CPP - Jurisprudência Flashcards
Compartilhamento, para fins penais, de dados bancários e fiscais
- É constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da UIF* (Unidade de Inteligência Financeira / Leia-se: COAF:
Conselho de Controle de Atividades Financeiras) e da íntegra do procedimento fiscalizatório da Receita Federal do Brasil (RFB), que define o lançamento do tributo, com os órgãos de persecução penal para fins criminais, sem a obrigatoriedade de prévia autorização judicial, devendo ser resguardado o sigilo das informações em procedimentos formalmente instaurados e sujeitos a posterior controle jurisdicional. - O compartilhamento pela UIF (COAF) e pela RFB, referente ao item anterior, deve ser feito unicamente por meio de comunicações formais, com garantia de sigilo, certificação do destinatário e estabelecimento de instrumentos efetivos de apuração e correção de eventuais desvios.
STF. Plenário. RE 1055941/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 4/12/2019 (repercussão geral – Tema 990) (Info 962).
Sobre o tema, importante conhecer o seguinte julgado posterior do STJ que interpretou e restringiu o alcance do precedente acima:
É ilegal a requisição, sem autorização judicial, de dados fiscais pelo Ministério Público
STJ. 3ª Seção. RHC 83.233-MG, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 09/02/2022 (Info 724).
(MP/SC, 2024)
Compartilhamento, para fins penais, de dados bancários e fiscais
O sigilo bancário é protegido pela CF/88?
SIM. A CF/88 não utiliza a expressão “sigilo bancário”, mas isso está sim protegido em dois incisos do art. 5º da CF/88. Confira:
Art. 5º (…)
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
(…)
XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;
O legislador infraconstitucional reafirmou a proteção ao sigilo bancário no caput do art. 1º da LC 105/2001, que dispõe sobre o sigilo das operações de instituições financeiras:
Art. 1º As instituições financeiras conservarão sigilo em suas operações ativas e passivas e serviços prestados.
No § 1º do art. 1º da LC 105/2001, o legislador elenca quem são consideradas instituições financeiras. A lista é extensa e abrange bancos de qualquer espécie, distribuidoras de valores mobiliários, corretoras de câmbio e até as bolsas de valores.
Para que haja acesso aos dados bancários (“quebra do sigilo bancário”), é necessário autorização judicial?
Em regra, sim. Em regra, para que se tenha acesso aos dados bancários de uma pessoa, é necessário prévia autorização judicial por se tratar de verdadeira cláusula de reserva de jurisdição.
E no caso do Fisco (Administração Tributária)? A Receita Federal pode requisitar, sem autorização judicial, informações bancárias das instituições financeiras?
SIM. Essa possibilidade está prevista no art. 6º da LC 105/2001.
O art. 6º afirma que as autoridades e os agentes fiscais tributários podem ter acesso às movimentações bancárias, mesmo sem autorização judicial, desde que exista um processo administrativo instaurado ou um procedimento fiscal em curso e essas informações sejam indispensáveis. Confira:
Art. 6º As autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios somente poderão examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente.
Parágrafo único. O resultado dos exames, as informações e os documentos a que se refere este artigo serão conservados em sigilo, observada a legislação tributária.
Logo, a lei autoriza que a Receita Federal requisite diretamente das instituições financeiras informações sobre as movimentações bancárias dos contribuintes.
Em 2016, o STF decidiu que o art. 6º da LC 105/2001 é CONSTITUCIONAL.
Mas o art. 6º não representa uma “quebra de sigilo bancário” sem autorização judicial?
NÃO. O STF entendeu que esse repasse das informações dos bancos para o Fisco não pode ser chamado de “quebra de sigilo bancário”. Isso porque as informações são passadas para o Fisco (ex: Receita Federal) em caráter sigiloso e permanecem de forma sigilosa na Administração Tributária. Logo, é uma tramitação sigilosa entre os bancos e o Fisco e, por não ser acessível a terceiros, não pode ser considerado violação (quebra) do sigilo.
Além disso:
- O sigilo bancário não é absoluto e deve ceder espaço ao princípio da moralidade nas hipóteses em que transações bancárias indiquem ilicitudes.
- A LC 100/2001 é um instrumento para fiscalizar o dever fundamental do contribuinte de pagar tributos. O dever fundamental de pagar tributos está alicerçado na ideia de solidariedade social. Assim, dado que o pagamento de tributos, no Brasil, seria um dever fundamental — por representar o contributo de cada cidadão para a manutenção e o desenvolvimento de um Estado que promove direitos fundamentais —, é preciso que sejam adotados mecanismos efetivos de combate à sonegação fiscal.
- A LC 105/2001 não viola a CF/88. Isso porque o legislador estabeleceu requisitos objetivos para requisição de informação pela administração tributária às instituições financeiras e exigiu que, quando essas informações chegassem ao Fisco, ali mantivessem o dever de sigilo.
Compartilhamento, para fins penais, de dados bancários e fiscais
As Receitas estadual e municipal também poderão requisitar dos bancos informações sobre movimentações bancárias?
