Direito Falimentar e Recuperacional - André Flashcards

1
Q

Quais são as principais alterações trazidas pela Lei 11.101\2005?

A

O principal destaque a ser feito acerca da Lei 11.101/2005 está relacionado à clara influência que ela sofreu do princípio da preservação da empresa, o qual, segundo alguns autores, tem origem remota na própria Constituição Federal, que acolheu a valorização do trabalho humano e a livre-iniciativa como princípios jurídicos fundamentais.

Dentre as principais alterações trazidas pela Lei 11.101/2005, já batizada de Lei de Recuperação de Empresas (LRE), podemos citar: (i) a substituição da ultrapassada figura da concordata pelo instituto da recuperação judicial; (ii) o aumento do prazo de contestação, de 24 horas para 10 dias; (iii) a exigência de que a impontualidade injustificada que embasa o pedido de falência seja relativa à dívida superior a 40 salários mínimos; (iv) a redução da participação do Ministério Público no processo falimentar; (v) a alteração de regras relativas ao síndico, que passa a ser chamado agora de administrador judicial; (vi) a mudança na ordem de classificação dos créditos e a previsão de créditos extraconcursais; (vii) a alteração nas regras relativas à ação revocatória; (viii) o fim da medida cautelar de verificação de contas; (ix) o fim do inquérito judicial para apuração de crime falimentar; e (x) a criação da figura da recuperação extrajudicial.

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2
Q

Qual é a natureza jurídica da falência: de direito processual ou de direito material?

A

Resumo

  • Caráter híbrido ou complexo da falência, diante da confluência de normas processuais e materiais no arcabouço jurídico-falimentar.

Livro

O direito falimentar é extremamente complexo, razão pela qual se estabeleceu, há muito tempo, intrigante polêmica acerca da natureza jurídica da falência: afinal, seria ela instituto de direito material ou de direito processual?

Sérgio Campinho, acolhendo ensinamentos de Carvalho de Mendonça, afirma que a discussão em questão é “acadêmica e inócua” e lembra que ela atravessa os mais variados ramos da árvore jurídica, contendo normas “de fundo e de forma, não havendo que se falar na prevalência do caráter material ou processual do instituto, pois a feição híbrida lhe é peculiar”.

Com efeito, a despeito de a falência se desenvolver, conforme já ressaltamos, como uma execução concursal do devedor empresário insolvente, o que lhe confere natureza nitidamente processual, a legislação falimentar também regula, por exemplo, os efeitos da decretação da quebra em relação aos bens, à pessoa, aos contratos e aos atos do falido, situação em que estabelece preceitos de ordem claramente material.

Não há como deixar de reconhecer, pois, o caráter híbrido ou complexo da falência, diante da confluência de normas processuais e materiais no arcabouço jurídico-falimentar.

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3
Q

Quais são os princípios que orientam o processo de falência?

A

Resumo

  • Princípio da preservação da empresa;
  • Princípio da maximização dos ativos;
  • Princípio da celeridade e economia processual.

Livro

Segundo o art. 75 da LRE, “a falência, ao promover o afastamento do devedor de suas atividades, visa a preservar e otimizar a utilização produtiva dos bens, ativos e recursos produtivos, inclusive os intangíveis, da empresa”.

O objetivo primordial do processo falimentar, segundo o dispositivo ora em análise, é “promover o afastamento do devedor de suas atividades” visando a “preservar e otimizar a utilização produtiva dos bens, ativos e recursos produtivos, inclusive os intangíveis, da empresa”. Aqui se destacam dois importantes princípios do Direito Falimentar moderno: (i) o princípio da preservação da empresa e (ii) o princípio da maximização dos ativos.

De fato, sabendo-se que empresa é uma atividade econômica organizada para produção ou circulação de bens ou serviços (art. 966 do Código Civil), nota-se que a decretação da falência do devedor (empresário individual ou sociedade empresária) não acarreta, necessariamente, o fim da atividade (empresa) que ele exercia. Essa atividade (empresa) pode continuar sob a responsabilidade de outro empresário (empresário individual ou sociedade empresária), caso ocorra, por exemplo, a venda do estabelecimento empresarial do devedor, nos termos do art. 140, I, da LRE.

Portanto, é por isso que a lei, no artigo em comento, fala em preservar e otimizar a utilização produtiva dos ativos, mesmo após o afastamento do devedor. Mantendo-se a empresa em funcionamento, evita-se que seus ativos – sobretudo ativos intangíveis, como uma marca – se desvalorizem ou se deteriorem, por exemplo. Isso contribui para que, no curso do processo falimentar, quando for realizada a venda dos bens, consigam-se interessados em adquirir o estabelecimento empresarial do devedor, dando continuidade à atividade que ele desenvolvia (princípio da preservação da empresa). Ademais, evitando-se a desvalorização e a deterioração, consegue-se fazer com que no momento da venda esta seja feita por um preço justo, o que em última análise interessa aos credores da massa, visto que o dinheiro arrecadado será usado para o pagamento de seus créditos (princípio da maximização dos ativos).

Por fim, registre-se também que o artigo em análise, em seu parágrafo único, ainda prevê que “o processo de falência atenderá aos princípios da celeridade e da economia processual”. Com efeito, quanto mais rápido o processo falimentar se desenvolver, melhor será para todos, haja vista que o tempo, nesse caso, só contribui para a desvalorização e a deterioração dos ativos do devedor e para o atraso no pagamento dos credores.

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4
Q

Quais são os pressupostos da falência?

A

Resumo

Pressuposto material subjetivo -> qualidade de empresário do devedor;

Pressuposto material objetivo -> insolvência do devedor;

Pressuposto formal -> sentença de falência.

Livro

A doutrina aponta que são três os pressupostos da falência: o primeiro, denominado de pressuposto material subjetivo, consiste na qualidade de empresário do devedor; o segundo, denominado de pressuposto material objetivo, é consubstanciado na insolvência do devedor; e o terceiro, por fim, denominado de pressuposto formal, é a sentença que a decreta.

Assim sendo, o regime de execução concursal especial a que nos referimos anteriormente só se instaura quando presentes os pressupostos acima listados: o devedor empresário, a sua insolvência e a consequente sentença judicial de decretação da falência.

[…]

Portanto, antes do início do processo falimentar propriamente dito, se estabelece toda uma fase pré-falimentar, que vai do pedido de falência até a sua eventual decretação. É o que passaremos a analisar a seguir.

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5
Q

A LRE aplica-se à sociedade simples?

A

Resumo

  • Não se aplica à sociedade simples, associação cooperativa, fundação, partido político.
  • Só se aplica aos empresários individuais e as sociedades empresárias.
  • Não se aplica aos profissionais liberais.

Livro

[…] desde já fique claro que o uso da expressão devedor, no presente capítulo, é abrangente, englobando tanto o empresário individual quanto as sociedades empresárias, mas é nestas que o estudo vai ser focado, porque são elas, na prática, os principais agentes exploradores de atividade econômica do mercado.

Essa observação é imprescindível, porque a própria LRE possui um defeito gravíssimo, herdado da antiga lei de falência (DL 7.661/1945): a maioria dos seus dispositivos utiliza como referência o empresário individual, o que acaba gerando, para o intérprete, alguma dificuldade.

Da leitura do art. 1.º percebe-se que as regras da LRE não se aplicam a devedores civis, os quais se submetem, quando caracterizada a sua insolvência, às regras do concurso de credores, previstas no Código de Processo Civil. Assim, das pessoas jurídicas de direito privado (art. 44 do CC) apenas as sociedades empresárias e as EIRELI se submetem às regras da LRE. Portanto, uma associação, uma fundação, um partido político, uma organização religiosa ou uma sociedade simples não podem requerer recuperação ou ter sua falência requerida.

O mesmo ocorre com as cooperativas, as quais, por serem sociedades simples, independentemente do seu objeto social (art. 982, parágrafo único, do Código Civil), não podem requerer recuperação nem ter sua falência requerida. […]

Por fim, registre-se que os profissionais liberais (profissionais intelectuais – art. 966, parágrafo único, do Código Civil), em regra não são considerados empresários, não podendo também, pois, requerer recuperação nem ter sua falência requerida.

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6
Q

A LRE é aplicável às empresas estatais?

A

Resumo

  • Havia polêmica antes da LRE, pois a CF exige tratamento idêntico ao de empresas privadas para as empresas pública exploradoras de atividade econômica.
  • Com a LRE, a dúvida foi dissipada: não se submete a falência nem SEM nem EP, ainda que sejam exploradoras de atividade econômica.

Livro

Até a entrada em vigor da LRE, estabeleceu-se certa polêmica acerca da submissão ou não das empresas públicas e das sociedades de economia mista, quando exploradoras de atividade econômica, ao regime jurídico falimentar até então regulado pelo Decreto–lei 7.661/1945. As empresas públicas e sociedades de economia mista são entes integrantes da chamada Administração Pública indireta.

Podem ser prestadoras de serviços públicos ou exploradoras de atividade econômica, hipótese em que funcionam como instrumentos estatais para exploração direta de atividades econômicas, conforme disposto no art. 173, caput, da CF/1988.

A polêmica em foco, portanto, era alimentada, basicamente, pela disposição normativa constante do art. 173, § 1.º, II, da Constituição da República, o qual assim dispõe: “a lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização e bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: (…) II – a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários”.

Interpretando o dispositivo constitucional acima transcrito, defendiam alguns autores que as empresas públicas e sociedades de economia mista, quando constituídas para a exploração de atividade econômica, deveriam submeter-se ao regime jurídico falimentar aplicável às empresas privadas. Contribuiu para esse entendimento se formar a revogação do art. 242 da LSA (Lei 6.404/1976), que expressamente excluía as sociedades de economia mista do procedimento falimentar. Essa revogação reforçou o posicionamento dos que defendiam a sujeição dessas entidades – e paralelamente das empresas públicas – ao regime jurídico falimentar.

Ocorre que, a partir da vigência da LRE, a discussão ganhou novos contornos, porque a referida lei, em seu art. 2.º, I, expressamente determinou que ela não se aplica a “empresa pública e sociedade de economia mista”, sem proceder a qualquer distinção entre as prestadoras de serviços públicos e as exploradoras de atividade econômica. Ademais, a Lei 13.303/2016, que regulamentou o art. 173, § 1.º, II, da CF/1988, silenciou sobre essa questão específica.

Diante de tal fato, pode-se afirmar, com certa segurança, que os regimes falimentar e recuperacional disciplinados na LRE não se aplicam às empresas públicas nem às sociedades de economia mista, ainda que sejam exploradoras de atividade econômica.

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7
Q

Quais sociedades empresariais não se submetem à LRE?

A

Dispõe o art. 2.º, II, da LRE que ela não se aplica a “instituição financeira pública ou privada, cooperativa de crédito, consórcio, entidade de previdência complementar, sociedade operadora de plano de assistência à saúde, sociedade seguradora, sociedade de capitalização e outras entidades legalmente equiparadas às anteriores”. Trata-se, basicamente, de agentes econômicos que atuam em mercados regulados.

A norma em questão deve ser interpretada com cuidado. Não se deve entender, pela simples leitura do dispositivo acima transcrito, que os agentes econômicos nele referidos estão completamente excluídos do regime falimentar estabelecido pela LRE. Na verdade, a situação desses agentes, ao que nos parece, não sofreu alteração, uma vez que eles, de fato, também não se submetiam, em princípio, ao Decreto-lei 7.661/1945, nosso antigo diploma falimentar. Tais agentes possuem, na verdade, leis específicas que disciplinam o tratamento jurídico de sua insolvência, submetendo-os a um processo especial de liquidação extrajudicial. Citem-se, por exemplo, a Lei 6.024/1974, aplicável às instituições financeiras, e o Decreto-lei 73/1966, aplicável às seguradoras.

Ocorre que essas leis específicas, em alguns casos, preveem a aplicação subsidiária da antiga legislação falimentar, como o art. 34 da Lei 6.024/1974, que elege como fonte subsidiária o Decreto-lei 7.661/1945. Pensando nisso, a própria LRE estabeleceu, em seu art. 197, que, “enquanto não forem aprovadas as respectivas leis específicas, esta Lei aplica–se subsidiariamente, no que couber, aos regimes previstos no Decreto-lei n.º 73, de 21 de novembro de 1966, na Lei n.º 6.024, de 13 de março de 1974, no Decreto-lei n.º 2.321, de 25 de fevereiro de 1987, e na Lei n.º 9.514, de 20 de novembro de 1997”.

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8
Q

Quem pode requerer a falência?

A

Segundo o art. 97 da LRE, “podem requerer a falência do devedor: I – o próprio devedor, na forma do disposto nos arts. 105 a 107 desta Lei; II – o cônjuge sobrevivente, qualquer herdeiro do devedor ou o inventariante; III – o cotista ou o acionista do devedor na forma da lei ou do ato constitutivo da sociedade; IV – qualquer credor”.

Observação:

A regra do art. 97, II, da LRE é aplicável ao empresário individual, e não à sociedade empresária.

Se o empresário individual falecer, seus sucessores podem ter interesse em dar continuidade à sua atividade ou não. Caso não tenham interesse em dar continuidade à empresa, em princípio cabe a eles promover o encerramento normal das atividades do empresário individual falecido, dando-se a devida baixa na Junta Comercial competente.

Pode ocorrer, todavia, de os sucessores perceberem que o empresário individual falecido estava em situação de insolvência, cabendo a eles, nesse caso, pedir a sua falência, com base no dispositivo legal em comento.

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9
Q

O devedor é obrigado, em caso de crise econômica insuperável, requerer a falência?

A

Resumo

  • É obrigado, mas não é comum e a lei não prevê qualquer consequência no caso de não cumprimento do dever.

Livro

O pedido de falência feito pelo próprio devedor – chamado de autofalência –, apesar de estar previsto na lei, é hipótese raríssima na prática.

Na verdade, costuma o devedor em crise tomar duas atitudes, basicamente: (i) não aceitar que sua crise é irremediável, insistindo na atividade até ter, eventualmente, a sua falência decretada a pedido de terceiro, normalmente um credor; ou (ii) encerrar o exercício da atividade empresarial, muitas vezes sem a observância das regras legais impostas para tanto. Veja-se que a lei impõe ao devedor o dever de requerer a sua própria falência, determinando em seu art. 105 que “o devedor em crise econômico-financeira que julgue não atender aos requisitos para pleitear sua recuperação judicial deverá requerer ao juízo sua falência, expondo as razões da impossibilidade de prosseguimento da atividade empresarial, acompanhadas dos seguintes documentos: I – demonstrações contábeis referentes aos 3 (três) últimos exercícios sociais e as levantadas especialmente para instruir o pedido, confeccionadas com estrita observância da legislação societária aplicável e compostas obrigatoriamente de: a) balanço patrimonial; b) demonstração de resultados acumulados; c) demonstração do resultado desde o último exercício social; d) relatório do fluxo de caixa; II – relação nominal dos credores, indicando endereço, importância, natureza e classificação dos respectivos créditos; III – relação dos bens e direitos que compõem o ativo, com a respectiva estimativa de valor e documentos comprobatórios de propriedade; IV – prova da condição de empresário, contrato social ou estatuto em vigor ou, se não houver, a indicação de todos os sócios, seus endereços e a relação de seus bens pessoais; V – os livros obrigatórios e documentos contábeis que lhe forem exigidos por lei; VI – relação de seus administradores nos últimos 5 (cinco) anos, com os respectivos endereços, suas funções e participação societária”.

Ocorre que, não obstante a lei imponha ao devedor esse dever, não prevê nenhuma sanção para a hipótese de descumprimento, o que desestimula o devedor a seguir o comando legal.

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10
Q

O credor cujo crédito ainda não venceu pode requerer a falência do devedor?

A

Resumo

  • Sim, bastando demonstrar a ocorrência de uma das hipóteses que justificam a falência;
  • Se o devedor já deixou de pagar outros credores, ele certamente não terá condições de adimplir a dívida que se vencerá mais à frente.

Livro

Ainda sobre o pedido de falência formulado por credor do empresário, há uma questão interessante: é necessário que a dívida do devedor em relação a ele esteja vencida? Parece-nos que não. A obrigação do devedor em relação ao credor que pede a sua falência não precisa sequer estar vencida. Primeiro, porque o pedido de falência pode estar lastreado na prática de um dos atos de falência previstos no art. 94, III, da LRE, caso em que a demonstração inequívoca de que o devedor incidiu em uma daquelas condutas é por si só suficiente à caracterização de sua insolvência. Segundo, porque, se o devedor já está inadimplente, por exemplo, em relação a outros credores, está configurado o interesse de todos os credores – e não apenas dos que possuem títulos inadimplidos – na instauração da execução concursal. Afinal, se o devedor não está pagando seus credores de hoje, nada garante que ele pagará seus credores de amanhã. Ao contrário, tudo indica que ele não o fará.

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11
Q

O credor com garantia de direito real pode requerer a falência antes de executar a garantia?

A

Outra polêmica interessante acerca dos credores legitimados ao pedido de falência do devedor empresário é a relativa aos credores com garantia real. No regime da lei anterior, havia regra expressa disciplinando a questão. Tratava-se do art. 9.º, III, alínea b, segundo o qual esse credor só poderia requerer a falência do devedor se (i) renunciasse a garantia ou (ii) se provasse que a garantia já não era mais suficiente, em razão da depreciação do bem. A atual legislação falimentar silenciou, o que nos leva a crer que agora pode o credor com garantia real requerer a falência do devedor, independentemente de qualquer circunstância. Com efeito, se a lei afirma expressamente que qualquer credor pode requerer a falência do devedor, não cabe excepcionar onde a própria lei assim não o fez.

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12
Q

A Fazenda Pública pode requerer a falência?

A

Por fim, resta ainda a questão de saber se a Fazenda Pública pode requerer a falência do devedor. Não obstante exista controvérsia doutrinária sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça tem diversos precedentes no sentido de que a Fazenda Pública não tem legitimidade, nem interesse de agir, para pedir a falência do devedor. […]

Em suma: entende o STJ que, uma vez que a Fazenda Pública dispõe de instrumento específico para cobrança do crédito tributário, a Lei 6.380/1980 (Lei de Execuções Fiscais), falta-lhe interesse de agir para o pedido de falência. No mesmo sentido, foi aprovado o Enunciado 56 da I Jornada de Direito Comercial do CJF: “A Fazenda Pública não possui legitimidade ou interesse de agir para requerer a falência do devedor empresário”.

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13
Q

Qual o foro competente para o processo de falência?

A

Resumo

  • Segundo a lei, é o do principal estabelecimento do devedor.
  • Para o STJ, principal estabelecimento não é, necessariamente, a sede da sociedade, mas onde ela realiza a maior volume de atividades.

Livro

Vistos acima os sujeitos passivo e ativo do pedido de falência do devedor, resta saber onde deverá ser ajuizado o pedido. Segundo o art. 3.º da LRE, “é competente para homologar o plano de recuperação extrajudicial, deferir a recuperação judicial ou decretar a falência o juízo do local do principal estabelecimento do devedor ou da filial de empresa que tenha sede fora do Brasil”.

O conceito de principal estabelecimento, todavia, não corresponde à noção geral que a expressão suscita inicialmente. De fato, quando se fala em principal estabelecimento, vem em nosso pensamento, de imediato, a ideia de sede estatutária/contratual ou matriz administrativa da empresa. Trata-se, porém, de noção equivocada. Para o direito falimentar, a correta noção de principal estabelecimento está ligada ao aspecto econômico: é o local onde o devedor concentra o maior volume de negócios, o qual, frise-se, muitas vezes não coincide com o local da sede da empresa ou do seu centro administrativo. […]

Em suma, o STJ já decidiu que a expressão principal estabelecimento pode significar (embora os acórdãos sejam anteriores à LRE, o entendimento continua atual): (i) o centro vital das principais atividades do devedor; (ii) local onde o devedor mantém suas atividades e seu principal estabelecimento; (iii) local onde a atividade se mantém centralizada. Nesse sentido, confirase o Enunciado 465 do CJF: “Para fins do Direito Falimentar, o local do principal estabelecimento é aquele de onde partem as decisões empresariais, e não necessariamente a sede indicada no registro público”.

E há uma razão lógica para a regra do art. 3.º da LRE: é no local do principal estabelecimento do devedor onde se encontram, provavelmente, a maioria dos seus clientes e a maior parte do seu patrimônio, o que facilita sobremaneira a instauração do concurso de credores e a arrecadação dos seus bens. Por isso, ademais, que a competência é de natureza absoluta.

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14
Q

Para que se aceite o pedido de falência, é necessária a demonstração de insolvência econômica?

A

Resumo

  • O que autoriza a falência é a verificação de uma das hipóteses da lei. Por isso, alguns dizem que se trata de insovência presumida.
  • Não é necessária a demonstração de situação deficitária da empresa.
  • A LRE adota o sistema da enumeração legal e da impontualidade injustificada.

Livro

No seu sentido técnico/econômico, a insolvência – também chamada de insolvabilidade – é o estado patrimonial do devedor caracterizado pela insuficiência do ativo para saldar o passivo. Assim, o devedor que possui patrimônio negativo – ativo menor que passivo – se diz insolvente. Se ele é empresário, poderá ter a sua falência decretada, a fim de estabelecer a sua execução concursal em obediência ao princípio da par conditio creditorum.

A doutrina costuma apontar, todavia, que a insolvência do empresário, como pressuposto para a decretação da falência, não deve ser compreendida no seu sentido técnico/ econômico acima referido, mas em um sentido jurídico, definido pela própria legislação falimentar. Nesse sentido, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:

(…) A insolvência econômica do devedor não é pressuposto para o requerimento ou decretação da falência. Verificadas as situações fáticas previstas em lei, abre-se aos legitimados a oportunidade para pedir a falência. (…) (REsp 733.060/MG, Rel. Min. Sidnei Beneti, 3.ª Turma, j. 24.11.2009, DJe 02.12.2009).

Cabe à lei, pois, definir os casos específicos em que se admite caracterizada a insolvência do empresário, razão pela qual alguns autores chegam a afirmar que se trata de uma insolvência presumida, mas nem sempre real.

Na doutrina brasileira, já se tornaram clássicas as lições de Rubens Requião acerca dos sistemas de determinação da insolvência existentes, bem como dos sistemas adotados pela legislação falimentar pátria. O autor apontava para a existência de quatro sistemas distintos, afirmando ainda que a legislação brasileira adotava dois deles.

O primeiro sistema é o do <strong>estado patrimonial deficitário</strong>, segundo o qual a insolvência restaria caracterizada quando se constatasse, efetivamente, a insuficiência do ativo do empresário para saldar o seu passivo. Esse sistema, em síntese, exige a demonstração da insolvência econômica do devedor, e por isso recebe duras críticas da doutrina comercialista, não obstante consista no sistema mais preciso e seguro para a real aferição do estado patrimonial do devedor.15 Esse sistema torna o processo pré-falimentar muito lento, em razão da necessidade de adoção de procedimentos contábeis para a análise do patrimônio do empresário. Além disso, ele também pode, em alguns casos, ensejar a decretação da falência de determinado empresário que, embora temporariamente insolvente, seja viável ou recuperável.

O segundo sistema é o da <strong>cessação de pagamentos</strong>, segundo o qual a insolvência do devedor estaria caracterizada quando ele parasse de efetuar o pagamento de suas dívidas, o que indicaria uma situação de impossibilidade de adimplemento das suas obrigações. Veja-se que esse sistema, ao contrário do primeiro, baseia-se fundamentalmente em uma presunção de insolvabilidade, porque em alguns casos a cessação de pagamentos pode significar uma crise temporária, não representando, realmente, um estado patrimonial de insolvência econômica.

O terceiro sistema, por sua vez, é o da <strong>impontualidade injustificada</strong>, segundo o qual o devedor se considera juridicamente insolvente quando não paga, injustificadamente, uma determinada obrigação líquida no seu vencimento. Perceba-se que nesse sistema a insolvência do devedor empresário também é presumida, no entanto, com ainda mais rigor que no sistema anterior, uma vez que neste basta a mera inadimplência isolada de uma dívida, enquanto naquele se exige a inadimplência reiterada.

Por fim, tem-se ainda o<strong> sistema da enumeração legal</strong>, segundo o qual a insolvência do devedor se caracteriza pela prática de determinados atos previstos taxativamente na legislação falimentar: são os chamados atos de falência, que correspondem a comportamentos do devedor que também presumem o seu estado de insolvabilidade, mesmo que ele, eventualmente, não esteja sequer impontual quanto ao pagamento de suas dívidas.

[…]

O Decreto-lei 7.661/1945 adotava dois sistemas para a determinação da insolvência do devedor: o da impontualidade e o da enumeração legal. A sistemática foi mantida pela Lei 11.101/2005, em seu art. 94.

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15
Q

É possível usar a falência como cobrança de dívidas?

A

Resumo

  • Existia discussão antes da LRE sobre essa possibilidade.
  • Havia se criado uma jurisprudência, embora não pacífica, de que pequenos valores não autorizariam o pedido de falência, pois não demonstrariam insolvência, mas mera iliquidez temporária. Falência era situação drástica e havia pouco prazo para defesa, de modo que o pedido podia se mostrar abusivo.
  • Alguns autores, como Fábio Ulhoa, criticavam essa posição.
  • Hoje a lei possibilita o pedido de falência de débito não inferior a 40 salários mínimos, o que é alvo de críticas do André.
  • Credores podem ser reunir em litisconsórcio para atingir o limite.

Livro

De novidade em relação à legislação falimentar anterior tem-se a atual exigência de que a dívida seja superior a 40 salários mínimos. Nesse ponto, fica patente a tentativa do legislador de desestimular o uso da ação de falência como meio de cobrança de dívidas de pequeno valor, visto que elas se prestam a presumir, na verdade, uma situação de iliquidez do devedor (crise temporária, passageira), mas não de insolvência (crise mais séria). Segundo o legislador, as dívidas menores, de até quarenta salários mínimos, não são, por si sós, suficientes para caracterizar uma situação de inviabilidade da empresa, devendo o credor, nesse caso, tentar o recebimento de seu crédito pela via executiva ordinária.

Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça julgou dois recursos especiais (REsp 870.509 e REsp 959.695) que visavam a reformar acórdãos do Tribunal de Justiça de São Paulo que julgaram indevidos pedidos de falência feitos com base em dívidas inferiores a 40 salários mínimos, formulados na vigência da lei anterior (DL 7.661/1945). O STJ manteve as decisões do TJSP, mesmo tendo as ações sido ajuizadas antes da entrada em vigor da LRE. O mesmo aconteceu no REsp 598.881:

Comercial. Recurso especial. Falência. Decreto-lei 7.661/45. Títulos de valor insignificante frente ao princípio da preservação da empresa. Decreto de quebra. Descabimento. Precedentes. I. Nos termos da jurisprudência do STJ, “Apesar de o art. 1.º do Decreto-lei n.º 7.661/45 ser omisso quanto ao valor do pedido, não é razoável, nem se coaduna com a sistemática do próprio Decreto, que valores insignificantes provoquem a quebra de uma empresa. Nessas circunstâncias, há de prevalecer o princípio, também implícito naquele diploma, de preservação da empresa” (REsp 959695/SP, Relatora Ministra Nancy Andrighi, DJe 10/03/2009). Precedentes. II. Recurso especial não conhecido (REsp 598.881/SC, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, 4.ª Turma, j. 15.12.2009, DJe 08.02.2010).

O legislador foi infeliz na redação desse dispositivo, no nosso entender. Por que estabelecer um valor mínimo a priori, ignorando o fato de que no mercado há empresários individuais e sociedades empresárias com situações econômicas completamente distintas? Com efeito, uma dívida de 40 salários mínimos pode não representar nada para uma grande sociedade anônima, mas pode ser uma dívida muito grande para um empresário individual que explora um determinado microempreendimento.

É preciso destacar, porém, que, embora a LRE exija que a dívida seja superior a 40 salários mínimos, ela permite que os credores se reúnam para somar seus créditos, a fim de que o montante ultrapasse tal valor e lhes permita pedir, em litisconsórcio, a falência do devedor. É o que prevê o art. 94, § 1.º, da LRE: “credores podem reunir-se em litisconsórcio a fim de perfazer o limite mínimo para o pedido de falência com base no inciso I do caput deste artigo”.

Comentários meus:

Antes da LRE, havia discussão sobre se a falência poderia ser usada como instrumento de cobrança. Existiam julgados no STJ que afirmavam que sim e outros que não. Diziam alguns que, sendo pouco significativo o débito cobrado, não serviria ele para demonstrar insolvência, mas apenas iliquidez temporária. Vejam-se estes julgados:

Falência. Cobrança. Incompatibilidade. O processo de falência não deve ser desvirtuado para servir de instrumento de coação para a cobrança de dívidas. Considerando os graves resultados que decorrem da quebra da empresa, o seu requerimento merece ser examinado com rigor formal, e afastado sempre que a pretensão do credor seja tão somente a satisfação do seu crédito. Propósito que se caracterizou pelo requerimento de envio dos autos à Contadoria, para apurar o valor do débito, pelo posterior recebimento daquela quantia, acompanhado de pedido de desistência da ação. Recurso conhecido e provido (STJ, REsp 136.565/RS, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJ 14.06.1999, p. 198).

Falência. Requerimento. Pequeno credor. Licitude. Indeferimento. Substituição do processo executivo. Abuso inexistente. 1. O Ordenamento jurídico põe à disposição do credor lesado por inadimplemento de comerciante, dois caminhos, absolutamente lícitos, a saber: a) o primeiro – linear e barato – que é requerer a declaração da falência materializada pelo inadimplemento. Esta via, apesar de mais cômoda, é mais arriscada. De fato, se o devedor por descuido ou falta de dinheiro, não pagar no prazo assinalado, instaura-se o processo falimentar e a nota promissória perde a força executiva, para tornar-se reles título quirografário, despido de qualquer preferência; b) a segunda via é a cobrança executiva. Para percorrê-la, o credor é obrigado a localizar bens do devedor, indicá-los à penhora, pagar o oficial de justiça, para que efetue a citação e, depois, para que consume a penhora. Depois, com o processo suspenso, o exequente é obrigado a esperar o julgamento dos embargos. Por último, decorridos vários anos, é compelido a despender mais dinheiro, para os editais de praça ou leilão. Como se vê, este segundo caminho é consideravelmente lento e dispendioso. Obrigar o pequeno credor a segui-lo é colocar o Poder Judiciário a serviço do mau pagador, em patente injustiça. 2. Para obviar a declaração de falência o comerciante solvente e decente deve resgatar seus títulos, no próprio dia do vencimento. Em caso de protesto, honra a obrigação imediatamente, ou informa ao oficial de protesto, os motivos que justificam o não pagamento. Por exigir decência de todos os comerciantes, o Direito Positivo enxerga na inadimplência um sinal inconfundível de insolvência. 3. Em constatando que o comerciante “sem relevante razão de direito” não pagou, no vencimento, obrigação líquida, constante de título que legitime ação executiva, cumpre ao juiz declarar a falência. Não lhe é lícito furtar-se à declaração, a pretexto de que o credor está usando o pedido de falência, como substitutivo da ação de execução (STJ, 3.ª Turma, REsp 515.285/SC, Rel. Min. Castro Filho, Rel. p/ Acórdão Min. Humberto Gomes de Barros, DJ 07.06.2004, p. 220).

