Responsabilidade Civil Flashcards
A responsabilidade civil do Estado por atos de notários e oficiais de registro que, nessa qualidade, causarem danos a terceiros é primária, solidária ou subsidiária?
No RE 842846 o STF, por maioria, fixou a seguinte tese: “O estado responde objetivamente pelos atos dos tabeliães registradores oficiais, que no exercício de suas funções causem dano a terceiro, assentado o dever de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa, sob pena de improbidade administrativa”
Um município poderá ser condenado ao pagamento de indenização por danos causados por conduta de agentes de sua guarda municipal, ainda que tais danos tenham decorrido de conduta amparada por causa excludente de ilicitude penal expressamente reconhecida em sentença transitada em julgado?
“1. Segundo a orientação jurisprudencial do STJ, a Administração Pública pode ser condenada ao pagamento de indenização pelos danos cíveis causados por uma ação de seus agentes, mesmo que consequentes de causa excludente de ilicitude penal: REsp 884.198/RO, 2ª Turma, Rel. Min. Humberto Martins, DJ 23.4.2007; REsp 111.843/PR, 1ª Turma, Rel. Min. José Delgado, DJ 9.6.1997.
2. Logo, apesar da não responsabilização penal dos agentes públicos envolvidos no evento danoso, deve-se concluir pela manutenção do acórdão origem, já que eventual causa de justificação (legítima defesa) reconhecida em âmbito penal não é capaz de excluir responsabilidade civil do Estado pelos danos provocados indevidamente a ora recorrida.”
(REsp 1266517/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/12/2012, DJe 10/12/2012)
Com relação ao nexo causal, qual a teoria adotada pelo direito brasileiro?
No direito brasileiro, a responsabilidade civil, como regra geral, é orientada pela assim chamada teoria da causalidade direta e imediata, segundo a qual ninguém pode ser responsabilizado por algo a que não tenha dado causa e somente se considera causa o evento que produziu direta e concretamente o resultado danoso. Portanto, só origina responsabilidade civil, em princípio, o nexo causal direto e imediato, isto é, deve haver ligação lógica direta entre a conduta (comissiva ou omissiva) e o dano efetivo. (p. 913)
Explique brevemente em que consiste a teoria da culpa administrativa.
A teoria da culpa administrativa representou o primeiro estágio da transição entre a doutrina subjetiva da culpa civil e a responsabilidade objetiva atualmente adotada pela maioria dos países ocidentais.
Segundo a teoria da culpa administrativa, o dever do Estado de indenizar o dano sofrido pelo particular somente existe caso seja comprovada a ocorrência de uma falha na prestação de um serviço público - uma “faute de service”, consoante a expressão consagrada pelo direito administrativo francês.
Não se trata de investigar se houve culpa subjetiva de um determinado agente público na causação de um dano a um particular, mas de perquirir, objetivamente, se a prestação defeituosa de um serviço público, ou a falta dele, quando obrigatório, acarretou prejuízo a terceiros.
[…]
A culpa administrativa pode decorrer de uma das três formas possíveis de falta do serviço: inexistência do serviço, mau funcionamento do serviço ou retardamento do serviço. […] (p. 915)
No caso da teoria do risco administrativo, a ocorrência de culpa recíproca é capaz de atenuar a indenização devida pelo Estado?
Sim. A explicação para essa atenuação, segundo Celso de Mello, está no nexo causal.
Qual é o fundamento da teoria do risco administrativo?
A ideia subjacente à teoria do risco administrativo, que atribui ao Estado (e às pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos) responsabilidade extracontratual independentemente de perquirição a respeito de culpa na sua atuação - responsabilidade civil objetiva -, é a de que as atividades administrativas são desempenhadas no interesse de toda a sociedade e, portanto, é justo que um indivíduo (ou um grupo determinado de indivíduos) que tenha sofrido danos por elas causados, não infligidos aos demais membros da coletividade, seja por esta indenizado.
