[AC] Direito Penal Flashcards
Havendo pluralidade de causas de aumento de pena e sendo apenas uma delas empregada na terceira fase, as demais podem ser utilizadas nas demais etapas da dosimetria da pena?
O deslocamento da majorante sobejante para outra fase da dosimetria, além de não contrariar o sistema trifásico, é a que melhor se coaduna com o princípio da individualização da pena.
Exemplo: Camila foi condenada pela prática do crime de roubo circunstanciado com o reconhecimento de três causas de aumento de pena (art. 157, § 2º, II, V e VII). O juiz pode empregar a majorante do inciso II (concurso de agentes) na terceira fase da dosimetria e utilizar as outras na primeira fase como circunstâncias judiciais negativas.
STJ. 3ª Seção. HC 463.434-MT, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 25/11/2020 (Info 684).
Condenações anteriores transitadas em julgado podem ser utilizadas como personalidade ou conduta social desfavorável?
Eventuais condenações criminais do réu transitadas em julgado e não utilizadas para caracterizar a reincidência somente podem ser valoradas, na primeira fase da dosimetria, a título de antecedentes criminais, não se admitindo sua utilização também para desvalorar a personalidade ou a conduta social do agente.
A conduta social e a personalidade do agente não se confundem com os antecedentes criminais, porquanto gozam de contornos próprios - referem-se ao modo de ser e agir do autor do delito -, os quais não podem ser deduzidos, de forma automática, da folha de antecedentes criminais do réu. Trata-se da atuação do réu na comunidade, no contexto familiar, no trabalho, na vizinhança (conduta social), do seu temperamento e das características do seu caráter, aos quais se agregam fatores hereditários e socioambientais, moldados pelas experiências vividas pelo agente (personalidade social).
Já a circunstância judicial dos antecedentes se presta eminentemente à análise da folha criminal do réu, momento em que eventual histórico de múltiplas condenações definitivas pode, a critério do julgador, ser valorado de forma mais enfática, o que, por si só, já demonstra a desnecessidade de se valorar negativamente outras condenações definitivas nos vetores personalidade e conduta social.
STJ. 3ª Seção. EAREsp 1.311.636-MS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 10/04/2019 (Info 647).
Em caso de concurso formal de crimes, o perdão judicial concedido para um deles abrange o outro?
Não necessariamente
O fato de os delitos terem sido cometidos em concurso formal não autoriza a extensão dos efeitos do perdão judicial concedido para um dos crimes, se não restou comprovada, quanto ao outro, a existência do liame subjetivo entre o infrator e a outra vítima fatal. Ex: o réu, dirigindo seu veículo imprudentemente, causa a morte de sua noiva e de um amigo; o fato de ter sido concedido perdão judicial para a morte da noiva não significará a extinção da punibilidade no que tange ao homicídio culposo do amigo.
STJ. 6ª Turma. REsp 1444699-RS, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, julgado em 1/6/2017 (Info 606).
Qual é o valor máximo considerado insignificante no caso de crimes tributários?
20 mil reais
Cabe a aplicação do princípio da insignificância nas hipóteses de furto qualificado?
COMO REGRA, a aplicação do princípio da insignificância tem sido rechaçada nas hipóteses de furto qualificado, tendo em vista que tal circunstância denota, em tese, maior ofensividade e reprovabilidade da conduta. Deve-se, todavia, considerar as circunstâncias peculiares de cada caso concreto, de maneira a verificar se, diante do quadro completo do delito, a conduta do agente representa maior reprovabilidade a desautorizar a aplicação do princípio da insignificância.
STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 785.755/MT, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 22/11/2016.
Cabe a aplicação do princípio da insignificância nas hipóteses de contrabando?
EM REGRA, é inaplicável o princípio da insignificância ao crime de contrabando, uma vez que o bem juridicamente tutelado vai além do mero valor pecuniário do imposto elidido, alcançando também o interesse estatal de impedir a entrada e a comercialização de produtos proibidos em território nacional. Trata-se, assim, de um delito pluriofensivo.
- STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1744739/RS, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 02/10/2018.*
- STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1717048/RS, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 11/09/2018.*
- STF. 1ª Turma. HC 133958 AgR, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 06/09/2016.*
Vale ressaltar, no entanto, que o STJ possui alguns precedentes admitindo, de forma excepcional, a aplicação deste princípio para o caso de contrabando de pequena quantidade de medicamento para uso próprio: A importação de pequena quantidade de medicamento destinada a uso próprio denota a mínima ofensividade da conduta do agente, a ausência de periculosidade social da ação, o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada, tudo a autorizar a excepcional aplicação do princípio da insignificância.
STJ. 5ª Turma. EDcl no AgRg no REsp 1708371/PR, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 24/04/2018.
O princípio da insignificância se aplica a casos de transmissão clandestina de sinal de internet via radiofrequência?
Súmula 606-STJ: Não se aplica o princípio da insignificância a casos de transmissão clandestina de sinal de internet via radiofrequência, que caracteriza o fato típico previsto no art. 183 da Lei n. 9.472/1997.
Condenação por fato posterior ao crime em julgamento gera maus antecedentes?
Na dosimetria da pena, as condenações por fatos posteriores ao crime em julgamento não podem ser utilizadas como fundamento para valorar negativamente a culpabilidade, a personalidade e a conduta social do réu.
STJ. 6ª Turma. HC 189.385-RS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 20/2/2014 (Info 535).
Folha de antecedentes criminais é um documento válido para comprovar maus antecedentes ou reincidência?
Súmula 636-STJ: A folha de antecedentes criminais é documento suficiente a comprovar os maus antecedentes e a reincidência.