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16
Q

É indispensável o protesto do título judicial para que ele autorize o pedido de falência?

A

Resumo

  • Para formulação do pedido de falência com base na impotualidade, é indispensável o protesto do título que materializa a obrigação inadimplida, seja ele título de crédito, seja ele título judicial. Interpretação do art. 94, I, e pár. 3, da LRE.

Livro

A LRE determina, no § 3.º do art. 94, que, “na hipótese do inciso I do caput deste artigo, o pedido de falência será instruído com os títulos executivos na forma do parágrafo único do art. 9.º desta Lei, acompanhados, em qualquer caso, dos respectivos instrumentos de protesto para fim falimentar nos termos da legislação específica”.

Portanto, fica claro que a única forma de demonstrar a impontualidade injustificada (sem relevante razão de direito, no dizer da lei) é o protesto do título. Não se admite nenhum outro meio de prova – documental, testemunhal ou pericial – para a comprovação do inadimplemento do devedor: apenas o protesto serve a essa finalidade. Sendo assim, qualquer título executivo que o credor possua contra o devedor deve ser levado a protesto, para só depois servir de base ao pedido de falência. Se o título que representa a dívida for um título de crédito, por exemplo, basta o seu protesto cambial, ainda que realizado fora do prazo previsto na legislação cambiária. Se, por outro lado, o título não comporta o protesto cambial – uma sentença ou um contrato, por exemplo –, deve ser tirado o chamado protesto especial para fins de falência. Nesse sentido, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, citando precedente do Supremo Tribunal Federal, que é possível o protesto especial de uma decisão judicial, para fins de instruir o pedido de falência:

Protesto. Título judicial. Pedido de falência. Discute-se a necessidade ou não de protesto de título judicial para postular pedido de falência. O título judicial originou-se de um acordo celebrado em uma medida cautelar de sustação de protesto de outro título. De posse do título judicial inadimplido, pretendeu o recorrente credor o seu protesto para embasar pedido de quebra da devedora recorrida, que a levou ao ajuizamento de uma ação ordinária de cancelamento de protesto, com o deferimento da tutela antecipada, do qual decorre o agravo e o presente recurso. Pretendia o recorrente protestar o título judicial apenas para firmar o descumprimento do acordo, já que inexistia execução anterior, situação em que até se dispensaria o protesto, e forte na letra do art. 10 da LF, que não excepciona do protesto título algum e abarca também os judiciais. No STF, prevaleceu, por maioria, o entendimento que admite o protesto de sentença trabalhista para a instrução do pedido de quebra (RE 81.202-RS, 1.ª Turma). A Turma conheceu em parte do recurso e deu-lhe provimento para autorizar o protesto do título (REsp 252.134/SP, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, j. 25.11.2002).

[…]

Tratando-se de cheque, o protesto é indispensável, mesmo que nele conste a declaração de devolução da instituição financeira. É que essa declaração substitui o protesto para fins cambiais, mas não substitui o protesto para fins de falência.

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17
Q

Cite alguns dos assim chamados atos de falência.

A

Além de permitir o pedido de falência do devedor com fundamento na sua impontualidade injustificada, a legislação falimentar brasileira também possibilita que o pedido seja lastreado na prática dos chamados atos de falência, enumerados no inciso II do art. 94 (execução frustrada) e em rol taxativo constante das alíneas do seu inciso III.

Art. 94. Será decretada a falência do devedor que:

I – sem relevante razão de direito, não paga, no vencimento, obrigação líquida materializada em título ou títulos executivos protestados cuja soma ultrapasse o equivalente a 40 (quarenta) salários-mínimos na data do pedido de falência;

II – executado por qualquer quantia líquida, não paga, não deposita e não nomeia à penhora bens suficientes dentro do prazo legal; [“<em>Atente-se, ademais, que nessa situação a legislação sequer exige valor mínimo para a dívida, como fez na hipótese analisada no tópico antecedente. Assim, qualquer que seja o valor da dívida exequenda, se o devedor incorrer na tríplice omissão apontada, poderá ter sua falência requerida e eventualmente decretada.</em>”]

III – pratica qualquer dos seguintes atos, exceto se fizer parte de plano de recuperação judicial:

a) procede à liquidação precipitada de seus ativos ou lança mão de meio ruinoso ou fraudulento para realizar pagamentos;

b) realiza ou, por atos inequívocos, tenta realizar, com o objetivo de retardar pagamentos ou fraudar credores, negócio simulado ou alienação de parte ou da totalidade de seu ativo a terceiro, credor ou não;

c) transfere estabelecimento a terceiro, credor ou não, sem o consentimento de todos os credores e sem ficar com bens suficientes para solver seu passivo;

d) simula a transferência de seu principal estabelecimento com o objetivo de burlar a legislação ou a fiscalização ou para prejudicar credor;

e) dá ou reforça garantia a credor por dívida contraída anteriormente sem ficar com bens livres e desembaraçados suficientes para saldar seu passivo;

f) ausenta-se sem deixar representante habilitado e com recursos suficientes para pagar os credores, abandona estabelecimento ou tenta ocultar-se de seu domicílio, do local de sua sede ou de seu principal estabelecimento;

g) deixa de cumprir, no prazo estabelecido, obrigação assumida no plano de recuperação judicial.

§ 1º Credores podem reunir-se em litisconsórcio a fim de perfazer o limite mínimo para o pedido de falência com base no inciso I do caput deste artigo.

§ 2º Ainda que líquidos, não legitimam o pedido de falência os créditos que nela não se possam reclamar.

§ 3º Na hipótese do inciso I do caput deste artigo, o pedido de falência será instruído com os títulos executivos na forma do parágrafo único do art. 9º desta Lei, acompanhados, em qualquer caso, dos respectivos instrumentos de protesto para fim falimentar nos termos da legislação específica.

§ 4º Na hipótese do inciso II do caput deste artigo, o pedido de falência será instruído com certidão expedida pelo juízo em que se processa a execução.

§ 5º Na hipótese do inciso III do caput deste artigo, o pedido de falência descreverá os fatos que a caracterizam, juntando-se as provas que houver e especificando-se as que serão produzidas.

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18
Q

A execução frustrada, que autoriza a falência, caracteriza-se quando é nomeado bem para penhora, porém em valor insuficiente para satisfazer o credor? E se o bem é apresentado intempestivamente?

A

Resumo

  • A inércia não precisa ser total.
  • Se o bem é manifestamente insuficiente para cobrir a dívida, cabe o pedido de falência.
  • A nomeação de bem, ainda que intempestiva, impede a falência (STJ).

Livro

Uma observação sobre a execução frustrada deve ser feita. No regime da lei anterior, sempre se entendeu que a configuração da chamada execução frustrada só se daria quando o devedor executado ficasse totalmente inerte. Parece que, com a redação dada ao inciso II do art. 94 da LRE, a situação mudou um pouco. Com efeito, a lei atual afirma que a execução frustrada se caracteriza quando o devedor “não paga, não deposita e não nomeia bens à penhora suficientes”, o que nos leva a crer que não é imprescindível a sua total inércia. Se o devedor executado, por exemplo, nomeia bens manifestamente insuficientes, estaria caracterizada também a execução frustrada, admitindo-se o requerimento de sua falência.

No entanto, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que não se caracteriza execução frustrada quando o devedor apresenta bens à penhora intempestivamente, ou seja, nesse caso o STJ entendeu que só há realmente a execução frustrada se o devedor de fato incidir na tríplice omissão.

(…) A nomeação de bens à penhora na execução singular, ainda que realizada de forma intempestiva, descaracteriza a execução frustrada, circunstância que impede o prosseguimento do pedido de falência com base no art. 2.º, inciso I, da antiga Lei de Quebras. (…) (REsp 741.053/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4.ª Turma, j. 20.10.2009, DJe 09.11.2009).

Da leitura do acórdão fica claro, todavia, que o STJ analisou o caso ainda à luz da legislação falimentar anterior.

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19
Q

Após decretada a falência, algum fato pode autorizar a transformação do processo de falência em processo de recuperação judicial?

A

Resumo

  • Até a contestação do pedido de falência, é possível realizar o pedido de recuperação judicial.
  • Depois de decretada a falência, não cabe mais o benefício da recuperação judicial.
  • Na lei anterior, era possível.

Livro

A matéria de defesa mencionada no inciso VII do art. 96 da LRE (apresentação de pedido de recuperação judicial no prazo da contestação) está expressamente prevista no art. 95 da LRE: “dentro do prazo de contestação, o devedor poderá pleitear sua recuperação judicial”.

A norma em análise prevê um pedido de recuperação judicial incidental ao pedido de falência. Note-se bem que, nesse caso, o devedor ainda não é falido. Esse registro é importante porque a atual legislação falimentar não previu figura semelhante à antiga concordata suspensiva, que o devedor podia requerer mesmo depois de ter sua falência decretada. Na atual lei, ao contrário, a decretação da falência impede o devedor de obter o benefício da recuperação (art. 48, I, da LRE).

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20
Q

O depósito elisivo da falência pode ser usado em todas as hipóteses que autorizam o pedido de falência (art. 94)?

A

Resumo

  • Há divergências na doutrina.
  • Interpretado literalmente o art. 98 da LRE, o autor defende que o depósito elisivo só cabe na hipótese de impontualidade injustificada ou de execução frustrada.

- Fábio Ulhoa e jurisprudência discordam com base numa interpretação extensiva ao artigo.

Livro

No prazo de resposta, o devedor pode elidir a falência, assegurando-se de que o juiz não a decretará de maneira alguma. A elisão da falência é feita com o depósito em juízo do valor da dívida reclamada no pedido falimentar, devidamente corrigido e acrescido de juros e honorários advocatícios. É o que dispõe o art. 98, parágrafo único, da LRE, segundo o qual “nos pedidos baseados nos incisos I e II do caput do art. 94 desta Lei, o devedor poderá, no prazo da contestação, depositar o valor correspondente ao total do crédito, acrescido de correção monetária, juros e honorários advocatícios, hipótese em que a falência não será decretada e, caso julgado procedente o pedido de falência, o juiz ordenará o levantamento do valor pelo autor”.

[…]

Note-se ainda que o início do parágrafo único do art. 98 faz menção apenas aos pedidos de falência fundados na impontualidade injustificada e na execução frustrada, o que nos traz a seguinte questão: caso a falência tenha sido requerida com base na prática dos atos de falência descritos no art. 94, III, da LRE, cabe a elisão da falência, na forma prevista na norma ora em análise? Parece-nos que não. Primeiro, porque a interpretação a contrario sensu do dispositivo não deixa dúvidas: se ele fez referência específica aos incisos I e II, é porque teve a intenção clara e inequívoca de restringir o permissivo legal a esses dois casos. Segundo, porque, nas hipóteses de incidência nas condutas descritas como atos de falência, a presunção de insolvência do devedor independe do fato de ele, eventualmente, estar impontual quanto às suas obrigações. A doutrina e a jurisprudência, todavia, tendem a admitir o depósito elisivo em qualquer caso.

Fábio Ulhoa:

“Embora a lei não o preveja expressamente, deve ser admitido o depósito elisivo também nos pedidos de credor fundados em ato e falência, já que ele afasta a legitimidade do requerente. Assegurado, pelo depósito, o pagamento do crédito por ele titularizado, não tem interesse legítimo na instauração do concurso falimentar.”

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21
Q

É possível, no caso de improcedência do pedido de falência, condenar-se o credor ao pagamento de indenização na próprio processo de falência?

A

Resumo

  • Sim, segundo o art. 101 da LRE:” Quem por dolo requerer a falência de outrem será condenado, na sentença que julgar improcedente o pedido, a indenizar o devedor, apurando-se as perdas e danos em liquidação de sentença.”
  • Logo, o simples requerimento da falência não basta para fixação de indenização.

Livro

Quando a falência é denegada em razão da improcedência do pedido de falência, como o pedido do autor foi julgado improcedente pelo juiz, cabe a ele arcar com os ônus da sucumbência (custas e honorários advocatícios). E mais: de acordo com o art. 101 da LRE, o juiz poderá condenar o autor a pagar indenização ao devedor se entender que a ação falimentar foi requerida por dolo manifesto daquele, caso em que as perdas e danos serão apurados em liquidação de sentença. O § 1.º do referido dispositivo o complementa, determinando que, “havendo mais de 1 (um) autor do pedido de falência, serão solidariamente responsáveis aqueles que se conduziram na forma prevista no caput deste artigo”.

A regra do art. 101 da LRE tem uma finalidade clara e bastante justa: desestimular os pedidos de falência maliciosos, por meio dos quais o autor pretende apenas causar constrangimento ao devedor. Em termos processuais, tem-se em vista coibir a litigância de má-fé ou a litigância temerária. Devese ressaltar, porém, que nem todo pedido de falência julgado improcedente acarretará a imposição de tal indenização. Isso só deve acontecer quando o juiz da causa verificar que houve a intenção do autor do pedido de causar constrangimento ao réu. Nesse sentido, o STJ, à luz da legislação antiga (art. 20, parágrafo único do DL 7.661/1945), afastou o dolo do credor pelo fato de a lei exigir a demonstração do elemento subjetivo e nexo de causalidade para que se justifique a condenação, sendo insuficiente a simples propositura da ação falimentar para a caracterização destes (REsp 512.399/PE, Rel. Min. Luís Felipe Salomão, DJ 15.12.2008).

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22
Q

O devedor pode impugnar o pedido de falência e, ao mesmo tempo, realizar o depósito elisivo?

A

O segundo fundamento em que se pode basear a sentença denegatória da falência é a realização regular e tempestiva do depósito elisivo. É claro que o devedor pode fazer o depósito elisivo e contestar. Nesse caso, cabe ao juiz analisar os seus argumentos. Se acolhê-los, a falência será denegada não em razão do depósito elisivo, mas da improcedência do pedido do autor. Se o juiz, todavia, não acolher os argumentos do devedor, deveria, em tese, decretar a sua falência. Mas, como foi feito o depósito elisivo, ele a denegará, mandando o autor levantar a importância depositada.

Nesse caso, o pedido do autor foi julgado procedente, mas ainda assim a falência será denegada, em obediência ao disposto no art. 98, parágrafo único, da LRE, que já analisamos

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23
Q

A decisão que decreta a falência é uma sentença ou uma decisão intelocutória?

A

Resumo

  • Há divergência na doutrina sobre o assunto.
  • Para André, a decisão que decreta a falência “não põe fim à fase cognitiva do procedimento comum nem extingue a execução”, de modo que não poderia ser considerada sentença, nem mesmo sob a vigência do CPC\2015.
  • A doutrina majoritária, contudo, entende que se trata de sentença.

Livro

Em primeiro lugar, cabe-nos perquirir se a sentença que decreta a falência do devedor se trata de ato judicial que pode realmente ser encaixado na categoria de sentença. De acordo com a doutrina e a sistemática processualista tradicionais, sentença era o ato judicial que encerrava o processo, com ou sem julgamento do mérito (antiga redação do art. 162, § 1.º, do Código de Processo Civil de 1973). Nesse sentido, era difícil entender a decisão que decreta a falência como uma sentença, visto que ela não encerra o processo falimentar, mas, ao contrário, dá início a ele. De fato, o processo falimentar se inicia com a sentença que decreta a quebra: ela é, pois, o seu ato inicial.

A reforma do processo de execução, levada a efeito pela Lei 11.232/2005, alterou a redação do art. 162, § 1.º, do Código de Processo Civil de 1973, o qual passou a designar a sentença como o ato do juiz que implica alguma das situações previstas nos seus arts. 267 e 269. O novo CPC, por sua vez, dispõe em seu art. 203, § 1.º, que “sentença é o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução”. Parece-nos, pois, que ainda assim fica difícil entender a decisão que decreta a falência, tecnicamente, como uma sentença. Afinal, ela não põe fim à fase cognitiva do procedimento comum nem extingue a execução. Como exposto no parágrafo anterior, a decisão que decreta a falência apenas dá início ao processo falimentar, o qual só se encerrará, realmente, após a realização do ativo, o pagamento dos credores e a apresentação do relatório final por parte do administrador judicial (vide art. 156 da LRE).

INTERNET

No que tange à decisão que julga procedente a ação de falência, parte da doutrina sustenta que é uma decisão interlocutória, como também há, majoritariamente, doutrinadores que sustentam que este ato do juiz seria uma sentença. Assim, salienta-se que a própria Lei n.º 11.101/05 não padroniza a terminologia que dá a este pronunciamento judicial, chamando às vezes de decisão, como nos artigos 99, parágrafo único, e 100, ambos da supracitada lei, e, às vezes, de sentença, conforme consta nos artigos 99, caput, e 180 da aludida lei.

Entretanto, não há dúvidas que a decisão que julga procedente a ação de falência se trata de uma sentença, seguindo o que diz a doutrina majoritária.

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24
Q

Qual é a natureza jurídica da decisão que decreta a falência?

A

Resumo

  • Segundo o entendimento doutrinário majoritário e o STJ, a sentença possui natureza constitutiva.
  • Cabe ação rescisória contra decisão que decreta a falência. Necessidade de interpretação ampla do conceito de “mérito”.

Livro

A legislação falimentar anterior e boa parte da doutrina comercialista se referem à sentença que decreta a falência como sentença declaratória da falência, o que também não corresponde, tecnicamente, à realidade. De fato, as sentenças declaratórias são aquelas que apenas declaram a existência de determinada relação jurídica ou apenas atestam a falsidade ou autenticidade de determinado documento. Seus efeitos, portanto, são retroativos. Já as sentenças constitutivas são aquelas que criam, modificam ou extinguem certa relação jurídica.

Diante disso, não há como negar que a sentença que decreta a falência possui natureza constitutiva, conforme entendimento majoritário na doutrina, dado que é ela que constitui o devedor em estado falimentar e instaura o regime de execução concursal do seu patrimônio. Assim, pois, “a sentença declaratória da falência não é declaratória, mas constitutiva, porque altera as relações entre os credores em concurso e a sociedade devedora falida, ao fazer incidir sobre elas as normas específicas do direito falimentar”.

No julgamento do REsp 1.780.442, a Terceira Turma do STJ enfrentou essa questão sobre a natureza jurídica da decisão que decreta a falência, com a finalidade de definir o cabimento de ação rescisória contra ela.

O entendimento doutrinário foi confirmado pela decisão do STJ: “o ato decisório que decreta a falência possui natureza de sentença constitutiva, pois sua prolação faz operar a dissolução da sociedade empresária, conduzindo à inauguração de um regime jurídico específico. Doutrina. Inteligência do art. 99 da Lei 11.101/2005”.

Assim, como o art. 485 do CPC/1973 (aplicável ao caso) previa o cabimento de ação rescisória contra sentenças de mérito, entendeu-se que a decisão que decreta a falência se enquadra no permissivo legal, inclusive porque “a doutrina e a jurisprudência, desde há muito, entendem que à expressão ‘sentença’, veiculada no dispositivo precitado [art. 485 do CPC/1973), deveria ser conferida uma abrangência mais ampla”.

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25
Q

O que é o termo legal de falência e o período suspeito?

A

Resumo

  • Termo legal de falência, também chamado de período suspeito, é o período, antes da decretação da falência, em que “atos eventualmente praticados pelo falido são considerados suspeitos de fraude e, por isso, suscetíveis de investigação, podendo vir a ser declarados ineficazes em relação à massa” (STJ).

Livro

Uma das medidas mais importantes tomadas pelo juiz quando da decretação da falência do devedor é a fixação do termo legal da falência, conforme o que dispõe o inciso II do art. 99 da LRE.

Tratando-se, por exemplo, de pedido de falência fundado na impontualidade injustificada (art. 94, I), o termo legal deve ser fixado pelo juiz da seguinte maneira: na data da decretação da sentença (por exemplo, 08.05.2007), considera-se a data do primeiro protesto por falta de pagamento (por exemplo, 25.10.2006) – não necessariamente a do protesto do título que embasa a falência, mas a do primeiro protesto feito contra o devedor – retrotraindo-a por até 90 dias (no exemplo em questão, voltaríamos ao dia 27.07.2006). O período compreendido entre 27.07.2006 e 08.05.2007 corresponderia ao chamado termo legal da falência, que a doutrina, encampando uma expressão criada por Carvalho de Mendonça, também denomina de período suspeito.

Se o pedido é fundado na prática de atos de falência, considerar-seá a data do próprio pedido de falência, retrotraindo-a por até 90 dias. Se, todavia, a decretação é decorrente da convolação de recuperação em falência, considerar-se-á a data do respectivo requerimento da recuperação, também a retrotraindo por até 90 dias.

Sobre a importância e a finalidade da fixação do termo legal da falência, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça:

(…) O termo legal da falência estabelece o espaço de tempo imediatamente anterior à declaração da falência dentro do qual os atos eventualmente praticados pelo falido são considerados suspeitos de fraude e, por isso, suscetíveis de investigação, podendo vir a ser declarados ineficazes em relação à massa. (…) (REsp 752.624/PR, Rel. Min. Sidnei Beneti, 3.ª Turma, j. 10.11.2009, DJe 23.11.2009).

A fixação do termo legal, portanto, delimita um lapso temporal imediatamente anterior à decretação da falência que será investigado pelos credores do devedor. Afinal, como bem destaca a doutrina, a decretação da quebra nunca pega o devedor de surpresa. Geralmente, como a falência é precedida de uma crise econômica lenta e gradual, o empresário devedor ou os sócios da sociedade empresária devedora, muitas vezes desesperados pela iminente possibilidade de instauração do processo falimentar, podem praticar atos que prejudiquem os interesses de credores, na tentativa de salvaguardar certos bens que poderiam, no futuro, ser arrecadados para a massa falida e servir ao pagamento das dívidas.

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26
Q

A LRE confere ao Juiz o poder geral de cautela para adotar que medidas?

A

O inciso VII do art. 99 da LRE confere ao juízo que decreta a falência um poder geral de cautela que lhe permite: (i) tomar medidas que salvaguardem os interesses das partes; (ii) decretar a prisão preventiva do empresário individual falido ou dos administradores da sociedade empresária falida; e (iii) autorizar a continuação provisória das atividades do devedor.

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27
Q

O administrador judicial é considerado funcionário público para fins penais?

A

Resumo

Sim, é considerado.

Livro

O principal auxiliar do juiz na condução do processo falimentar é o administrador judicial, que a legislação anterior chamava de síndico. Além de exercer as diversas atribuições de cunho administrativo que a lei lhe reserva (vide extenso rol do art. 22 da LRE), o administrador também é o representante legal da chamada massa falida subjetiva, comunidade de credores que se instala com a decretação da falência. Trata-se, enfim, de pessoa a quem o ordenamento jurídico-falimentar incumbiu tarefas relevantes, razão pela qual ele é considerado funcionário público para fins penais.

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Q

Qual é o valor limite da remuneração do administrador judicial?

A

Resumo

Sociedades empresárias normais: 5%

EPP ou ME: 2%

Livro

O valor da remuneração “não excederá 5% (cinco por cento) do valor devido aos credores submetidos à recuperação judicial ou do valor de venda dos bens na falência” (art. 24, § 1.º, da LRE), exceto no caso de microempresas e empresas de pequeno porte, para as quais a remuneração fica reduzida ao limite de 2% (dois por cento), conforme preceitua o art. 24, § 5.º, da LRE, com redação determinada pela LC 147/2014.

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Q

É obrigatória a instalação do Comitê de Credores? Qual é a sua composição?

A

Resumo

  • O Comitê de Credores não é orgão obrigatório.
  • Será composto de quatro pesssoas (uma indicada pelos credores trabalhistas; uma indicada pelos credores não sujeitos a rateio, ou seja, credores com garantia real e com privilégio especial; uma indicada pelos credores quirografários e com privilégio geral; e uma indicada pelos credores que são ME ou EPP)

Livro

De acordo com o art. 99, XII, o juiz, na sentença que decretar a falência, “determinará, quando entender conveniente, a convocação da assembleia geral de credores para a constituição de Comitê de Credores, podendo ainda autorizar a manutenção do Comitê eventualmente em funcionamento na recuperação judicial quando da decretação da falência”.

[…]

O comitê de credores é um importante órgão criado pela atual legislação falimentar. Sua criação se coaduna com a intenção do legislador de aumentar a participação dos credores nos processos que envolvem a crise do empresário.

Perceba-se que o comitê não é um órgão obrigatório nos processos de falência (bem como nos processos de recuperação, como veremos). O próprio juiz pode entender ser conveniente a sua criação (art. 99, XII), caso em que convocará a assembleia para que eleja os seus membros, respeitando-se a regra do dispositivo ora em análise. Quando não houver comitê, o administrador judicial exerce suas atribuições (art. 28).

Assim, o comitê, se houver, terá em regra quatro pessoas (uma indicada pelos credores trabalhistas; uma indicada pelos credores não sujeitos a rateio, ou seja, credores com garantia real e com privilégio especial; uma indicada pelos credores quirografários e com privilégio geral; e uma indicada pelos credores que são ME ou EPP). Cada membro terá dois suplentes. Dissemos que o comitê terá em regra quatro membros porque ele pode funcionar também com número inferior, caso uma das classes de credores não indique representante (§ 1.º). Formado o comitê, seus próprios membros elegerão o presidente (§ 3.º).

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30
Q

Como deve se dar a participação do MP no processo de falência?

A

Resumo

  • Antes da LRE, a participação do Parquet era ampla.
  • Com a LRE, que teve alguns dos artigos foram vetados, a participação do Ministério Público ficou reduzida às hipóteses previstas na lei.
  • Exemplos: casos em que há indícios de responsabilidade penal do devedor (art. 22, § 4.º) e em que for determinada a alienação de bens do devedor (art. 142, § 7.º).
  • Membros do MP não acolheram bem a mudança e continuam propondo a intervenção do MP em todos os processos.

Livro

A participação do membro do Ministério Público nos processos de falência (e também nos processos de recuperação de empresas) é um tema que, após a edição da LRE, trouxe polêmicos debates. Isso porque a legislação falimentar anterior previa, em seu art. 210, uma ampla participação do parquet no processo falimentar e em todas as ações em que a massa fosse parte ou interessada.

A LRE, por sua vez, trazia dispositivo com regra semelhante, que dava ampla atuação do Ministério Público nos processos falimentares e nas demais ações propostas pela massa falida ou contra ela. Tratava-se do art. 4.º, que dispunha o seguinte: “o representante do Ministério Público intervirá nos processos de recuperação judicial e de falência”. No mesmo sentido, o seu parágrafo único estabelecia que, “além das disposições previstas nesta Lei, o representante do Ministério Público intervirá em toda ação proposta pela massa falida ou contra ela”. Ocorre que essas duas normas foram vetadas pelo Poder Executivo.

O veto em referência não deixa dúvidas: a nova legislação falimentar brasileira reduziu sobremaneira a atuação do Ministério Público no processo falimentar, estando ela restrita, agora, aos casos em que a lei expressamente determinar a sua participação – como ocorre, por exemplo, nos casos em que há indícios de responsabilidade penal do devedor (art. 22, § 4.º) e em que for determinada a alienação de bens do devedor (art. 142, § 7.º).

[…]

Infelizmente, o entendimento acima transcrito não é comungado por todos, muito menos pelos próprios membros do parquet. Há notícia, por exemplo, de que no Rio de Janeiro, logo após a edição da lei, foi expedida recomendação formal (Recomendação 01/2005) pela Procuradoria-Geral de Justiça no sentido de que os promotores daquela unidade federativa continuassem atuando da mesma forma que atuavam sob a vigência da lei anterior.

Manoel Justino Bezerra Filho, manifestando opinião da qual discordamos veementemente, também se opõe ao veto ao art. 4º da LRE, afirmando que o mesmo é um reflexo da hipertrofia do Poder Executivo. E o autor vai além, defendendo que “sempre que necessário, o Ministério Público deve ser ouvido, zelando o juiz do processo para que os autos lhes sejam remetidos quando a situação, a critério judicial, assim recomendar”.

Em nossa opinião, o melhor entendimento é o da participação mínima do Ministério Público nos processos de falência (bem como nos processos de recuperação de empresas), sobretudo em obediência ao princípio da celeridade processual consagrado expressamente pelo art. 75, parágrafo único, da LRE. Com efeito, as sucessivas remessas dos autos ao órgão ministerial burocratizam o processo e atrasam a sua tramitação. O parquet só deve ser ouvido, portanto, quando a lei expressamente determinar a sua participação.

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Q

Deve o juiz ouvir o Ministério Público antes de prolatar a sentença que julga o pedido de falência?

A

Resumo

  • Já antes da LRE, dispensava-se a participação do MP na fase pré-falimentar. O STJ manteve esse entendimento após a edição da lei.

Livro

A matéria é extremamente polêmica. Para comprovar tal fato, confiram-se dois julgados recentes do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, com posicionamentos diametralmente opostos.

[…]

Ainda na vigência da lei antiga, entendia o Superior Tribunal de Justiça que era desnecessária a atuação do Ministério Público na chamada fase pré-falimentar (antes da prolação da sentença que denega ou decreta a falência):

(…) O procedimento estabelecido pelo DL n.º 7.661/45 previa, para a fase pré–falimentar, uma instrução sumária, própria das ações executórias, de sorte que, não havendo depósito elisivo e não sendo requerida a concessão do prazo previsto no art. 11, § 3.º, o Tribunal, após afastar os argumentos da defesa, podia de plano decretar a quebra. – Não havia no DL n.º 7.661/45 um único dispositivo que determinasse a intervenção do Ministério Público no processo pré-falimentar. A análise sistemática do art. 15, II, permite concluir que o Ministério Público somente deveria ter ciência do pedido de falência após a prolação da respectiva decisão de quebra. (…) (REsp 867.128/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3.ª Turma, j. 01.10.2009, DJe 18.11.2009).