[…]
Por exemplo, se a administração pública necessita interditar o tráfego de pessoas e veículos em uma via pública para executar obras de ampliação das galerias pluviais e essa medida causa prejuízos a um estabelecimento comercial situado naquele local, o seu proprietário fará jus a uma indenização destinada a compensar o dano específico que ele sofreu, ainda que absolutamente nenhuma irregularidade seja imputada ao poder público. É claro que, se ocorrerem ilicitudes na atuação administrativa, os danos decorrentes
deverão ser igualmente indenizados, mas o que nos interessa ilustrar nesse exemplo, é a desnecessidade de que se verifiquem desvios, abusos ou vícios na atuação estatal para que a indenização seja devida.
O Estado responde pelo dano causado pela delegatária de serviço público?
[…] Aliás, como decorrência do fundamento da responsabilidade objetiva ora em apreço (teoria do risco administrativo), a doutrina administrativista defende que, no caso de pessoa privada que preste serviço público por delegação do poder público, sendo impossível ao terceiro prejudicado obter dela a reparação (por exemplo, se o patrimônio respectivo for insuficiente para suportar a indenização devida), deverá o Estado responder subsidiariamente.
INTERNET:
Segundo doutrina majoritária, não há que se falar, na hipótese, em responsabilidade solidária, uma vez que a solidariedade só pode advir da lei ou do contrato[33], inexistindo norma legal atribuindo solidariedade ao Estado em relação à pessoa jurídica com a qual celebra contrato administrativo. Logo, o Estado responde apenas subsidiariamente, uma vez exauridos os recursos da (insolvente) responsável primária.
Não há que se abonar, pois, o pensamento minoritário de que o Poder Público tem responsabilidade solidária pelos danos causados por pessoa privada à qual compete prestar determinado serviço público, só pelo fato de ter havido delegação do serviço. Tal radical conclusão, em que pese o relevo das vozes dissonantes, não encontra guarida nos cânones jurídicos que regem a matéria. Nesse sentido, é o lúcido magistério de José dos Santos Carvalho Filho:
O Poder Público não é, repita-se, o segurador universal de todos os danos causados aos administrados. O que é importante é verificar a conduta administrativa. Se a Administração concorreu com a pessoa responsável para o resultado danoso (o que ocorre algumas vezes por negligência e omissão administrativa), haverá realmente solidariedade; a Administração terá agido com culpa in ommittendo ou in vigilando, podendo ser demandada juntamente com o autor do dano. Contudo, se a culpa é exclusiva da pessoa prestadora de serviço público, a ela deve ser imputada a responsabilidade primária e ao Poder Público a responsabilidade subsidiária. Resulta, pois, nessa hipótese que eventual demanda indenizatória deve ser dirigida em face exclusivamente do causador do dano, sendo a Administração parte ilegítima ad causam na referida ação.
Não é outro o entendimento sedimentado nos tribunais superiores, que asseveram, inclusive, em apreço ao princípio da actio nata, que a pretensão de responsabilização subsidiária do Estado somente surgiria no momento em que a empresa concessionária de serviços públicos torna-se insolvente para a recomposição do dano, sendo este o termo a quo para a contagem do lapso prescricional. É o que se observa do julgado adiante transcrito, com destaques não constantes do original:
RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. PODER CONCEDENTE. CABIMENTO. PRESCRIÇAO. NAO OCORRÊNCIA. 1. Há responsabilidade subsidiária do Poder Concedente, em situações em que o concessionário não possuir meios de arcar com a indenização pelos prejuízos a que deu causa. Precedentes. 2. No que tange à alegada ofensa ao art. 1º, do Decreto 20.910/32, mostra-se improcedente a tese de contagem da prescrição desde o evento danoso, vez que os autos revelam que a demanda foi originalmente intentada em face da empresa concessionária do serviço público, no tempo e no modo devidos, sendo que a pretensão de responsabilidade subsidiária do Estado somente surgira no momento em que a referida empresa tornou-se insolvente para a recomposição do dano. 3. Em apreço ao princípio da actio nata que informa o regime jurídico da prescrição (art. 189, do CC), há de se reconhecer que o termo a quo do lapso prescricional somente teve início no momento em que se configurou o fato gerador da responsabilidade subsidiária do Poder Concedente, in casu , a falência da empresa concessionária, sob pena de esvaziamento da garantia de responsabilidade civil do Estado nos casos de incapacidade econômica das empresas delegatárias de serviço público. 4. Recurso especial não provido.