Admite-se o uso de informações processuais extraídas dos sítios eletrônicos dos tribunais a fim de demonstrar a reincidência do réu?
Para fins de comprovação da reincidência, é necessária documentação hábil que traduza o cometimento de novo crime depois de transitar em julgado a sentença condenatória por crime anterior, mas não se exige, contudo, forma específica para a comprovação.
Desse modo, é possível que a reincidência do réu seja demonstrada com informações processuais extraídas dos sítios eletrônicos dos tribunais.
- STJ. 5ª Turma. AgRg no HC 448.972/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 16/08/2018.*
- STF. 1ª Turma. HC 162548 AgR/SP, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 16/6/2020 (Info 982).*
É legítima a utilização da condição pessoal de policial civil como circunstância judicial desfavorável para fins de exasperação da pena-base aplicada a acusado pela prática do crime de concussão?
É legítima a utilização da condição pessoal de policial civil como circunstância judicial desfavorável para fins de exasperação da pena-base aplicada a acusado pela prática do crime de concussão.
Aquele que está investido de parcela de autoridade pública — como é o caso de um juiz, um membro do Ministério Público ou uma autoridade policial — deve ser avaliado, no desempenho da sua função, com maior rigor do que as demais pessoas não ocupantes de tais cargos.
STF. 1ª Turma. HC 132990/PE, rel. orig. Min. Luiz Fux, red. p/ o acórdão Min. Edson Fachin, julgado em 16/8/2016 (Info 835).
“Lucro fácil” e “cobiça” podem ser usados como argumentos para aumentar a pena da concussão e da corrupção passiva?
A obtenção de lucro fácil e a cobiça constituem elementares dos tipos de concussão e corrupção passiva (arts. 316 e 317 do CP), sendo indevido utilizá-las para aumentar a pena-base alegando que os “motivos do crime” (circunstância judicial do art. 59 do CP) seriam desfavoráveis.
STJ. 3ª Seção. EDv nos EREsp 1.196.136-RO, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 24/5/2017 (Info 608).
A agravante do art. 61, II, “h”, do CP aplica-se ao furto praticado aleatoriamente em residência sem a presença do morador idoso?
Art. 61. São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime:
II - ter o agente cometido o crime:
h) contra criança, maior de 60 (sessenta) anos, enfermo ou mulher grávida;
O STJ, contudo, entende que tal agravante não se aplica ao furto praticado aleatoriamente em residência sem a presença do morador idoso.
STJ. 5ª Turma. HC 593.219-SC, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 25/08/2020 (Info 679).
A tenra idade da vítima é fundamento idôneo para a majoração da pena-base do crime de homicídio pela valoração negativa das consequências do crime?
A tenra idade da vítima é fundamento idôneo para a majoração da pena-base do crime de homicídio pela valoração negativa das consequências do crime.
STJ. 3ª Seção. AgRg no REsp 1.851.435-PA, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 12/08/2020 (Info 679).
Quando a confissão for utilizada para a formação do convencimento do julgador, o réu terá necessariamente direito à atenuante prevista no artigo 65, III, d, do Código Penal?
Súmula 545-STJ: Quando a confissão for utilizada para a formação do convencimento do julgador, o réu fará jus à atenuante prevista no artigo 65, III, d, do Código Penal.
Para ter direito à atenuante no caso do crime de tráfico de drogas, é necessário que o réu admita que traficava? E se ele admitir a posse ou propriedade da droga, alegando apenas que era usuário?
Súmula 630-STJ: A incidência da atenuante da confissão espontânea no crime de tráfico ilícito de entorpecentes exige o reconhecimento da traficância pelo acusado, não bastando a mera admissão da posse ou propriedade para uso próprio.
A pena de perdimento deve ser restrita ao cargo ocupado no momento do delito, ou se aplica também ao novo cargo?
A pena de perdimento deve ser restrita ao cargo ocupado ou função pública exercida no momento do delito, à exceção da hipótese em que o magistrado, motivadamente, entender que o novo cargo ou função guarda correlação com as atribuições anteriores.
STJ. 5ª Turma. REsp 1452935/PE, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 14/03/2017 (Info 599).
Há continuidade delitiva entre roubo e extorsão, quando praticados em conjunto?
Não há continuidade delitiva entre os crimes de roubo e extorsão, ainda que praticados em conjunto. Isso porque, os referidos crimes, apesar de serem da mesma natureza, são de espécies diversas.
STF. 1ª Turma. HC 114667/SP, rel. org. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgado em 24/4/2018 (Info 899).
Não há como reconhecer a continuidade delitiva entre os crimes de roubo e o de latrocínio porquanto são delitos de espécies diversas, já que tutelam bens jurídicos diferentes.
STJ. 5ª Turma. AgInt no AREsp 908.786/PB, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 06/12/2016.
Se a pena privativa de liberdade foi fixada no mínimo legal, é possível a fixação de regime inicial mais severo do que o previsto pela quantidade de pena? Ex.: Paulo, réu primário, foi condenado a uma pena de seis anos de reclusão. As circunstâncias judiciais foram favoráveis. Pode o juiz fixar o regime inicial fechado?
NÃO. A posição que prevalece no STJ é a de que, fixada a pena-base no mínimo legal e sendo o acusado primário e sem antecedentes criminais não se justifica a fixação do regime prisional mais gravoso
(STJ. 5ª Turma. AgRg no HC 303.275/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 03/02/2015).
Assim, por exemplo, no crime de roubo, o emprego de arma de fogo não autoriza, por si só, a imposição do regime inicial fechado se, primário o réu, a pena-base foi fixada no mínimo legal.
STJ. 5ª Turma. HC 309.939-SP, Rel. Min. Newton Trisotto (Desembargador convocado do TJ-SC), julgado em 28/4/2015 (Info 562).