E o STJ, felizmente, parece inclinado a seguir esse caminho, conforme se observa da leitura dos seguintes julgados:

Processual civil. Ministério Público. Atuação. Ausência. Nulidade. Inexistência. Ação de rescisão de contrato. Falência posterior da autora. Quantia ilíquida. Instrumentalidade das formas. 1 – Ocorrida a falência da autora em outro juízo e somente sete meses depois de ajuizada a presente demanda, onde se postula quantia ilíquida, a participação do Ministério Público é despicienda, sobrelevando a instrumentalidade das formas, apta a afastar eventual nulidade pela ausência de participação do Parquet, máxime em se tratando de direito disponível, que ainda não está em fase de liquidação. 2 – Recurso especial não conhecido (REsp 419.020/MG, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 4.ª Turma, j. 20.10.2009, DJe 09.11.2009). Comercial e processo civil. Pedido de falência ajuizado na vigência do DL n.º 7.661/45. Intervenção do Ministério Público em ação conexa antes do trânsito em julgado da decisão que decreta a quebra. Possibilidade. Anulação do processo. Demonstração de prejuízo. Necessidade. 1. Na vigência do DL 7.661/45 era possível a intervenção do Ministério Público durante todo o procedimento de quebra, inclusive em sua fase pré-falimentar, alcançando também as ações conexas. 2. <strong>Com o advento da Lei 11.101/05, houve sensível alteração desse panorama, sobretudo ante a constatação de que o número excessivo de intervenções do Ministério Público vinha assoberbando o órgão e embaraçando o trâmite das ações falimentares. Diante disso, vetou-se o art. 4.º da Lei 11.101/05, que mantinha a essência do art. 210 do DL 7.661/45, ficando a atuação do Ministério Público, atualmente, restrita às hipóteses expressamente previstas em lei. </strong> 3. Tendo em vista o princípio da instrumentalidade das formas, a anulação do processo falimentar ou de ações conexas por ausência de intervenção ou pela atuação indevida do Ministério Público somente se justifica quando for caracterizado efetivo prejuízo à parte. 4. Recurso especial não provido (REsp 1.230.431/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, j. 18.10.2011, DJe 18.11.2011).

Processo civil. Intervenção do Ministério Público. Lei 11.101/05. Pedido de falência. Fase pré-falimentar. Desnecessidade. 1. <strong>O interesse público que justifica a intervenção do Ministério Público nos procedimentos falimentares não deve ser confundido com a repercussão econômica que toda quebra compreende, ou mesmo com interesses específicos de credores trabalhistas ou fiscais.</strong> 2. Não há, na Lei 11.101/05, qualquer dispositivo que determine a manifestação do Ministério Público em estágio anterior ao decreto de quebra nos pedidos de falência. Recurso especial a que se nega provimento (REsp 1.094.500/DF, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, j. 16.09.2010, DJe 20.10.2010).

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Q

Quais são os efeitos da decretação da falência?

A

Resumo

  • Ver imagem
  • Lembrar que a LRE muitas vezes fala apenas em empresário individual, mas suas normas se aplicam às sociedades empresárias, com as devidas adaptações. Isso ocorre muito no que diz respeito aos efeito da decretação da falência.

- Efeitos quanto à pessoa do devedor:

a) A falência dos sócios ocorre quando se trata de sociedade de responsabilidade ilimitada.
b) A inabilitação da sociedade limitada não atinge seus sócios (se for ilimitada, atinge-os). A inabilitação é automática.
c) Perda do direito de administração dos seus bens.

Efeitos quanto aos bens do devedor:

a) perde-se o direito de retenção de bens, que são passados ao administrador;
b) sócios não podem mais exercer direito de retirada;
c) compensação dos créditos (não se aplica aos transferidos após a falência, salvo se provenientes de cisão, fusão, incorporação ou mortes; nem aos transferidos quando já conhecido o estado de crise ecônomico-financeira);
d) não cabe juros contra a massa falida, se os ativos não bastarem para pagar os credores.
e) os contratos bilaterais não se rompem, necessariamente, por conta da decretação da falência, podendo o administrador judicial dar-lhes cumprimento quando for conveniente a preservação do ativo. Fábio Ulhoa adverte que essa regra só se aplica a contratos cujo cumprimento ainda não foi iniciado. Se a execução do contrato já foi iniciada, o credor deve habilitar seu crédito na falência.

Efeitos quanto aos credores do falido

a) Instauração do juízo universal.
b) Ficam de fora do juízo universal “causas trabalhistas, fiscais e aquelas não reguladas nesta Lei em que o falido figurar como autor ou litisconsorte ativo”. Devem-se acrescentar ainda as ações que demandam quantia ilíquida (art. 6.º, § 1.º, da LRE) e as ações em que for parte União ou entidade federal (art. 109, I, da CF/1988).
c) Suspensão da prescrição e das execuções contra o falido (há exceções).

Livro

Efeitos quanto à pessoa do devedor:

1) Dissolução da sociedade

Como o estudo da falência, no presente capítulo, está enfocando preponderantemente as sociedades empresárias, o primeiro efeito da falência a ser destacado é, logicamente, a dissolução da sociedade. Afinal, com a decretação da quebra e a instauração do processo de execução concursal do devedor, haverá o encerramento da atividade empresarial e a consequente liquidação do patrimônio social para o posterior pagamento dos credores.

Mas a falência não atinge apenas a pessoa jurídica. Os membros que a compõem, ou seja, os sócios da sociedade empresária falida, também são atingidos, variando os efeitos sobre as suas pessoas a depender do tipo societário e da função que eles exerciam na sociedade.

Tratando-se de sociedade em que a responsabilidade dos sócios é ilimitada, prevê o art. 81 da LRE que a decretação da falência da sociedade também acarreta a decretação da falência dos sócios: “a decisão que decreta a falência da sociedade com sócios ilimitadamente responsáveis também acarreta a falência destes, que ficam sujeitos aos mesmos efeitos jurídicos produzidos em relação à sociedade falida e, por isso, deverão ser citados para apresentar contestação, se assim o desejarem”. Veja-se que nesse caso a repercussão da falência da sociedade sobre a pessoa dos sócios é tão relevante que a lei determina que eles devem ser também citados quanto aos termos da ação falimentar, para que possam se defender. O dispositivo transcrito ainda determina, em seu § 1.º, que a regra nele prevista “aplica-se ao sócio que tenha se retirado voluntariamente ou que tenha sido excluído da sociedade, há menos de 2 (dois) anos, quanto às dívidas existentes na data do arquivamento da alteração do contrato, no caso de não terem sido solvidas até a data da decretação da falência”. Em se tratando, em contrapartida, de sociedade em que os sócios respondem de forma limitada, eles em princípio não se submetem aos efeitos da falência, uma vez que quem faliu foi a sociedade, pessoa jurídica com existência e patrimônio distintos da pessoa dos sócios. Não obstante, caberá ao juízo da falência apurar eventual responsabilidade pessoal dos quotistas e administradores, conforme regra estabelecida no art. 82 da LRE, segundo a qual “a responsabilidade pessoal dos sócios de responsabilidade limitada, dos controladores e dos administradores da sociedade falida, estabelecida nas respectivas leis, será apurada no próprio juízo da falência, independentemente da realização do ativo e da prova da sua insuficiência para cobrir o passivo, observado o procedimento ordinário previsto no Código de Processo Civil”.

2) Inabilitação do empresário

[…] Mais uma vez é importante destacar a diferença entre o empresário individual e a sociedade empresária. Se a falência atinge um empresário individual, é ele, obviamente, que sofrerá o efeito específico do dispositivo legal em comento. No entanto, se a falência atinge uma sociedade empresária, a situação é diferente, uma vez que quem faliu foi a própria sociedade, e não seus sócios.

Assim, o empresário individual que vai à falência ou o sócio de responsabilidade ilimitada de uma sociedade que tem sua falência decretada, por exemplo, ficam impedidos de exercer qualquer atividade empresarial até que suas obrigações sejam consideradas extintas por sentença transitada em julgado.

Ressalte-se que essa inabilitação é automática, iniciando-se com a decretação da falência e terminando com a sentença de encerramento do processo falimentar (art. 156 da LRE). No entanto, deve-se ressalvar a hipótese de o falido ser condenado por crime falimentar, caso em que referida condenação também lhe impõe a pena acessória de inabilitação empresarial, e nesse caso essa inabilitação só cessará cinco anos após a extinção da punibilidade, nos termos do art. 181 da LRE.

3) Perda do direito de administração dos bens

Outro efeito importante da falência sobre a pessoa do devedor é a perda do direito de administração dos seus bens e da disponibilidade sobre eles, o que está previsto no art. 103 da LRE: “Desde a decretação da falência ou do sequestro, o devedor perde o direito de administrar os seus bens ou deles dispor”. A lei prevê apenas que o falido “poderá, contudo, fiscalizar a administração da falência, requerer as providências necessárias para a conservação de seus direitos ou dos bens arrecadados e intervir nos processos em que a massa falida seja parte ou interessada, requerendo o que for de direito e interpondo os recursos cabíveis” (parágrafo único).

Afinal, caso a falência não esteja sendo bem administrada, não são apenas os credores que serão prejudicados, mas também o próprio devedor, que tem a legítima expectativa de ver suas dívidas rapidamente honradas, na medida do possível, para que possa pedir no futuro a extinção de suas obrigações e voltar, eventualmente, a exercer atividade empresarial.

Efeitos quanto aos bens do devedor:

a) De acordo com o art. 116 da LRE, “a decretação da falência suspende: I – o exercício do direito de retenção sobre os bens sujeitos à arrecadação, os quais deverão ser entregues ao administrador judicial; II – o exercício do direito de retirada ou de recebimento do valor de suas quotas ou ações, por parte dos sócios da sociedade falida”.

A decretação da falência também acarreta “o vencimento antecipado das dívidas do devedor e dos sócios ilimitada e solidariamente responsáveis, com o abatimento proporcional dos juros, e converte todos os créditos em moeda estrangeira para a moeda do País, pelo câmbio do dia da decisão judicial” (art. 77 da LRE).

Ademais, prescreve o art. 122 da LRE que “compensam-se, com preferência sobre todos os demais credores, as dívidas do devedor vencidas até o dia da decretação da falência, provenha o vencimento da sentença de falência ou não, obedecidos os requisitos da legislação civil”. A regra do art. 122, todavia, não é absoluta, uma vez que o seu parágrafo único estabelece que “não se compensam: I – os créditos transferidos após a decretação da falência, salvo em caso de sucessão por fusão, incorporação, cisão ou morte; ou II – os créditos, ainda que vencidos anteriormente, transferidos quando já conhecido o estado de crise econômico-financeira do devedor ou cuja transferência se operou com fraude ou dolo”.

Por fim, determina o art. 124 da LRE que “contra a massa falida não são exigíveis juros vencidos após a decretação da falência, previstos em lei ou em contrato, se o ativo apurado não bastar para o pagamento dos credores subordinados”. Assim, em princípio fica suspensa a fluência de juros contra o devedor falido. Todavia, uma vez realizado o ativo e verificando-se que a massa possui recursos suficientes para saldar todos os seus credores, inclusive os subordinados, computam-se os juros normalmente e a massa deve pagá-los, conforme entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça.

b) Os contratos do falido

Ao contrário do que se possa imaginar, os contratos do devedor falido não se extinguem de pleno direito em razão da decretação da falência. De acordo com o art. 117 da LRE, “os contratos bilaterais não se resolvem pela falência e podem ser cumpridos pelo administrador judicial se o cumprimento reduzir ou evitar o aumento do passivo da massa falida ou for necessário à manutenção e preservação de seus ativos, mediante autorização do Comitê”. De fato, muitas vezes a manutenção de certos vínculos contratuais pode ser extremamente interessante para a massa, do ponto de vista da maximização do seu ativo, uma vez que da continuidade do contrato podem advir recursos para o devedor, os quais posteriormente serão usados para saldar o seu passivo.

[…]

Ressalte-se, todavia, que, segundo alguns doutrinadores, notadamente Fábio Ulhoa Coelho, embora a redação do art. 117 da LRE não seja clara, ele se refere apenas aos contratos bilaterais que ainda não tiveram sua execução iniciada por qualquer uma das partes contratantes. Assim sendo, “a falência do contratante pode provocar a resolução do contrato em que ambas as partes assumem obrigações (sinalagmático) se a sua execução ainda não teve início por nenhuma delas”.22 Em contrapartida, se a execução do contrato já foi iniciada por alguma das partes, ou por ambas, não poderá ser resolvido o contrato, não se aplicando, nesse caso, a regra do art. 117 acima transcrita. Ocorrendo essa situação, a solução dependerá, segundo o referido autor, da posição assumida pelo devedor falido na relação contratual: (i) se ele é credor, caberá ao administrador judicial tomar as providências necessárias ao recebimento do crédito, que se incorporará à massa; (ii) se ele é devedor, caberá à parte contratante adversa habilitar o seu crédito no processo falimentar, a fim de receber o que lhe for devido no momento oportuno.

Efeito quanto aos credores do falido

a) instauração dos juízo universal

Decretada a falência pelo juízo competente, instaura-se o chamado juízo universal da falência, que atrairá para si todas – na verdade, quase todas – as ações que envolvam o devedor falido. Trata-se do que os doutrinadores chamam de aptidão atrativa do juízo falimentar, que passa a ser o juízo competente para processar e julgar todas as demandas de cunho patrimonial relativas ao devedor.

A matéria está traçada no art. 76 da LRE: “o juízo da falência é indivisível e competente para conhecer todas as ações sobre bens, interesses e negócios do falido, ressalvadas as causas trabalhistas, fiscais e aquelas não reguladas nesta Lei em que o falido figurar como autor ou litisconsorte ativo”. […]

A universalidade do juízo falimentar, todavia, não é absoluta, visto que há certas demandas judiciais, mencionadas no próprio art. 76 da LRE, que não são atraídas para ele: “causas trabalhistas, fiscais e aquelas não reguladas nesta Lei em que o falido figurar como autor ou litisconsorte ativo”. Devem-se acrescentar ainda as ações que demandam quantia ilíquida (art. 6.º, § 1.º, da LRE) e as ações em que for parte União ou entidade federal (art. 109, I, da CF/1988).

Quanto às ações não reguladas pela LRE em que a massa falida atue no polo ativo da relação processual, individualmente ou em litisconsórcio, cumpre frisar que estamos nos referindo apenas às ações não reguladas na LRE. Portanto, nas ações reguladas pela LRE, ainda que a massa falida seja autora ou litisconsorte ativa, o juízo falimentar será o juízo competente para processá-la e julgá-la. É o que ocorre, por exemplo, na hipótese de a massa falida ajuizar ação revocatória (art. 132 da LRE) contra o devedor. Como se trata de ação regulada na própria legislação falimentar, a competência para o seu processamento e julgamento é do juízo universal da falência, não obstante esteja a massa no polo ativo da demanda.

Por fim, vale lembrar que, de acordo com o art. 76, parágrafo único, da LRE, todas as ações do devedor falido, inclusive as que correm fora do juízo universal da falência, “terão prosseguimento com o administrador judicial, que deverá ser intimado para representar a massa falida, sob pena de nulidade do processo”. O administrador judicial passa a ser, pois, o representante legal da massa falida, atuando em juízo na defesa de seus interesses em todos os processos nos quais a mesma seja parte ou interessada.

b) suspensão da prescrição e das execuções contra o falido

No mesmo sentido da regra do art. 76 da LRE, que estabelece a formação do juízo universal da falência, o art. 6.º determina que “a decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário”. Essa suspensão será decretada na própria sentença que decreta a falência, conforme determinação do art. 99, V, da LRE.

Da mesma forma que a universalidade do juízo falimentar não é absoluta, a regra que estabelece a suspensão da prescrição e das ações e execuções contra o devedor falido também admite exceções. Em suma: embora a lei diga que a decretação da falência suspende a prescrição e o curso de “todas” as ações e execuções contra o devedor, a verdade é que não são todas as ações e execuções que se submetem a essa regra.

Ademais, quanto à expressão “sócio solidário” prevista na parte final do art. 6.º da LRE, o STJ tem entendido que ela não se refere aos sócios que, eventualmente, assumem a condição de fiadores ou avalistas da sociedade em determinados negócios jurídicos, mas apenas aos sócios de responsabilidade ilimitada presentes em alguns tipos societários específicos, como a sociedade em nome coletivo, por exemplo. Nesse sentido, foi aprovado o Enunciado 43 da I Jornada de Direito Comercial do CJF: “a suspensão das ações e execuções previstas no art. 6.º da Lei n. 11.101/2005 não se estende aos coobrigados do devedor”.

c)

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33
Q

A LRE impõe alguns deveres ao falido. Qual a consequência do não atendimento a esses deveres?

A

Resumo

A desobediência dos deveres pelo falido importa, depois da devida intimação para cumpri-los, em crime de desobediência.

Lei

Art. 104. A decretação da falência impõe ao falido os seguintes deveres:

I – assinar nos autos, desde que intimado da decisão, termo de comparecimento, com a indicação do nome, nacionalidade, estado civil, endereço completo do domicílio, devendo ainda declarar, para constar do dito termo:

a) as causas determinantes da sua falência, quando requerida pelos credores;

b) tratando-se de sociedade, os nomes e endereços de todos os sócios, acionistas controladores, diretores ou administradores, apresentando o contrato ou estatuto social e a prova do respectivo registro, bem como suas alterações;

c) o nome do contador encarregado da escrituração dos livros obrigatórios;

d) os mandatos que porventura tenha outorgado, indicando seu objeto, nome e endereço do mandatário;

e) seus bens imóveis e os móveis que não se encontram no estabelecimento;

f) se faz parte de outras sociedades, exibindo respectivo contrato;

g) suas contas bancárias, aplicações, títulos em cobrança e processos em andamento em que for autor ou réu;

II – depositar em cartório, no ato de assinatura do termo de comparecimento, os seus livros obrigatórios, a fim de serem entregues ao administrador judicial, depois de encerrados por termos assinados pelo juiz;

III – não se ausentar do lugar onde se processa a falência sem motivo justo e comunicação expressa ao juiz, e sem deixar procurador bastante, sob as penas cominadas na lei;

IV – comparecer a todos os atos da falência, podendo ser representado por procurador, quando não for indispensável sua presença;

V – entregar, sem demora, todos os bens, livros, papéis e documentos ao administrador judicial, indicando-lhe, para serem arrecadados, os bens que porventura tenha em poder de terceiros;

VI – prestar as informações reclamadas pelo juiz, administrador judicial, credor ou Ministério Público sobre circunstâncias e fatos que interessem à falência;

VII – auxiliar o administrador judicial com zelo e presteza;

VIII – examinar as habilitações de crédito apresentadas;

IX – assistir ao levantamento, à verificação do balanço e ao exame dos livros;

X – manifestar-se sempre que for determinado pelo juiz;

XI – apresentar, no prazo fixado pelo juiz, a relação de seus credores;

XII – <strong>examinar e dar parecer sobre as contas do administrador judicial.</strong>

Parágrafo único. Faltando ao cumprimento de quaisquer dos deveres que esta Lei lhe impõe, após intimado pelo juiz a fazê-lo, responderá o falido por crime de desobediência.

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34
Q

A cláusula arbitral impede que uma das partes formule pedido de falência?

A

Resumo

  • Não. A cláusula arbitral não impede a execução do título e, com ainda mais razão, o pedido de falência.

Livro

Havendo a decretação da falência, algumas questões que envolvem a arbitragem suscitam polêmica. Por exemplo: a existência de cláusula arbitral, que, como se sabe, afasta a atuação do Poder Judiciário para solução de litígios decorrentes daquele contrato, impedem que uma das partes requeira a decretação da falência da outra? A Terceira Turma do STJ entendeu que não. Decidiu-se que é possível a decretação de falência na hipótese de inadimplemento de títulos de crédito ligados a contrato no qual há previsão de convenção de arbitragem, visto que o inadimplemento serve de base tanto para dar início à execução por quantia certa quanto para fundamentar pedido de falência, sendo certo, ademais, que a convenção de arbitragem em nada afeta a executividade dos títulos de crédito, nem constitui causa impeditiva da deflagração do procedimento falimentar perante o Poder Judiciário. Confira-se a ementa do acórdão:

Direito processual civil e falimentar. Recurso especial. Embargos de declaração. Omissão, contradição ou obscuridade. Não ocorrência. Pedido de falência. Inadimplemento de títulos de crédito. Contrato com cláusula compromissória. Instauração prévia do juízo arbitral. Desnecessidade. (…) 2 – A convenção de arbitragem prevista em contrato não impede a deflagração do procedimento falimentar fundamentado no art. 94, I, da Lei n. 11.101/05. 3 – <strong>A existência de cláusula compromissória, de um lado, não afeta a executividade do título de crédito inadimplido. De outro lado, a falência, instituto que ostenta natureza de execução coletiva, não pode ser decretada por sentença arbitral. Logo, o direito do credor somente pode ser exercitado mediante provocação da jurisdição estatal.</strong> 4 – Admite-se a convivência harmônica das duas jurisdições – arbitral e estatal –, desde que respeitadas as competências correspondentes, que ostentam natureza absoluta. Precedente. 5 – Recurso especial não provido (REsp 1.277.725/AM, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3.ª Turma, j. 12.03.2013, DJe 18.03.2013).

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Q

Decretada a falência, o processo arbitral em andamento deve ser suspenso?

A

Resumo

  • O entendimento majoritário é de que a arbitragem não se suspende, aplicando-se a ela a ressalva do art. 6.º, § 1.º, da LRE, que assim determina: “terá prosseguimento no juízo no qual estiver se processando a ação que demandar quantia ilíquida”.

Livro

Outra questão que se tem debatido é a seguinte: decretada a falência, caso exista procedimento arbitral já em curso, ele deve ser suspenso, nos termos do art. 6.º, caput, da LRE? O entendimento majoritário é de que a arbitragem não se suspende, aplicando–se a ela a ressalva do art. 6.º, § 1.º, da LRE, que assim determina: “terá prosseguimento no juízo no qual estiver se processando a ação que demandar quantia ilíquida”. Assim, o procedimento arbitral continua normalmente até que seja decidido. Se a decisão do árbitro impuser uma condenação pecuniária ao falido, o crédito será habilitado no processo falimentar, exatamente como ocorre com qualquer ação que demanda quantia ilíquida.

Pode ainda o árbitro, no curso do procedimento arbitral, determinar ao juízo falimentar a reserva de valores, nos termos do art. 6.º, § 3.º, da LRE. Vale salientar, porém, que nesses casos as partes provavelmente terão que abrir mão do sigilo que normalmente envolve os processos arbitrais, não apenas para permitir ao juízo arbitral a comunicação ao juízo falimentar (art. 6.º, §§ 3.º e 6.º, da LRE), mas também em nome do princípio da transparência que deve ser sempre observado nas demandas concursais.

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36
Q

O que ocorre com as execuções individuais após sua suspensão em razão da instauração da falência?

A

Sobre essa regra do art. 6.o e sua aplicação no caso de falência, a Terceira Turma do STJ entendeu que a suspensão das execuções individuais contra o devedor falido (art. 6.o, caput e art. 99, inciso V da LRE) só deve ser mantida enquanto houver possibilidade de reforma da decisão que decretou a falência.

Após isso, as execuções devem ser extintas. Decidiu-se que “exceto na hipótese de a decisão que decreta a falência ser reformada em grau de recurso, a suspensão das execuções terá força de definitividade, correspondendo à extinção do processo.” (REsp 1564021/MG).

Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário.

§ 1º Terá prosseguimento no juízo no qual estiver se processando a ação que demandar quantia ilíquida.

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37
Q

O que ocorre com a ação trabalhista após a instauração da falência?

A

Resumo

  • Ela continua seu curso até definição do crédito.
  • Contudo, o cálculo do crédito deve levar em conta a data da decretação da falência.
  • O juiz trabalhista pode determinar a reserva de valores na falência para evitar prejuízos ao reclamante.

Livro

Vê-se, pois, que o STJ decidiu que, uma vez decretada a quebra, as reclamações trabalhistas anteriormente intentadas devem ser ultimadas pela Justiça do Trabalho, que é absolutamente competente para o respectivo julgamento (art. 114 da CF/1988). Entretanto, definitivamente julgados e liquidados os créditos trabalhistas, a respectiva execução deles deve ser remetida ao juízo universal da falência, a quem compete classificar os créditos de acordo com ordem legal, em respeito a par conditio creditorum.

Sobre esse § 2.º do art. 6.º, foi editado o Enunciado 73 na II Jornada de Direito Comercial do CJF: “para que seja preservada a eficácia do disposto na parte final do § 2.º do artigo 6.º da Lei n. 11.101/05, é necessário que, no juízo do trabalho, o crédito trabalhista para fins de habilitação seja calculado até a data do pedido da recuperação judicial ou da decretação da falência, para não se ferir a par conditio creditorum e observarem-se os arts. 49, caput, e 124 da Lei n. 11.101/2005”.

Portanto, tanto as ações que demandam quantia ilíquida quanto as reclamações trabalhistas não se suspendem, continuando a tramitar no respectivo juízo até que se apure o valor do crédito. Todavia, pode ser que a demora na definição dos créditos discutidos nessas ações comprometa o direito dos respectivos credores, sobretudo se o processo de falência tramitar rapidamente. Pensando nisso, previu a LRE, no § 3.º do art. 6.º: “O juiz competente para as ações referidas nos §§ 1.º e 2.º deste artigo poderá determinar a reserva da importância que estimar devida na recuperação judicial ou na falência, e, uma vez reconhecido líquido o direito, será o crédito incluído na classe própria”.

Sendo assim, cabe aos interessados – por exemplo, o reclamante – pleitear, perante o juízo em que tramita o seu processo – no caso, o juízo trabalhista –, a reserva de valor. Assim, nesse exemplo dado, o Juiz do Trabalho determinaria ao juízo da falência que reservasse um valor determinado, para que, na eventualidade de aquele reclamante vencer a reclamação trabalhista, não ver frustrado seu direito de crédito em razão de a massa já ter usado seus recursos para pagamento dos demais credores.

Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário.

§ 2º É permitido pleitear, perante o administrador judicial, habilitação, exclusão ou modificação de créditos derivados da relação de trabalho, mas as ações de natureza trabalhista, inclusive as impugnações a que se refere o art. 8º desta Lei, serão processadas perante a justiça especializada até a apuração do respectivo crédito, que será inscrito no quadro-geral de credores pelo valor determinado em sentença.

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38
Q

Considerando que o texto do art. 6.º, § 7.º, da LRE, pode-se dizer que a falência suspende a execução fiscal? Entendendo-se que não se suspende, é correto afirmar que o juiz da execução fiscal pode determinar medidas constritivas contra o falido?

§ 7º As execuções de natureza fiscal não são suspensas pelo deferimento da recuperação judicial, ressalvada a concessão de parcelamento nos termos do Código Tributário Nacional e da legislação ordinária específica.

A

Resumo

  • Há divergência na doutrina.
  • STJ entende que suspensão não se aplica nem no caso de recuperação judicial nem no de falência.
  • A não suspensão da execução, todavia, não autoriza que se realize constrições judiciais no bojo da execução fiscal, sob pena de violação do princípio da igualdade entre os credores. O juiz da execução deverá apenas comunicar o da falência, para que inclua o crédito no quadro-geral de credores.

Livro

Outra exceção prevista à regra de suspensão das ações e execuções contra o devedor falido é relativa às execuções fiscais (Lei 6.830/1980), uma vez que a Fazenda Pública, segundo o art. 187 do Código Tributário Nacional, não se sujeita a nenhum tipo de concurso de credores. Quanto a esse ponto, cumpre destacar que a LRE trouxe, segundo alguns autores, uma importante inovação, ao prever que as execuções fiscais não se suspendem apenas na recuperação judicial, conforme dispõe o art. 6.º, § 7.º, da LRE: “as execuções de natureza fiscal não são suspensas pelo deferimento da recuperação judicial, ressalvada a concessão de parcelamento nos termos do Código Tributário Nacional e da legislação ordinária específica”. Segundo esses autores, pela interpretação a contrario sensu desse dispositivo a decretação da falência suspende o curso da execução fiscal. É o que pensa, por exemplo, Manoel Justino Bezerra Filho, que assim se manifesta:

A nova lei trouxe inovação neste aspecto, pois permite o prosseguimento das execuções fiscais, apenas no caso de recuperação judicial, ressalvando unicamente esta situação no § 7.º do art. 6.º. Dessa forma, no sistema desta nova lei, decretada a falência, suspende-se a execução fiscal. <strong>O art. 187 do CTN, ao dizer que a cobrança judicial do crédito tributário não é sujeita a concurso de credores ou habilitação em falência, não dá permissão para a continuação da execução fiscal – apenas permite que o fisco, independentemente de procedimento de habilitação, informe seu crédito ao juiz da falência, para inclusão no quadro-geral de credores.</strong> Se acaso houver embargos de devedor em andamento, o feito continuará correndo ante o juízo original da execução, apenas até a solução dos embargos, por força o art. 76.

No entanto, o Superior Tribunal de Justiça decidiu, já na vigência da LRE, que a execução fiscal contra a massa falida não se suspende, podendo correr normalmente perante o juízo no qual foi proposta, mesmo que o juízo falimentar seja em outra circunscrição. O crédito fiscal deve, porém, respeitar a ordem de classificação dos créditos prevista na legislação falimentar (art. 83 da LRE).

[…]

De fato, a execução fiscal não deve ser suspensa em razão da decretação da falência do devedor. Aliás, isso é o que dispõe claramente a própria Lei 6.830/1980 (Lei de Execuções Fiscais), em seu art. 5.º: “a competência para processar e julgar a execução da Dívida Ativa da Fazenda Pública exclui a de qualquer outro Juízo, inclusive o da falência, da concordata, da liquidação, da insolvência ou do inventário”. […]

No entanto, embora a execução fiscal não se suspenda, isso não permite que o juízo da execução fiscal determine medidas constritivas contra o patrimônio do devedor após a sua falência, pois isso significaria excluir o crédito tributário da execução concursal falimentar, em clara violação do art. 83, III, da LRE e do princípio da par conditio creditorum. Assim, tomando conhecimento da decretação da quebra, o juízo da execução fiscal deve apenas comunicar ao juízo universal da falência o crédito tributário exequendo, a fim de que seja devidamente incluso no quadro-geral de credores.

