Problema 4: anemias causadas por doenças crônicas. Flashcards
Anemias em doenças crônicas:
As anemias em doenças crônicas (ADC), também chamadas de anemias de doenças inflamatórias, são um tipo comum de anemia associada a doenças crônicas inflamatórias, infecciosas ou neoplásicas. É a segunda causa mais comum de anemia, ficando atrás apenas da anemia ferropriva.
Mecanismos: Doença renal crônica.
-Mecanismos:
1.Redução da eritropoetina: com danos aos rins, gerados por quadros de diversas condições que acometem esse órgão, ocorre a redução da produção de eritropoetina, enzima responsável por desencadear a eritropoiese.
2. quadros inflamatórios crônicos levam ao aumento da expressão do gene HAMP, responsável por codificar a hepcidinia.
3.Acúmulo de toxinas urêmicas: Redução da produção de EPO pelas células renais. Acúmulo de toxinas urêmicas, que suprimem a medula óssea. Destruição precoce das hemácias devido à fragilidade da membrana. Deficiência de ferro e nutrientes essenciais.
4.Deficiência de ferro e folato: Perda crônica por diálise e distúrbios da absorção.
Como e porque quadros inflamatórios geram o aumento de hepcidina?
-Aumento da IL-6 e outras citocinas inflamatórias (TNF-α, IL-1, IFN-γ):
A IL-6 ativa diretamente a expressão do gene da hepcidina (HAMP) no fígado.
O TNF-α e a IL-1 também estimulam a hepcidina, mas de forma menos direta.
-Inflamação Crônica → IL-6 ↑ → Hepcidina ↑ → Ferro preso nos estoques → Medula óssea sem ferro → Anemia
-Isso ocorre devido a resposta imune inata que é programada com o fim de reduzir drasticamente a quantidade de ferro circulante funcional presente na corrente sanguínea, visto que diversos microrganismos patogênicos utilizam o ferro como nutriente crucial na sua nutrição/proliferação.
Fisiopatologia das anemias causadas por DRC:
1.Deficiência de eritropoetina:
-Na DRC avançada, ocorre lesão e fibrose das células intersticiais peritubulares dos rins, que são as principais produtoras de EPO.
2.Redução da eritropoiese pela toxicidade urêmica:
-Principais toxinas urêmicas envolvidas:
.Ácido guanidinosuccínico
.Indoxil sulfato
.Paratormônio elevado (PTH)
.Ácido úrico aumentado
-Efeitos dessas toxinas na eritropoiese:
.Inibição da proliferação dos precursores eritroides na medula óssea.
.Redução da resposta da medula à EPO (resistência eritropoiética).
.Aumento da apoptose dos precursores eritroides, levando a eritropoiese ineficaz.
3.Quadro inflamatório: aumento da produção de hepcidina.
4.Hiperparatireoidismo Secundário e Doença Óssea Metabólica.
5.Redução da sobrevida das hemácias:
-Aumento do estresse oxidativo:
.As toxinas urêmicas promovem dano oxidativo à membrana das hemácias, tornando-as mais frágeis e propensas à destruição precoce.
-Danos mecânicos:
.Hemácias sofrem trauma mecânico durante a hemodiálise, acelerando sua destruição.
-Deficiência de carnitina:
.Pacientes em diálise podem ter déficit de carnitina, um fator essencial para a estabilidade da membrana das hemácias.
Isso leva a fragilidade eritrocitária e hemólise subclínica.
Hiperparatireoidismo secundário a DRC:
-Rins doentes não conseguem excretar fósforo com eficiência, seu acúmulo no sangue leva a redução dos níveis de cálcio (hipocalemia), pois o fósforo livre na corrente sanguínea reage com o cálcio formando um complexo insolúvel inibitório que deixa o cálcio disfuncional.
-Esse quadro de hipocalemia estimula a libera de PTH paratormônio à fim de mobilizar o cálcio soa ossos e corrigir os níveis séricos.
-Com a progressão da DRC o tecido ósseo se torna menos sensível a ação do PTH, oq induz ao aumento da produção desse hormônio.
-O aumento da produção do paratormônio leva:
✅ Inibição da proliferação de precursores eritroides:
.O PTH reduz a resposta da medula óssea à eritropoetina (EPO).
Isso ocorre porque o PTH ativa vias inflamatórias (TNF-α, IL-6), que inibem a diferenciação dos progenitores eritroides.
✅ Indução da Fibrose Medular:
.O PTH estimula fibroblastos dentro da medula óssea, resultando em fibrose medular.
Com menos espaço para células hematopoiéticas, há menor produção de hemácias.
✅ Aumento da apoptose de células progenitoras:
.O PTH promove apoptose (morte celular programada) dos precursores eritroides, diminuindo sua sobrevivência e reduzindo a eritropoiese.
Quadro clínico, Diagnóstico e Tratamento: Anemias associadas a DRC.