O tempo de duração da medida de segurança pode ultrapassar o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado, caso se mostre clinicamente recomendável?
Súmula 527-STJ: O tempo de duração da medida de segurança não deve ultrapassar o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado.
Na aplicação do art. 97 do CP se o agente praticou fato punido com RECLUSÃO, ele receberá, obrigatoriamente, a medida de internação. Por outro lado, se o agente praticou fato punido com DETENÇÃO, o juiz, com base na periculosidade do agente, poderá submetê-lo à medida de internação ou tratamento ambulatorial. Havia quem defendesse, contudo, que em qualquer caso o juiz deveria ter liberdade para decidir pela melhor medida cabível ao inimputável, ainda que o fato fosse punido com reclusão. O caso chegou ao STJ em 2019. O que ele decidiu?
O STJ abrandou a regra legal e construiu a tese de que o art. 97 do CP não deve ser aplicado de forma isolada, devendo analisar também qual é a medida de segurança que melhor se ajusta à natureza do tratamento de que necessita o inimputável.
Em outras palavras, o STJ afirmou o seguinte: mesmo que o inimputável tenha praticado um fato previsto como crime punível com reclusão, ainda assim será possível submetê-lo a tratamento ambulatorial (não precisando ser internação), desde que fique demonstrado que essa é a medida de segurança que melhor se ajusta ao caso concreto.
À luz dos princípios da adequação, da razoabilidade e da proporcionalidade, na fixação da espécie de medida de segurança a ser aplicada não deve ser considerada a natureza da pena privativa de liberdade aplicável, mas sim a periculosidade do agente, cabendo ao julgador a faculdade de optar pelo tratamento que melhor se adapte ao inimputável. Desse modo, mesmo em se tratando de delito punível com reclusão, é facultado ao magistrado a escolha do tratamento mais adequado ao inimputável.
STJ. 3ª Seção. EREsp 998.128-MG, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 27/11/2019 (Info 662).
Acórdão que confirma a pena interrompe a prescrição? E aquele que reduz?
Nos termos do inciso IV do artigo 117 do Código Penal, o acórdão condenatório sempre interrompe a prescrição, inclusive quando confirmatório da sentença de 1º grau, seja mantendo, reduzindo ou aumentando a pena anteriormente imposta. A prescrição é, como se sabe, o perecimento da pretensão punitiva ou da pretensão executória pela inércia do próprio Estado. No art. 117 do Código Penal, que deve ser interpretado de forma sistemática, todas as causas interruptivas da prescrição demonstram, em cada inciso, que o Estado não está inerte.
Não obstante a posição de parte da doutrina, o Código Penal não faz distinção entre acórdão condenatório inicial e acórdão condenatório confirmatório da decisão. Não há, sistematicamente, justificativa para tratamentos díspares.
- STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 1.668.298-SP, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 12/05/2020 (Info 672).*
- STF. Plenário. HC 176473/RR, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 27/04/2020.*
o reconhecimento das qualificadoras de motivo torpe e de feminicídio no crime de homicídio praticado contra mulher em situação de violência doméstica e familiar caracteriza o bis in idem?
Não caracteriza bis in idem o reconhecimento das qualificadoras de motivo torpe e de feminicídio no crime de homicídio praticado contra mulher em situação de violência doméstica e familiar.
Isso se dá porque o feminicídio é uma qualificadora de ordem OBJETIVA - vai incidir sempre que o crime estiver atrelado à violência doméstica e familiar propriamente dita, enquanto que a torpeza é de cunho subjetivo, ou seja, continuará adstrita aos motivos (razões) que levaram um indivíduo a praticar o delito.
STJ. 6ª Turma. HC 433.898-RS, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 24/04/2018 (Info 625).
Até que momento da gestação a interrupção da gravidez provocada pela própria gestante ou com o seu consentimento não será crime, de acordo com o STF?
A interrupção da gravidez no primeiro trimestre da gestação provocada pela própria gestante (art. 124) ou com o seu consentimento (art. 126) não é crime. É preciso conferir interpretação conforme a Constituição aos arts. 124 a 126 do Código Penal – que tipificam o crime de aborto – para excluir do seu âmbito de incidência a interrupção voluntária da gestação efetivada no primeiro trimestre. A criminalização, nessa hipótese, viola diversos direitos fundamentais da mulher, bem como o princípio da proporcionalidade.
STF. 1ª Turma. HC 124306/RJ, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgado em 29/11/2016 (Info 849).
A lesão corporal que provoca na vítima a perda de dois dentes tem natureza grave (art. 129, § 1º, III, do CP), ou gravíssima (art. 129, § 2º, IV, do CP)?
A lesão corporal que provoca na vítima a perda de dois dentes tem natureza grave (art. 129, § 1º, III, do CP), e não gravíssima (art. 129, § 2º, IV, do CP). A perda de dois dentes pode até gerar uma debilidade permanente (§ 1º, III), ou seja, uma dificuldade maior da mastigação, mas não configura deformidade permanente (§ 2º, IV).
STJ. 6ª Turma. REsp 1.620.158-RJ, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 13/9/2016 (Info 590).
Durante a reunião de uma CPI, o então Deputado Federal Jean Wyllys proferiu a seguinte frase: “tem um imaginário impregnado, sobretudo nos agentes das forças de segurança, de que uma pessoa negra e pobre é potencialmente perigosa. É mais perigosa do que uma pessoa branca de classe média. Esse é um imaginário que está impregnado na gente”. O Deputado Federal Eder Mauro publicou, em sua página no Facebook, um vídeo no qual o discurso de Jean Wyllys é editado. No vídeo publicado, a parte inicial e final da frase são cortadas e ouve-se apenas: “Uma pessoa negra e pobre é potencialmente perigosa. É mais perigosa do que uma pessoa branca de classe média”. Para o STF, essa conduta configurou o crime de difamação?