Princípio da<em> par conditio creditorum</em>: O princípio<em> par conditio creditorum</em> ou princípio da igualdade entre credores é um princípio geral de Direito que determina que os credores de um devedor devem ser tratados de forma igual, sem prejuízo das diferenciações justificadas por razões objetivas.

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39
Q

Se no momento da decretação da falência, existir execução em andamento na qual já tenha sido penhorado bem do falido, como se deve proceder?

A

Resumo

  • A legislação anterior tratava do tema de forma específica. A LRE foi omissa em relação ao assunto.
  • Continua aplicável, porém, o entendimento formada na vigência da lei antiga: a) se o bem já tiver sido arrematado, só o valor remanescente - ou seja, aquilo que não tenha sido destinado ao credor - será remetido ao juízo da falência; b) se o bem não houver sido levado à hasta pública, deve-se fazê-lo, remetendo depois todo o valor para o juízo da falência.
  • Aplicação do princípio da economia e celeridade processual.
  • A suspensão da ação de execução, portanto, não ocorre no caso em que já há constrição de bem.

Livro

Um tema deveras polêmico relacionado à instauração do juízo universal da falência diz respeito ao tratamento que deve ser dispensado às execuções ajuizadas anteriormente ao decreto de falência nas quais já houve a realização de atos de constrição de bens, por exemplo, a penhora.

A antiga legislação falimentar continha regra específica sobre o assunto. Tratava-se do art. 24, § 1.º, que assim dispunha: “as ações ou execuções individuais dos credores, sob direitos e interesses relativos à massa falida, inclusive as dos credores particulares de sócio solidário da sociedade falida, ficam suspensas, desde que seja declarada a falência até o seu encerramento. § 1.º Achando-se os bens já em praça, com dia definitivo para arrematação, fixado por editais, far-se-á esta, entrando o produto para a massa. Se, porém, os bens já tiverem sido arrematados ao tempo da declaração da falência, somente entrará para a massa a sobra, depois de pago o exequente”. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça tinha inúmeros precedentes […]

Em suma: o STJ entendia que a execução com penhora já realizada deveria prosseguir, com a realização da hasta pública e a consequente venda do bem. No entanto, o produto resultante da alienação dos bens, os quais foram penhorados antes da decretação da falência, deve ser remetido ao juízo universal da falência, a fim de que neste se proceda aos pagamentos de acordo com a ordem legal de preferência dos créditos, respeitando-se o princípio da par conditio creditorum.

A atual legislação, todavia, não contém regra específica. Não obstante, acreditamos que nada impede que se continue entendendo da mesma maneira. Afinal, se os bens foram arrematados antes da decretação da falência, nada justifica que o decreto de quebra posterior determine a remessa ao juízo falimentar do produto arrecadado com a arrematação. Deve-se privilegiar, nesse caso, o credor da execução individual, que teve todo o trabalho de conduzir o processo executivo até os seus atos finais. Assim, somente o eventual saldo remanescente deve ser enviado para a massa. Caso, em contrapartida, ainda não tenha ocorrido a venda do bem, deve-se proceder de forma diversa. Com efeito, nessa situação recomenda-se seja realizada a hasta pública – para que não sejam desperdiçados os atos processuais já praticados até aquele momento –, enviando-se apenas o produto arrecadado para o juízo falimentar. Não há como negar, pois, que nesse caso o credor da execução individual será de certa forma prejudicado, uma vez que todo o seu trabalho será aproveitado pelos demais credores habilitados no juízo da falência. E mais: caso ele não seja um credor privilegiado, pode até nem ser beneficiado com o produto arrecadado com a venda daquele(s) bem(ns) objeto de sua execução individual. Mas se deve agir assim em obediência ao princípio da par conditio creditorum.

Em suma: decretada a falência, a execução de quaisquer créditos contra o devedor falido deve ser feita no juízo universal da falência, ainda que se trate de crédito trabalhista ou tributário. Admite-se o prosseguimento da execução, excepcionalmente, apenas para que se ultimem alguns atos executórios já iniciados, em homenagem aos princípios da economia e celeridade processuais. Mesmo assim, o produto arrecadado deve ser remetido ao juízo falimentar, que o incorporará à massa e pagará os credores segundo a ordem de preferência determinada em lei. Nesse sentido, confiram-se as seguintes decisões do STJ, que explicam muito bem a questão […]

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40
Q

Qual a diferença entre massa falida objetiva e massa falida subjetiva?

A

O grande responsável pelo bom desenvolvimento do processo falimentar é o administrador judicial, que ficará encarregado de proceder, concomitantemente, ao (i) procedimento de arrecadação dos bens do devedor falido, o que dará origem à massa falida objetiva, e ao (ii) procedimento de verificação e habilitação dos créditos, o que dará origem à massa falida subjetiva.

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41
Q

Admite-se a adjudicação na falência?

A

Resumo

  • Sim, mediante autorização judicial.
  • Benefício: aceleração do trâmite falimentar.

Livro

Outra medida que pode ser tomada pelo juiz, com a oitiva prévia do comitê, se houver, é a autorização para que alguns credores, de forma individual ou coletiva, em razão dos custos e no interesse da massa falida, adquiram ou adjudiquem, de imediato, os bens arrecadados, pelo valor da avaliação, atendida a regra de classificação e preferência entre eles (art. 111 da LRE). Essa medida é muitas vezes interessante, porque evita a realização de leilão para a venda dos bens, acelerando o trâmite do processo falimentar.

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42
Q

Os atos praticados com intenção de prejudicar credores devem ser declarados ineficazes ou ter sua nulidade reconhecida? Em outras palavras, trata-se de ineficácia ou de nulidade?

A

Resumo

  • Os atos praticados pelo falido no período suspeito podem ser considerados ineficazes.
  • Nas hipóteses legais do art. 129, os atos serão considerados ineficazes.
  • O art. 130, relativo à ação revocatória, fala em revogação dos atos praticados com a intenção de prejudicar credores.
  • Embora a Lei use o termo “revogação”, o caso é de ineficácia. Tanto assim que o art. 136 atribui as mesmas consequências para os atos referidos no art. 129 e os atos de que cuida o art. 130.
  • Trata-se de ineficácia subjetiva. Pode ocorrer fora do período suspeito. “[…] só terão reconhecida a sua ineficácia se forem provados (i) a intenção de prejudicar os credores, (ii) o conluio fraudulento entre o devedor e o terceiro que contratou com ele e (iii) o real prejuízo da massa.”
  • Isso não ocorre nas hipóteses do art. 129 (ineficácia objetiva).

Livro

A arrecadação dos bens do devedor falido não deve se restringir ao ativo que o devedor possui no momento em que sua falência foi decretada. Afinal, é bem possível que o devedor tenha se desfeito de bens que compunham seu ativo antes da decretação da quebra com o objetivo de evitar que tais bens fossem arrecadados no processo falimentar.

É justamente por esse motivo que, quando estudamos a sentença que decreta a falência do devedor, vimos que uma das principais medidas tomadas pelo juízo falimentar quando da sua prolação consiste na fixação do termo legal da falência, que irá delimitar o chamado período suspeito.

A principal finalidade da fixação do termo legal, como visto, é delimitar um lapso temporal prévio à decretação da falência que será investigado pelos credores, uma vez que durante esse período o empresário individual falido ou os administradores da sociedade empresária falida, por exemplo, pressentindo a futura decretação da quebra e temerosos quanto aos efeitos patrimoniais negativos advindos da instauração do processo falimentar, podem eventualmente ter praticado alguns atos que prejudiquem os interesses de credores.

Diante dessa inexorável realidade, a LRE contempla uma série de regras específicas que estabelecem a ineficácia de certos atos praticados pelo devedor falido antes da decretação da falência, e o reconhecimento da ineficácia desses atos perante a massa, consequentemente, permitirá que mais bens sejam incorporados a ela.

[…]

Antes de analisarmos especificamente os atos objetivamente e subjetivamente ineficazes perante a massa, cumpre esclarecer que há uma relevante diferença entre ineficácia e nulidade. A declaração de ineficácia do ato perante a massa não se confunde com a declaração de sua nulidade.

Os atos da sociedade falida considerados ineficazes pela Lei de Falências não produzem qualquer efeito jurídico perante a massa. Não são atos nulos ou anuláveis, ressalte-se, mas ineficazes. Quer dizer, sua validade não se compromete pela lei falimentar – embora de alguns deles até se pudesse cogitar de invalidação por vício social, nos termos da lei civil. Por isso, os atos referidos pela Lei de Falências como ineficazes diante da massa falida produzem, amplamente, todos os efeitos para os quais estavam preordenados em relação aos demais sujeitos de direito.

É bem verdade que a LRE, repetindo a técnica constante da lei anterior, usa expressões distintas para se referir aos atos objetivamente ineficazes e aos atos subjetivamente ineficazes. No primeiro caso, fala realmente em ineficácia perante a massa, que pode ser reconhecida até mesmo de ofício pelo juiz, enquanto no segundo caso fala em revogação, que só poderia ser reconhecida por meio de ação autônoma, a ação revocatória. Não obstante o uso equivocado da expressão revogação para os atos subjetivamente ineficazes (art. 130 da LRE [“São revogáveis os atos praticados com a intenção de prejudicar credores, provando-se o conluio fraudulento entre o devedor e o terceiro que com ele contratar e o efetivo prejuízo sofrido pela massa falida”]), não é exatamente isso o que ocorre com eles, na verdade. De fato, a consequência jurídica que a LRE atribui, tanto para os atos do art. 129 quanto para os atos do art. 130 é a ineficácia perante a massa, ou seja, trata-se de atos válidos, mas que não produzem nenhum efeito jurídico perante a massa falida.

Corrobora esse nosso entendimento – que, conforme demonstra a transcrição acima, não é isolado, mas compartilhado pela doutrina majoritária – a norma do art. 136 da LRE, segundo a qual “reconhecida a ineficácia ou julgada procedente a ação revocatória, as partes retornarão ao estado anterior, e o contratante de boa-fé terá direito à restituição dos bens ou valores entregues ao devedor”. Veja-se que a lei atribui os mesmos efeitos tanto à hipótese de reconhecimento de ineficácia (art. 129 – atos objetivamente ineficazes) quanto à hipótese de “revogação” decorrente da procedência da ação revocatória (art. 130 – atos subjetivamente ineficazes).

Em conclusão, pode-se dizer, então, que apesar de a LRE usar a expressão revogação para os atos do art. 130, eles são na verdade ineficazes perante a massa, assim como os atos do art. 129. A diferença, conforme será visto adiante, é que estes são objetivamente ineficazes, e aqueles são subjetivamente ineficazes.

OBSERVAÇÃO:

Ineficácia subjetiva: “no caso dos atos subjetivamente ineficazes, não há a previsão específica de condutas típicas do devedor nem a utilização de nenhum marco temporal como referência. Em princípio, portanto, qualquer ato do devedor que os credores julguem encaixar-se na previsão do art. 130 da LRE, independentemente da época de sua prática, pode ser questionado com o requerimento de declaração da sua ineficácia perante a massa.”

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43
Q

Cite alguns dos atos do falido que, segundo a lei, são considerados objetivamente ineficazes.

A

Trata-se do que a doutrina chama de atos objetivamente ineficazes, uma vez que o reconhecimento de sua ineficácia independe da demonstração de fraude do devedor ou de conluio com o terceiro que com ele contratou. Veja-se que os atos objetivamente ineficazes estão previstos em rol taxativo e sua prática, em geral, ocorreu em certo lapso temporal específico – que muitas vezes é justamente o denominado período suspeito, delimitado a partir da fixação do termo legal da falência.

Art. 129. São ineficazes em relação à massa falida, tenha ou não o contratante conhecimento do estado de crise econômico-financeira do devedor, seja ou não intenção deste fraudar credores:

I – o pagamento de dívidas não vencidas realizado pelo devedor dentro do termo legal, por qualquer meio extintivo do direito de crédito, ainda que pelo desconto do próprio título;

II – o pagamento de dívidas vencidas e exigíveis realizado dentro do termo legal, por qualquer forma que não seja a prevista pelo contrato;

III – a constituição de direito real de garantia, inclusive a retenção, dentro do termo legal, tratando-se de dívida contraída anteriormente; se os bens dados em hipoteca forem objeto de outras posteriores, a massa falida receberá a parte que devia caber ao credor da hipoteca revogada;

IV – a prática de atos a título gratuito, desde 2 (dois) anos antes da decretação da falência;

V – a renúncia à herança ou a legado, até 2 (dois) anos antes da decretação da falência;

VI – a venda ou transferência de estabelecimento feita sem o consentimento expresso ou o pagamento de todos os credores, a esse tempo existentes, não tendo restado ao devedor bens suficientes para solver o seu passivo, salvo se, no prazo de 30 (trinta) dias, não houver oposição dos credores, após serem devidamente notificados, judicialmente ou pelo oficial do registro de títulos e documentos;

VII – os registros de direitos reais e de transferência de propriedade entre vivos, por título oneroso ou gratuito, ou a averbação relativa a imóveis realizados após a decretação da falência, salvo se tiver havido prenotação anterior.

OBS: No inciso IV, por sua vez, é prevista como ato objetivamente ineficaz “a prática de atos a título gratuito, desde 2 (dois) anos antes da decretação da falência”. Embora nesse caso não se utilize o termo legal como referência, também se exige, para o reconhecimento da ineficácia do ato, que este tenha sido praticado em determinado lapso temporal prévio à decretação da quebra. Ora, já vimos, no capítulo 2, que é da essência do direito empresarial lidar com situações onerosas, dados a especulação e o intuito lucrativo típicos das atividades econômicas exercidas pelos empresários e pelas sociedades empresárias. O simples fato de o devedor falido ter praticado atos gratuitos, de mera liberalidade, em período no qual, supõe-se, ele já tinha consciência do seu estado de crise, por si só justifica o dispositivo em questão. Devem ser ressalvados, entretanto: (i) os atos gratuitos de valor irrisório, como as doações a entidades beneficentes e os brindes promocionais, e (ii) as gratificações pagas a diretores e empregados.

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44
Q

É eficaz em relação à massa falida a alienação de imóvel de sua propriedade ocorrida dentro do termo legal da falência, também denominado período suspeito, mas anteriormente à declaração da quebra?

A

Resumo

  • É eficaz a venda realizada no período suspeito.
  • A única restrição é que não se pode tranferir o imóvel por meio de registro após a decretação da falência, exceto se tiver havido prenotação do negócio do registro de imóveis.

Livro

Por fim, no inciso VII, a lei prevê a ineficácia objetiva dos “registros de direitos reais e de transferência de propriedade entre vivos, por título oneroso ou gratuito, ou a averbação relativa a imóveis realizados após a decretação da falência, salvo se tiver havido prenotação anterior”. Sabe-se que a oneração ou a alienação de bem imóvel só se aperfeiçoa, produzindo efeitos perante terceiros, depois de devidamente registrada no órgão competente, isto é, o cartório de registro de imóveis. Ora, se até a decretação da falência não tinha sido levado a efeito o registro, ele será completamente ineficaz perante a massa se feito após a sentença de quebra. A única exceção aberta pela norma em questão é a existência de prenotação anterior. Isso nos leva a concluir, pois, a contrario sensu, que a simples operação de venda de bens imóveis do devedor ou a mera constituição de garantia sobre eles, antes da decretação de sua falência – ainda que dentro do período suspeito –, é plenamente válida e eficaz. Esse sempre foi o entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça, conforme demonstram os julgados a seguir transcritos:

Ação revocatória. Art. 52, VII, da Lei de Falências. Precedentes da Corte. 1. Como assentado na jurisprudência da Corte, “inocorrendo demonstração de fraude, <strong>é eficaz em relação à massa falida a alienação de imóvel de sua propriedade ocorrida dentro do termo legal da falência, também denominado período suspeito, mas anteriormente à declaração da quebra</strong>” (REsp n.º 246.667/SP, Relator o Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 14.04.2003; na mesma linha: REsp n.º 168.401/RS, relator o Ministro Barros Monteiro, DJ de 17/2/03; REsp n.º 228.197/SP, de minha relatoria, DJ de 18/12/2000). 2. Recurso especial conhecido e provido. (STJ, REsp 681.798/PR, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 22.08.2005, p. 271).

[…]

Ocorre que, se a venda foi feita, mas o registro respectivo não foi efetuado, não se poderá fazê-lo depois da sentença de quebra. É isso o que a regra em comento preceitua. E a razão para essa regra é bastante simples: caso se admitisse o registro posterior, estar-se-ia abrindo uma brecha perigosa, isto é, permitindo que se forjasse um contrato de compra e venda anterior à sentença, para justificar o registro posterior à quebra. Isso explica, ademais, o fato de a lei fazer uma única ressalva: a existência de prenotação anterior.

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45
Q

De que forma se pode reconhecer a ineficácia do ato descritos no art. 129 da LRE (atos do falido objetivamente ineficazes perante a massa falida)? Há alguma diferença, neste aspecto, entre o ato objetivamente e o subjetivamente ineficaz?

A

Descoberta a prática de um dos atos acima descritos e analisados, “a ineficácia poderá ser declarada de ofício pelo juiz, alegada em defesa ou pleiteada mediante ação própria ou incidentalmente no curso do processo” (art. 129, parágrafo único, da LRE). Trata-se de novidade interessantíssima trazida pela nova legislação falimentar, uma vez que na vigência da legislação anterior o reconhecimento da ineficácia objetiva se submetia ao procedimento da ação revocatória, hoje restrita às hipóteses de ineficácia subjetiva, analisadas adiante.

[…]

Ao contrário do que ocorre com os atos de ineficácia objetiva previstos no art. 129 da LRE, a declaração de ineficácia subjetiva não poderá ser reconhecida de ofício pelo juiz, alegada em defesa ou pleiteada incidentalmente. Nesse caso, será necessário o ajuizamento de ação própria, a chamada ação revocatória, […]

46
Q

De quem é a legitimidade para ajuizar a ação revocatória? Qual é o prazo para o ajuizamento?

A

Resumo

  • A legitimidade, segundo a lei, é do administrador judicial, de qualquer credor e do Ministério Público.
  • Embora a lei diga que o adminitrador é legítimo, ele na verdade atua como represetante da massa falida.
  • O prazo para ajuizamento da ação é de 3 anos.

Livro

Ao contrário do que ocorre com os atos de ineficácia objetiva previstos no art. 129 da LRE, a declaração de ineficácia subjetiva não poderá ser reconhecida de ofício pelo juiz, alegada em defesa ou pleiteada incidentalmente. Nesse caso, será necessário o ajuizamento de ação própria, a chamada ação revocatória, a qual, segundo o art. 132 da LRE, “deverá ser proposta pelo administrador judicial, por qualquer credor ou pelo Ministério Público no prazo de 3 (três) anos contado da decretação da falência”. Aqui houve mais uma novidade importante trazida pela legislação falimentar atual. É que na lei anterior o prazo para a sua propositura era de apenas 1 (um) ano, e a legitimidade ativa, no primeiro mês, era exclusiva do síndico. Na LRE, além de o prazo ter sido aumentado para três anos, a legitimidade, desde o início, é concorrente entre administrador judicial, credores e Ministério Público.

Embora o art. 132 da LRE confira legitimidade ativa ao administrador judicial, a melhor interpretação, de fato, é a de que tal legitimidade é da própria massa falida, agindo o administrador judicial como seu representante – ou presentante. Com efeito, muitas vezes, na prática quem ingressa com a ação é o próprio administrador judicial, em seu nome, e isso, na nossa opinião, configura vício formal sanável, devendo o juiz, com base no art. 321 do CPC/2015, determinar a emenda da inicial para a sua correção, e não extinguir o processo por ilegitimidade ad causam, como fazem alguns magistrados. Nesse sentido, confira-se o seguinte julgado do STJ, o qual, embora tenha analisado a questão à luz da lei antiga, vale também para a lei atual:

Direito falimentar. Ação revocatória. Legitimidade ativa. 1. A redação do art. 55 do antigo Decreto-Lei n. 7.661/1945 gerava dúvidas quanto à legitimidade ativa para a ação revocatória, embora a melhor interpretação fosse a que conferia tal legitimidade à própria massa, agindo o síndico como seu representante. 2. No entanto, o fato de o síndico ingressar com a ação em seu nome configura vício formal sanável, que pode ser corrigido com a determinação de emenda da inicial (art. 284 do CPC). 3. Aplicação, ao caso, do princípio da instrumentalidade das formas. 4. Recurso especial conhecido e provido (STJ, 4.ª T., REsp 919.737/RJ, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, j. 18.10.2011, DJ 24.10.2011).

47
Q

Quem deve figurar no polo passivo da ação revocatória?

A

A ação revocatória, que corre perante o juízo universal da falência e segue o rito comum do Novo Código de Processo Civil (art. 134 da LRE), pode ser ajuizada contra: (i) todos os que figuraram no ato ou que por efeito dele foram pagos, garantidos ou beneficiados; (ii) os terceiros adquirentes, se tiveram conhecimento, ao se criar o direito, da intenção do devedor de prejudicar os credores; (iii) os herdeiros ou legatários das pessoas indicadas nos dois casos ora mencionados (art. 133 da LRE).

48
Q

Praticado por força de decisão judicial o ato, pode sua ineficácia ser reconhecida no processo de falência ou em ação revocatória?

A

Art. 138. O ato pode ser declarado ineficaz ou revogado, ainda que praticado com base em decisão judicial, observado o disposto no art. 131 desta Lei.

Parágrafo único. Revogado o ato ou declarada sua ineficácia, ficará rescindida a sentença que o motivou.

Art. 131. Nenhum dos atos referidos nos incisos I a III e VI do art. 129 desta Lei que tenham sido previstos e realizados na forma definida no plano de recuperação judicial será declarado ineficaz ou revogado.

49
Q

Cite as hipóteses de restituição de bens e valores em poder do falido.

A

Resumo

  • Bem de propriedade de terceiros;
  • Coisa vendida a crédito e entregue ao devedor nos 15 (quinze) dias anteriores ao requerimento de sua falência, se ainda não alienada;
  • Importância entregue ao devedor, em moeda corrente nacional, decorrente de adiantamento a contrato de câmbio para exportação.
  • Valores descontados do salário do empregado relativos à contribuição deste para o INSS.
  • Valores em depósitos bancário não podem ser restituídos.

Livro

O primeiro caso de restituição de bens arrecadados está consagrado no art. 85 da LRE, segundo o qual “o proprietário de bem arrecadado no processo de falência ou que se encontre em poder do devedor na data da decretação da falência poderá pedir sua restituição”. Tem-se, aqui, caso em que o bem arrecadado é de propriedade de terceiro. Pode ser, por exemplo, que o bem tivesse sido entregue ao falido em comodato.

O segundo caso está previsto no art. 85, parágrafo único, da LRE, que dispõe o seguinte: “também pode ser pedida a restituição de coisa vendida a crédito e entregue ao devedor nos 15 (quinze) dias anteriores ao requerimento de sua falência, se ainda não alienada”. Aqui a situação é um pouco diferente. Trata-se de bem que foi vendido a crédito ao falido, entregue a este até quinze dias antes da decretação de sua quebra e ainda não alienado. O objetivo do legislador, nesse caso, foi proteger o terceiro de boa-fé que contratou com o falido às vésperas de sua falência. Afinal, nos quinze dias anteriores à quebra é bastante provável que o empresário devedor ou os administradores da sociedade devedora soubessem da situação de crise da empresa, fato que deveria fazer com que não adquirissem mercadorias a crédito, haja vista a grande possibilidade de não poderem honrar o compromisso assumido.

A terceira hipótese de restituição, por sua vez, está assegurada pelo art. 86, II, da LRE, que faz referência a outro dispositivo normativo. Com efeito, prevê a norma em comento que caberá a restituição em dinheiro “da importância entregue ao devedor, em moeda corrente nacional, decorrente de adiantamento a contrato de câmbio para exportação, na forma do art. 75, §§ 3.º e 4.º, da Lei n.º 4.728, de 14 de julho de 1965, desde que o prazo total da operação, inclusive eventuais prorrogações, não exceda o previsto nas normas específicas da autoridade competente”. Destaque-se que, nesse caso, conforme será reiterado adiante, a restituição deve ser feita em dinheiro. O dispositivo em questão foi uma importante inovação da LRE, mas que tem causado muita polêmica entre os doutrinadores. Enquanto uns o defendem de forma veemente, destacando a importância da reforma do direito falimentar brasileiro para a redução dos juros e o desenvolvimento da economia nacional,32 outros o criticam severamente, vendo nele apenas mais uma medida da lei em defesa do capital financeiro e em detrimento dos demais credores do falido33. Em nossa opinião particular, o dispositivo é bem-vindo. Com efeito, já afirmamos aqui mais de uma vez que um dos principais objetivos da LRE foi conferir mais segurança ao crédito e, com isso, reduzir os juros cobrados nessas operações. Portanto, regras como a ora analisada servem bem a essa finalidade, conferindo a ela um custo-benefício positivo.

[…]

Há ainda uma quarta hipótese de restituição, prevista no art. 86, III, da LRE, que está disciplinada no art. 136 da LRE. Trata-se da situação em que o juiz declara a ineficácia de ato praticado pelo falido antes da decretação da quebra, caso em que “as partes retornarão ao estado anterior, e o contratante de boa-fé terá direito à restituição dos bens ou valores entregues ao devedor”. Sendo assim, “o contratante de boa-fé em cuja propriedade se encontrava bem que, em razão da declaração da ineficácia objetiva ou subjetiva de um ato da sociedade falida, deve retornar à massa, tem o direito de ser compensado pecuniariamente pelo seu prejuízo. Esse direito é exercido por meio de um pedido de restituição”.35 Nesse caso a restituição também será feita em dinheiro, conforme será reiterado no tópico seguinte.

Destaque-se também uma situação especial, relativa aos valores descontados pelo devedor falido no salário de seus empregados, a título de contribuição social para o INSS. De acordo com o art. 51, parágrafo único, da Lei 8.212/1991, nos processos de falência “o Instituto Nacional do Seguro Social-INSS reivindicará os valores descontados pela empresa de seus empregados e ainda não recolhidos”. Portanto, tratando-se dos valores devidos pelo devedor falido relativos à contribuição social dos seus empregados – que cabe a ele, empresário, descontar do salário dos funcionários e recolher –, deve o INSS formular pedido de restituição, e não habilitar tais créditos no quadro-geral. A habilitação é feita apenas em relação aos valores devidos pelo próprio devedor falido, relativos à contribuição social devida por ele mesmo. […]

Em suma: o INSS deve (i) pedir restituição das contribuições sociais devidas pelos empregados – que o devedor falido devia ter descontado dos seus salários e recolhido – e (ii) habilitar como crédito fiscal as contribuições devidas pelo empregador, na qualidade de créditos fiscais. E a razão é bem simples: no que se refere às contribuições dos empregados, os valores não podem ser incorporados à massa, conforme descrito na decisão do STJ acima transcrita, uma vez que não se trata de dinheiro do devedor falido. Cuida-se, na verdade, de dinheiro do INSS, que o falido apenas tinha a obrigação de descontar dos seus funcionários e recolher aos cofres públicos. Se não o fez, o INSS deve tão somente pedir a sua restituição.

Por fim, cumpre fazer uma observação relevante, referente aos valores dos correntistas de instituições financeiras – bancos – que eventualmente tenham a sua falência decretada. Pergunta-se: nesse caso, poderiam os correntistas fazer pedido de restituição em relação aos valores depositados em suas contas bancárias, alegando que os valores em questão não seriam da instituição financeira, mas deles? A resposta é negativa. A matéria, ainda na vigência da legislação falimentar anterior – que cuidava dos pedidos de restituição em seu art. 76 –, já estava pacificada no âmbito da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

Agravos contra decisão monocrática proferida em recurso especial. Restituição de depósitos bancários. Indevida. Honorários advocatícios. Reduzidos. Art. 20, § 4.º, do CPC.

Os depósitos bancários não se enquadram na hipótese do art. 76 da Lei de Falências, pois neles, em particular, ocorre a transferência da titularidade dos valores à instituição bancária, ficando o correntista apenas com o direito ao crédito correspondente. […] (AgRg no REsp 660.762/MG, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, DJ 13.06.2005, p. 316).

Jurisprudência:

(…) Consoante jurisprudência consolidada nesta Corte Superior, é cabível o pedido de restituição baseado no adiantamento de contrato de câmbio, pois os valores dele decorrentes não integram o patrimônio da massa falida ou da empresa concordatária (art. 75, § 3.º, da Lei 4.728/65 – Lei do Mercado de Capitais). 4. A teor da Súmula 133 do STJ, “a restituição da importância adiantada, a conta de contrato de câmbio, independe de ter sido a antecipação efetuada nos quinze dias anteriores ao requerimento da concordata” ou da falência, não incidindo, portanto, a condição temporal prevista no art. 76, § 2.º, da antiga Lei de Falências. 5. “A restituição de adiantamento de contrato de câmbio, na falência [ou concordata], deve ser atendida antes de qualquer crédito” (Súmula 307 do STJ), ainda que seja o mesmo de natureza trabalhista. (…) (AgRg no Ag 510.416/RJ, Rel. Min. Vasco Della Giustina (desembargador convocado do TJ/RS), 3.ª Turma, j. 04.02.2010, DJe 23.02.2010).

50
Q

A restituição de bens ocorre antes de qualquer pagamento?

A

Ressalte-se, entretanto, que todas essas hipóteses de restituição em dinheiro “somente serão efetuadas após o pagamento previsto no art. 151 da LRE” (art. 86, parágrafo único). O art. 151, por sua vez, determina que “os créditos trabalhistas de natureza estritamente salarial vencidos nos 3 (três) meses anteriores à decretação da falência, até o limite de 5 (cinco) salários mínimos por trabalhador, serão pagos tão logo haja disponibilidade em caixa”. […]

Art. 85. O proprietário de bem arrecadado no processo de falência ou que se encontre em poder do devedor na data da decretação da falência poderá pedir sua restituição.

Parágrafo único. Também pode ser pedida a restituição de coisa vendida a crédito e entregue ao devedor nos 15 (quinze) dias anteriores ao requerimento de sua falência, se ainda não alienada.