- as Receitas estadual e municipal (Secretarias de Fazenda estadual e municipal) também poderão requisitar dos bancos, sem autorização judicial, informações sobre movimentações bancárias sem que isso configure quebra do sigilo bancário.
No entanto, para que os Estados, DF e Municípios possam fazer uso dessa prerrogativa prevista no art. 6º da LC 105/2001, eles precisarão, antes, editar um ato normativo que regulamente e traga, com detalhes, todas as regras operacionais para aplicação do dispositivo legal.
Além de só poderem fazer essa requisição se houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais dados forem considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente.
Compartilhamento, para fins penais, de dados bancários e fiscais
As autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios podem requisitar diretamente das instituições financeiras informações sobre as movimentações bancárias dos contribuintes.
Esta possibilidade encontra-se prevista no art. 6º da LC 105/2001, que foi considerada constitucional pelo STF. Isso porque esta previsão não se caracteriza como “quebra” de sigilo bancário, ocorrendo apenas a “transferência de sigilo” dos bancos ao Fisco.
Vale ressaltar que os Estados-Membros e os Municípios somente podem obter as informações previstas no art. 6º da LC 105/2001, uma vez regulamentada a matéria de forma análoga ao Decreto Federal nº 3.724/2001, observados os seguintes parâmetros:
a) pertinência temática entre a obtenção das informações bancárias e o tributo objeto de cobrança no procedimento administrativo instaurado;
b) prévia notificação do contribuinte quanto à instauração do processo e a todos os demais atos, garantido o mais amplo acesso do contribuinte aos autos, permitindo-lhe tirar cópias, não apenas de documentos, mas também de decisões;
c) sujeição do pedido de acesso a um superior hierárquico;
d) existência de sistemas eletrônicos de segurança que fossem certificados e com o registro de acesso; e, finalmente,
e) estabelecimento de mecanismos efetivos de apuração e correção de desvios.
STF. Plenário. ADI 2390/DF, ADI 2386/DF, ADI 2397/DF e ADI 2859/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgados em 24/2/2016 (Info 815).
STF. Plenário. RE 601314/SP, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 24/2/2016 (repercussão geral) (Info 815).
É LEGÍTIMO O COMPARTILHAMENTO DOS DADOS OBTIDOS PELA RECEITA FEDERAL COM MINISTÉRIO PÚBLICO MESMO SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL?
- Garantia constitucional do sigilo não é absoluta;
Seja no direito constitucional brasileiro, seja no direito comparado, os direitos fundamentais não podem servir como escudo protetivo à prática de atividades ilícitas, de atividades criminosas. Não é essa a finalidade das garantias individuais, das liberdades públicas.
- Relatividade dos direitos fundamentais é prevista em documentos internacionais;
A proteção lícita do exercício dos direitos fundamentais é prevista na Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU). Em seu art. XXIX, o documento afirma tanto a finalidade quanto a relatividade dos direitos individuais.
Na finalidade, sujeita o exercício dos direitos e liberdades individuais às limitações estabelecidas pela lei.
- Restrições excepcionais às liberdades públicas são constitucionais;
Diante desse caráter relativo, pode-se concluir que não existe inconstitucionalidade na previsão de excepcionais restrições às liberdades públicas, inclusive à intimidade, à vida privada e ao sigilo de dados, desde que a finalidade seja garantir direitos e liberdades dos demais membros da sociedade às justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar de uma sociedade democrática.
No caso do sigilo financeiro, principalmente, há uma finalidade internacional da defesa da probidade, combate à criminalidade organizada e à corrupção.
- O raciocínio jurídico construído na decisão do STF de 2016 pode ser aplicado aqui;
- Receita pode enviar a integralidade do procedimento;
A Receita pode enviar tudo — dados, provas, informações — que a fez chegar ao lançamento definitivo do tributo e embasá-lo, por ser necessário à constituição da materialidade na infração penal. O restante, como já é feito, ou se devolve ao contribuinte ou se destrói.
Abertura de encomenda postada nos Correios
- SF, Tema 1041 - Admissibilidade, no âmbito do processo penal, de prova obtida por meio de abertura de encomenda postada nos Correios, ante a inviolabilidade do sigilo das correspondências.
- Recurso extraordinário em que se discute, considerado o artigo 5º, incisos XII e LVI, da Constituição Federal, a licitude de prova obtida mediante abertura de pacote postado nos Correios, a respaldar condenação de militar ante a prática do crime tipificado no artigo 290, § 1º, inciso II, do Código Penal Militar – tráfico de entorpecentes.
TESE:
- (1) Sem autorização judicial ou fora das hipóteses legais, é ilícita a prova obtida mediante abertura de carta, telegrama, pacote ou meio análogo, salvo se ocorrida em estabelecimento penitenciário, quando houver fundados indícios da prática de atividades ilícitas;
- (2) Em relação a abertura de encomenda postada nos Correios, a prova obtida somente será lícita quando houver fundados indícios da prática de atividade ilícita, formalizando-se as providências adotadas para fins de controle administrativo ou judicial.
(MP/SC, 2024)