Configura difamação a conduta do agente que publica vídeo de um discurso no qual a frase completa do orador é editada, transmitindo a falsa ideia de que ele estava falando mal de negros e pobres. A edição de um vídeo ou áudio tem como objetivo guiar o espectador e, quando feita com o objetivo de difamar a honra de uma pessoa, configura dolo da prática criminosa. Vale ressaltar que esta conduta do agente, ainda que praticada por Deputado Federal, não estará protegida pela imunidade parlamentar.
Para o STF, essa conduta configurou o crime de difamação agravada.
STF. 1ª Turma. AP 1021/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 18/8/2020 (Info 987).
Rita e Adriana trabalhavam em um órgão público. Rita ligou para o ramal telefônico de Adriana para falar sobre um requerimento de abono de faltas que ela havia solicitado. Adriana avisou, então, que Reginaldo (chefe do setor) havia indeferido o pedido. Ao saber de tal fato, Rita passou a proferir ofensas contra ele, afirmando para Adriana: “este macaco, preto sem vergonha está indeferindo a minha falta”. Vale ressaltar, contudo, que, momentos antes, Reginaldo, que estava no mesmo setor que Adriana, havia retirado o telefone do gancho para fazer uma ligação e acabou por ouvir as palavras injuriosas proferidas por Rita. O Ministério Público ofereceu denúncia contra Rita pela prática do crime de injúria racial (art. 140, § 3º do CP: “se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência: Pena - reclusão de um a três anos e multa”. O caso chegou ao STJ. Para o Tribunal Superior, houve ou não crime de injúria?
Não houve crime. Isso porque o delito de injúria se consuma quando a ofensa chega ao conhecimento da vítima, sendo necessário dolo específico de ofender a honra subjetiva da vítima. A acusada não tinha como saber que a vítima estava ouvindo o teor da conversa pela extensão telefônica. Como a injúria se consuma com a ofensa à honra subjetiva de alguém, não há que se falar em dolo específico no caso em que a vítima não era seu interlocutor na conversa telefônica e, acidentalmente, tomou conhecimento do teor da conversa.
O tipo penal em questão exige que a ofensa seja dirigida ao ofendido com a intenção de menosprezá-lo, ofendendo-lhe a honra subjetiva.
STJ. 6ª Turma. REsp 1.765.673-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 26/05/2020 (Info 672).
Um funcionário público exige, em razão de sua função, vantagem indevida da vítima; dois dias depois, quando a vítima entrega a quantia exigida, há situação de flagrância? Em outras palavras, o crime se consuma com a exigência ou com a entrega da vantagem?
No crime de concussão, a situação de flagrante delito configura-se no momento da exigência da vantagem indevida (e não no instante da entrega). Isso porque a concussão é crime FORMAL, que se consuma com a exigência da vantagem indevida. Assim, a entrega da vantagem indevida representa mero exaurimento do crime que já se consumou anteriormente.
STJ. 5ª Turma. HC 266.460-ES, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 11/6/2015 (Info 564).
Em que momento se consuma o crime de furto? E do roubo?
Consuma-se o crime de FURTO com a posse de fato da res furtiva, ainda que por breve espaço de tempo e seguida de perseguição ao agente, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada.
STJ. 3ª Seção. REsp 1.524.450-RJ, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 14/10/2015 (recurso repetitivo) (Info 572).
Súmula 582-STJ: Consuma-se o crime de ROUBO com a inversão da posse do bem mediante emprego de violência ou grave ameaça, ainda que por breve tempo e em seguida à perseguição imediata ao agente e recuperação da coisa roubada, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada.
Adulterar o sistema de medição da energia elétrica para pagar menos que o devido configura crime de furto ou de estelionato?
A alteração do sistema de medição, mediante fraude, para que aponte resultado menor do que o real consumo de energia elétrica configura estelionato. Ex: as fases “A” e “B” do medidor foram isoladas por um material transparente, que permitia a alteração do relógio fazendo com que fosse registrada menos energia do que a consumida.
STJ. 5ª Turma. AREsp 1.418.119-DF, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 07/05/2019 (Info 648).
Cuidado para não confundir:
- agente desvia a energia elétrica por meio de ligação clandestina (“gato”):crime de FURTO (há subtração e inversão da posse do bem).
- agente altera o sistema de medição para que aponte resultado menor do que o real consumo: crime de ESTELIONATO.
A mudança na ação penal do crime de estelionato, promovida pela Lei 13.964/2019 (exigência de representação da vítima) retroage para alcançar os processos penais que já estavam em curso?
Para a 1ª Turma do STF e a 3ª Seção do STJ, A exigência de representação da vítima no crime de estelionato não retroage aos processos cuja denúncia já foi OFERECIDA.
- STF. 1ª Turma. HC 187341, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 13/10/2020.*
- STJ. 3ª Seção. HC 610.201/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 24/03/2021 (Info 691).*
Para a 2ª Turma do STF, a alteração promovida pela Lei nº 13.964/2019, que introduziu o § 5º ao art. 171 do Código Penal, ao condicionar o exercício da pretensão punitiva do Estado à representação da pessoa ofendida, deve ser aplicada de forma retroativa a abranger tanto as ações penais não iniciadas quanto as ações penais em curso até o trânsito em julgado.
STF. Plenário. HC 180421 AgR/SP, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 22/6/2021 (Info 1023).
O pagamento do débito oriundo de furto de energia elétrica antes do recebimento da denúncia é causa de extinção da punibilidade?