Art. 86. Proceder-se-á à restituição em dinheiro:

I – se a coisa não mais existir ao tempo do pedido de restituição, hipótese em que o requerente receberá o valor da avaliação do bem, ou, no caso de ter ocorrido sua venda, o respectivo preço, em ambos os casos no valor atualizado;

II – da importância entregue ao devedor, em moeda corrente nacional, decorrente de adiantamento a contrato de câmbio para exportação, na forma do art. 75, §§ 3º e 4º , da Lei nº 4.728, de 14 de julho de 1965, desde que o prazo total da operação, inclusive eventuais prorrogações, não exceda o previsto nas normas específicas da autoridade competente;

III – dos valores entregues ao devedor pelo contratante de boa-fé na hipótese de revogação ou ineficácia do contrato, conforme disposto no art. 136 desta Lei.

Parágrafo único. As restituições de que trata este artigo somente serão efetuadas após o pagamento previsto no art. 151 desta Lei.

51
Q

Cabe o ajuizamento da embargos de terceiro pelo proprietário de bem para postular a restintuição de bem?

A

Art. 93. Nos casos em que não couber pedido de restituição, fica resguardado o direito dos credores de propor embargos de terceiros, observada a legislação processual civil.

52
Q

Qual é o papel do Juiz em relação ao quandro-geral de credores?

A

Resumo

  • Houve a desjudicialização da habilitação de créditos com a LRE. Administrador judicial que elabora o quadro-geral de credores.
  • O quadro-geral apresentado pelo administrador está sujeito a impugnação pelos credores, pelo próprio devedor ou pelo MP, que será decidida pelo Juiz.
  • Após a resolução dos incidentes, o quadro-geral é homologado pelo juiz.

Livro

A formação da massa falida subjetiva se dá com o procedimento de verificação e habilitação dos créditos, para o qual a LRE trouxe interessantes inovações, visando a dar mais celeridade ao processo falimentar. Em síntese, a LRE, ao contrário do que fazia a lei anterior, segundo a qual a habilitação dos créditos era feita pelo juiz, previu a “desjudicialização” dessa matéria, determinado, em seu art. 7.º, que “a verificação dos créditos será realizada pelo administrador judicial, com base nos livros contábeis e documentos comerciais e fiscais do devedor e nos documentos que lhe forem apresentados pelos credores, podendo contar com o auxílio de profissionais ou empresas especializadas”.

Atuou aqui o legislador de maneira correta, com o chamado espírito de “desjudicialização” de matérias que podem ser solucionadas independentemente de atividade jurisdicional. (…)

(…) agiu corretamente o legislador pois, para a simples formação de um quadro de credores, não há mesmo necessidade da jurisdição. Se o administrador, no exercício de seu trabalho, elabora o quadro-geral e todos estão de acordo, tal quadro deve apenas ser apresentado em juízo para os fins de direito, não havendo qualquer necessidade de decisões do juiz, tendo em vista que todas as partes estão de acordo com a classificação feita e com os valores apontados. (…)

Enfim, entre os diversos equívocos desta Lei, esse sistema de habilitação dos créditos na falência é digno de louvor, por dispensar o Judiciário de atividades que podem chegar a final perfeito apenas com atividades administrativas, mantendo sempre porém a possibilidade, até em homenagem ao princípio constitucional da indeclinabilidade da jurisdição (inciso XXXV do art. 5.o da Constituição), de recurso ao Judiciário para resolver de forma definitiva as questões que não podem prescindir da solução a ser dada pelo juiz natural.

[…]

Após o período de habilitação, o administrador, com base na relação fornecida pelo devedor e nos documentos apresentados pelos credores que se habilitaram, terá prazo de 45 (quarenta e cinco) dias para “publicar edital contendo a relação de credores (…), devendo indicar o local, o horário e o prazo comum em que as pessoas indicadas no art. 8.º da LRE terão acesso aos documentos que fundamentaram a elaboração dessa relação” (art. 7.º, § 2.º, da LRE). Não havendo nenhuma impugnação, a relação de credores estará formalizada (art. 14 da LRE).

Caso, todavia, algum credor, o próprio devedor – ou sócio da sociedade devedora – ou mesmo o Ministério Público verifiquem algum equívoco na relação apresentada pelo administrador judicial, consistente, por exemplo, na ausência de algum crédito ou na inclusão de crédito ilegítimo, poderão apresentar impugnação ao juiz, no prazo de dez dias, contados da publicação do edital que contém a relação, acima referido, valendo destacar que a Terceira Turma do STJ já decidiu, por maioria, ser inviável a impugnação retardatária, que não se confunde com a habilitação retardatária, esta expressamente admitida na lei.

[…]

Definidos, enfim, todos os incidentes acima descritos, caberá ao administrador judicial consolidar, definitivamente, o quadro-geral de credores, que será então homologado pelo juiz (art. 18 da LRE).

53
Q

Um contrato de abertura de crédito pode ser habilitado como crédito na falência?

A

De acordo com o STJ, uma vez que o procedimento de habilitação de crédito tem caráter contencioso, com instrução probatória, o título que o embasa não precisa ser um título executivo, entendimento que vale tanto para a lei anterior quanto para a lei atual.

Direito falimentar. Falência regulada pelo Decreto-lei n. 7.661/1945. Procedimento de habilitação de crédito. Desnecessidade de embasamento em título executivo. 1. O requerimento de habilitação de crédito não precisa estar lastreado em título executivo, em razão do caráter cognitivo e contencioso do seu procedimento. 2. O <u><strong>contrato de abertura de crédito</strong></u>, a despeito de não ser considerado título executivo (Súmula n. 233 do STJ), é documento hábil a embasar requerimento de habilitação de crédito em processo falimentar. 3. Recurso especial conhecido em parte, mas desprovido (REsp 992.846/PR, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, 4.ª Turma, j. 27.09.2011, DJe 03.10.2011).

54
Q

O que são habilitações retardatárias? Qual a consequência do retardamento?

A

Resumo

  • Habilitação retardatária é aquela realizada após o prazo para habilitação do crédito perante o administrador judicial.
  • Se ela o pedido for feito antes da homologação do quadro-geral de credores, será recebido como impugnação. Após a homologação, será necessário ajuizamento de ação para postular a retificação do quadro.
  • O credor retardatário, exceto o de crédito trabalhista, perde o direito de participar da assembleia geral de credores.
  • Perde também o direito a rateios já realizados.

Livro

Ressalte-se que a perda do prazo para a habilitação do crédito não significa que o credor perdeu o direito de receber seu crédito no processo falimentar. O art. 10 da LRE determina, apenas, que as habilitações, nesse caso, sejam recebidas como retardatárias, o que, por óbvio, trará algumas consequências negativas.

Se as habilitações retardatárias forem apresentadas antes da homologação do quadro-geral de credores, serão elas recebidas como impugnação e processadas na forma dos arts. 13 a 15 da LRE (art. 10, § 5.º). Se, no entanto, a habilitação for feita com tanto atraso que já tenha sido homologado o quadro-geral, será necessário requerer ao juízo universal da falência, em ação própria que obedeça ao procedimento comum do Novo CPC, a retificação do quadro, para a inclusão do crédito retardatário (art. 10, § 6.º).

Ademais, não se deve esquecer que os credores retardatários, conforme já mencionado acima, sofrerão algumas consequências negativas, previstas nos parágrafos do art. 10 da LRE, em razão do seu atraso na habilitação dos respectivos créditos. Assim, por exemplo, os credores retardatários, “excetuados os titulares de créditos derivados da relação de trabalho, não terão direito a voto nas deliberações da assembleia geral de credores” (§§ 1.º e 2.º). Da mesma forma, os credores retardatários “perderão o direito a rateios eventualmente realizados e ficarão sujeitos ao pagamento de custas, não se computando os acessórios compreendidos entre o término do prazo e a data do pedido de habilitação” (§ 3.º).

Art. 10. Não observado o prazo estipulado no art. 7º , § 1º , desta Lei, as habilitações de crédito serão recebidas como retardatárias.

§ 1º Na recuperação judicial, os titulares de créditos retardatários, excetuados os titulares de créditos derivados da relação de trabalho, não terão direito a voto nas deliberações da assembléia-geral de credores.

§ 2º Aplica-se o disposto no § 1º deste artigo ao processo de falência, salvo se, na data da realização da assembléia-geral, já houver sido homologado o quadro-geral de credores contendo o crédito retardatário.

§ 3º Na falência, os créditos retardatários perderão o direito a rateios eventualmente realizados e ficarão sujeitos ao pagamento de custas, não se computando os acessórios compreendidos entre o término do prazo e a data do pedido de habilitação.

§ 4º Na hipótese prevista no § 3º deste artigo, o credor poderá requerer a reserva de valor para satisfação de seu crédito.

§ 5º As habilitações de crédito retardatárias, se apresentadas antes da homologação do quadro-geral de credores, serão recebidas como impugnação e processadas na forma dos arts. 13 a 15 desta Lei.

§ 6º Após a homologação do quadro-geral de credores, aqueles que não habilitaram seu crédito poderão, observado, no que couber, o procedimento ordinário previsto no Código de Processo Civil, requerer ao juízo da falência ou da recuperação judicial a retificação do quadro-geral para inclusão do respectivo crédito.

55
Q

Por que via é possível alterar o quadro geral de credores?

A

Definidos, enfim, todos os incidentes acima descritos, caberá ao administrador judicial consolidar, definitivamente, o quadro-geral de credores, que será então homologado pelo juiz (art. 18 da LRE).

Mas ainda assim o referido quadro poderá ser alterado, até o encerramento do processo falimentar, por meio de ação própria a ser ajuizada pelo administrador judicial, por qualquer credor, pelo comitê de credores ou pelo Ministério Público (art. 19 da LRE). Nesta ação, que seguirá o rito comum do Novo CPC, poder-se-á “pedir a exclusão, outra classificação ou a retificação de qualquer crédito, nos casos de descoberta de falsidade, dolo, simulação, fraude, erro essencial ou, ainda, documentos ignorados na época do julgamento do crédito ou da inclusão no quadro-geral de credores”.

Destaque-se que referida ação deverá ser ajuizada no juízo universal da falência ou, nas hipóteses previstas no art. 6.º, §§ 1.º e 2.º, da LRE, perante o juízo que tenha originariamente reconhecido o crédito (art. 19, § 1.º). Ademais, o eventual pagamento ao titular do crédito que ajuizou a ação em comento só poderá ser efetuado mediante a prestação de caução no mesmo valor do crédito questionado (art. 19, § 2.º).

Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário.

§ 1º Terá prosseguimento no juízo no qual estiver se processando a ação que demandar quantia ilíquida.

§ 2º É permitido pleitear, perante o administrador judicial, habilitação, exclusão ou modificação de créditos derivados da relação de trabalho, mas as ações de natureza trabalhista, inclusive as impugnações a que se refere o art. 8º desta Lei, serão processadas perante a justiça especializada até a apuração do respectivo crédito, que será inscrito no quadro-geral de credores pelo valor determinado em sentença.

Art. 19. O administrador judicial, o Comitê, qualquer credor ou o representante do Ministério Público poderá, até o encerramento da recuperação judicial ou da falência, observado, no que couber, o procedimento ordinário previsto no Código de Processo Civil, pedir a exclusão, outra classificação ou a retificação de qualquer crédito, nos casos de descoberta de falsidade, dolo, simulação, fraude, erro essencial ou, ainda, documentos ignorados na época do julgamento do crédito ou da inclusão no quadro-geral de credores.

§ 1º A ação prevista neste artigo será proposta exclusivamente perante o juízo da recuperação judicial ou da falência ou, nas hipóteses previstas no art. 6º , §§ 1º e 2º , desta Lei, perante o juízo que tenha originariamente reconhecido o crédito.

56
Q

Como se dá a habilitação do crédito na falência?

A

Como as execuções fiscais não se suspendem em razão da decretação da falência, a Fazenda Pública não precisa formular pedido de habilitação de crédito ao administrador judicial. O próprio juízo da execução fiscal comunica ao juízo falimentar o valor do crédito tributário exequendo, o qual será devidamente inscrito no quadro geral de credores. No entanto, o STJ entende que a Fazenda Pública pode, se quiser, optar por habilitar o crédito como os demais credores. Nesse sentido, confira-se:

Agravo regimental. Agravo de instrumento. Comercial e processo civil. Falência. Habilitação de crédito tributário. Possibilidade. Ausência de obrigatoriedade de propositura de execução fiscal. Admissibilidade de opção da via adequada ao caso concreto. 1. A jurisprudência desta Corte Superior se firmou na vertente de que os arts. 187 do CTN e 29 da LEF (Lei 6.830/80) conferem, na realidade, ao Ente de Direito Público a prerrogativa de optar entre o ajuizamento de execução fiscal ou a habilitação de crédito na falência, para a cobrança em juízo dos créditos tributários e equiparados. Assim, escolhida uma via judicial, ocorre a renúncia com relação a outra, pois não se admite a garantia dúplice. 2. Agravo regimental a que se nega provimento (AgRg no Ag 713.217/RS, Rel. Min. Vasco Della Giustina (desembargador convocado do TJ/RS), 3.ª Turma, j. 19.11.2009, DJe 01.12.2009).

57
Q

A realização do ativo pode ocorrer antes de formado o quadro-geral de credores?

A

Resumo

Sim, é o que dispõe o art. 140, pár. 2: “A realização do ativo terá início independentemente da formação do quadro-geral de credores”.

Livro

Ultimadas as etapas de definição da massa falida objetiva, que corresponde, como visto, ao ativo do devedor que será utilizado para o pagamento dos credores habilitados (a massa falida subjetiva), proceder-se-á ao início da fase chamada pela lei de realização do ativo (art. 139 da LRE), que consiste, grosso modo, na venda dos bens da massa.

Veja-se que a LRE, em seu art. 140, § 2.º, determina que a venda dos bens deve ser iniciada antes mesmo de formado o quadro-geral de credores, e a determinação é realmente correta. Afinal, a demora na venda dos bens é extremamente prejudicial ao atingimento das finalidades do processo falimentar.

Quanto maior for a demora na venda dos bens, maiores serão as chances de eles se deteriorarem, desvalorizarem ou às vezes até desaparecerem, dada a dificuldade encontrada, em muitos casos, de guardá-los e conservá-los.

58
Q

No que toca à alienação dos bens da massa falida, qual a ordem que a LRE previu?

A

Art. 140. A alienação dos bens será realizada de uma das seguintes formas, observada a seguinte ordem de preferência:

I – alienação da empresa, com a venda de seus estabelecimentos em bloco;

II – alienação da empresa, com a venda de suas filiais ou unidades produtivas isoladamente;

III – alienação em bloco dos bens que integram cada um dos estabelecimentos do devedor;

IV – alienação dos bens individualmente considerados.

Não se deve esquecer ainda que, segundo o § 1.º do art. 140, “se convier à realização do ativo, ou em razão de oportunidade, podem ser adotadas mais de uma forma de alienação”. Assim, em determinado processo falimentar de uma sociedade empresária com cinco filiais, por exemplo, pode ser feita a venda autônoma de duas delas, a venda em bloco dos bens de outras duas e a venda em separado dos bens da última. Caberá aos órgãos do processo falimentar avaliar a melhor alternativa para a maximização do ativo do devedor.

59
Q

Como funciona o pregão previsto na LRE para realização dos ativos?

A

Por fim, dispõe o § 5.º do art. 142 sobre a modalidade de venda chamada de pregão, a qual “constitui modalidade híbrida das anteriores, comportando 2 (duas) fases: I – recebimento de propostas, na forma do § 3.º deste artigo; II – leilão por lances orais, de que participarão somente aqueles que apresentarem propostas não inferiores a 90% (noventa por cento) da maior proposta ofertada, na forma do § 2.º deste artigo”. Vê-se, pois, que o pregão representa, grosso modo, uma combinação do leilão com a venda por propostas fechadas. Em primeiro lugar, o juiz recebe e abre as propostas realizadas. Posteriormente, notifica aqueles que fizeram as melhores propostas, nos termos da lei, para a fase dos lances orais, na qual será usado, como valor de abertura, o montante da maior proposta oferecida na fase anterior, cujo ofertante ficará obrigado a cumprir. Com efeito, “caso não compareça ao leilão o ofertante da maior proposta e não seja dado lance igual ou superior ao valor por ele ofertado, fica obrigado a prestar a diferença verificada, constituindo a respectiva certidão do juízo título executivo para a cobrança dos valores pelo administrador judicial” (art. 142, § 6.º, III, da LRE).

60
Q

É obrigatória a participação do MP na alienação dos bens?

A

Resumo

  • Segundo a LRE, a ausência de intimação do Ministério Público antes da alienação dos bens é causa de nulidade.
  • Autor entende que a nulidade só deverá ser decretada se houver alguma violação à ordem legal.
  • O MP deve impugnar a arrematação 48 horas após a arrematação.

Livro

Destaque-se ainda que, “em qualquer modalidade de alienação, o Ministério Público será intimado pessoalmente, sob pena de nulidade” (art. 142, § 7.º). O dispositivo em questão, todavia, deve ser interpretado com cautela pelo julgador, levando-se em consideração, sobretudo, o veto ao art. 4.º da LRE, já comentado. De fato, o referido veto demonstrou a opção clara por um processo falimentar com menor participação do membro do Parquet, em nome da celeridade processual. Portanto, se por acaso o Ministério Público não for intimado pessoalmente acerca de determinado leilão ou pregão para venda de bens do falido, isso por si só não deverá ser visto, posteriormente, como causa de nulidade absoluta do procedimento de alienação. Deve o juiz observar o caso com prudência e só declarar a nulidade do ato se realmente essa medida for recomendável. Por outro lado, se ele perceber que, a despeito da ausência de intimação do órgão ministerial, a alienação tenha sido realizada em obediência aos ditames legais, deve manter o ato e dar seguimento ao processo.

O art. 143 da LRE ainda prevê a possibilidade de apresentação de impugnação em qualquer das três modalidades de alienação estudadas. A impugnação poderá ser oferecida “por quaisquer credores, pelo devedor ou pelo Ministério Público, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas da arrematação, hipótese em que os autos serão conclusos ao juiz, que, no prazo de 5 (cinco) dias, decidirá sobre as impugnações e, julgando-as improcedentes, ordenará a entrega dos bens ao arrematante, respeitadas as condições estabelecidas no edital”. Voltando ao assunto comentado no parágrafo anterior, pois o melhor caminho a ser seguido, em caso de ausência de intimação pessoal do membro do Ministério Público, é o oferecimento de impugnação por parte deste, desde que se verifique a ocorrência de alguma irregularidade relevante. Se a única irregularidade encontrada, porém, for a mera ausência de sua intimação pessoal, sua impugnação deve ser julgada improcedente. Ressalte-se que essa é uma opinião particular nossa, fundada na necessidade de redefinição do papel do Parquet nos processos falimentares após o veto ao art. 4.º da LRE. Em nossa opinião, frise-se, todos os dispositivos da lei que preveem a atuação do Ministério Público no processo falimentar devem ser interpretados à luz do referido veto presidencial, restringindo-se, sempre que possível, a sua participação, em nome da celeridade e economia processuais.

61
Q

O administrador judicial, com autorização do Cômite de Credores, pode determinar formas de alineação dos bens diversas daquelas previstas no art. 142 da LRE?

A

Resumo

  • Será necessário autorização judicial para realização de alienação de forma diversa das hipóteses do art. 142.
  • Modalidades atípicas de alienação propostas pela assembleia geral de credores podem ser homologadas pelo Juiz, inclusive mediante a continuação da empresa pela sociedade de credores ou mesmo de trabalhadores.

Livro

Além das modalidades típicas de venda dos bens analisadas no tópico antecedente, a LRE permite ainda que a venda seja realizada por meios atípicos, desde que isso, é óbvio, seja mais interessante sob o ponto de vista da maximização dos ativos do devedor falido.

Nesse sentido, prevê o art. 144 da LRE que, “havendo motivos justificados, o juiz poderá autorizar, mediante requerimento fundamentado do administrador judicial ou do Comitê, modalidades de alienação judicial diversas das previstas no art. 142 desta Lei”. Veja-se que nesse caso a decisão sobre a utilidade da modalidade atípica de venda dos bens compete exclusivamente ao juiz, quando provocado pelo administrador judicial ou pelo comitê de credores. Assim, por mais que estes entendam que uma modalidade atípica de venda dos bens – diversa do leilão, da proposta fechada e do pregão – é mais adequada, ela não se efetivará se o juiz não se convencer de tal fato. A última palavra, nesse caso, é da autoridade judicial.

Prevê também a LRE, em seu art. 145, que “o juiz homologará qualquer outra modalidade de realização do ativo, desde que aprovada pela assembleia geral de credores, inclusive com a constituição de sociedade de credores ou dos empregados do próprio devedor, com a participação, se necessária, dos atuais sócios ou de terceiros”. Aqui, perceba-se, a opinião do órgão julgador é menos decisiva, uma vez que cabe a ele apenas homologar o consenso formado pelos credores por meio de decisão da assembleia geral, que deve ser tomada por pelo menos 2/3 dos créditos titularizados pelos credores presentes (art. 46 da LRE).

No caso do art. 145, perceba-se que a lei privilegia a continuação da empresa, que será exercida a partir de então por sociedade de credores ou mesmo de empregados. Estes, aliás, podem até “utilizar créditos derivados da legislação do trabalho para a aquisição ou arrendamento da empresa”.

62
Q

Que novidades a LRE traz no que toca ao trespasse?

A

Resumo

  • Não “haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária, as derivadas da legislação do trabalho e as decorrentes de acidentes de trabalho”.
  • Regra que excepciona o art. 1.146 do Código Civil (responsabilidade solidária pelo prazo de 1 ano).
  • A regra não se aplica no caso em que o arrematante é “I – sócio da sociedade falida, ou sociedade controlada pelo falido; II – parente, em linha reta ou colateral até o 4.º (quarto) grau, consanguíneo ou afim, do falido ou de sócio da sociedade falida; ou III – identificado como agente do falido com o objetivo de fraudar a sucessão
  • Mesmo quando o trespasse é realizado para sociedade de credores ou de trabalhadores, não haverá sucessão.
  • Empregados do devedor contratados pelo arrematante serão admitidos mediante novos contratos de trabalho e o arrematante não responde por obrigações decorrentes do contrato anterior.

Livro

Vimos acima que, na ordem de preferência estabelecida pelo art. 140 da LRE para a venda do ativo do devedor falido, está em primeiro lugar a venda da própria empresa (rectius: estabelecimento empresarial), operacionalizada por meio do trespasse.

Pois bem. No capítulo 2, analisamos a questão da sucessão empresarial quando da realização do trespasse, que está disciplinada pelo art. 1.146 do CC, o qual estabelece, em suma, que o adquirente do estabelecimento assume o passivo contabilizado do alienante, que, por sua vez, fica solidariamente responsável com o adquirente pelo prazo de um ano.

Todavia, conforme já havíamos adiantado quando do estudo do trespasse, a legislação falimentar trouxe uma interessantíssima novidade em relação ao tema em enfoque, prevendo, em seu art. 141, que “na alienação conjunta ou separada de ativos, inclusive da empresa ou de suas filiais, promovida sob qualquer das modalidades de que trata este artigo: I – todos os credores, observada a ordem de preferência definida no art. 83 desta Lei, sub-rogam-se no produto da realização do ativo; II – o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária, as derivadas da legislação do trabalho e as decorrentes de acidentes de trabalho”. A novidade de que ora se fala, perceba-se, está no inciso II do dispositivo transcrito, que excepciona a regra de sucessão empresarial prevista no art. 1.146 do CC quando o trespasse for realizado em processo falimentar por meio de hasta pública em uma das modalidades constantes do art. 140 da LRE (leilão, propostas fechadas ou pregão).

Mas não é só. A regra de sucessão empresarial do art. 1.146 do CC, conforme já estudamos, refere-se apenas às dívidas negociais do alienante do estabelecimento, não se aplicando, por conseguinte, às dívidas trabalhistas e tributárias, que possuem disciplina especial, respectivamente, na CLT (arts. 448 e 448-A) e no CTN (art. 133). Ocorre que o art. 141 da LRE faz expressa menção a estas dívidas, não deixando dúvidas de que as sucessões trabalhista e tributária, quando o trespasse é feito em processo falimentar, também não se produzem, ou seja, o adquirente-arrematante do estabelecimento empresarial está isento de qualquer responsabilidade por dívidas anteriores à compra, ainda que elas sejam de natureza trabalhista ou tributária.

No que se refere às dívidas tributárias, a aplicação do dispositivo inovador da legislação falimentar não trará maiores problemas, uma vez que o art. 133 do CTN foi modificado recentemente para adaptar-se a essa nova realidade. Com efeito, a Lei Complementar 118/2005 acrescentou três parágrafos a ele, ajustando-o de forma perfeita ao disposto no art. 140 da LRE.

No que tange às dívidas trabalhistas, entretanto, a nova disciplina deve gerar polêmicas nos tribunais da Justiça laboral, uma vez que: (i) sua postura é sempre de proteção intransigente do crédito trabalhista, dada a sua natureza alimentar, e que (ii) não houve, assim como ocorreu no CTN, uma alteração da CLT para adaptá-la aos novos ditames do direito falimentar.

De nossa parte, recebemos com aplausos e entusiasmo a inovação em referência, por acreditarmos que ela tornará mais atrativa a venda do estabelecimento empresarial do devedor falido, o que, em última análise, beneficiará os credores, sobretudo os trabalhistas e tributários, que, por serem titulares de créditos privilegiados, provavelmente terão mais chances de os verem satisfeitos com o produto do trespasse. Enfim, “quando a lei expressamente nega a sucessão, amplia as chances de interessados adquirirem o negócio da sociedade falida e, consequentemente, as de mais credores virem a ter seus créditos satisfeitos com os recursos advindos da aquisição”.

Não se deve esquecer, ademais, que a norma da legislação falimentar ora em comento, que excepciona as regras de sucessão empresarial, trabalhista e tributária quando o trespasse é feito em processo falimentar, não se aplica de forma absoluta. De fato, o § 1.º do art. 141 da LRE estabelece que haverá normalmente a sucessão “(…) quando o arrematante for: I – sócio da sociedade falida, ou sociedade controlada pelo falido; II – parente, em linha reta ou colateral até o 4.º (quarto) grau, consanguíneo ou afim, do falido ou de sócio da sociedade falida; ou III – identificado como agente do falido com o objetivo de fraudar a sucessão”. Vê-se, portanto, que o legislador procurou se precaver em relação à tentativa de fraude, identificando situações em que o adquirente-arrematante é o próprio falido – na verdade, sócio(s) da sociedade falida – ou pessoa próxima a ele, quando a sucessão se operará normalmente.

Por fim, merecem destaque ainda duas normas da LRE sobre o assunto em questão. A primeira delas é a constante do art. 145, § 1.º, que prevê a aplicação da regra de não sucessão quando o trespasse do estabelecimento empresarial for realizado para sociedade de credores ou de empregados do devedor falido. Nesse caso, pois, os credores ou empregados que continuarem no exercício da empresa também estarão isentos de qualquer responsabilidade por dívidas negociais, trabalhistas ou tributárias anteriores ao negócio.

A outra norma que merece destaque é a constante do § 2.º do próprio art. 141 da LRE, segundo o qual “empregados do devedor contratados pelo arrematante serão admitidos mediante novos contratos de trabalho e o arrematante não responde por obrigações decorrentes do contrato anterior”. É apenas um reforço ao que já está previsto no art. 141, II, e que foi comentado com detalhes acima.

63
Q

Quais são os créditos considerados extraconcursais?

A

Mais uma interessante novidade trazida pela LRE foi a figura dos chamados créditos extraconcursais, que devem ser pagos antes de qualquer outro crédito concursal, por maior que seja a sua preferência na ordem de classificação.

Assim, segundo o art. 84 da LRE, “serão considerados créditos extraconcursais e serão pagos com precedência sobre os mencionados no art. 83 desta Lei, na ordem a seguir, os relativos a: I – remunerações devidas ao administrador judicial e seus auxiliares, e créditos derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidentes de trabalho relativos a serviços prestados após a decretação da falência; II – quantias fornecidas à massa pelos credores; III – despesas com arrecadação, administração, realização do ativo e distribuição do seu produto, bem como custas do processo de falência; IV – custas judiciais relativas às ações e execuções em que a massa falida tenha sido vencida; V – obrigações resultantes de atos jurídicos válidos praticados durante a recuperação judicial, nos termos do art. 67 desta Lei, ou após a decretação da falência, e tributos relativos a fatos geradores ocorridos após a decretação da falência, respeitada a ordem estabelecida no art. 83 desta Lei”.

Da leitura atenta do dispositivo acima transcrito pode-se perceber que os créditos extraconcursais, além de serem pagos antes de qualquer outro crédito submetido a concurso, também obedecem a uma ordem de preferência.

[…]

Finalmente, registre-se que a Corte Especial do STJ, em julgado de recurso especial repetitivo, decidiu que “são créditos extraconcursais os honorários de advogado resultantes de trabalhos prestados à massa falida, depois do decreto de falência, nos termos dos arts. 84 e 149 da Lei n. 11.101/2005” (REsp 1.152.218/RS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, j. 07.05.2014, DJe 09.10.2014).

64
Q

Até que limite o crédito trabalhista goza de preferência sobre os demais na falência?

A

Resumo

  • Os créditos trabalhistas, em regra, só tem preferência até o limite de 150 salários mínimos por credor.
  • Esse limite não se aplica a crédito decorrente de acidente de trabalho.
  • Outros crédito de natureza alimentar devido pela empresa também entram nessa preferência.
  • O crédito trabalhista cedido não goza de preferência (norma que busca evitar assédio de trabalhadores necessitados por especuladores).

Livro

Em primeiro lugar, no inciso I, estão “os créditos derivados da legislação do trabalho, limitados a 150 (cento e cinquenta) salários mínimos por credor, e os decorrentes de acidentes de trabalho”. […]

Quantos aos créditos decorrentes de acidentes do trabalho, esses concorrem como créditos preferenciais pela totalidade do seu valor. A limitação de 150 salários mínimos não os atinge, estando restrita aos créditos trabalhistas stricto sensu.