QC clássico de anemias em doenças crônicas:
.Fadiga crônica
.Pele e mucosas pálidas
.Dispneia aos esforços
.Tontura e cefaleia
.Taquicardia compensatória
.Fraqueza muscular
*o grau da anemia reflete o grau da doença base.
Diagnóstico:
- A anemia da DRC aparece a partir do estágio 3 da DRC, representada pela taxa de filtração glomerular inferior a <60 mL/min/1,73m² e com presença de hemoglobina inferior a 13g/dL em homens e mulheres na pós-menopausa e 12g/dL em mulheres na pré-menopausa.
- Para investigação da anemia é necessário um eritrograma completo, que pode evidenciar pistas de anemia ferropriva (presença de microcitose), de deficiência de vitamina B12 ou ácido fólico (presença de macrocitose), de hemólise (presença de esquizócitos).
- A avaliação dos estoques de ferro é obrigatória, incluindo a dosagem da saturação de transferrina e de ferritina sérica.
.A saturação de transferrina sérica abaixo de 20% é considerada como deficiência de ferro.
.Os níveis de ferritina menores que 100 ng/mL são considerados como deficiência de ferro nos pacientes em tratamento conservador (estágio 3 e 4 de DRC) e em programa de diálise peritoneal.
Tratamento:
- A base do tratamento da anemia da DRC age justamente sobre a incapacidade de secreção de quantidades apropriadas de eritropoetina.
- Dessa forma, o manejo consiste na reposição exógena de eritropoetina, além de medidas como transfusão ou correção de deficiência de ferro e folato, caso seja necessário.
Essa suplementação de eritropoetina leva ao aumento dos níveis de hemoglobina, melhorando a qualidade de vida do paciente e reduzindo a necessidade de transfusões.
- O tratamento está indicado em pacientes com DRC nos estágios 3 a 5, que apresentarem níveis de hemoglobina menores de 10 g/dL.
- A suplementação é feita com aplicação subcutânea ou endovenosa de análogos da eritropoetina, como a alfaepoetina, em doses de 50 a 100 unidades/kg de 1 a 3 vezes por semana.
Em adultos, recomenda-se redução de dose se o nível da hemoglobina sérica for igual ou superior a 12 g/dL, conforme esquemas de administração; e suspensão temporária, quando superior a 13 g/dL, reiniciando-se quando estiver entre 10 e 12 g/dL.
- O tratamento com alfaepoetina tem como benefícios a correção da anemia, com consequente redução da necessidade de transfusões, redução no número de hospitalizações e melhora sintomática, da qualidade de vida, da capacidade cognitiva e do desempenho físico.
.Contudo, o uso de eritropoetina pode aumentar o risco trombótico dos pacientes, além de precipitar quadros de hipertensão arterial.
- Antes de iniciar o tratamento, deve-se garantir que haja reservas adequadas de ferro, com recomendações de ferritina sérica maior que 100-200 ng/dL e saturação de transferrina de pelo menos 20%
Mecanismos: Doenças Neoplásicas
-Inflamação crônica: Citocinas inflamatórias (IL-6, TNF-α) aumentam a hepcidina e reduzem ferro disponível.
-Infiltração da medula óssea: Neoplasias hematológicas (ex: leucemias, linfomas, mieloma múltiplo) podem prejudicar a produção de hemácias.
-Sangramentos crônicos: Câncer gastrointestinal (ex: estômago e cólon) pode causar sangramentos ocultos.
-Quimioterapia e radioterapia: Afetam diretamente a medula óssea e reduzem a eritropoiese.
Fisiopatologia das anemias: Neoplasias.
1️⃣ Inflamação Crônica e Aumento da Hepcidina (Anemia de Doença Crônica)
-A anemia de doença crônica (ADC) é o principal mecanismo nas neoplasias sólidas e hematológicas devido ao estado inflamatório persistente.
2️⃣ Infiltração da Medula Óssea pelo Tumor (Anemia Hipoproliferativa)
-Em neoplasias hematológicas (ex: leucemias, linfomas, mieloma múltiplo) e metástases ósseas, há invasão da medula óssea por células neoplásicas, prejudicando a produção de hemácias.
Mecanismos:
✅ Substituição do tecido hematopoiético por células tumorais:
.O espaço da medula óssea é ocupado por células malignas, reduzindo a produção de hemácias, leucócitos e plaquetas.
Isso causa pancitopenia (anemia, leucopenia e trombocitopenia).
✅ Produção de citocinas supressoras (TGF-β, IL-10):
.Essas citocinas impedem a proliferação de precursores eritroides.
✅ Fibrose medular (mielofibrose secundária):
.Algumas neoplasias estimulam a produção excessiva de colágeno na medula, levando à mielofibrose, que agrava a anemia.
3️⃣ Efeito da Quimioterapia e Radioterapia
.Os tratamentos contra o câncer afetam a medula óssea e as hemácias, contribuindo para a anemia.