No caso de furto de energia elétrica mediante fraude, o adimplemento do débito antes do recebimento da denúncia não extingue a punibilidade.
O furto de energia elétrica não pode receber o mesmo tratamento dado ao inadimplemento tributário, de modo que o pagamento do débito antes do recebimento da denúncia não configura causa extintiva de punibilidade, mas causa de redução de pena relativa ao arrependimento posterior (art. 16 do CP). Isso porque nos crimes contra a ordem tributária, o legislador (Leis nº 9.249/1995 e nº 10.684/2003), ao consagrar a possibilidade da extinção da punibilidade pelo pagamento do débito, adota política que visa a garantir a higidez do patrimônio público, somente. A sanção penal é invocada pela norma tributária como forma de fortalecer a ideia de cumprimento da obrigação fiscal.
Já nos crimes patrimoniais, como o furto de energia elétrica, existe previsão legal específica de causa de diminuição da pena para os casos de pagamento da “dívida” antes do recebimento da denúncia. Em tais hipóteses, o Código Penal, em seu art. 16, prevê o instituto do ARREPENDIMENTO POSTERIOR, que em nada afeta a pretensão punitiva, apenas constitui causa de diminuição da pena.
Outrossim, a jurisprudência se consolidou no sentido de que a natureza jurídica da remuneração pela prestação de serviço público, no caso de fornecimento de energia elétrica, prestado por concessionária, é de tarifa ou preço público, não possuindo caráter tributário. Não há como se atribuir o efeito pretendido aos diversos institutos legais, considerando que o disposto no art. 34 da Lei nº 9.249/1995 e no art. 9º da Lei nº 10.684/2003 fazem referência expressa e, por isso, taxativa, aos tributos e contribuições sociais, não dizendo respeito às tarifas ou preços públicos.
STJ. 3ª Seção. RHC 101.299-RS, Rel. Min. Nefi Cordeiro, Rel. Acd. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 13/03/2019 (Info 645).
O § 1º do art. 158 do CP prevê que se a extorsão é cometida por duas ou mais pessoas, ou com emprego de arma, a pena deverá ser aumentada de um terço até metade. A extorsão qualificada pela restrição da liberdade da vítima, de seu turno, só vem prevista depois, no § 3º do mesmo artigo. A topologia legal de tais regras gerou dúvidas acerca da aplicação dessa qualificadora. Ela seria aplicável apenas para a extorsão comum, prevista no caput do artigo, ou também seria para a forma qualificada, prevista nos parágrafos subsequentes? Em outras palavras, é possível que o agente seja condenado por extorsão pela restrição da liberdade da vítima (§ 3º) e, na terceira fase da dosimetria, o juiz aumente a pena de 1/3 até 1/2 se o crime foi cometido por duas ou mais pessoas, ou com emprego de arma (§ 1º)?
Em que pese o legislador não ter primado pela melhor técnica ao fazer o arranjo topográfico dos parágrafos nesse artigo, o STJ entende pacificamente ser possível o agente seja condenado por extorsão pela restrição da liberdade da vítima (§ 3º) e, na terceira fase da dosimetria, o juiz aumente a pena de 1/3 até 1/2 se o crime foi cometido por duas ou mais pessoas, ou com emprego de arma (parágrafo 1º).
STJ. 5ª Turma. REsp 1.353.693-RS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 13/9/2016 (Info 590).
A extorsão pode ser praticada mediante a ameaça feita pelo agente de causar um “mal espiritual” na vítima?
Configura o delito de extorsão (art. 158 do CP) a conduta do agente que submete vítima à grave ameaça espiritual que se revelou idônea a atemorizá-la e compeli-la a realizar o pagamento de vantagem econômica indevida.
STJ. 6ª Turma. REsp 1.299.021-SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 14/2/2017 (Info 598).
Inserir informação falsa em currículo Lattes configura crime de falsidade ideológica?
Não é típica a conduta de inserir, em currículo Lattes, dado que não condiz com a realidade. Isso não configura falsidade ideológica (art. 299 do CP).
STJ. 6ª Turma. RHC 81.451-RJ, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 22/8/2017 (Info 610).
Caso concreto: “J” (30 anos) era casado com “M” (20 anos). “J” praticou, durante anos, estupro de vulnerável contra a sua cunhada “L” (criança de 6 anos de idade). “L” era irmã de “M”. Os abusos ocorriam nas vezes em que “L” ia visitar sua irmã. Certo dia, “M” descobriu que os estupros estavam ocorrendo, mas, apesar disso, continuou permitindo que a irmã fosse até a sua casa e que ficasse sozinha na residência com o marido. “M”, a irmã da vítima, responde pelo delito de estupro de vulnerável?
A irmã de vítima do crime de estupro de vulnerável responde por conduta omissiva imprópria se assume o papel de garantidora. Assim, a irmã de “M” responde pelo delito de estupro de vulnerável.
STJ. 5ª Turma. HC 603.195-PR, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 06/10/2020 (Info 681).
Quais crimes contra a dignidade sexual são de ação pública incondicionada?
A Lei nº 13.718/2018 alterou a redação do art. 225 do CP e passou a prever que todos os crimes contra a dignidade sexual são de ação pública incondicionada (sempre). Não há exceções! Veja a nova redação do art. 225 do CP: “Art. 225. Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública incondicionada”.
O “cliente” da exploração sexual (art. 218-B do CP) pode ser punido sozinho, ou seja, mesmo que não haja um proxeneta?
SIM. O delito previsto no art. 218-B, § 2°, inciso I, do Código Penal, na situação de exploração sexual, não exige a figura do terceiro intermediador. A configuração do crime do art. 218-B do CP não pressupõe a existência de terceira pessoa, bastando que o agente, por meio de pagamento, convença a vítima, maior de 14 e menor de 18 anos, a praticar com ele conjunção carnal ou outro ato libidinoso, de modo a satisfazer a sua própria lascívia.