[…]

Estes créditos trabalhistas stricto sensu a que nos referimos são, basicamente, os créditos de indenizações determinadas pela Justiça do Trabalho (pagamento de horas extras, décimo terceiro salário, férias etc.), bem como outros créditos a eles equiparados: (i) os devidos aos representantes comerciais autônomos a título de comissões (art. 44 da Lei 4.886/1965) e (ii) os devidos à Caixa Econômica Federal a título de contribuição para o FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço).40 É o caso, também, de quaisquer outros créditos que tenham natureza alimentar, como um crédito decorrente de pensão fixada em decisão judicial contra a empresa falida ou em recuperação: “o Superior Tribunal de Justiça tem entendido que créditos de natureza alimentar, ainda que não decorram especificamente de relação jurídica submetida aos ditames da legislação trabalhista, devem receber tratamento análogo para fins de classificação em processos de execução concursal. Versando a hipótese sobre valores que ostentam indubitável natureza alimentar, pois se referem à pensão fixada em decorrência de perda definitiva da capacidade laboral do recorrido, deve ser observado, quanto a esses, o tratamento conferido aos créditos derivados da legislação do trabalho” (REsp 1.799.041/PR).

Por fim, há ainda outra norma inovadora da LRE quanto aos créditos trabalhistas que provocou intensos debates e reações negativas das entidades representativas dos trabalhadores. Trata-se do § 4.º do art. 83, segundo o qual “os créditos trabalhistas cedidos a terceiros serão considerados quirografários”. A regra em questão tentou evitar outra prática recorrente na vigência da lei anterior, e a sua intenção foi, como se verá, proteger o trabalhador, e não o contrário.

De fato, segundo a legislação comum (arts. 287 e 349 do Código Civil), a cessão de crédito transfere ao cessionário todas as preferências do crédito cedido. Isso fazia com que se estabelecesse um verdadeiro “câmbio negro” de créditos trabalhistas nos processos falimentares. Vários especuladores assediavam empregados que detinham créditos significativos e compravam esses créditos com deságio, aproveitando-se na maioria das vezes do estado de necessidade pelo qual passava o trabalhador. Com a nova regra, essa prática provavelmente desaparecerá, visto que o crédito trabalhista, uma vez cedido, perderá seu privilégio, razão pela qual os especuladores com certeza deixarão de ter interesse na sua aquisição.

65
Q

Os créditos com garantia real também se sujeitam a rateio?

A

Em segundo lugar, no inciso II, estão os “créditos com garantia real até o limite do valor do bem gravado”. […]

Trata-se de créditos não sujeitos a rateio, ou seja, nesses casos, o produto da venda do bem dado em garantia real à dívida será usado para o pagamento do credor garantido. Caso esse produto da venda seja superior à dívida, o saldo restante será usado para o pagamento dos demais credores, na ordem de classificação. Caso, em contrapartida, o produto da venda não seja suficiente para o pagamento da dívida, o restante dela será classificado como crédito quirografário.

Ressalvada, é óbvio, a situação dos credores extraconcursais, das restituições em dinheiro e dos credores trabalhistas e de créditos acidentários. Como eles estão acima dos credores com garantia real, devem sempre receber primeiro. Sendo assim, pode ocorrer de os bens não gravados do devedor serem insuficientes para o pagamento deles (extraconcursais, restituições, trabalhistas e acidentários), caso em que inevitavelmente os bens gravados – os quais, em princípio, deveriam garantir o pagamento dos credores com garantia real – terão que ser usados para sua quitação.

66
Q

As multas tributária podem ser cobradas na falência?

A

Em terceiro lugar, no inciso III, estão os “créditos tributários, independentemente da sua natureza e tempo de constituição, excetuadas as multas tributárias”. Vê-se, de imediato, que a LRE solucionou uma controvérsia existente na vigência da lei anterior, relativa às multas tributárias, as quais, segundo entendimento jurisprudencial, não podiam ser cobradas no processo falimentar. A nova legislação falimentar, todavia, permitiu a cobrança dos créditos decorrentes de multas tributárias no processo falimentar, mas não os classificou como créditos fiscais, deixando-os, na verdade, em sétimo lugar na ordem de classificação, abaixo dos créditos quirografários.

[…]

Por fim, registre-se que, segundo a mesma legislação tributária, há uma hierarquia interna entre os créditos tributários. De acordo com o art. 187, parágrafo único, do CTN, e com o art. 29, parágrafo único, da Lei 6.830/1980 (Lei de Execuções Fiscais), devem ser pagos primeiro os créditos tributários da União e de suas autarquias; depois, os créditos tributários dos Estados, Distrito Federal e Territórios e suas respectivas autarquias, conjuntamente e pro rata; por fim, os créditos tributários dos Municípios e suas autarquias, também conjuntamente e pro rata.

67
Q

O que são créditos subordinados?

A

Por fim, em oitavo lugar, no inciso VIII, estão “créditos subordinados, a saber: a) os assim previstos em lei ou em contrato; b) os créditos dos sócios e dos administradores sem vínculo empregatício”.

A inclusão dos créditos subordinados na ordem de classificação dos créditos também foi uma inovação da LRE, visto que, como dito, na lei anterior a última classe era a dos quirografários. São credores que se enquadram nessa categoria, por exemplo, os titulares de debêntures subordinadas e os sócios e administradores da sociedade sem vínculo empregatício. Eles só terão seus créditos satisfeitos depois de pagos todos os demais credores acima estudados.

Ressalte-se que os créditos subordinados titularizados por sócios da sociedade falida sem vínculo empregatício, mencionados pelo inciso ora em análise, não correspondem aos valores de suas ações ou quotas. Trata-se, por exemplo, de crédito decorrente de um empréstimo contraído pela sociedade junto ao sócio. Os valores correspondentes às quotas ou ações, segundo o art. 83, § 2.º, da LRE não são oponíveis à massa: “não são oponíveis à massa os valores decorrentes de direito de sócio ao recebimento de sua parcela do capital social na liquidação da sociedade”. Assim, os sócios – quotistas ou acionistas – só receberão algum valor referente às suas quotas ou ações se a sociedade falida pagar todos os seus credores, e ainda assim restarem recursos em caixa, hipótese obviamente dificílima de verificar na prática.

68
Q

Após a falência, as obrigações do falido são consideradas extintas?

A

O encerramento da falência não significa, por si só, a extinção das obrigações do devedor falido, o que só ocorrerá nos casos especificamente previstos no art. 158 da LRE e após a respectiva sentença. Suas obrigações só serão extintas, portanto, se houver: “I – o pagamento de todos os créditos; II – o pagamento, depois de realizado todo o ativo, de mais de 50% (cinquenta por cento) dos créditos quirografários, sendo facultado ao falido o depósito da quantia necessária para atingir essa porcentagem se para tanto não bastou a integral liquidação do ativo; III – o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contado do encerramento da falência, se o falido não tiver sido condenado por prática de crime previsto nesta Lei; IV – o decurso do prazo de 10 (dez) anos, contado do encerramento da falência, se o falido tiver sido condenado por prática de crime previsto nesta Lei”.

[…]

Assim, verificada uma das hipóteses descritas no art. 158, o devedor falido poderá então requerer ao juízo, por meio de petição que será autuada em apartado, a prolação de sentença que declare extintas as suas obrigações (art. 159 da LRE). O requerimento deve ser publicado por edital no órgão oficial e em jornal de grande circulação (§ 1.º), abrindo-se prazo de 30 dias para que qualquer credor possa opor-se ao pedido (§ 2.º), findo o qual o juiz, em cinco dias, proferirá sentença (§ 3.º), contra a qual caberá recurso de apelação (§ 5.º). Transitada em julgado a sentença, os autos do requerimento serão apensados aos do processo falimentar (§ 6.º).

69
Q

Admite-se a participação de sociedade empresarial em recuperação judicial em licitação?

A

[…] o STJ já admitiu a participação, em procedimento licitatório, de sociedade empresária em recuperação judicial, entendendo ser dispensável a apresentação de “certidão negativa de recuperação judicial” por parte da licitante (AgRg na MC 23.499/RS).

Enfim, dando eficácia máxima ao princípio da preservação da empresa, o STJ decidiu que “a exigência de apresentação de certidão negativa de recuperação judicial deve ser relativizada a fim de possibilitar à empresa em recuperação judicial participar do certame, desde que demonstre, na fase de habilitação, a sua viabilidade econômica” (AREsp 309.867/ ES).

70
Q

É possível a formação de litisconsórcio ativo no procedimento de recuperação judicial?

A

Resumo

  • É possível a formação de litisconsórcio ativo em caso de grupo econômico. Chama-se isso de “consolidação processual”.
  • Há também a “consolidação substancial”, que ocorre quando, além de formarem um litisconsórcio ativo, as sociedades “têm sua autonomia patrimonial desconsiderada, de modo que será apresentado um único plano de recuperação, que reunirá todos os credores em um mesmo quadro-geral, os quais votarão em assembleia conjunta”.
  • Nenhuma dessas hipóteses está prevista em lei, embora sejam admitidas na prática.

Livro

Embora a LRE, ao tratar do pedido de recuperação judicial, não tenha regra expressa sobre a possibilidade de litisconsórcio ativo em caso de grupo econômico, isso é algo que ocorre comumente na prática, e no julgamento do REsp 1.665.042, a Terceira Turma do STJ confirmou que “é possível a formação de litisconsórcio ativo na recuperação judicial para abranger as sociedades integrantes do mesmo grupo econômico”. De acordo com o relator, Ministro Cueva, “a admissão do litisconsórcio ativo na recuperação judicial obedece a dois importantes fatores: (i) a interdependência das relações societárias formadas pelos grupos econômicos e a necessidade de superar simultaneamente o quadro de instabilidade econômico-financeiro, e (ii) a autorização da legislação processual civil para as partes (no caso, as sociedades) litigarem em conjunto no mesmo processo (art. 113 do CPC/2015 e 46 do CPC/1973) e a ausência de colisão com os princípios e os fundamentos preconizados pela Lei 11.101/2005”.

Essa situação tratada no parágrafo anterior se refere ao que se convencionou chamar de “consolidação processual”, mas há também uma situação mais complexa, chamada de “consolidação substancial”: nesse caso, além de as sociedades integrantes de um grupo econômico formarem litisconsórcio ativo para formulação do pedido de recuperação judicial, elas têm sua autonomia patrimonial desconsiderada, de modo que será apresentado um único plano de recuperação, que reunirá todos os credores em um mesmo quadro-geral, os quais votarão em assembleia conjunta. Embora também não exista regra expressa sobre essa possibilidade na LRE, há muitos casos na prática.

O TJSP tem precedentes no sentido de que a consolidação processual não conduz automaticamente a uma consolidação substancial, sendo imprescindível que se verifiquem requisitos como a existência de garantias cruzadas, a unidade de instalações físicas, o uso de contas centralizadas, a adoção de regime de caixa único, dentro outros.

O TJSP também tem precedentes no sentido de que cabe às assembleia-gerais de credores das sociedades integrantes do grupo econômico, com base na regra do art. 35, inciso I, alínea “f ”, da LRE, deliberar sobre a aplicação da consolidação substancial, fazendo-o em votações separadas.

71
Q

Quais são os requisitos que o devedor deve atender para que o juiz autorize o processamento do seu pedido de recuperação?

A

No art. 48 da LRE estão delineados os requisitos que o devedor deve atender para que o juiz autorize o processamento do seu pedido de recuperação. Veja-se que não estamos falando ainda na concessão do pedido do devedor, mas apenas no deferimento de seu processamento. Assim, de acordo com o dispositivo em questão, “poderá requerer recuperação judicial o devedor que, no momento do pedido, exerça regularmente suas atividades há mais de 2 (dois) anos e que atenda aos seguintes requisitos, cumulativamente:

I – não ser falido e, se o foi, estejam declaradas extintas, por sentença transitada em julgado, as responsabilidades daí decorrentes;

II – não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de recuperação judicial;

III – não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de recuperação judicial com base no plano especial de que trata a Seção V deste Capítulo;

IV – não ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio controlador, pessoa condenada por qualquer dos crimes previstos nesta Lei”.

[…]

Além do requisito constante do caput do art. 48 da LRE, há os que constam dos incisos desse dispositivo legal. Conforme o inciso I, o devedor precisa comprovar também que nunca teve sua falência decretada ou, se teve, que as suas obrigações já foram declaradas extintas por sentença transitada em julgado. Mais uma vez é preciso destacar que essa é mais uma das normas da LRE que foram redigidas tendo como referência o empresário individual. Assim, quando o dispositivo em enfoque utiliza a expressão “falido”, está se referindo ao empresário individual: se ele já teve sua falência decretada, não pode requerer recuperação judicial, salvo se suas obrigações já foram declaradas extintas por sentença transitada em julgado. Tratando-se de sociedade empresária, será óbice ao deferimento de seu pedido a existência de sócios de responsabilidade ilimitada que já tenham tido a sua falência decretada anteriormente ou que tenham participado de outra sociedade que teve sua falência decretada.

[…]

Por fim, no inciso IV, a lei ainda exige, no caso de empresário individual, que ele não tenha sido condenado por crime falimentar, ou, no caso de sociedade empresária, que isso não tenha ocorrido com nenhum de seus sócios controladores ou administradores. Perceba-se que, se um sócio minoritário, sem poder de controle ou de administração, já tenha eventualmente sido condenado por crimes tipificados na LRE, isso por si só não impede o juiz de deferir o processamento do pedido de recuperação da sociedade devedora. A regra é clara ao afirmar que o óbice legal só incide se o condenado era administrador ou controlador da sociedade.

72
Q

Produtores rurais não registrados na Junta Comercial podem obter o benefício da recuperação judicial, algo típico do regime jurídico empresarial?

A

Resumo

  • Se não tive inscrito na junta antes do pedido, o produtor rural não pode se beneficiar da recuperação judicial.
  • Não precisa estar inscrito há mais de 2 anos na junta. Basta que prove o exercício de atividade rural durante esse prazo.
  • Todos os créditos se sujeitarão ao plano de recuperação, inclusive aqueles constituídos antes do registro na Junta Comercial.

Livro

No julgamento do REsp 1.193.115-MT, a Terceira Tuma do STJ, analisando um caso em que o produtor rural pediu a recuperação judicial e só fez seu registro na Junta Comercial após o ajuizamento do pedido, decidiu, por maioria, que não: sem registro na Junta, produtores rurais não são considerados empresários, para os efeitos legais, e não podem obter o benefício da recuperação judicial. Eis a ementa do acórdão:

RECUPERAÇÃO JUDICIAL. COMPROVAÇÃO DA CONDIÇÃO DE EMPRESÁRIO POR MAIS DE 2 ANOS. NECESSIDADE DE JUNTADA DE DOCUMENTO COM-PROBATÓRIO DE REGISTRO COMERCIAL. DOCUMENTO SUBSTANCIAL. INSU-FICIÊNCIA DA INVOCAÇÃO DE EXERCÍCIO PROFISSIONAL. INSUFICIÊNCIA DE REGISTRO REALIZADO 55 DIAS APÓS O AJUIZAMENTO. POSSIBILIDADE OU NÃO DE RECUPERAÇÃO DE EMPRESÁRIO RURAL NÃO ENFRENTADA NO JULGAMENTO. 1. O deferimento da recuperação judicial pressupõe a comprovação documental da qualidade de empresário, mediante a juntada com a petição inicial, ou em prazo concedido nos termos do CPC 284, de certidão de inscrição na Junta Comercial, realizada antes do ingresso do pedido em Juízo, comprovando o exercício das atividades por mais de dois anos, inadmissível a inscrição posterior ao ajuizamento. Não enfrentada, no julgamento, questão relativa às condições de admissibilidade ou não de pedido de recuperação judicial rural. 2. Recurso Especial improvido quanto ao pleito de recuperação. (REsp 1193115/MT, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. p/ Acórdão Min. Sidnei Beneti, 3.ª Turma, j. 20.08.2013, DJe 07.10.2013)

Anos após esse julgamento, foram aprovados dois importantes enunciados das Jornadas de Direito Comercial do CJF: o Enunciado 96 diz que “a recuperação judicial do empresário rural, pessoa natural ou jurídica, sujeita todos os créditos existentes na data do pedido, inclusive os anteriores à data da inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis”; já o Enunciado 97 diz que “o produtor rural, pessoa natural ou jurídica, na ocasião do pedido de recuperação judicial, não precisa estar inscrito há mais de dois anos no Registro Público de Empresas Mercantis, bastando a demonstração de exercício de atividade rural por esse período e a comprovação da inscrição anterior ao pedido”.

Depois da aprovação desses enunciados, a Quarta Turma do STJ enfrentou essa questão no julgamento do REsp 1.800.032-MT. Assim como ocorreu na Terceira Turma, a decisão não foi unânime, e prevaleceu o entendimento de que o produtor rural pode se beneficiar da recuperação judicial desde que tenha registro na Junta anterior ao ajuizamento do pedido. Na linha do Enunciado 97 das Jornadas de Direito Comercial, entendeu-se que esse registro, porém, não precisa ter sido feito há mais de dois anos do pedido de recuperação, bastando apenas que se comprove o exercício de atividade rural há mais de dois anos, por quaisquer meios de prova. Por fim, decidiu-se também no mesmo sentido do Enunciado 96 das Jornadas de Direito Comercial, isto é, todos os créditos se sujeitarão ao plano de recuperação, inclusive aqueles constituídos antes do registro na Junta Comercial.

73
Q

Quais são os documentos que devem acompanhar o pedido de recuperação judicial?

A

Art. 51. A petição inicial de recuperação judicial será instruída com:

I – a exposição das causas concretas da situação patrimonial do devedor e das razões da crise econômico-financeira;

II – as demonstrações contábeis relativas aos 3 (três) últimos exercícios sociais e as levantadas especialmente para instruir o pedido, confeccionadas com estrita observância da legislação societária aplicável e compostas obrigatoriamente de:

a) balanço patrimonial;
b) demonstração de resultados acumulados;
c) demonstração do resultado desde o último exercício social;
d) relatório gerencial de fluxo de caixa e de sua projeção;

III – a relação nominal completa dos credores, inclusive aqueles por obrigação de fazer ou de dar, com a indicação do endereço de cada um, a natureza, a classificação e o valor atualizado do crédito, discriminando sua origem, o regime dos respectivos vencimentos e a indicação dos registros contábeis de cada transação pendente;

IV – a relação integral dos empregados, em que constem as respectivas funções, salários, indenizações e outras parcelas a que têm direito, com o correspondente mês de competência, e a discriminação dos valores pendentes de pagamento;

V – certidão de regularidade do devedor no Registro Público de Empresas, o ato constitutivo atualizado e as atas de nomeação dos atuais administradores;

VI – a relação dos bens particulares dos sócios controladores e dos administradores do devedor;

VII – os extratos atualizados das contas bancárias do devedor e de suas eventuais aplicações financeiras de qualquer modalidade, inclusive em fundos de investimento ou em bolsas de valores, emitidos pelas respectivas instituições financeiras;

VIII – certidões dos cartórios de protestos situados na comarca do domicílio ou sede do devedor e naquelas onde possui filial;

IX – a relação, subscrita pelo devedor, de todas as ações judiciais em que este figure como parte, inclusive as de natureza trabalhista, com a estimativa dos respectivos valores demandados.

§ 1º Os documentos de escrituração contábil e demais relatórios auxiliares, na forma e no suporte previstos em lei, permanecerão à disposição do juízo, do administrador judicial e, mediante autorização judicial, de qualquer interessado.

§ 2º Com relação à exigência prevista no inciso II do caput deste artigo, as microempresas e empresas de pequeno porte poderão apresentar livros e escrituração contábil simplificados nos termos da legislação específica.

§ 3º O juiz poderá determinar o depósito em cartório dos documentos a que se referem os §§ 1º e 2º deste artigo ou de cópia destes.

74
Q

O deferimento do processamento da recuperação judicial enseja o cancelamento da negativação do nome do devedor nos órgãos de proteção ao crédito?

A

Estando, todavia, devidamente instruída a exordial do devedor, prevê o art. 52 da LRE que “o juiz deferirá o processamento da recuperação judicial”, o que, repita-se, não significa o mesmo que conceder a recuperação judicial, o que só ocorrerá, eventualmente, em momento posterior. Neste momento, o juiz apenas está deferindo o processamento do pedido de recuperação, por entender, após juízo sumário de cognição, que aquele atendeu aos requisitos mínimos exigidos pela lei.

Sobre essa decisão que apenas defere o processamento do pedido de recuperação, foi aprovado o Enunciado 54 da I Jornada de Direito Comercial do CJF: “O deferimento do processamento da recuperação judicial não enseja o cancelamento da negativação do nome do devedor nos órgãos de proteção ao crédito e nos tabelionatos de protestos”. No entanto, entendo que poderá o juízo da recuperação, no exercício do seu poder geral de cautela, determinar a suspensão dos efeitos de eventuais negativações.

75
Q

Em que momento ocorre a nomeação do administrador judicial na recuperação judicial? Qual a sua função nesse procedimento?

A

Deferido o processamento do pedido de recuperação, o juiz então deverá tomar as medidas descritas nos incisos do art. 52 da LRE. No inciso I, determina a lei que o juiz “nomeará o administrador judicial, observado o disposto no art. 21 desta Lei”. É bom ressaltar que, na recuperação, a função do administrador judicial é quase a mesma exercida no processo falimentar. Uma distinção importante, porém, deve ser apontada: na falência, ele passa a administrar a empresa, enquanto na recuperação o devedor continua com plenos direitos de administração, sendo apenas fiscalizado de perto pelo administrador judicial.

76
Q

O devedor judicial cuja recuperação judicial foi deferida tem de apresentar certidão negativa de débito para contratar com a Administração Pública?

A

No inciso II [do art. 52], prevê-se que o juiz “determinará a dispensa da apresentação de certidões negativas para que o devedor exerça suas atividades, exceto para contratação com o Poder Público ou para recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, observando o disposto no art. 69 desta Lei”. Em nossa opinião, para que o dispositivo realmente fosse útil na prática, deveria dispensar a apresentação de certidões negativas em qualquer situação. Afinal, se o devedor for sociedade empresária que tem boa parte de sua receita decorrente de contratação com a Administração Pública, suas atividades estarão seriamente comprometidas. Aliás, pode ser justamente esta a razão de sua crise. O ideal, pois, seria que a regra dispensasse, de forma genérica, a apresentação de certidões negativas para que o devedor exercesse normalmente suas atividades.

OBSERVAÇÃO:

O art. 52, II, foi recentemente alterado:

Art. 52. Estando em termos a documentação exigida no art. 51 desta Lei, o juiz deferirá o processamento da recuperação judicial e, no mesmo ato:

II – determinará a dispensa da apresentação de certidões negativas para que o devedor exerça suas atividades, exceto para contratação com o Poder Público ou para recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, observando o disposto no art. 69 desta Lei;

II - determinará a dispensa da apresentação de certidões negativas para que o devedor exerça suas atividades, observado o disposto no § 3º do art. 195 da Constituição Federal e no art. 69 desta Lei; (Redação dada pela Lei nº 14.112, de 2020) (Vigência)

Jurisprudência:

ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO. EMPRESA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PARTICIPAÇÃO. POSSIBILIDADE. CERTIDÃO DE FALÊNCIA OU CONCORDATA. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. DESCABIMENTO. APTIDÃO ECONÔMICO-FINANCEIRA. COMPROVAÇÃO. OUTROS MEIOS. NECESSIDADE.

  1. Conforme estabelecido pelo Plenário do STJ, “aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça” (Enunciado Administrativo n. 2).
  2. Conquanto a Lei n. 11.101/2005 tenha substituído a figura da concordata pelos institutos da recuperação judicial e extrajudicial, o art. 31 da Lei n. 8.666/1993 não teve o texto alterado para se amoldar à nova sistemática, tampouco foi derrogado.
  3. À luz do princípio da legalidade, “é vedado à Administração levar a termo interpretação extensiva ou restritiva de direitos, quando a lei assim não o dispuser de forma expressa” (AgRg no RMS 44099/ES, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 03/03/2016, DJe 10/03/2016).
  4. Inexistindo autorização legislativa, incabível a automática inabilitação de empresas submetidas à Lei n. 11.101/2005 unicamente pela não apresentação de certidão negativa de recuperação judicial, principalmente considerando o disposto no art. 52, I, daquele normativo, que prevê a possibilidade de contratação com o poder público, o que, em regra geral, pressupõe a participação prévia em licitação.
  5. O escopo primordial da Lei n. 11.101/2005, nos termos do art. 47, é viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.
  6. A interpretação sistemática dos dispositivos das Leis n.
  7. 666/1993 e n. 11.101/2005 leva à conclusão de que é possível uma ponderação equilibrada dos princípios nelas contidos, pois a preservação da empresa, de sua função social e do estímulo à atividade econômica atendem também, em última análise, ao interesse da coletividade, uma vez que se busca a manutenção da fonte produtora, dos postos de trabalho e dos interesses dos credores.
  8. A exigência de apresentação de certidão negativa de recuperação judicial deve ser relativizada a fim de possibilitar à empresa em recuperação judicial participar do certame, desde que demonstre, na fase de habilitação, a sua viabilidade econômica.
  9. Agravo conhecido para dar provimento ao recurso especial.
    (AREsp 309.867/ES, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 26/06/2018, DJe 08/08/2018)
77
Q

Os que ocorre com as ações e execuções movidas contra o devedor no caso de deferimento da recuperação judicial?

A

Resumo

  • Em princípio todas as ações e execuções contra o devedor são suspensas, com exceção das ações que demandam quantia ilíquida (art. 6.º, § 1.º), das ações que correm perante a Justiça do Trabalho (art. 6.º, § 2.º), das execuções fiscais (art. 6.º, § 7.º) e das ações e execuções movidas por credores cujos créditos não se sujeitam à recuperação judicial, nos termos do art. 49, §§ 3.º e 4.º, da LRE.

Livro

No inciso III, estabelece a lei que o juiz “ordenará a suspensão de todas as ações ou execuções contra o devedor, na forma do art. 6.º desta Lei, permanecendo os respectivos autos no juízo onde se processam, ressalvadas as ações previstas nos §§ 1.º, 2.º e 7.º do art. 6.º desta Lei e as relativas a créditos excetuados na forma dos §§ 3.º e 4.º do art. 49 desta Lei”. O dispositivo em questão cuida da instauração do chamado juízo universal, já analisado quando do estudo do processo falimentar. Na recuperação judicial também há a instauração do juízo universal e também há exceções a este. Assim, em princípio todas as ações e execuções contra o devedor são suspensas, com exceção das ações que demandam quantia ilíquida (art. 6.º, § 1.º), das ações que correm perante a Justiça do Trabalho (art. 6.º, § 2.º), das execuções fiscais (art. 6.º, § 7.º) e das ações e execuções movidas por credores cujos créditos não se sujeitam à recuperação judicial, nos termos do art. 49, §§ 3.º e 4.º, da LRE. Destaque-se, porém, que nesses casos o juízo universal não atrairá as demandas suspensas para a sua competência: a lei deixou claro que elas se suspendem, mas continuam nos respectivos juízos onde estão sendo processadas, sobretudo porque essa suspensão é temporária, conforme determinação do art. 6.º, § 4.º, da LRE: “na recuperação judicial, a suspensão de que trata o caput deste artigo em hipótese nenhuma excederá o prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias contado do deferimento do processamento da recuperação, restabelecendo-se, após o decurso do prazo, o direito dos credores de iniciar ou continuar suas ações e execuções, independentemente de pronunciamento judicial”.

Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário.

§ 1º Terá prosseguimento no juízo no qual estiver se processando a ação que demandar quantia ilíquida.

§ 2º É permitido pleitear, perante o administrador judicial, habilitação, exclusão ou modificação de créditos derivados da relação de trabalho, mas as ações de natureza trabalhista, inclusive as impugnações a que se refere o art. 8º desta Lei, serão processadas perante a justiça especializada até a apuração do respectivo crédito, que será inscrito no quadro-geral de credores pelo valor determinado em sentença.

§ 4º Na recuperação judicial, a suspensão de que trata o caput deste artigo em hipótese nenhuma excederá o prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias contado do deferimento do processamento da recuperação, restabelecendo-se, após o decurso do prazo, o direito dos credores de iniciar ou continuar suas ações e execuções, independentemente de pronunciamento judicial.

§ 7º As execuções de natureza fiscal não são suspensas pelo deferimento da recuperação judicial, ressalvada a concessão de parcelamento nos termos do Código Tributário Nacional e da legislação ordinária específica.

Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos.

§ 1º Os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso.

§ 2º As obrigações anteriores à recuperação judicial observarão as condições originalmente contratadas ou definidas em lei, inclusive no que diz respeito aos encargos, salvo se de modo diverso ficar estabelecido no plano de recuperação judicial.

§ 3º Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação respectiva, não se permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4º do art. 6º desta Lei, a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial.

§ 4º Não se sujeitará aos efeitos da recuperação judicial a importância a que se refere o inciso II do art. 86 desta Lei.

§ 5º Tratando-se de crédito garantido por penhor sobre títulos de crédito, direitos creditórios, aplicações financeiras ou valores mobiliários, poderão ser substituídas ou renovadas as garantias liquidadas ou vencidas durante a recuperação judicial e, enquanto não renovadas ou substituídas, o valor eventualmente recebido em pagamento das garantias permanecerá em conta vinculada durante o período de suspensão de que trata o § 4º do art. 6º desta Lei.

78
Q

Quais os efeitos do deferimento do processamento da recuperação judicial perante essas obrigações do sócio avalista? O curso da prescrição e de eventual execução relativa a essa dívida se suspende tanto em relação à sociedade quanto no tocante ao sócio avalista, nos termos do art. 6.º, parte final, da LRE? Ou o sócio avalista não pode ser compreendido na expressão sócio solidário usada pelo legislador?

A

Resumo

  • O entendimento prevalente na jurisprudência é de que o deferimento do processamento da recuperação judicial não gera a suspensão das ações e execuções movidas contra os sócios avalistas da sociedade.

- Entende-se que, no caso dos sócios que assumem a posição de avalistas, se deve aplicar o disposto no art. 49, § 1.º, da mesma lei: “os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso”.