(REsp 1.135.927/MG, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 10.08.2010, DJ 19.08.2010)
Exceções à regra da responsabilidade subsidiária do Estado.
Como se vem afirmando, o poder concedente responderá subsidiariamente quando os bens do concessionário não forem suficientes para arcar com os ônus decorrentes dos danos causados a terceiros. Cabe, entretanto, alertar para a correta ressalva feita por Celso Antônio Bandeira de Mello no sentido de que a responsabilidade subsidiária do poder concedente somente se justifica quando o dano for decorrente de atividade diretamente constitutiva do desempenho do serviço.
Assevera o ilustre autor que os prejuízos de terceiros oriundos de comportamento do concessionário alheios à própria prestação do serviço, ainda que assumidos a fim de se instrumentar para a prestação dele, não são suportáveis pelo concedente, no caso de insolvência do concessionário. Quem contrata ou se relaciona com este, tanto como em sua relação com qualquer pessoa, deve acautelar-se com respeito às condições de solvência da outra parte. Não pode, em suma, contar antecipadamente com que o Estado respalde economicamente o concessionário, o que não se coadunaria com o ordenamento vigente. O concessionário, pessoa de direito privado, de objetivos econômicos, está, ao agir nessa qualidade, sujeito, como qualquer empresa, aos percalços naturais da atividade empresarial, fato que não pode ser ignorado pelos usuários.
Yussef Said Cahali acentua, ainda, com irreparável acerto, que a responsabilidade do Estado por ato do concessionário pode ser solidária, e não meramente subsidiária, em determinadas circunstâncias nas quais se verifique a omissão do poder concedente no controle da prestação do serviço concedido ou falha na seleção do concessionário. Nesse sentido, afirma o renomado publicista:
A exclusão da responsabilidade objetiva e direta do Estado (da regra constitucional) em reparar os danos causados a terceiros pelo concessionário (como também o permissionário ou autorizatário), assim admitida em princípio, não afasta a possibilidade do reconhecimento de sua responsabilidade indireta (por fato de outrem) e solidária, se, em razão da má escolha do concessionário a quem a atividade diretamente constitutiva do desempenho do serviço foi concedida, ou de desídia na fiscalização da maneira como este estaria sendo prestado à coletividade, vem a concorrer por esse modo para a verificação do evento danoso.
Por derradeiro, importante mencionar antigo posicionamento do STJ segundo o qual o Poder Público, nas ações coletivas que discutam interesses metaindividuais, também responderia solidariamente com o concessionário, em razão de sua omissão no dever de fiscalizar, mormente quando estiverem em discussão interesses que tenham por escopo a proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, assegurado constitucionalmente. In verbis, com grifos acrescidos:
DIREITO ADMINISTRATIVO E AMBIENTAL. ARTIGOS 23, INCISO VI E 225, AMBOS DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CONCESSÃO DE SERVIÇO PÚBLICO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO MUNICÍPIO. SOLIDARIEDADE DO PODER CONCEDENTE. DANO DECORRENTE DA EXECUÇÃO DO OBJETO DO CONTRATO DE CONCESSÃO FIRMADO ENTRE A RECORRENTE E A COMPANHIA DE SANEAMENTO BÁSICO DO ESTADO DE SÃO PAULO - SABESP (DELEGATÁRIA DO SERVIÇO MUNICIPAL). AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. IMPOSSIBILIDADE DE EXCLUSÃO DE RESPONSABILIDADE DO MUNICÍPIO POR ATO DE CONCESSIONÁRIO DO QUAL É FIADOR DA REGULARIDADE DO SERVIÇO CONCEDIDO. OMISSÃO NO DEVER DE FISCALIZAÇÃO DA BOA EXECUÇÃO DO CONTRATO PERANTE O POVO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO PARA RECONHECER A LEGITIMIDADE PASSIVA DO MUNICÍPIO. I - O Município de Itapetininga é responsável, solidariamente, com o concessionário de serviço público municipal, com quem firmou “convênio” para realização do serviço de coleta de esgoto urbano, pela poluição causada no Ribeirão Carrito, ou Ribeirão Taboãozinho. II - Nas ações coletivas de proteção a direitos metaindividuais, como o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, a responsabilidade do poder concedente não é subsidiária, na forma da novel lei das concessões (Lei n.º 8.987 de 13.02.95), mas objetiva e, portanto, solidária com o concessionário de serviço público, contra quem possui direito de regresso, com espeque no art. 14, § 1° da Lei n.º 6.938/81. Não se discute, portanto, a liceidade das atividades exercidas pelo concessionário, ou a legalidade do contrato administrativo que concedeu a exploração de serviço público; o que importa é a potencialidade do dano ambiental e sua pronta reparação.