STJ. 3ª Seção. EREsp 1.530.637/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 24/03/2021 (Info 690).
O Código Penal prevê, em seu artigo 273, o crime de falsificação de produto destinado a fins terapêuticos e medicinais. Em seu parágrafo 1º-B, incluído pela Lei 9.677/1998, prevê que “está sujeito às penas deste artigo quem pratica as ações previstas no § 1º [importar, vender, expor à venda] em relação a produtos […] sem registro, quando exigível, no órgão de vigilância sanitária competente”, ampliando apena para tal ação, que antes era de reclusão de 1 a 3 anos, para a pena de reclusão de 10 a 15 anos. O STF foi provocado a se manifestar sobre a constitucionalidade de tal previsão. O que ele disse?
É inconstitucional a aplicação do preceito secundário do art. 273 do Código Penal, com redação dada pela Lei nº 9.677/98 (reclusão, de 10 a 15 anos, e multa), à hipótese prevista no seu § 1º-B, I, que versa sobre a importação de medicamento sem registro no órgão de vigilância sanitária. Para esta situação específica, fica repristinado o preceito secundário do art. 273, na redação originária (reclusão, de 1 a 3 anos, e multa).
STF. Plenário. RE 979962/RS, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 24/3/2021 (Repercussão Geral – Tema 1003) (Info 1011).
É possível falar na configuração do delito de violação de direito autoral apenas com perícia por amostragem do produto, em relação a seus aspectos externos, sem que se identifiquem os titulares dos direitos autorais violados ou daqueles que os representem?
Súmula 574-STJ: Para a configuração do delito de violação de direito autoral e a comprovação de sua materialidade, é suficiente a perícia realizada por amostragem do produto apreendido, nos aspectos externos do material, e é desnecessária a identificação dos titulares dos direitos autorais violados ou daqueles que os representem.
A conduta de atribuir-se falsa identidade perante autoridade policial é típica? E se a conduta for comprovadamente praticada em situação de autodefesa?
Súmula 522-STJ: A conduta de atribuir-se falsa identidade perante autoridade policial é típica, ainda que em situação de alegada autodefesa.
O Código Penal prevê o crime de adulteração de sinal identificador de veículo automotor: “Art. 311. Adulterar ou remarcar número de chassi ou qualquer sinal identificador de veículo automotor, de seu componente ou equipamento”. Nesse contexto, pergunta-se: Adulterar placa de veículo reboque ou semirreboque configura o crime do art. 311 do CP?
A conduta de adulterar placa de veículo reboque ou semirreboque é formalmente atípica. O reboque e o semirreboque são veículos, no entanto, não são veículos automotores. Isso porque veículo automotor é aquele que pode circular por seus próprios meios. O reboque e o semirreboque não conseguem circular por seus próprios meios. Precisam ser “puxados” por um veículo automotor.
STJ. 6ª Turma. RHC 98.058-MG, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 24/09/2019 (Info 657).
Qual crime se configura pelo fomento econômico de candidatura à reeleição por Governador de Estado com o patrimônio de empresas estatais?
Governador do Estado que desvia grande soma de recursos públicos de empresas estatais, utilizando esse dinheiro para custear sua campanha de reeleição, pratica o crime de PECULATO-DESVIO. As empresas estatais gozam de autonomia administrativa e financeira. Mesmo assim, pode-se dizer que o Governador tem a posse do dinheiro neste caso? É possível. Isso porque a posse necessária para configuração do crime de peculato deve ser compreendida não só como a disponibilidade direta, mas também como disponibilidade jurídica, exercida por meio de ordens.
STJ. 5ª Turma. REsp 1.776.680-MG, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 11/02/2020 (Info 666).
A conduta de Defensor Público Geral que deixa de atender à requisição judicial de nomeação de defensor público para atuar em determinada ação penal configura crime de desobediência?
Não configura o crime de desobediência (art. 330 do CP) a conduta de Defensor Público Geral que deixa de atender à requisição judicial de nomeação de defensor público para atuar em determinada ação penal (é preciso lembrar que, à época, a DPE não tinha ainda estrutura vascularizada, como exige a CF, de forma que é sua prerrogativa organizar seus quadros de acordo com as prioridades que entender aplicáveis).
STJ. 6ª Turma. HC 310.901-SC, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 16/6/2016 (Info 586).
O crime de exercício arbitrário das próprias razões é formal ou material? Ele se consuma com o emprego do meio arbitrário, ainda que o agente não consiga satisfazer a sua pretensão?
O crime do art. 345 do CP pune a conduta de “fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão”. O tipo penal afirma que o sujeito age “para satisfazer”. Logo, conclui-se ser suficiente, para a consumação do delito, que os atos que buscaram fazer justiça com as próprias mãos tenham visado obter a pretensão, mas não é necessário que o agente tenha conseguido efetivamente satisfazê-la, por meio da conduta arbitrária. A satisfação, se ocorrer, constitui mero exaurimento da conduta.
Ex: o credor encontrou a devedora na rua e tentou tomar o seu aparelho de celular como forma de satisfazer o débito. Chegou a puxar seu braço e seu cabelo, mas a devedora conseguiu fugir levando o celular. O crime está consumado mesmo ele não tendo conseguido o resultado pretendido.
STJ. 6ª Turma. REsp 1.860.791, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 09/02/2021 (Info 685).
Introduzir chip de aparelho celular em presídio caracteriza qual crime?
A conduta de ingressar em estabelecimento prisional com chip de celular não se subsome ao tipo penal previsto no art. 349-A do Código Penal. Ela é, portanto, atípica.
