Gastroenterologia pediátrica Flashcards

1
Q

Alergia à proteína do leite de vaca (APLV)

A
  • Alergia alimentar mais comum na infância
  • Origem na falha nos mecanismos de tolerância oral
  • Pode ser IgE mediada (IgE específica contra a proteína), não mediada por IgE ou ter componente misto
  • Diferenciar intolerância à lactose e APLV
    –> APLV é de etiologia imune: o paciente é sensibilizado contra a proteína do soro do leite de vaca
    –> A intolerância gástrica envolve deficiência qualitativa ou quantitativa da enzima lactase, predispondo a sintomas gástricos e diarreia osmótica
  • Pode iniciar com a interrupção do aleitamento exclusivo e substituição por fórmulas infantis contendo proteína do soro de vaca; pode haver passagem transplacentária de antígenos maternos para a criança ou ainda sensibilização a partir dos antígenos ingeridos pela mãe que passam para o bebê durante a amamentação.
  • Manifestações agudas: são normalmente IgE mediadas, sintomas que aparecem em minutos até 2 h após exposição da proteína do leite de vaca. As manifestações precoces IgE mediadas mais prevalentes são as CUTÂNEAS.
    –>Alergia oral –> hiperemia/enantema, edema, dor
    –> Urticária: lesões elevadas com centro mais pálido e halo eritematoso
    –> Anafilaxia: manifestações cutâneo-mucosas, broncoespasmo, angioedema e acometimento sistêmico
    –> Enterocolite induzida por proteína alimentar (FPIES)
    Acomete principalmente < 1 ano
    Ocorre cerca de 1-2 h após ingesta
    Cursa com vômitos intratáveis, hipotonia, palidez
    Diarreia mucossanguinolenta
    Desidratação e hipovolemia grave
    NÃO MEDIADO POR IgE
  • Manifestações subagudas ou crônicas:
    –> Proctocolite eosinofílica:
    Acomete mais bebês do sexo masculino, nos primeiros 6 meses de vida
    Quadro clínico de SANGUE NAS FEZES (raias de sangue nas fezes), NÃO gerando impacto no ganho ponderal e no estado geral da criança, nem febre, nem distensão abdominal.
    50% dos bebês podem estar em aleitamento materno exclusivo (por ação dos antígenos proteicos do leite de vaca ingeridos pela mãe passados pelo leite materno)
    –> Esofagite eosinofílica:
    Estabelece diagnóstico diferencial com refluxo
    Quadro clínico: disfagia, impactação alimentar
    –> Outros acometimentos crônicos: enteropatia perdedora de proteínas, gastroenterite eosinofílica
  • Diagnóstico:
    –> Restrição da dieta
    Se bebê em AME: manter aleitamento materno e pedir que mãe não ingira leite e seus derivados
    Se uso de fórmulas infantis: trocar para fórmulas EXTENSAMENTE HIDROLISADAS
    –> Padrão ouro para o diagnóstico: TESTE DE PROVOCAÇÃO ORAL
    Dieta de restrição por pelo menos 2 semanas, para assim obter uma melhora do quadro clínico. Após esse período, administra-se doses crescentes de antígeno específico (proteína do leite de vaca) em serviço de saúde e monitora-se eventual surgimento de sinais e sintomas. Caso aparecerem, está feito o diagnóstico!
    Ter cautela na realização desse teste em crianças com história de anafilaxia, com sintomas importantes e ameaçadores à vida (angioedema grave) ou ainda aquelas que tiveram antecedente de FPIES.
    –> Outros testes:
    Somente nos mediados por IgE: dosagem de IgE sérica específica para proteína do leite de vaca ou teste cutâneo (prick test*)
    *Aplicação intradérmica do alérgeno. Se ocorrer evolução para pápula ≥ 3 mm, o teste é positivo
    Nem a medição de IgE específica, nem o prick test são específicos, não definindo o diagnóstico!
  • Tratamento:
    –> Em caso de boa resposta inicial de bebês em AME com a dieta materna restrita de leite e derivados, manter conduta
    –> Em caso de boa resposta inicial de crianças em uso de fórmulas infantis com fórmulas extensamente hidrolisadas, manter essa conduta
    –> Indicação da fórmula de aminoácidos livres:
    CASOS GRAVES (histórico de anafilaxia, enterocolite/FPIES, obstrução aguda de via aérea, enteropatia perdedora de proteínas com importante lesão das vilosidades e prejuízo nutricional determinando grave déficit pondero-estrutural)
    REFRATARIEDADE ÀS FÓRMULAS EXTENSAMENTE HIDROLISADAS
    –> Indicação de fórmula de soja:
    Mais barata e com um sabor melhor, mais aceitas pelo lactente
    O bebê deve ter > 6 meses + ter um mecanismo alérgico tipo 1 (IgE imediada) + deve ter uma barreira intestinal íntegra (quadros inflamatórios intestinais - DII, malformações gastrointestinais) ~ todos esses itens devem ser contemplados para prescrever fórmulas à base de soja!
    –> NÃO UTILIZAR NUNCA: fórmulas parcialmente hidrolisada, leite de outros mamíferos (ex., leite de cabra), leites de arroz/amêndoas/aveia (não tem evidência)
  • Prognóstico:
    –> 85-90% tende a remitir aos 3 anos de idade
    –> Maior risco de permanência de APLV:
    Reações graves, desencadeadas por mínimas quantidades, associação com outras comorbidades alérgicas/atópicas, alergias IgE mediadas e altos níveis de IgE específica.
  • Prevenção de APLV:
    –> Aleitamento materno exclusivo é a ÚNICA medida que REDUZ O RISCO DE ALERGIA!
    –> Não realizar: restrição na dieta da gestante ou lactente com objetivo de prevenir alergias, adiamento ou antecipação na introdução de alimentos e fórmulas hidrolisadas ou de soja sem indicações precisas que objetivam evitar a APLV.
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Q