(REsp 28.222/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, Rel. p/ Acórdão Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA TURMA, julgado em 15.02.2000, DJ 15.10.2001)
Em tais casos, nos quais o dano foi provocado por uma conduta omissiva do poder concedente, restará caracterizada a responsabilidade subjetiva do Estado (exceto em matéria de dano ambiental, conforme julgado supra), com base na teoria da culpa administrativa – também denominada de culpa anônima ou falta do serviço. Saliente-se, todavia, que as específicas hipóteses aventadas, nas linhas propostas por este estudo, são excepcionais. A regra, como amplamente repisado, é a responsabilidade subsidiária do poder concedente.
A responsabilidade da administração por danos causados ao servidor público é objetiva também?
Nossa Corte Constitucional também teve oportunidade, por diversas vezes de explicitar que os “terceiros” a que se reporta o preceito constitucional ora em apreço podem ser, ou não, servidores públicos. Isto é, se determinada atuação estatal causar prejuízos a um agente público, seja ele integrante ou não dos quadros do órgão ou entidade que determinou aquela atuação terá esse agente que sofreu o dano direito à indenização nas mesmas bases a que faria jus um “terceiro” particular que não possuísse relação funcional alguma com o poder publico. (p. 921).
Quais são as condições para que um ato praticado por um agente público seja imputado à Administração? O fato de o policial estar fardado é suficiente para responsabilidade o Estado por sua conduta, ainda que pratica fora do expediente? A ação do policial que, de férias e sem farda, realiza disparos contra terceiro gera responsabilidade do Estado?
[…] Porém - e esse aspecto é de grande importância -, para restar configurada a responsabilidade civil objetiva da pessoa jurídica, é imprescindível que, ao praticar o ato lesivo, o seu agente estivesse atuando, corretamente ou não, na condição de agente público, no desempenho das atribuições própria de sua função pública, ou a pretexto de exercê-las. Nada importa perquirir se a atuação do agente foi lícia ou ilícita. O que interessa é exclusivamente a qualidade de agente público ostentada na sua atuação. É necessário, tão somente, verificar se a condição de agente foi determinante para a prática do ato. Enfim, basta que, ao pratica o ato, lícito ou ilícito, o agente esteja atuando “na qualidade do agente público” (incluídos nessa expressão os agentes das delegatárias de serviço público).
[…]
Dessa forma, se um policial fardado, agindo em nome do Estado - o que, no caso, presume-se pelo só fato de o agente estar fardado e integrar efetivamente os quadros da corporação policial -, ainda que fora de seu horário de expediente, causar dano ao particular, a obrigação de indenizar compete ao poder público, independentemente da existência de irregularidade na conduta do agente.
[…]
Não haverá, tampouco, responsabilidade da administração pública nos casos em que o agente causador do dano seja realmente um agente público, mas a atuação dele não esteja relacionada à sua condição de agente público. Como exemplo, mencionamos julgado em que o Supremo Tribunal Federal considerou não haver obrigação do Estado de indenizar vítima de disparo de arma de fogo utilizada por policial durante período de folga, embora a arma pertencesse a corporação. Considerou-se que, no caso, “o dano fora praticado por policial que se encontrava fora de suas funções públicas” e que o evento danoso decorrera de interesse privado, que o policial atuara movido por sentimento pessoal, concernente ao relacionamento amoroso que mantinha com a vítima. (p. 943)
Como fica a responsabilidade do Estado no caso de danos sofridos por pessoas sob sua guarda ou custódia?