STJ. 5ª Turma. HC 619.776/DF, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 20/04/2021 (Info 693).
CUIDADO PARA NÃO CONFUNDIR:
A posse de chip de telefone celular pelo preso, dentro de estabelecimento prisional, configura falta disciplinar de natureza grave, ainda que ele não esteja portando o aparelho
(STJ. 5ª Turma. HC 260122-RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 21/3/2013).
foi aberta licitação que era restrita a MEs e EPPs. A empresa “X” tinha um faturamento acima daquilo que a LC 123/2006 estabelecia como sendo o teto para ser considerada EPP. Desse modo, a empresa “X”, segundo a lei vigente na época, não podia ser considerada EPP. Mesmo assim, os sócios da empresa “X” forneceram declaração dizendo que ela se enquadrava como EPP, com o objetivo de fazer com que ela pudesse participar da licitação. Pouco tempo depois, entrou em vigor a LC 139/2011, que aumentou os valores máximos para fins de caracterização como ME ou EPP previstos no art. 3º da LC 123/2006. Com essa mudança, a empresa “X” passou a ser considerada como empresa de pequeno porte. Essas revisões de valores previstos na LC 123/2006 retroagem para descaracterizar o crime de frustração do caráter competitivo de licitação?
As sucessivas revisões dos quantitativos máximos de receita bruta para enquadramento como ME ou EPP, da LC 123/2006, para fazer frente à inflação, não descaracterizam crimes de inserção de informação falsa em documento público, para fins de participação em procedimento licitatório, cometidos anteriormente. Essa alteração legislativa não tem eficácia retroativa, não servindo para absolver os réus pela declaração falsa.
STJ. 5ª Turma. AREsp 1.526.095-RJ, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 08/06/2021 (Info 700).
Pagar remuneração a funcionário fantasma configura qual crime?
O pagamento de remuneração a funcionários fantasmas não configura apropriação ou desvio de verba pública, previstos pelo art. 1º, inciso I, do Decreto-Lei nº 201/67. O pagamento de salário não configura apropriação ou desvio de verba pública, previstos pelo art. 1º, I, do Decreto-Lei nº 201/67, pois a remuneração é devida, ainda que questionável a contratação de parentes do Prefeito. A conduta, portanto, é penalmente atípica.
STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp 1.162.086-SP, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 05/03/2020 (Info 667).
O Decreto-Lei nº 201/1967, em seu artigo 1º, VII, define como crime de responsabilidade dos Prefeitos Municipais “deixar de prestar contas, no devido tempo, ao órgão competente, da aplicação de recursos, empréstimos subvenções ou auxílios internos ou externos, recebidos a qualquer título”. A partir de que momento esse crime se perfectibiliza? Com o mero atraso na prestação de contas?
Se tiver havido a entrega da prestação de contas em momento posterior ao estipulado, mas se não tiver ficado suficientemente demonstrada a intenção de atrasar e de descumprir os prazos previstos para se prestar contas, não haverá crime por falta de elemento subjetivo (dolo).
STJ. 6ª Turma. REsp 1695266/PB, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 23/06/2020 (Info 676).
A Lei nº 7.716/89, que trata de crimes de racismo, pode ser aplicada para punir as condutas homofóbicas e transfóbicas?
- Até que sobrevenha lei emanada do Congresso Nacional destinada a implementar os mandados de criminalização definidos nos incisos XLI e XLII do art. 5º da Constituição da República, as condutas homofóbicas e transfóbicas, reais ou supostas, que envolvem aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade de gênero de alguém, por traduzirem expressões de racismo, compreendido este em sua dimensão social, ajustam-se, por identidade de razão e mediante adequação típica, aos preceitos primários de incriminação definidos na Lei nº 7.716, de 08.01.1989, constituindo, também, na hipótese de homicídio doloso, circunstância que o qualifica, por configurar motivo torpe (Código Penal, art. 121, § 2º, I, “in fine”); 2. A repressão penal à prática da homotransfobia não alcança nem restringe ou limita o exercício da liberdade religiosa, qualquer que seja a denominação confessional professada, a cujos fiéis e ministros (sacerdotes, pastores, rabinos, mulás ou clérigos muçulmanos e líderes ou celebrantes das religiões afro-brasileiras, entre outros) é assegurado o direito de pregar e de divulgar, livremente, pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, o seu pensamento e de externar suas convicções de acordo com o que se contiver em seus livros e códigos sagrados, bem assim o de ensinar segundo sua orientação doutrinária e/ou teológica, podendo buscar e conquistar prosélitos e praticar os atos de culto e respectiva liturgia, independentemente do espaço, público ou privado, de sua atuação individual ou coletiva, desde que tais manifestações não configurem discurso de ódio, assim entendidas aquelas exteriorizações que incitem a discriminação, a hostilidade ou a violência contra pessoas em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero;
- O conceito de racismo, compreendido em sua dimensão social, projeta-se para além de aspectos estritamente biológicos ou fenotípicos, pois resulta, enquanto manifestação de poder, de uma construção de índole histórico-cultural motivada pelo objetivo de justificar a desigualdade e destinada ao controle ideológico, à dominação política, à subjugação social e à negação da alteridade, da dignidade e da humanidade daqueles que, por integrarem grupo vulnerável (LGBTI+) e por não pertencerem ao estamento que detém posição de hegemonia em uma dada estrutura social, são considerados estranhos e diferentes, degradados à condição de marginais do ordenamento jurídico, expostos, em consequência de odiosa inferiorização e de perversa estigmatização, a uma injusta e lesiva situação de exclusão do sistema geral de proteção do direito.
