) o solo é plano e 2) coisas não suportadas caiem, logo só quando a criança é capaz de reinterpretar estes pressupostos é que esta adquire o modelo esférico da Terra.
Nota: Muitas vezes ainda encontramos vestígios destas teorias leigas nos adultos. O que é que causa as estações do ano? Muitos julgam erradamente que é a diferente proximidade da Terra ao Sol, no entanto este fenómeno deve-se a mudança no grau de incidência dos raios solares na superfície terrestre.
Segundo as teorias leigas da biologia, de onde vêm os bebés?
Muitas crianças acreditam que os bebés vão parar à porta dos pais porque são trazidos por uma cegonha-
O que descobriu Hood (1995) ao aplicar a “tarefa dos tubos”?
Hood (1995), através da aplicação da “tarefa dos tubos” a diferentes faixas etárias, descobriu que as crianças mais novas apresentam, nos níveis mais difíceis, o “erro da gravidade”, ou seja, a tendência intuitiva para achar que uma bola que é largada em 1 de 3 tubos opacos, que tendem a estar interligados para formar um labirinto visuoespacial, irá “cair diretamente para baixo” e, portanto, procuram erradamente no buraco em baixo do sítio onde a bola foi largada.
Resumidamente, o que é a Teoria da Mente e que competências traz à criança escolar?
As crianças na idade escolar desenvolvem as teorias da mente pré-existentes, que lhes permitem ter consciência de que os seus pensamentos, sentimentos e valores são distintos daqueles que o rodeiam. Neste sentido, elas solidificam competências como:
a) participar em momentos de atenção conjunta, ou seja, é capaz de direcionar o seu foco atencional para o objecto alvo dos seus pais ou amigos;
b) inferir objectivos nas acções de outros;
c) inferir estados emocionais nas pessoas que o rodeiam;
d) distinguir entre o que é aparência e o que é realidade.
Além disto, as crianças na idade escolar tornam-se capazes de ter e compreender crenças de segunda ordem como “O João pensa que a Maria pensa que…” e, segundo um estudo de Talwar, Gordon e Lee (2007), de mentir para ocultar uma transgressão, havendo um aumento da capacidade de manter essa mentira à medida que estas envelhecem.