“[…] assaz relevante é assinalar que, nas hipóteses de pessoas ou coisas que estejam sob a guarda, a proteção direta ou a custódia do Estado, isto é, quando o poder público está na posição de garante, quando tem o dever legal de assegurar a integridade de pessoas ou coisas que estejam a ele vinculadas por alguma condição específica: a re.sponsabilidade civil por danos ocasionados a essas pessoas ou coisas e do tipo objetiva.
Vale repisar: quando o Estado tem o dever legal de garantir a integridade de pessoas ou coisas que estejam sob sua proteção direta, ele responderá com base no art. 37, § 6.º, por danos a elas ocasionados, mesmo que não diretamente causados por atuação de seus agentes. Afirma-se que, nessas situações, ao possibilitar que o dano ocorresse - mesmo sem ter sido ele provocado por alguma conduta comissiva de agente público -, o Estado responderá por uma omissão específica, a qual, para efeito de responsabilidade civil de poder público, equipara-se à conduta comissiva (a omissão genérica, diferentemente, enseja, em regra, responsabilidade subjetiva estatal, na modalidade “culpa administrativa”, conforme será estudado em tópico próprio).”
OBS: se ficar comprovado alguma excludente de causalidade.
“Dessa forma, se houve uma invasão imprevísível, inevitável e absolutamente excepcional da escola, por um bando armado, que causou ferimentos em diversos estudantes, poderá a administração, provando essa excludente de força maior ou caso fortuito desvinculada de qualquer omissão culposa de sua parte, ver afastada a sua responsabilidade; porém, se um dano sofrido por um aluno deu-se em circunstâncias normais da escola, dentro da sala de aula, e a atuação eficaz e diligente da administração tivesse a possibilidade de evitar a sua ocorrência, o Estado será responsabilizado.
No caso de omissão estatal, a doutrina e a jurisprudência majoritárias defendem que se aplica a teoria da culpa administrativa (ou culpa anônima). O que deve provar o prejudiciado, então, para fazer jus a indenização?
Assim, para que lhe seja reconhecido direito a indenização, o particular deverá demonstrar que a atuação estatal regular, normal, ordinária, teria sido suficiente para evitar o dano a ele infligido. É necessário que ele comprove que concorreu para o resultado lesivo determinada omissão culposa do Estado: este estava obrigado a agir, tinha possibilidade material de atuar e, se tivesse agido, poderia ter evitado o dano. Nisso consiste, quando estamos diante de um caso de responsabilidade civil subjetiva por culpa administrativa, o nexo de causalidade entre o dano e a falta na prestação do serviço público (que pode assumir as modalidades omissivas inexistência do serviço, deficiência do serviço ou atraso na prestação do serviço).
Em quais circunstâncias deve o Estado ser condenado a indenizar vítima de delinquente que tenha se evadido de penitenciária?
As decisões de nossa Corte Suprema sobre o assunto geralmente enfatiazam a necessidade de configuração de um nexo causal direto e imediato entre a omissão estatal que ensejou a fuga do detento e o dano por ele causado - e reconhecem a presença de tal vinculação apenas quando o crime praticado puder ser considerado um desdobramento lógico ou uma consequência próxima da evasão.
Por exemplo, se, durante a fuga, o criminoso causa lesão corporal a um transeunte, ou rouba um veículo para se deslocar mais rapidamente, ou mesm se, poucos dia depois da evasão, ele pratica um latrocínio, um estupro, ou outro crime violento, a tendência do Supremo Tribunal Federal é decidir pela caracterização da responsabilidade civil do poder público. Diferentemente, se o evadido pratica um crime semanas ou meses depois da fuga, a inclinação de nosso Tribunal Constitucional é considerar que houve interrupção do nexo causal e, por conseguinte, excluir a responsabilidade extracontratual estatal.
O Estado pode ser responsabilizado a indenizar danos morais sofridos por detentos em razão das precárias condições de encarceramento?
Sim.
Considerando que é dever do Estado, imposto pelo sistema normativo, manter em seus presídios os padrões mínimos de humanidade previstos no ordenamento jurídico, é de sua responsabilidade, nos termos do art. 37, § 6.º, da Constituição, a obrigação de ressarcir os danos, inclusive morais, comprovadamente causados aos detentos em decorrência da falta ou insuficiência das condições legais de encarceramento.
No caso de dano nuclear, qual é o entendimento da doutrina?