-Mecanismos:
✅ Supressão da medula óssea pela quimioterapia:
.A maioria dos quimioterápicos inibe a divisão celular, afetando diretamente as células-tronco hematopoiéticas.
Isso causa anemia, leucopenia e trombocitopenia (mielossupressão).
✅ Radiação em locais hematopoiéticos (ex: pelve, esterno, coluna):
.Danifica células progenitoras da medula óssea, reduzindo a produção de hemácias.
✅ Toxicidade para as hemácias:
.Alguns quimioterápicos (ex: cisplatina) podem causar hemólise e diminuir a sobrevida das hemácias.
4️⃣ Sangramentos Crônicos e Hemólise
.Muitos tipos de câncer podem causar perdas sanguíneas ocultas, levando à anemia ferropriva associada.
-Mecanismos:
✅ Sangramentos Gastrointestinais (câncer de cólon, estômago, esôfago):
.O tumor pode causar erosão da mucosa e sangramentos ocultos, levando à anemia microcítica hipocrômica.
✅ Sangramentos ginecológicos (câncer de útero, ovário):
.Hemorragias menstruais anormais causam déficit crônico de ferro.
✅ Hemólise induzida pelo câncer:
.Algumas neoplasias (ex: linfomas, leucemias) podem causar anemia hemolítica autoimune, onde o sistema imune ataca as hemácias, reduzindo sua vida útil.
Quadro clínico, Diagnóstico e Tratamento: Anemias associadas a Neoplasias:
● Quadro Clínico
- Em termos clínicos, a anemia pode manifestar-se desde sintomas ligeiros até quadros de descompensação cárdio-respiratória, o que depende do grau de anemia, da rapidez da sua instalação e da função pulmonar e cardiovascular do paciente.
Por essa razão é comum o paciente apresentar dispneia aos esforços e taquicardia compensatória.
- Outros sintomas muito comuns são a fadiga intensa e fraqueza generalizada, que ocorrem num ciclo contínuo que não é aliviado pelo sono.
A fadiga é causada por fatores fisiológicos, como sejam a anemia, e também por fatores psicológicos e pela própria neoplasia.
- Além desses, a anemia causa sintomas esperados como palpitações, tontura, palidez cutânea e mucosa.
● Investigação Diagnóstica
- O diagnóstico etiológico da anemia é feito mediante a realização do hemograma completo, com contagem de reticulócitos, doseamento da vitamina B12, ácido fólico e ferro sérico, ponderando-se, face aos resultados destes exames, na necessidade de realização de estudo do esfregaço do sangue periférico e mielograma.
- Nos casos em que há diminuição dos reticulócitos devem colocar-se as hipóteses de anemia por supressão medular, deficiente nutrição, ou anemia da doença crónica.
- Já em casos de produção aumentada de reticulócitos se deve pensar nas causas de destruição dos glóbulos vermelhos (hemólise, hiperesplenismo, ou perda aguda de sangue).
● Conduta Terapêutica
- O tratamento da anemia passa em primeiro lugar pelo tratamento dirigido à causa subjacente.
- Existem duas indicações principais para a transfusão de concentrado eritrocitário:
Hemorragia grave e;
Anemia sintomática crônica para a qual não existe terapêutica, sendo o principal objetivo da transfusão a melhoria do fornecimento de oxigénio aos tecidos através do aumento do conteúdo do oxigénio no sangue.
- A eritropoietina recombinante humana (RhEPO) pode ser usada na profilaxia, expansão da série eritroide, ou no tratamento da anemia, evitando o recurso a transfusão sanguínea.
O tratamento com RhEPO reduz a anemia e a necessidade de transfusão no doente oncológico em aproximadamente 50% dos casos.
Antes de considerar o uso de RhEPO é importante excluir causas corrigíveis de anemia, como deficiência nutricional, lesões crônicas sangrantes, bem como condições subjacentes que predisponham à anemia, como o hipotiroidismo.
- Lembrando que novamente nesses casos, o estudo das reservas de ferro deve ser efetuado antes do início do tratamento com a eritropoetina.
Os suplementos de ferro devem ser dados por via oral ou endovenosa na presença de ferritina menor 40-100mg/l, saturação da transferrina diminuída para menos que 20%, ou quando a percentagem de células hipocrômicas for superior a 10%.
- Nos doentes que respondem ao tratamento com a eritropoietina ocorre um aumento de hemoglobina e do hematócrito, com diminuição da necessidade de transfusão, o que se traduz numa melhoria da qualidade de vida.
- As reações adversas mais frequentemente encontradas no tratamento com RhEPO são o:
Aparecimento de sintomas flu-like (cefaleias, artralgias, astenia, tonturas, fadiga);
Aumento de ácido úrico e fósforo devido ao turnover rápido do ácido nucleico da medula;
Aumento da tensão arterial, sendo este aumento moderado e facilmente controlável com fármacos anti-hipertensores.