Livro

A interpretação do art. 6.º da LRE, nos processos de recuperação judicial, tem suscitado uma polêmica interessante, que tem sido muito debatida nos tribunais pátrios. Trata-se dos efeitos do deferimento do processamento da recuperação judicial sobre as obrigações do sócio avalista da sociedade empresária em recuperação. O fato é que, em muitas situações, as sociedades empresárias em dificuldades financeiras recorrem a empréstimos e financiamentos, e muitas vezes esses negócios são avalizados pelos próprios sócios, que passam a ser, portanto, devedores solidários da sociedade da qual fazem parte em relação àquela específica obrigação. Assim, em caso de inadimplemento do empréstimo, por exemplo, a instituição financeira poderá executar tanto a sociedade quanto o sócio avalista, o qual, repita-se, assume a posição de devedor solidário da dívida. Pois bem. Quais os efeitos do deferimento do processamento da recuperação judicial perante essas obrigações do sócio avalista? O curso da prescrição e de eventual execução relativa a essa dívida se suspende tanto em relação à sociedade quanto no tocante ao sócio avalista, nos termos do art. 6.º, parte final, da LRE? Ou o sócio avalista não pode ser compreendido na expressão sócio solidário usada pelo legislador? Os tribunais brasileiros, em regra, têm entendido que o deferimento do processamento da recuperação judicial somente gera os efeitos do art. 6.º da LRE sobre as ações e execuções contra a sociedade, mas não contra seus sócios avalistas, isto é, as ações e execuções contra os sócios não seriam suspensas e tramitariam normalmente. Segundo esse entendimento, majoritário até então, o sócio solidário a que faz referência o dispositivo legal em análise seria apenas aquele que tem responsabilidade solidária à da sociedade, como o sócio da sociedade em nome coletivo, por exemplo. Ademais, entende-se que, no caso dos sócios que assumem a posição de avalistas, se deve aplicar o disposto no art. 49, § 1.º, da mesma lei: “os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso”. Discordamos desse entendimento, uma vez que ele com certeza inibirá os pedidos de recuperação judicial por parte de sociedades que tenham empréstimos avalizados por sócios, o que não atende ao espírito da lei. No sentido da posição majoritária, confiram-se o Enunciado 43 da I Jornada de Direito Comercial do CJF e os seguintes julgados do STJ:

Enunciado 43. A suspensão das ações e execuções previstas no art. 6.º da Lei n. 11.101/2005 não se estende aos coobrigados do devedor.

Processual civil e comercial. Nota promissória. Execução de sócioavalista. Empresa avalizada com falência decretada. Suspensão da ação. Não cabimento. Inexistência de solidariedade entre sócio e sociedade falida. Como instituto típico do direito cambiário, o aval é dotado de autonomia substancial, de sorte que a sua existência, validade e eficácia não estão jungidas à da obrigação avalizada. Diante disso, o fato do sacador de nota promissória vir a ter sua falência decretada, em nada afeta a obrigação do avalista do título, que, inclusive, não pode opor em seu favor qualquer dos efeitos decorrentes da quebra do avalizado. O art. 24 do DL 7.661/45 determina a suspensão das ações dos credores particulares de sócio solidário da sociedade falida, circunstância que não alcança a execução ajuizada em desfavor de avalista da falida. Muito embora o avalista seja devedor solidário da obrigação avalizada, ele não se torna, por conta exclusiva do aval, sócio da empresa em favor da qual presta a garantia. Mesmo na hipótese do avalista ser também sócio da empresa avalizada, para que se possa falar em suspensão da execução contra o sócio-avalista, tendo por fundamento a quebra da empresa avalizada, é indispensável, nos termos do art. 24 do DL 7.661/45, que se trate de sócio solidário da sociedade falida. Recurso especial a que se nega provimento (REsp 883.859/SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3.ª Turma, j. 10.03.2009, DJe 23.03.2009). Agravo regimental. Direito empresarial e processual civil. Recurso especial. Execução ajuizada em face de sócio-avalista de pessoa jurídica em recuperação judicial. Suspensão da ação. Impossibilidade. 1. O caput do art. 6.º da Lei n. 11.101/05, no que concerne à suspensão das ações por ocasião do deferimento da recuperação, alcança apenas os sócios solidários, presentes naqueles tipos societários em que a responsabilidade pessoal dos consorciados não é limitada às suas respectivas quotas/ações. 2. Não se suspendem, porém, as execuções individuais direcionadas aos avalistas de título cujo devedor principal é sociedade em recuperação judicial, pois diferente é a situação do devedor solidário, na forma do § 1.º do art. 49 da referida Lei. De fato, “[a] suspensão das ações e execuções previstas no art. 6.º da Lei n. 11.101/2005 não se estende aos coobrigados do devedor” (Enunciado n. 43 da I Jornada de Direito Comercial CJF/STJ) 3. Agravo regimental não provido (AgRg no REsp 1.342.833/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4.ª Turma, j. 15.05.2014, DJe 21.05.2014).

79
Q

Que outras deliberações o juiz deve adotar na decisão em que defere o processamento de pedido de recuperação judicial?

A

Art. 52. Estando em termos a documentação exigida no art. 51 desta Lei, o juiz deferirá o processamento da recuperação judicial e, no mesmo ato:

I – <strong>nomeará o administrador judicial</strong>, observado o disposto no art. 21 desta Lei;

II - determinará a<strong> dispensa da apresentação de certidões</strong> negativas para que o devedor exerça suas atividades, observado o disposto no § 3º do art. 195 da Constituição Federal e no art. 69 desta Lei; (Redação dada pela Lei nº 14.112, de 2020) (Vigência)

III – ordenará a <strong>suspensão de todas as ações ou execuções</strong> contra o devedor, na forma do art. 6º desta Lei, permanecendo os respectivos autos no juízo onde se processam, ressalvadas as ações previstas nos §§ 1º , 2º e 7º do art. 6º desta Lei e as relativas a créditos excetuados na forma dos §§ 3º e 4º do art. 49 desta Lei;

IV – determinará ao devedor a apresentação de contas <strong>demonstrativas mensais</strong> enquanto perdurar a recuperação judicial, sob pena de destituição de seus administradores;

V – ordenará a intimação do Ministério Público e a comunicação por carta às Fazendas Públicas Federal e de todos os Estados e Municípios em que o devedor tiver estabelecimento.

§ 1º O juiz ordenará a expedição de edital, para publicação no órgão oficial, que conterá:

I – o resumo do pedido do devedor e da decisão que defere o processamento da recuperação judicial;

II – a relação nominal de credores, em que se discrimine o valor atualizado e a classificação de cada crédito;

III – a advertência acerca dos prazos para habilitação dos créditos, na forma do art. 7º , § 1º , desta Lei, e para que os credores apresentem objeção ao plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor nos termos do art. 55 desta Lei.

§ 2º Deferido o processamento da recuperação judicial, os credores poderão, a qualquer tempo, requerer a convocação de assembléia-geral para a constituição do Comitê de Credores ou substituição de seus membros, observado o disposto no § 2º do art. 36 desta Lei.

§ 3º No caso do inciso III do caput deste artigo, <strong>caberá ao devedor comunicar a suspensão aos juízos competentes.</strong>

§ 4º <u><strong>O devedor não poderá desistir do pedido de recuperação judicial após o deferimento de seu processamento, salvo se obtiver aprovação da desistência na assembléia-geral de credores.</strong></u>

OBS: De acordo com o inciso IV, o juiz ainda “determinará ao devedor a apresentação de contas demonstrativas mensais enquanto perdurar a recuperação judicial, sob pena de destituição de seus administradores”. A regra, ao que nos parece, está mal localizada, isso porque, como já foi dito, nesse momento a recuperação ainda não foi sequer concedida pelo juiz, tendo havido apenas o deferimento de seu processamento. De qualquer forma, fica já ciente o devedor de que, caso a recuperação judicial seja posteriormente concedida, ele deverá apresentar contas demonstrativas mensais para que sua situação financeira e patrimonial seja monitorada constantemente pelo juiz e pelos credores.

80
Q

O prazo do § 4.º do art. 6.º da LRE (180 de suspensão das ações e execuções com o deferimento do processamento do pedido de recuperação judicial) pode ser prorrogado?

A

Resumo

  • Pelo que entendi, o STJ tem admitido a prorrogação do prazo de 180 dias, quando a demora na aprovação do plano de recuperação judicial não decorre de culpa do devedor.
  • O STJ tem admitido a suspensão das ações e execuções após a aprovação do plano de recuperação judicial, o que, segundo André, é um equívoco.
  • Segundo ele, com a aprovação do plano, há a novação dos débitos, e a decisão homologa o plano passa a servir como título executivo judicial, de modo que as ações e execução suspensas devem ser extintas.

Livro

Quanto à aplicação do § 4.º do art. 6.º (“na recuperação judicial, a suspensão de que trata o caput deste artigo em hipótese nenhuma excederá o prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias contado do deferimento do processamento da recuperação, restabelecendo-se, após o decurso do prazo, o direito dos credores de iniciar ou continuar suas ações e execuções, independentemente de pronunciamento judicial”), o STJ tem mitigado tal regra, permitindo que a suspensão extrapole o prazo de 180 dias. Confira-se:

Processual civil. Conflito positivo de competência. Agravo regimental. Juízo de Direito e Juízo do Trabalho. Recuperação judicial. Reclamação trabalhista. Atos de execução. Montante apurado. Sujeição ao Juízo da Recuperação Judicial. Art. 6.º, § 4.º, da Lei n. 11.101/2005. Retomada das execuções individuais. Ausência de razoabilidade. Competência da Justiça estadual. (…) 3. A Segunda Seção do STJ tem jurisprudência firmada no sentido de que, no normal estágio da recuperação judicial, não é razoável a retomada das execuções individuais após o simples decurso do prazo legal de 180 dias de que trata o art. 6.º, § 4.º, da Lei n. 11.101/2005. 4. Agravo regimental desprovido (AgRg no CC 101.628/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 2.ª Seção, j. 25.05.2011, DJe 01.06.2011).

[…]

Na nossa opinião, o entendimento do STJ é equivocado. Veja-se que o tribunal tem aplicado a suspensão do § 4.º após a aprovação do plano e concessão da recuperação judicial, o que é sem sentido. Explico: uma vez aprovado o plano, há uma novação dos créditos a ele submetidos, e a decisão que o homologa constitui novo título executivo em favor dos credores. Assim, as eventuais execuções contra o devedor, que estavam suspensas, devem ser oportunamente extintas, e cada credor receberá seu crédito por meio de pagamentos espontâneos do devedor, nos termos no plano. Nesse sentido, confira-se o seguinte julgado, relatado pela Ministra Nancy Andrighi, com o qual concordamos:

Comercial. Agravo no conflito positivo de competência. Justiça Comum e do Trabalho. Lei 11.101/05. Recuperação judicial. Suspensão de ações e execuções. Prazo. Superado o prazo de suspensão previsto no art. 6.º, §§ 4.º e 5.º, da Lei n.º 11.101/05, sem que tenha havido a aprovação do plano de recuperação, devem as ações e execuções individuais retomar o seu curso, até que seja aprovado o plano ou decretada a falência da empresa. O legislador concatenou o período de suspensão de 180 dias com os demais prazos e procedimentos previstos no trâmite do próprio pedido de recuperação, que deve primar pela celeridade e efetividade, com vistas a evitar maiores prejuízos aos trabalhadores e à coletividade de credores, bem como à própria empresa devedora. A função social da empresa exige sua preservação, mas não a todo custo. A sociedade empresária deve demonstrar ter meios de cumprir eficazmente tal função, gerando empregos, honrando seus compromissos e colaborando com o desenvolvimento da economia, tudo nos termos do art. 47 da Lei n.º 11.101/05. Nesse contexto, a suspensão, por prazo indeterminado, de ações e execuções contra a empresa, antes de colaborar com a função social da empresa, significa manter trabalhadores e demais credores sem ação, o que, na maioria das vezes, terá efeito inverso, contribuindo apenas para o aumento do passivo que originou o pedido de recuperação. <u><strong>Outrossim, uma vez aprovado o plano de recuperação, não se faz plausível a retomada das ações e execuções individuais após o decurso do prazo legal de 180 dias, pois nos termos do art. 59 da Lei n.º 11.101/05, tal aprovação implica novação. </strong></u>Em situações excepcionais, a serem oportunamente enfrentadas por esta Corte, a regra pode comportar exceções. Todavia, o temperamento banalizado e desmedido do prazo de suspensão pode, desde já, importar retrocesso para o drama vivido na época das intermináveis concordatas, que o legislador procurou sepultar. Agravo não provido (AgRg no CC 110.250/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, 2.ª Seção, j. 08.09.2010, DJe 16.09.2010).

Ademais, é preciso lembrar que a regra do art. 6.º, § 4.º, da LRE teve o objetivo de assegurar a rápida solução do processo de recuperação judicial, evitando que o devedor postergue o seu andamento e, ao mesmo tempo, se beneficie da suspensão das execuções contra ele propostas. Nesses casos, porém, o STJ tem entendido que a suspensão só deve durar mesmo os 180 dias, aplicando-se literalmente a lei. Caso, porém, o atraso na conclusão do processo não seja culpa do devedor, o STJ tem mantido a suspensão das execuções após os 180 dias. Confira-se:

Comercial e processual civil. Agravo regimental. Conflito de competência. Recuperação judicial. Lei n. 11.101/2006, art. 6.º, § 4.º. Suspensão das ações e execuções. Prazo de 180 dias. Homologação do plano de recuperação. Prova do retardamento. Ausência. Flexibilização. Possibilidade. Improvimento. I. O deferimento da recuperação judicial carreia ao Juízo que a defere a competência para distribuir o patrimônio da massa falida aos credores conforme as regras concursais da lei falimentar. II. A extrapolação do prazo de 180 dias previsto no art. 6.º, § 4.º, da Lei n. 11.101/2005 não causa o automático prosseguimento das ações e das execuções contra a empresa recuperanda, senão quando comprovado que sua desídia causou o retardamento da homologação do plano de recuperação. III. Agravo regimental improvido (AgRg no CC 113.001/DF, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, 2.ª Seção, j. 14.03.2011, DJe 21.03.2011).

No mesmo sentido, foi aprovado o Enunciado 42 da I Jornada de Direito Comercial do CJF: “O prazo de suspensão previsto no art. 6.º, § 4.º, da Lei 11.101/2005 pode excepcionalmente ser prorrogado, se o retardamento do feito não puder ser imputado ao devedor”.

81
Q

O deferimento do pedido de processamento da recuperação judicial importa na suspensão da execuções fiscais movidas contra o devedor?

A

Resumo

  • Há decisões na Primeira Seção do STJ que admitem o prosseguimento da execução fiscal, inclusive com a prática de atos constritivos.
  • A Segunda Seção, contudo, tem decidido que, embora a execução fiscal não se suspenda, os atos de constrição do patrimônio do devedor devem ser submetidos ao crivo do juízo da recuperação judicial.
  • Enunciado 8 da Jurisprudência em Teses do STJ diz o seguinte: “o deferimento da recuperação judicial não suspende a execução fiscal, mas os atos que importem em constrição ou alienação do patrimônio da recuperanda devem se submeter ao juízo universal”.
  • O tema está para ser pacificado pela Corte Especial.

Livro

A Primeira Seção do STJ (Turmas que julgam questões de direito público) tem julgados que interpretam literalmente o art. 6.º, § 7.º, da LRE, entendendo que o deferimento do processamento da recuperação judicial não suspende o curso das execuções fiscais contra a empresa recuperanda.

Processual civil. Conflito positivo de competência. Empresa suscitante em recuperação judicial. Execução fiscal. Prosseguimento. Utilização do conflito de competência como sucedâneo recursal. Não conhecimento. Precedentes. 1. A Lei 11.101, de 2005, regulou a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, dispondo, em seu art. 6.º, caput, que “a decretação da falência ou deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário”. 2. Por seu turno, o parágrafo 7.º do referido dispositivo legal estabelece que a execução fiscal não se suspende em face do deferimento do pedido de recuperação judicial, visto que a competência para processamento e julgamento das execuções da Dívida Ativa da Fazenda Pública exclui a de qualquer outro juízo. 3. Tal dispositivo (art. 6.º, § 7.º) corrobora a previsão contida no art. 5.º da própria Lei de Execução Fiscal que determina a competência para apreciar e julgar execuções fiscais, bem como no art. 29 da referida legislação e no art. 187 do Código Tributário Nacional, que estabelecem que a cobrança judicial da dívida da Fazenda Pública não se sujeita à habilitação em falência. 4. <strong>Assim, considerando que os efeitos da recuperação judicial não alcançam a cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública, ficando restritos aos débitos perante credores privados, não há que se suspender o prosseguimento da execução fiscal.</strong> (…) (CC 116.579/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 1.ª Seção, j. 22.06.2011, DJe 02.08.2011).

Processual civil. Conflito de competência. Execução fiscal (penalidade administrativa por infração à legislação trabalhista). Recuperação judicial. Prevenção. Inobservância do art. 71, § 4.º, do RI/STJ. Sucedâneo recursal. Não conhecimento. (…) 2. Controverte-se a respeito da competência para dispor sobre o patrimônio de empresa que, ocupando o polo passivo em Execução Fiscal, teve deferido o pedido de Recuperação Judicial. 3. Conforme preveem o art. 6.º, § 7.º, da Lei 11.101/2005 e os arts. 5.º e 29 da Lei 6.830/1980, o deferimento da recuperação judicial não suspende o processamento autônomo do executivo fiscal. (…) 6. Consequência do exposto é que o eventual deferimento da nova modalidade de concurso universal de credores mediante dispensa de apresentação de CND não impede o regular processamento da Execução Fiscal, com as implicações daí decorrentes (penhora de bens, etc.). 7. Não se aplicam os precedentes da Segunda Seção, que fixam a prevalência do Juízo da Falência sobre o Juízo da Execução Comum (Civil ou Trabalhista) para dispor sobre o patrimônio da empresa, tendo em vista que, conforme dito, o processamento da Execução Fiscal não sofre interferência, ao contrário do que ocorre com as demais ações (art. 6.º, caput, da Lei 11.101/2005). (…) 9. Deve, portanto, ser prestigiada a solução que preserve a harmonia e vigência da legislação federal, de sorte que, a menos que o crédito fiscal seja extinto ou tenha a exigibilidade suspensa, a Execução Fiscal terá regular processamento, <strong>mantendo-se plenamente respeitadas as faculdades e liberdade de atuação do Juízo por ela responsável</strong>. (…) (AgRg no CC 112.646/DF, Rel. Min. Herman Benjamin, 1.ª Seção, j. 11.05.2011, DJe 17.05.2011).

Em contrapartida, a Segunda Seção do STJ (Turmas que julgam questões de direito privado) tem inúmeros julgados adotando posição contrária, entendendo que, em respeito ao princípio da preservação da empresa, é incompatível o cumprimento da recuperação judicial e o prosseguimento normal das execuções fiscais (com penhoras, bloqueios de ativos etc.), porque isso atinge o patrimônio do devedor e pode comprometer o sucesso do plano de recuperação. Assim, quaisquer atos de constrição do patrimônio do devedor devem se submeter ao crivo do juízo da recuperação judicial, mesmo que sejam referentes a eventual execução fiscal.

Agravo regimental no conflito positivo de competência. Juízo da Recuperação Judicial e Juízo Trabalhista. Lei n.º 11.101/05. Preservação dos interesses dos demais credores. Manutenção da atividade econômica. Função social da empresa. Incompatibilidade entre o cumprimento do plano de recuperação e a manutenção de execução fiscal que corre no juízo trabalhista. Competência do juízo universal. Decisão mantida por seus próprios fundamentos. Agravo regimental não provido (AgRg no CC 112.402/RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 2.ª Seção, j. 10.08.2011, DJe 17.08.2011).

Agravo regimental no conflito positivo de competência. Recuperação judicial. Princípio da preservação da empresa. Função social da empresa. Incompatibilidade entre o cumprimento do plano de recuperação e a manutenção de execução fiscal que corre no juízo trabalhista. Competência do juízo universal. Decisão mantida por seus próprios fundamentos. Agravo regimental não provido. (…) 2. “Apesar de a execução fiscal não se suspender em face do deferimento do pedido de recuperação judicial (art. 6.º, § 7.º, da LF n. 11.101/05, art. 187 do CTN e art. 29 da LF n. 6.830/80), submetem-se ao crivo do juízo universal os atos de alienação voltados contra o patrimônio social das sociedades empresárias em recuperação, em homenagem ao princípio da preservação da empresa” (CC 114.987/SP, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Segunda Seção, julgado em 14.03.2011, DJe 23.03.2011). 3. Agravo regimental não provido (AgRg no CC 115.275/GO, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 2.ª Seção, j. 14.09.2011, DJe 07.10.2011).

[…]

Em 2012, a Corte Especial do STJ, no julgamento de Questão de Ordem no CC 120.432/SP, decidiu que a Segunda Seção, que congrega a Terceira e Quarta Turmas, é competente para julgar conflitos de competência que envolvam execuções fiscais movidas contra empresários e sociedades empresárias em recuperação judicial. Esse entendimento foi reafirmado em 2019, no julgamento do CC 153.998.

No entanto, as referidas decisões da Corte Especial, por se referirem a conflitos de competência, acabam não resolvendo o problema, porque quando se trata de recursos especiais continua a existir dualidade de competência em processos envolvendo execuções fiscais e recuperações judiciais: ora os recursos são distribuídos para as Turmas de Direito Público (Primeira e Segunda Turmas, que compõem a Primeira Seção), ora são distribuídos para as Turmas de Direito Privado (Terceira e Quarta Turmas, que compõem a Segunda Seção). A título ilustrativo, confira-se o seguinte julgado da Segunda Turma do STJ (que não devia mais estar julgando esse tipo de caso), que permitiu não apenas o seguimento da execução fiscal, mas também a determinação de medidas constritivas contra a empresa recuperanda:

Processual civil. Agravo interno no recurso especial. Submissão à regra prevista no Enunciado Administrativo 03/STJ. Execução fiscal. Empresa em recuperação judicial. Medidas constritivas. Possibilidade. Entendimento do Tribunal de origem no sentido de que, no caso, a medida não prejudica o plano de recuperação judicial. Questão atrelada ao reexame de matéria de fato. Óbice da Súmula 7/STJ. (…) (AgInt no REsp 1.615.859/MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, j. 10.11.2016, DJe 18.11.2016).

No geral, porém, o entendimento que parece prevalecer em ambas as Seções é semelhante: a execução fiscal pode prosseguir, mas atos de constrição que possam comprometer o sucesso da recuperação judicial devem ser evitados e se submeter ao crivo do juízo da recuperação. Nesse sentido:

Recurso fundado no novo CPC/2015. Tributário. Agravo interno. Sociedade empresária em recuperação judicial. Execução fiscal. Prosseguimento. Restrição patrimonial. Impossibilidade. 1. Vigora no STJ o posicionamento de que, não obstante disponha a Lei n.º 11.101/05 que o pedido de recuperação judicial não suspende os feitos executivos, a possibilidade de prosseguimento da execução fiscal, assim como a preferência do crédito tributário, não enseja, de forma automática, a continuidade de todos os atos executórios, tendo em vista que não devem ser realizados atos constritivos que venham a prejudicar a tentativa de recuperação da empresa. Precedentes: AgRg no REsp 1.121.762/SC, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, julgado em 5/6/2012, DJe 13/6/2012; AgInt no AREsp 779.631/DF, Rel. Ministra Diva Malerbi (Desembargadora convocada TRF-3.ª região), Segunda Turma, julgado em 17/5/2016, DJe 24/5/2016; AgRg no REsp 1519405/PE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 28/4/2015, DJe 6/5/2015. 2. Agravo interno a que se nega provimento (AgInt no REsp 1.605.862/SC, Rel. Min. Sérgio Kukina, Primeira Turma, j. 08.11.2016, DJe 24.11.2016).

Processo civil. Agravo interno no conflito de competência. Execução fiscal e recuperação judicial. Compatibilização das regras e princípios. Continuidade da execução fiscal. Atos de constrição judicial. Competência do juízo da recuperação judicial. Edição da Lei n. 13.043, de 13.11.2014. Parcelamento de créditos de empresa em recuperação. 1. A execução fiscal não se suspende com o deferimento da recuperação judicial; todavia, fica definida a competência do Juízo universal para dar seguimento aos atos constritivos ou de alienação. (…) (AgInt no CC 140.021/MT, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Segunda Seção, j. 10.08.2016, DJe 22.08.2016).

[…]

Há, inclusive, o Enunciado 8 da Jurisprudência em Teses, que tem o seguinte teor: “o deferimento da recuperação judicial não suspende a execução fiscal, mas os atos que importem em constrição ou alienação do patrimônio da recuperanda devem se submeter ao juízo universal”.

De qualquer forma, como já venho defendendo há alguns anos nesta obra, o ideal é que se determine, definitivamente, que Seção é competente para julgar essas questões que envolvem execuções fiscais contra empresas em recuperação judicial, seja qual for o tipo de processo (recurso especial, conflito de competência etc.). Isso deve ocorrer em breve, porque a matéria foi objeto do Tema Repetitivo 987 do STJ, cuja questão jurídica afetada a julgamento da Corte Especial é a “possibilidade da prática de atos constritivos, em face de empresa em recuperação judicial, em sede de execução fiscal de dívida tributária e não tributária”. Houve, inclusive, “determinação de suspensão nacional de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos (art. 1.037, II, CPC)”.

82
Q

As reclamações e execuções trabalhistas continuam tramitando no caso de deferimento do processamento da recuperação judicial?

A

Apesar de as reclamações trabalhistas serem suspensas pelo deferimento do processamento da recuperação judicial, o STJ tem admitido que a Justiça do Trabalho liquide os créditos discutidos nessas ações e até inicie a execução, desde, é claro, que as medidas executivas determinadas não comprometam o patrimônio da empresa em recuperação (pode-se, por exemplo, penhorar bens dos sócios ou de outra empresa do mesmo grupo econômico). Nesse sentido:

Processual civil. Agravo interno no conflito de competência. Declaração de competência da Justiça Trabalhista. Crédito laboral em fase de liquidação. Decisão mantida. 1. Segundo decidido por esta Corte Superior, mesmo estando a empresa devedora em recuperação judicial, a Justiça do Trabalho detém competência para liquidar os créditos pleiteados em reclamações trabalhistas. Precedentes. 2. “Decidido o conflito de competência, esgotado está o respectivo objeto; se fato superveniente exigir a modificação da competência, deve ser submetido ao juízo da causa” (AgRg no CC 34.393/GO, Relator Ministro Ari Pargendler, Segunda Seção, julgado em 08/3/2006, DJ 27/3/2006, p. 149). 3. <strong>Na execução trabalhista, podem ser determinados atos que não atinjam o patrimônio da recuperanda e, consequentemente, não prejudiquem a competência do juízo universal – nos termos da Súmula n. 480/STJ –,<u> a exemplo da constrição sobre o patrimônio dos sócios da empresa em restabelecimento ou de sociedade do mesmo grupo econômico não submetida à recuperação</u>, hipóteses verificadas em julgados desta Corte Superior.</strong> Precedentes. 4. Agravo interno a que se nega provimento (AgInt no CC 146.073/SP, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Segunda Seção, j. 23.11.2016, DJe 28.11.2016).

83
Q

Qual é o prazo para o devedor apresentar o plano de recuperação judicial uma vez deferido o processamento da recuperação? Qual a consequência da inobservância desse prazo?

A

Publicada a decisão que defere o processamento do pedido de recuperação, o devedor terá prazo de 60 dias para apresentar ao juízo o seu plano de recuperação, conforme previsão do art. 53 da LRE: “o plano de recuperação será apresentado pelo devedor em juízo no prazo improrrogável de 60 (sessenta) dias da publicação da decisão que deferir o processamento da recuperação judicial, sob pena de convolação em falência”.

Se o plano não for apresentado no prazo acima mencionado (60 dias), a falência do devedor será decretada. Portanto, é importante destacar: a partir do deferimento do processamento do pedido de recuperação judicial, ou o devedor conseguirá sua recuperação judicial ou sua falência será decretada. Não há uma terceira saída.

84
Q

O que deve conter o plano de recuperação judicial?

A

Art. 53. O plano de recuperação será apresentado pelo devedor em juízo no prazo improrrogável de 60 (sessenta) dias da publicação da decisão que deferir o processamento da recuperação judicial, sob pena de convolação em falência, e deverá conter:

I – discriminação pormenorizada dos meios de recuperação a ser empregados, conforme o art. 50 desta Lei, e seu resumo;

II – demonstração de sua viabilidade econômica; e

III – laudo econômico-financeiro e de avaliação dos bens e ativos do devedor, subscrito por profissional legalmente habilitado ou empresa especializada.

Art. 50. Constituem meios de recuperação judicial, observada a legislação pertinente a cada caso, dentre outros:

I – concessão de prazos e condições especiais para pagamento das obrigações vencidas ou vincendas;

II – cisão, incorporação, fusão ou transformação de sociedade, constituição de subsidiária integral, ou cessão de cotas ou ações, respeitados os direitos dos sócios, nos termos da legislação vigente;

III – alteração do controle societário;

IV – substituição total ou parcial dos administradores do devedor ou modificação de seus órgãos administrativos;

V – concessão aos credores de direito de eleição em separado de administradores e de poder de veto em relação às matérias que o plano especificar;

VI – aumento de capital social;

VII – trespasse ou arrendamento de estabelecimento, inclusive à sociedade constituída pelos próprios empregados;

VIII – redução salarial, compensação de horários e redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva;

IX – dação em pagamento ou novação de dívidas do passivo, com ou sem constituição de garantia própria ou de terceiro;

X – constituição de sociedade de credores;

XI – venda parcial dos bens;

XII – equalização de encargos financeiros relativos a débitos de qualquer natureza, tendo como termo inicial a data da distribuição do pedido de recuperação judicial, aplicando-se inclusive aos contratos de crédito rural, sem prejuízo do disposto em legislação específica;

XIII – usufruto da empresa;

XIV – administração compartilhada;

XV – emissão de valores mobiliários;

XVI – constituição de sociedade de propósito específico para adjudicar, em pagamento dos créditos, os ativos do devedor.

§ 1º Na alienação de bem objeto de garantia real, a supressão da garantia ou sua substituição somente serão admitidas mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia.

§ 2º Nos créditos em moeda estrangeira, a variação cambial será conservada como parâmetro de indexação da correspondente obrigação e só poderá ser afastada se o credor titular do respectivo crédito aprovar expressamente previsão diversa no plano de recuperação judicial.