A Constituição da República preceitua, literalmente, que a responsabilidade civil da União, no caso de dano nuclear, “independe da existência de culpa” (art. 21, XXIII, “d”). Não nos parece razoável considerar que esse dispositivo constitucional represente meramente um reforço específico (e inócuo) do § 6. º do art. 3 7 o qual, de forma ampla, atribui responsabilidade objetiva ao poder público pelos prejuízos que seus agentes causem a terceiros. Pensamos que, em relação ao dano nuclear, o constituinte pretendeu estabelecer que a responsabilidade civil do poder público será sempre objetiva, inclusive no casos de omissão estatal, específica ou genérica.
Alertamos que o assunto é controverso. Alguns autores simplesmente não fazem distinção entre a responsabilidade civil estatal por dano nuclear e as demais hipóteses de responsabilidade extracontratual do poder público. E outros entendem que a Constituição teria adotado, no caso do dano nuclear, a teoria do risco integral, isto é, a responsabilidade do Estado seria objetiva e não estaria sujeita a quaisquer excludentes. (p. 929)
A administração pode ser responsabilizada por ato praticado por multidão?
[…] Sendo o evento causador do dano um “ato de terceiro”, somente poderá ser a administração pública responsabilizada se ficar demonstrado que sua omissão indevida concorreu de forma direta para o surgimento do resultado danoso, ou seja, se ficar demonstrado que ela deveria ter prestado um serviço que teria impedido efetivamente o dano decorrente do “ato de terceiro”, mas, culposamente, deixou de prestar tal serviço, ou prestou deficientemente ou com atraso. (p.932).
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Sobre o tema, José dos Santos Carvalho Filho pontifica: “Não é incomum que os indivíduos sofram prejuízos em razão de atos danosos praticados por agrupamentos de pessoas. Nas sociedades de massa atuais se torna cada vez mais comum que multidões dirijam sua fúria destruidora a bens particulares, normalmente quando pretendem evidenciar algum protesto contra situações especiais. Em todo o mundo ocorrem esses movimentos, ora de estudantes contra a polícia, ora da população contra o Estado, ora de delinquentes contra o indivíduo. Sabemos que, nos agrupamentos de pessoas, o indivíduo perde muito dos parâmetros que demarcam seus valores morais e sociais, deixando-se levar pela caudalosa corrente do grupo e agindo, dentro do grupo, como não o faria individualmente. Daí ser reconhecida hoje a chamada psicologia das multidões. Qual a repercussão dos atos de multidões na responsabilidade civil do Estado? A regra, aceita no direito moderno, é a de que os danos causados ao indivíduo em decorrência exclusivamente de tais atos não acarreta a responsabilidade civil do Estado, já que, na verdade, são tidos como atos praticados por terceiros. Sequer existem os pressupostos da responsabilidade objetiva do Estado, seja pela ausência da conduta administrativa, seja por falta de nexo causal entre atos estatais e o dano. Pelo inusitado ou pela rapidez com que os fatos ocorrem, não se pode atribuir os seus efeitos a qualquer ação ou omissão do Poder Público. Ocorre, porém, que, em certas situações, se torna notória a omissão do Poder Público, porque teria ele a possibilidade de garantir o patrimônio das pessoas e evitar os danos provocados pela multidão. Nesse caso, é claro que existe uma conduta omissiva do Estado, assim como é indiscutível o reconhecimento do nexo de causalidade entre a conduta e o dano, configurando-se, então, a responsabilidade civil do Estado. Trata-se, pois, de situação em que fica cumpridamente provada a omissão culposa do Poder Público. Essa é a orientação que tem norteado a jurisprudência a respeito do assunto. Suponha-se, para exemplificar, que se esteja formando um agrupamento com mostras de hostilidade em certo local onde há várias casas comerciais. Se os órgãos de segurança tiverem sido avisados a tempo e ainda assim não tiverem comparecido os seus agentes, a conduta estatal estará qualificada como omissiva culposa, ensejando, por conseguinte, a responsabilidade civil do Estado, em ordem a reparar os danos causados pelos atos multitudinários. Tal como na hipótese dos fatos imprevisíveis, contudo, a indenização será proporcional à participação omissiva do Estado no resultado danoso”.