Doença do refluxo gastroesofágico

A
  • Maior parte fisiológica, podendo acometer cerca de 67% dos lactentes
  • Critérios de Roma IV para refluxo FISIOLÓGICO ou regurgitação do lactente:
    –> Lactente SAUDÁVEL com idade entre 3 semanas e 12 meses com:
    1. ≥ 2 regurgitações por dia por pelo menos 3 semanas E
    2. AUSÊNCIA de:
    ASPIRAÇÃO
    PERDA DE PESO OU POSTURA ANORMAL
    APNEIA
    NÁUSEAS
    HEMATÊMESE
    ALIMENTAÇÃO OU DEGLUTIÇÃO ALTERADOS
    TODOS esses critérios devem ser atendidos para fechar o diagnóstico de regurgitação fisiológica, tendo sido excluídas outras alterações orgânicas de suspeição clínica
  • Conduta do refluxo fisiológico:
    –> Tranquilizar e recomendar aos pais:
    Esse refluxo é provocado por relaxamentos transitórios do esfíncter esofágico inferior; tem curso benigno, normalmente se torna mais evidente entre o 2º e 4º mês de vida; tende a desaparecer entre 1 e 2 anos de idade
  • Doença do refluxo:
    –> Quando alguns dos critérios de Roma IV não forem atendidos, pensar em doença do refluxo
    –> Sintomas gerais: desconforto, choro, irritabilidade, sono agitado
    –> Síndrome de Sandifer: se caracteriza pela associação de posturas e movimentos anormais com refluxo gastresofágico. Um exemplo é o arqueamento de tronco que alguns bebês têm para aliviar os sintomas de refluxo
    –> Sintomas gastrointestinais: regurgitações frequentes, crianças maiores podem se queixar de pirose, dor retroesternal ascendente e epigastralgia
    –> Sintomas atípicos: aspirações (pneumonites, pneumonias de repetição), otites, laringites, asma de difícil controle
    –> Diagnóstico: não existe um padrão ouro universal para doença do refluxo:
    1. pHmetria de 24 h + impedanciometria:
    A impedanciometria consegue identificar refluxos alcalinos e seu conteúdo predominante (liquido, gasoso ou sólido)
    Indicações da pHmetria de 24 h e/ou impedanciometria:
    Sintomas atípicos
    Avaliar resposta ao tratamento, principalmente nos casos complicados - Barret ou refluxos refratários ao tratamento clínico
    Avaliação pré e pós-operatória
    2. Endoscopia digestiva alta (EDA):
    Identifica complicações - esofagite erosiva, estenoses e esôfago de Barret
    Solicitar na vigência de sinais de alarme
    Diagnóstico diferencial com outras esofagites
    –> Tratamento não medicamentoso:
    Fórmulas antiregurgitação
    Refeições em porções menores, evitar comer antes de dormir, evitar chocolates, chá, café, refrigerantes e alimentos gordurosos que aumentam o relaxamento do EEI
    Evitar tabagismo ativo e passivo, evitar roupas apertadas, evitar fármacos que pioram o refluxo (antihistamínicos, betabloqueadores)
    Orientar mãe realizar troca de roupa ou fraldas antes das refeições ou mamadas, evitando com que o paciente deite logo em seguida a uma refeição
    Para adolescentes, orientar deitar em decúbito lateral esquerdo com a cabeceira elevada
    Perda de peso aos pacientes com sobrepeso ou obesos
    –> Tratamento medicamentoso:
    Feita com IBP
    Quando prescrever?
    Crianças maiores com sintomas típicos
    Complicações presentes - esofagite erosiva, estenose péptica, esôfago de Barret
    Doença respiratória crônica grave
    Doenças neurológicas
    Quando não realizar IBP?
    Pacientes com sintomas extraesofágicos isolados, exceto se exame positivo para DRGE
    Sem evidência: metoclopramida, bromoprida, domperidona e ranitidina

FLUXOGRAMA DO LACTENTE COM SUSPEITA DE DOENÇA DO REFLUXO:

1º PASSO: investigar sinais de alarme, solicitar os exames adequados na vigência de sinais de alerta (afastar causas estruturais ou anomalias anatômicas) e orientar medidas não farmacológicas
Não houve melhora? Próximo passo
2º PASSO: tentar excluir possibilidade de APLV, recomendando dieta materna restrita de leite e derivados ou fórmulas extensamente hidrolisadas por pelo menos 2 semanas –> Melhorou? Considerar diagnóstico de APLV
Não melhorou? Próximo passo
3º PASSO: encaminhar ao especialista para avaliações adicionais. Considerar introdução de IBP ao longo desse processo de encaminhamento - se houver demora, introduzir IBP por 4-8 semanas.
Houve melhora com IBP? Tentar desmamar nas próximas 4-8 semanas
Sintomas não melhoraram com IBP ou retornam com o desmame? Considerar diagnósticos diferenciais, realizar exames e/ou testes terapêuticos de curta duração (4-8 semanas)

FLUXOGRAMA DA CRIANÇA > 2 ANOS COM SUSPEITA DE DOENÇA DO REFLUXO:

1º PASSO: investigar sinais de alarme, solicitar os exames apropriados se houver sinais de alarme (afastar causas estruturais ou anomalias anatômicas) e orientar medidas não farmacológicas
Não melhorou? Próximo passo
2º PASSO: prescrever IBP por 4-8 semanas e avaliar resposta
Melhorou? Tentar retirar o IBP em 4-8 semanas
Não melhora ou não consegue retirar? Próximo passo
3º PASSO: encaminhar ao especialista + EDA
–> EDA apontando alterações (esofagite erosiva, estenoses ou Barret) –> seguimento clínico conforme achado
–> EDA normal e sintomas respondem ao IBP? Continuar tratamento com IBP e tentar desmamar de tempos em tempos. Considerar doença não erosiva esofágica (NERD) em caso de dependência do IBP (volta dos sintomas após sua retirada completa)
–> EDA normal e sintomas persistentes apesar do IBP ou falha no desmame? Próximo passo
4º PASSO: solicitar pHmetria ou pH-impedanciometria
–> Os exames identificaram exposição ácida normal e sintomas tem correlação com os achados? Considerar esôfago hipersensível (ou seja, o esôfago do paciente já reage com mínimas concentrações de ácido, consideradas fisiológicas para a população geral)
–> Os exames identificaram exposição ácida normal e sintomas não tem correlação com os achados? Considerar azia funcional da criança e adolescente

Quais são os sinais de alarme que sugerem necessidade de afastar outras doenças?
- Febre
- Disúria
- Fontanela tensa, macro ou microcefalia (hipertensão intracraniana?)
- Convulsões, letargia e irritabilidade persistente
- Dor muito intensa, incapacitante (retroesternal ou abdominal)
- Início dos vômitos após os 6 meses ou que persistem após os 12 meses de idade.
- Vômitos persistentes, incoercíveis, biliosos ou noturnos
- Hematêmese, hematoquezia, melena ou enterorragia
- Diarreia crônica
- Distensão abdominal
- Falha importante de crescimento ou perda de peso

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3
Q

Constipação funcional

A
  • Diagnóstico exclusão!
  • Critérios de Roma IV p/ constipação funcional
    1. ≥ 2 dos seguintes durante um intervalo ≥ 1 mês
    –> ≤ 2 evacuações por semana
    –> Diâmetro das fezes aumentado e em grande volume, muitas vezes entupindo o vaso sanitário
    –> Fezes dolorosas e endurecidas
    –> Postura de retenção, adia ir ao banheiro, cruza as pernas
    –> Grande massa palpável no reto
    –> ≥ 1 episódio de incontinência fecal por semana (escape fecal)
  • Sinais de alerta para outras doenças
    –> Atraso na eliminação meconial > 24 h após o nascimento (pensar em íleo meconial secundário à fibrose cística)
    –> Início precoce ainda no primeiro mês de vida
    –> Estrias de sangue nas fezes, sem fissuras anais à inspeção
    –> História familiar positiva para doença de Hirschprung (megacólon congênito, agangliose de cólon)
    –> Baixo ganho ponderal
    –> Distensão abdominal importante
    –> Glândula tireoide anormal
    –> Presença de cicatrizes e/ou posições anormais do orifício anal
    –> Reflexo cremastérico ausente, diminuição da força/tônus/reflexo dos MMII, fosseta ou tufo de pelo sacral (espinha bífida)
  • Conduta
    –> Medidas iniciais de desimpactação fecal (primeiro desimpactar para depois prescrever o tratamento de manutenção):
    POLIETILENOGLICOL (PEG) 1-1,5 g/kg/dia ou
    ENEMA UMA VEZ AO DIA por 3 a 5 dias
    –> Tratamento de manutenção
    Orientar ingesta adequada de fibras, líquidos e exercício físico
    Prescrever PEG 0,4-0,8 g/kg/dia para normalizar o hábito intestinal e ficar assintomático por 1 mês para iniciar retirada OU
    Lactulose 1-2 ml/kg, na ausência ou impossibilidade de PEG
    Educar e orientar atender ao desejo de evacuar. Aproveitar o reflexo gastrocólico.
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