* STF. Plenário. ADO 26/DF, Rel. Min. Celso de Mello; MI 4733/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgados em 13/6/2019 (Info 944).*
A posse ou porte apenas da munição configura crime?
SIM. A posse ou o porte apenas da munição (ou seja, desacompanhada da arma) configura crime. Isso porque tal conduta consiste em crime de perigo abstrato, para cuja caracterização não importa o resultado concreto da ação. O objetivo do legislador foi o de antecipar a punição de fatos que apresentam potencial lesivo à população, prevenindo a prática de crimes.
- STF. 1ª Turma. HC 131771/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 18/10/2016 (Info 844).*
- STJ. 5ª Turma. HC 432.691/MG, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 21/06/2018.*
- STJ. 6ª Turma. HC 484.484/RS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 02/04/2019.*
O entendimento acima exposto configura a regra geral e deve ser adotada nos concursos caso não seja feito nenhum esclarecimento adicional. No entanto, o STF e o STJ, em alguns casos concretos, têm reconhecido, excepcionalmente, o princípio da insignificância para o crime de porte ilegal de pouca quantidade de munição desacompanhada da arma. Confira: “(…) I – Recorrente que guardava no interior de sua residência uma munição de uso permitido, calibre 22. II – Conduta formalmente típica, nos termos do art. 12 da Lei 10.826/2003. III – Inexistência de potencialidade lesiva da munição apreendida, desacompanhada de arma de fogo. Atipicidade material dos fatos. (…)”
STF. 2ª Turma. RHC 143449, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 26/09/2017.
A apreensão de ínfima quantidade de munição, aliada à ausência de artefato apto ao disparo, implica o reconhecimento, no caso concreto, da incapacidade de se gerar de perigo à incolumidade pública.
Hipótese em que, embora formalmente típica, a conduta de possuir apenas duas munições destituídas de potencialidade lesiva, desacompanhadas de armamento capaz de deflagrá-las, não enseja perigo de lesão ou probabilidade de dano aos bens jurídicos tutelados, permitindo-se o reconhecimento da atipicidade material da conduta.
- STJ. 5ª Turma. REsp 1710320/RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 03/05/2018.*
- STJ. 6ª Turma. AgInt no REsp 1704234/RS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 8/2/2018.*
No mesmo sentido:
É atípica a conduta daquele que porta, na forma de pingente, munição desacompanhada de arma.
STF. 2ª Turma. HC 133984/MG, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 17/5/2016 (Info 826).
Portar granada de gás lacrimogêneo ou de pimenta configura crime do Estatuto do Desarmamento?
A conduta de portar granada de gás lacrimogêneo ou granada de gás de pimenta não se subsome (amolda) ao delito previsto no art. 16, parágrafo único, III, da Lei nº 10.826/2003. Isso porque elas não se enquadram no conceito de artefatos explosivos.
STJ. 6ª Turma. REsp 1627028/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 21/02/2017 (Info 599).
Importação de colete à prova de balas configura contrabando?
Configura crime de contrabando (art. 334-A do CP) a importação de colete à prova de balas sem prévia autorização do Comando do Exército.
STJ. 6ª Turma. RHC 62.851-PR, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 16/2/2016 (Info 577).
João possui uma fazenda de 2 mil hectares onde cria 10 mil cabeças de gado. Ele possui um certificado de registro de arma de fogo. Isso significa que ele pode ficar com sua espingarda apenas dentro da casa onde mora com a família (sede da fazenda), ou pode andar com ela por toda a extensão dos 2 mil hectares de sua fazenda?
A Lei 13.870/2019 diz, em seu artigo 5º, §5º, que “aos residentes em área rural, para os fins do disposto no caput deste artigo, considera-se residência ou domicílio toda a extensão do respectivo imóvel rural”. Assim, nesse exemplo, João pode andar com a arma não somente dentro de sua casa (a sede da fazenda) como também por toda a extensão dos 2 mil hectares de sua fazenda.
O falso pode ser absorvido pelo descaminho?
Quando o falso se exaure no descaminho, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido, como crime-fim, condição que não se altera por ser menor a pena a este cominada.
STJ. 3ª Seção. REsp 1.378.053-PR, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 10/8/2016 (Info 587).
Descaminho é crime formal, material ou de mera conduta? Para sua constituição, é necessária a prévia constituição definitiva do crédito tributário?
O descaminho é crime tributário FORMAL. Logo, para que seja proposta ação penal por descaminho não é necessária a prévia constituição definitiva do crédito tributário. Não se aplica a Súmula Vinculante 24 do STF. O crime se consuma com a simples conduta de iludir o Estado quanto ao pagamento dos tributos devidos quando da importação ou exportação de mercadorias.
- STJ. 6ª Turma. REsp 1.343.463-BA, Rel. para acórdão Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 20/3/2014 (Info 548).*
- STF. 2ª Turma. HC 122325, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 27/05/2014.*
É dispensada a existência de procedimento administrativo fiscal com a posterior constituição do crédito tributário para a configuração do crime de descaminho (art. 334 do CP), tendo em conta sua natureza formal.
STF. 1ª Turma. HC 121798/BA, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 29/5/2018 (Info 904).
O contribuinte que deixa de recolher o ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço, incide no tipo penal do art. 2º, II, da Lei nº 8.137/90?
O valor do ICMS cobrado do consumidor não integra o patrimônio do comerciante, o qual é mero depositário desse ingresso de caixa que, depois de devidamente compensado, deve ser recolhido aos cofres públicos. Vale ressaltar, contudo, que, para caracterizar o delito, é preciso comprovar a existência de intenção de praticar o ilícito (dolo).
STF. Plenário. RHC 163334/SC, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 18/12/2019 (Info 964).