85
Q

O que ocorre com as garantias dos credores no caso de aprovação do plano de recuperação judicial?

A

Resumo

  • Segundo o art. 49, pár. 1, da LRE, os credores mantêm suas garantias e privilégios com a aprovação da recuperação judicial, e a alienação dos bens dados em garantia só pode ser feita no processo com seu consentimento.
  • Vislumbra-se, contudo, a possibilidade de que o plano de recuperação judicial preveja a supressão das garantia. Nesse caso, segundo o STJ, não haveria necessidade de consentimento dos credores com garantia, bastando a aprovação do plano pela maioria.
  • O autor - e o votos vencidos no julgado paradigma do STJ - defende a supressão só poderia valer aos credores que a ela aderissem.

Livro

Apesar de a concessão da recuperação judicial implicar novação dos créditos sujeitos ao plano, a lei faz expressa ressalva às eventuais garantias existentes (art. 59 da LRE, parte final).

Com efeito, o art. 49, § 1.º, da LRE diz que “os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso”, e o art. 50, § 1.º, estabelece que “na alienação de bem objeto de garantia real, a supressão da garantia ou sua substituição somente serão admitidas mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia”.

Nesse contexto, poderia um plano de recuperação estipular a supressão de garantias? E mais: nesse caso, a supressão se daria apenas em relação aos credores que com ela consentiram na assembleia que deliberou a aprovação do plano, ou se estenderia aos credores ausentes e dissidentes?

Em decisão polêmica, a Terceira Turma do STJ decidiu, por maioria, pela possibilidade de o plano de recuperação judicial estipular a supressão de garantias, entendendo ainda que essa supressão, se aprovada pela maioria, aplica-se a todos os credores, inclusive os dissidentes.

RECURSO ESPECIAL. PLANO DE RECUPERAÇÃO. 1. DELIMITAÇÃO DA CON-TROVÉRSIA. 2. TRATAMENTO DIFERENCIADO. CREDORES DA MESMA CLASSE. POSSIBILIDADE. PARÂMETROS. 3. CONVOLAÇÃO DA RECUPERAÇÃO EM FA-LÊNCIA. CONVOCAÇÃO DE ASSEMBLEIA DE CREDORES. DESNECESSIDADE. 4. PREVISÃO DE SUPRESSÃO DAS GARANTIAS REAIS E FIDEJUSSÓRIAS DEVIDAMENTE APROVADA PELA ASSEMBLEIA GERAL DE CREDORES. VINCULAÇÃO DA DEVEDORA E DE TODOS OS CREDORES, INDISTINTAMENTE. 5. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Cinge-se a controvérsia a definir: a) se é possível imprimir tratamento diferenciado entre credores de uma mesma classe na recuperação judicial; b) se é necessária a convocação da assembleia de credores antes da convolação da recuperação judicial em falência na hipótese de descumprimento de obrigação constante do plano de recuperação judicial; c) se a supressão das garantias real e fidejussória estampada expressamente no plano de recuperação judicial, aprovada em assembleia geral de credores, vincula todos os credores da respectiva classe ou apenas aqueles que votaram favoravelmente à supressão. Por unanimidade de votos. 2. A criação de subclasses entre os credores da recuperação judicial é possível desde que seja estabelecido um critério objetivo, justificado no plano de recuperação judicial, abrangendo credores com interesses homogêneos, ficando vedada a estipulação de descontos que impliquem em verdadeira anulação de direitos de eventuais credores isolados ou minoritários. 3. O devedor pode propor, quando antever dificuldades no cumprimento do plano de recuperação, alterações em suas cláusulas, as quais serão submetidas ao crivo dos credores. Uma vez descumpridas as obrigações estipuladas no plano e requerida a convolação da recuperação em falência, não pode a recuperanda submeter aos credores decisão que compete exclusivamente ao juízo da recuperação. Por maioria de votos. 4. Na hipótese dos autos, a supressão das garantias real e fidejussórias restou estampada expressamente no plano de recuperação judicial, que contou com a aprovação dos credores devidamente representados pelas respectivas classes, o que importa na vinculação de todos os credores, indistintamente. 4.1 Em regra (e no silêncio do plano de recuperação judicial), a despeito da novação operada pela recuperação judicial, preservam-se as garantias, no que alude à possibilidade de seu titular exercer seus direitos contra terceiros garantidores e impor a manutenção das ações e execuções promovidas contra fiadores, avalistas ou coobrigados em geral, a exceção do sócio com responsabilidade ilimitada e solidária (§ 1.º do art. 49 da Lei 11.101/2005). E, especificamente sobre as garantias reais, estas somente poderão ser supridas ou substituídas, por ocasião de sua alienação, mediante expressa anuência do credor titular de tal garantia, nos termos do § 1.º do art. 50 da referida lei. 4.2 Conservadas, em princípio, as condições originariamente contratadas, no que se inserem as garantias ajustadas, a lei de regência prevê, expressamente, a possibilidade de o plano de recuperação judicial, sobre elas, dispor de modo diverso (§ 2.º do art. 49 da Lei 11.101/2009). 4.3. Por ocasião da deliberação do plano de recuperação apresentado, credores, representados por sua respectiva classe, e devedora, procedem às tratativas negociais destinadas a adequar os interesses contrapostos, bem avaliando em que extensão de esforços e renúncias estariam dispostos a suportar, no intento de reduzir os prejuízos que se avizinham (sob a perspectiva dos credores), bem como de permitir a reestruturação da empresa em crise (sob o enfoque da devedora). E, de modo a permitir que os credores ostentem adequada representação, seja para instauração da assembleia geral, seja para a aprovação do plano de recuperação judicial, a lei de regência estabelece, nos arts. 37 e 45, o respectivo quórum mínimo. 4.4 Inadequado, pois, restringir a supressão das garantias reais e fidejussórias, tal como previsto no plano de recuperação judicial aprovado pela assembleia geral, somente aos credores que tenham votado favoravelmente nesse sentido, conferindo tratamento diferenciado aos demais credores da mesma classe, em manifesta contrariedade à deliberação majoritária. 4.5 No particular, a supressão das garantias real e fidejussórias restou estampada expressamente no plano de recuperação judicial, que contou com a aprovação dos credores devidamente representados pelas respectivas classes (providência, portanto, que converge, numa ponderação de valores, com os interesses destes majoritariamente), o que importa, reflexamente, na observância do § 1.º do art. 50 da Lei 11.101/2005, e, principalmente, na vinculação de todos os credores, indistintamente. 5. Recurso especial parcialmente provido. (REsp 1700487/MT, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Rel. p/ Acórdão Min. Marco Aurélio Bellizze, 3.ª Turma, j. 02.04.2019, DJe 26.04.2019)

Discordo do entendimento que se sagrou vencedor nesse julgamento, me alinhando com os votos divergentes.

O Ministro Cueva, com base nos dispositivos legais já mencionados (art. 49, § 1.º, e art. 50, § 1.º), votou no sentido de que “a cláusula que estende a novação aos coobrigados seria apenas legítima e oponível aos credores que aprovarem o plano de recuperação sem nenhuma ressalva, não sendo eficaz, portanto, no tocante aos credores que não se fizeram presentes quando da assembleia geral de credores, abstiveram-se de votar ou se posicionaram contra tal disposição”.

No mesmo sentido votou a Ministra Nancy, para quem “a supressão das garantias somente pode ser admissível – por se tratar de direitos disponíveis – na hipótese de haver anuência prévia dos respectivos titulares, consubstanciada na manifestação assemblear favorável à proposta de soerguimento apresentada pelo devedor”.

No entanto, prevaleceu o voto do Ministro Bellizze. Segundo ele, se a supressão das garantias estiver prevista no plano de recuperação judicial e se esse plano for aprovado pela maioria, isso “importa, reflexamente, na observância do § 1.º do art. 50 da Lei 11.101/2005, e, principalmente, na vinculação de todos os credores, indistintamente”.

86
Q

Quais crédito não se submetem aos efeitos da recuperação judicial?

A

Resumo

  • credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil
  • credor titular da posição de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias
  • credor titular de posição de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio.
  • credores titulares de importância entregue ao devedor, em moeda corrente nacional, decorrente de adiantamento a contrato de câmbio para exportação.

Livro

[…] estão excluídos da recuperação judicial, segundo os §§ 3.º e 4.º, do art. 49 da LRE, o “credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio (…)” e os credores titulares de “importância entregue ao devedor, em moeda corrente nacional, decorrente de adiantamento a contrato de câmbio para exportação, na forma do art. 75, §§ 3.º e 4.º, da Lei n.º 4.728, de 14 de julho de 1965, desde que o prazo total da operação, inclusive eventuais prorrogações, não exceda o previsto nas normas específicas da autoridade competente”. Trata-se, basicamente, de créditos bancários. A nova legislação falimentar deu tratamento privilegiado a esses créditos, determinando que eles não se submetem aos efeitos da recuperação judicial. O objetivo foi dar mais segurança ao crédito bancário no Brasil, e com isso tentar diminuir os juros dessas operações (o chamado spread).

Quanto à regra do art. 49, § 3.º, o STJ já confirmou, no julgamento do REsp 1.725.609, que os créditos referentes a contrato de compra e venda com reserva de domínio não estão sujeitos aos efeitos da recuperação judicial. Ademais, entendeu-se que para incidência da mencionada regra não é preciso que tenha sido feito o registro do contrato em cartório: “muito embora não haja precedentes do STJ tratando especificamente da matéria objeto deste recurso, verifica-se que esta 3ª Turma, em situações análogas – versando sobre direitos de crédito cedidos fiduciariamente –, já firmou posição no sentido da desnecessidade do registro para sua exclusão dos efeitos da recuperação judicial do devedor (REsp 1.412.529 e REsp 1.592.647)”.

87
Q

A obrigação relativa a aval concedido pelo devedor sujeita-se aos efeitos da recuperação judicial?

A

Resumo

  • Segundo a Terceira Turma do STJ, depende: se o aval foi oneroso, sim (art. 49 da LRE); se o aval foi gratuito, não (art. 5.º, inciso I, da LRE).

Livro

Por fim, ainda sobre os créditos sujeitos à recuperação, vale mencionar um julgado do STJ que analisou a seguinte questão: se uma sociedade empresária é avalista em um determinado negócio e pede recuperação judicial, esse seu “débito” referente ao aval se sujeita aos efeitos da recuperação? Segundo a Terceira Turma do STJ, depende: se o aval foi oneroso, sim (art. 49 da LRE); se o aval foi gratuito, não (art. 5.º, inciso I, da LRE).

No caso, o administrador judicial disse: “a manutenção da credora no rol de créditos tem por base apenas evitar discussões no futuro relativas à sua não participação efetiva nas discussões sobre o plano apresentado e que espera seja aprovado, eis que se eventualmente o devedor principal deixar de efetuar o pagamento das dívidas o aval da empresa recuperanda deverá ser pago nos moldes do plano ora aprovado”. Mas o juízo da recuperação excluiu o crédito do plano, a pedido do próprio credor: “a despeito da condição de avalista ostentada pela recuperanda, não há previsão legal a autorizar a inclusão de créditos devidos por terceiros no processo de soerguimento, sobretudo quando, como na hipótese, na data do pedido de recuperação, não havia se configurado o inadimplemento do devedor principal”. O TJRS reformou a decisão e manteve o crédito no quadro-geral de credores, entendendo ser viável “a habilitação de crédito decorrente de aval, porquanto o avalista garante o pagamento como devedor solidário, podendo, inclusive, ser acionado individualmente, sem que seja necessário observar a ordem pela qual se obrigaram em razão da solidariedade cambiária”. A Terceira Turma do STJ manteve a decisão do tribunal:

RECURSOS ESPECIAIS. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. IMPUGNAÇÃO DE CRÉDITO. AVAL PRESTADO PELA SOCIEDADE RECUPERANDA EM MOMENTO ANTERIOR AO PEDIDO DE SOERGUIMENTO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. AVAL. OBRIGAÇÃO AUTÔNOMA. SUJEIÇÃO AOS EFEITOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL. CRÉDITOS EXISTENTES NA DATA DO PEDIDO, AINDA QUE NÃO VENCIDOS. OBRIGAÇÕES A TÍTULO GRATUITO. EXCEÇÃO. VERIFICAÇÃO DA ONEROSIDADE/GRATUIDADE. IMPRESCINDIBILIDADE. RETORNO DOS AUTOS AO JUÍZO DE ORIGEM. (…) 2. O propósito recursal é definir se os créditos derivados de garantia cambiária (aval) prestada por sociedade empresária que veio a ingressar com pedido de recuperação judicial sujeita-se ou não aos efeitos do processo de soerguimento. (…) 4. O art. 49, caput, da Lei 11.101/2005 estipula que todos os créditos existentes na data do pedido de recuperação judicial ficam sujeitos a seus efeitos (ainda que não vencidos), excetuados aqueles listados nos §§ 3.º e 4.º do mesmo dispositivo, dentre os quais não se incluiu o aval prestado pela recuperanda. 5. Assim, dada a autonomia dessa espécie de garantia e a permissão legal para inclusão no plano dos créditos ainda não vencidos, não haveria motivos para a exclusão pleiteada pelo recorrente. 6. Há que se ponderar, todavia, acerca da disposição constante no art. 5.º, I, da Lei 11.101/2005, que afasta expressamente da recuperação judicial a exigibilidade das obrigações a título gratuito. 7. Tratando-se, como no particular, de aval prestado por sociedade empresária, não se pode presumir que a garantia cambiária tenha sido concedida como ato de mera liberalidade, devendo-se apurar as circunstâncias que ensejaram sua concessão. 8. De fato, é bastante comum que as relações negociais travadas no âmbito empresarial envolvam a prestação de garantias em contrapartida a algum outro ato praticado (ou a ser praticado) pelo avalizado ou por terceiros interessados. 9. Conforme anota respeitável doutrina, ainda que não exista contraprestação direta pelo aval, há situações em que a garantia foi prestada com o objetivo de auferir algum ganho, mesmo que intangível, como ocorre na hipótese de aval prestado em benefício de sociedades do mesmo grupo econômico ou para viabilizar operações junto a parceiros comerciais, hipóteses nas quais não se pode considerar tal obrigação como a título gratuito. 10. Desse modo – considerando a impossibilidade de se examinar fatos e provas em sede de recurso especial e tendo em vista que partes não tiveram a oportunidade de se manifestar acerca do fundamento sobre o qual se assenta o presente entendimento –, devem os autos retornar ao juízo a quo para que, após oportunizar às partes que comprovem o que for de seu interesse, verifique se o aval pode ou não ser classificado como ato de mera liberalidade e prossiga no julgamento da impugnação apresentada pelo recorrente. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO. (REsp 1829790/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3.ª Turma, j. 19.11.2019, DJe 22.11.2019)

88
Q

Em que consiste a “trava bancária”? O STJ tem a reconhecido na apreciação dos processo de recuperação judicial?

A

Como dito, os credores titulares da posição de proprietários fiduciários de bens móveis ou imóveis não se sujeitam à recuperação judicial. Muitas vezes, é um banco que ocupa essa posição, e geralmente os bens dados em garantia fiduciária são recebíveis da empresa devedora. Funciona assim: essa empresa faz um financiamento bancário e, para garantir esse financiamento, entrega ao banco, em garantia fiduciária, créditos que ela tem para receber no futuro (recebíveis). Como esses créditos são considerados, para os efeitos legais, bens móveis, o banco se torna um credor titular da posição de proprietário fiduciário, não ficando sujeito ao plano de recuperação judicial, nos termos do art. 49, § 3.º, da Lei 11.101/2005.

Na prática, isso significa que essa empresa não vai receber diretamente esses créditos futuros, os quais serão pagos ao banco e ficarão numa conta específica, como garantia, para eventual satisfação do financiamento da empresa devedora, caso ela não honre sua obrigação nos termos pactuados.

É aqui que surge o problema da “trava bancária”: se essa empresa devedora pedir recuperação judicial, os recebíveis dados em garantia (créditos futuros que ela receberia) estarão com o banco credor, o que faz com que eles “travem” a recuperação, já que muitas vezes esses recebíveis correspondem à boa parte do que a empresa devedora tem para receber.

Por isso, tornou-se comum que empresas devedoras nessa situação alegassem em juízo a ilegalidade da exclusão desses créditos na recuperação judicial, mas o STJ já tem precedentes concluindo pela sua legalidade.

89
Q

A quem cabe a decisão sobre a concessão da recuperação judicial? O prazo para objeção do plano de recuperação judicial conta-se a partir de que momento? Quem analisa a objeção ao plano?

A

Resumo

  • A assembleia de credores decide, o juiz apenas homologa.
  • As objeções deverão ser apresentadas ao juiz no prazo de 30 dias.
  • Em regra, esse prazo deve ser contado a partir da publicação da relação preliminar de credores elaborada pelo administrador judicial. Contudo, se o plano de recuperação ainda não tiver sido apresentado nesse momento, o prazo das objeções só será contado a partir da publicação do aviso de recebimento do plano, nos termos do art. 53, parágrafo único, da LRE.

- A não apresentação de objeção pelo credores caracteriza aprovação tácita, dispensando-se a convocação da assembleia.

  • É assembleia de credores, não o juiz, que analisa a objeção formulada por algum credor.
  • Eventuais alterações propostas ao plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor poderão ser aprovadas pela assembleia geral dos credores, “desde que haja expressa concordância do devedor e em termos que não impliquem diminuição dos direitos exclusivamente dos credores ausentes” (art. 56, § 3.º).
  • Não aprovado o plano, cabe ao juiz, em princípio, decretar a falência do devedor. Isso não ocorre na hipótese do parágrafo primeiro do art. 58.

Livro

Deferido o processamento da recuperação pelo juiz e apresentado o plano de recuperação pelo devedor, conforme visto nos tópicos antecedentes, estabelece o art. 53, parágrafo único, da LRE que “o juiz ordenará a publicação de edital contendo aviso aos credores sobre o recebimento do plano de recuperação e fixando o prazo para a manifestação de eventuais objeções (…)”.

Assim, depois que o devedor apresentar o seu plano de recuperação judicial, cabe aos credores analisar o plano e decidir se o devedor deve ter a concessão da recuperação ou não. Portanto, houve mudança relevante em relação ao regime anterior, no qual a decisão sobre a concessão da concordata cabia ao juiz, após análise dos requisitos legais. Na atual lei, são os credores que decidem, e o juiz apenas “homologa” essa decisão, concedendo a recuperação, caso o plano seja aprovado, ou decretando a falência, caso o plano seja rejeitado.

As objeções deverão ser apresentadas ao juiz no prazo de 30 dias, contados da publicação da relação preliminar de credores que o administrador judicial elaborará nos termos do art. 7.º, § 2.º, da LRE. Mas esse prazo é contado a partir de quando? Depende. Em regra, esse prazo deve ser contado a partir da publicação da relação preliminar de credores elaborada pelo administrador judicial, nos termos do art. 7.º, § 2.º, da LRE. No entanto, pode ocorrer de o plano não ter sido ainda apresentado nessa data, o que acontecerá quando o procedimento de habilitação e verificação dos créditos for rápido. Nesse caso, o plano pode ainda não ter sido apresentado, visto que o devedor tem, conforme vimos, 60 dias para cumprir tal dever. Assim, aplica-se a regra do parágrafo único do art. 55: o prazo das objeções só será contado a partir da publicação do aviso de recebimento do plano, nos termos do art. 53, parágrafo único, da LRE.

Se nenhum credor apresentar objeções ao plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor, significa que houve uma aprovação tácita. Nesse caso, não se convoca assembleia, e passa-se já para a fase do art. 57 da LRE, que será analisado adiante.

Por outro lado, se for apresentada alguma objeção por parte de qualquer credor ao plano de recuperação judicial, dispõe o art. 56 da LRE que “o juiz convocará a assembleia geral de credores para deliberar sobre o plano de recuperação”. Em obediência ao § 1.º desse mesmo art. 56, “a data designada para a realização da assembleia geral não excederá 150 (cento e cinquenta) dias contados do deferimento do processamento da recuperação judicial”.

O STJ já decidiu que o credor pode desistir da objeção apresentado contra o plano, se o fizer antes da convocação da assembleia.

Recurso especial. Pedido de recuperação judicial. Impugnação de credor. Desistência antes de convocada a Assembleia Geral de credores. Possibilidade. 1. O credor pode desistir da objeção ao plano de recuperação judicial se o pedido de desistência tiver sido apresentado antes de convocada a assembleia geral de credores. 2. Recurso especial provido (REsp 1.014.153/RN, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 4.ª Turma, j. 04.08.2011, DJe 05.09.2011).

É importante destacar que, havendo objeção de algum credor, não cabe ao juiz analisá-la e julgá-la. O juiz deve convocar a assembleia geral de credores para que ela decida sobre o plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor. A convocação não pode demorar, sobretudo porque o prazo de suspensão da prescrição e das execuções, na recuperação judicial, é de apenas 180 dias (art. 6.º, § 4.º, da LRE), conforme já visto. É por isso que a lei determina que a data designada para a realização da assembleia geral não excederá 150 dias contados do deferimento do processamento da recuperação judicial. Ou seja, ainda restarão 30 dias de suspensão da prescrição e das execuções.

Nas objeções que os credores apresentarem ao juiz, eles poderão expor meios alternativos de recuperação, diferentes dos meios indicados pelo devedor no seu plano.

A assembleia geral então será realizada e os credores devidamente habilitados deliberarão sobre a aprovação, a alteração ou a rejeição do plano apresentado pelo devedor. Caso o plano seja aprovado, a assembleia poderá, ainda, conforme previsão do § 2.º do art. 56, “indicar os membros do Comitê de Credores, na forma do art. 26 desta Lei, se já não estiver constituído”.

Ressalte-se que eventuais alterações propostas ao plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor poderão ser aprovadas pela assembleia geral dos credores, “desde que haja expressa concordância do devedor e em termos que não impliquem diminuição dos direitos exclusivamente dos credores ausentes” (art. 56, § 3.º).

Caso, todavia, o plano de recuperação do devedor não convença os credores quanto à sua viabilidade, a assembleia geral o rejeitará, e a consequência dessa rejeição será a decretação da falência do devedor, conforme previsão do § 4.º do art. 56 da LRE: “rejeitado o plano de recuperação pela assembleia geral de credores, o juiz decretará a falência do devedor”. Ressalve-se, no entanto, a hipótese excepcional em que o juiz pode conceder a recuperação judicial mesmo se os credores não aprovarem o plano (art. 58, § 1.º, da LRE).

Em suma: a assembleia geral de credores pode tomar basicamente três decisões sobre o plano de recuperação judicial apresentado pelo devedor: (i) aprovar sem alterações; (ii) aprovar com alterações; (iii) não aprovar.

No primeiro caso, aprovação sem alterações, a própria assembleia já pode eleger os membros do comitê de credores, se for o caso, e passa-se à fase do art. 57 da LRE, que será analisado a seguir.

No segundo caso, aprovação com alterações, será necessário que o devedor consinta expressamente com as mudanças e que elas não causem prejuízos aos credores ausentes, que não puderam votar. Cumpridos esses requisitos, passa-se à fase do art. 57.

No terceiro caso, não aprovação do plano, cabe ao juiz, em princípio, decretar a falência do devedor, porque a decisão dos credores é soberana. Existe apenas um caso em que a não aprovação do plano em assembleia não impede o juiz de conceder a recuperação judicial, que analisaremos adiante: trata-se da hipótese prevista no art. 58, § 1.º, da LRE, em que ocorre uma “quase aprovação”. Sendo esse o caso, e entendendo o juiz pela concessão, passa-se também à fase do art. 57.

Art. 57. Após a juntada aos autos do plano aprovado pela assembléia-geral de credores ou decorrido o prazo previsto no art. 55 desta Lei sem objeção de credores, o devedor apresentará certidões negativas de débitos tributários nos termos dos arts. 151, 205, 206 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional.

Art. 58. Cumpridas as exigências desta Lei, o juiz concederá a recuperação judicial do devedor cujo plano não tenha sofrido objeção de credor nos termos do art. 55 desta Lei ou tenha sido aprovado pela assembléia-geral de credores na forma do art. 45 desta Lei.

§ 1º O juiz poderá conceder a recuperação judicial com base em plano que não obteve aprovação na forma do art. 45 desta Lei, desde que, na mesma assembléia, tenha obtido, de forma cumulativa:

I – o voto favorável de credores que representem mais da metade do valor de todos os créditos presentes à assembléia, independentemente de classes;

II – a aprovação de 2 (duas) das classes de credores nos termos do art. 45 desta Lei ou, caso haja somente 2 (duas) classes com credores votantes, a aprovação de pelo menos 1 (uma) delas;

III – na classe que o houver rejeitado, o voto favorável de mais de 1/3 (um terço) dos credores, computados na forma dos §§ 1º e 2º do art. 45 desta Lei.

90
Q

O juiz pode deixar de homologar o plano de recuperação judicial se verificar a sua inviabilidade econômico-financeira?

A

Sobre o assunto, foi aprovado o Enunciado 46 da I Jornada de Direito Comercial do CJF: “Não compete ao juiz deixar de conceder a recuperação judicial ou de homologar a extrajudicial com fundamento na análise econômico-financeira do plano de recuperação aprovado pelos credores.”

Quanto a esse enunciado 46, o STJ já decidiu que “o plano de recuperação judicial, aprovado em assembleia pela vontade dos credores nos termos exigidos pela legislação de regência, possui índole marcadamente contratual. Como corolário, ao juízo competente não é dado imiscuir-se nas especificidades do conteúdo econômico do acordo estipulado entre devedor e credores”. Assim, entendeu-se que “a concessão de prazos e descontos para pagamento dos créditos novados insere-se dentre as tratativas negociais passíveis de deliberação pelo devedor e pelos credores quando da discussão assemblear sobre o plano de recuperação apresentado, respeitado o disposto no art. 54 da LFRE quanto aos créditos trabalhistas” (REsp 1.631.762/SP).

No mesmo sentido, o STJ já decidiu que o plano de recuperação judicial pode estabelecer o índice de correção monetária e a taxa de juros aplicável aos créditos a ele submetidos: “descabimento da revisão judicial da taxa de juros e do índice de correção monetária, em respeito à soberania da assembleia geral” (REsp 1.630.932-SP).

91
Q

O plano de recuperação judicial pode ser aprovado sem a apresentação de certidão negativa de débito tributário?

A

Resumo

  • Com a regulamentação do artigo referente ao parcelamento em caso de recuperação judicial, passou a ser necessário que o devedor apresente a certidão negativa de débito tributário.
  • Hoje, basta formular o pedido de recuperação judicial que já se torna possível a obtenção do parcelamento.

Livro

Segundo o disposto no art. 57 da LRE, “após a juntada aos autos do plano aprovado pela assembleia geral de credores ou decorrido o prazo previsto no art. 55 desta Lei sem objeção de credores, o devedor apresentará certidões negativas de débitos tributários nos termos dos arts. 151, 205, 206 da Lei n.º 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional”. Em suma: se os credores consentirem com o plano do devedor, sem a apresentação de qualquer objeção, ou se eles aprovarem o plano, com ou sem alterações, na assembleia geral, caberá apenas ao devedor providenciar a apresentação de certidões negativas de débitos tributários, nos termos previstos pela legislação tributária.

Muitos autores criticam essa exigência da lei falimentar, destacando que em diversas ocasiões o passivo tributário do devedor é justamente uma das razões de sua crise.

Além disso, entendia-se que essa regra só poderia ser aplicada quando fosse editada a lei específica que trata do parcelamento de crédito tributário para devedores em recuperação, prevista no art. 68 da LRE. Foi o que decidiu, por exemplo, a Câmara Especial de Falências e Recuperações Judiciais do Tribunal de Justiça de São Paulo, no caso da Vasp. No mesmo sentido, foi aprovado o Enunciado 55 da I Jornada de Direito Comercial do CJF: “O parcelamento do crédito tributário na recuperação judicial é um direito do contribuinte, e não uma faculdade da Fazenda Pública, e, enquanto não for editada lei específica, não é cabível a aplicação do disposto no art. 57 da Lei 11.101/2005 e no art.191-A do CTN”.

A Corte Especial do STJ, no julgamento do REsp 1.187.404, seguiu essa mesma linha de entendimento, acompanhando voto do Ministro Luís Felipe Salomão. Confira-se a ementa do referido julgado: Direito empresarial e tributário.

Recurso especial. Recuperação judicial. Exigência de que a empresa recuperanda comprove sua regularidade tributária. Art. 57 da Lei n.º 11.101/2005 (LRF) e art. 191-A do Código Tributário Nacional (CTN). Inoperância dos mencionados dispositivos. Inexistência de lei específica a disciplinar o parcelamento da dívida fiscal e previdenciária de empresas em recuperação judicial. 1. O art. 47 serve como um norte a guiar a operacionalidade da recuperação judicial, sempre com vistas ao desígnio do instituto, que é “viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica”. 2. O art. 57 da Lei n.º 11.101/2005 e o art. 191-A do CTN devem ser interpretados à luz das novas diretrizes traçadas pelo legislador para as dívidas tributárias, com vistas, notadamente, à previsão legal de parcelamento do crédito tributário em benefício da empresa em recuperação, que é causa de suspensão da exigibilidade do tributo, nos termos do art. 151, inciso VI, do CTN. 3. O parcelamento tributário é direito da empresa em recuperação judicial que conduz a situação de regularidade fiscal, de modo que eventual descumprimento do que dispõe o art. 57 da LRF só pode ser atribuído, ao menos imediatamente e por ora, à ausência de legislação específica que discipline o parcelamento em sede de recuperação judicial, não constituindo ônus do contribuinte, enquanto se fizer inerte o legislador, a apresentação de certidões de regularidade fiscal para que lhe seja concedida a recuperação. 4. Recurso especial não provido (REsp 1187404/MT, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial, j. 19.06.2013, DJe 21.08.2013).

Ocorre que a Lei 13.043/2014 finalmente disciplinou essa hipótese de parcelamento prevista no art. 68 da legislação falimentar, acrescentando o art. 10-A na Lei 10.522/2002. Agora, o devedor que pleitear ou tiver deferido o processamento da recuperação judicial, nos termos dos arts. 51, 52 e 70 da Lei 11.101/2005, poderá parcelar seus débitos com a Fazenda Nacional em 84 (oitenta e quatro) parcelas mensais e consecutivas (a LC 147/2014 acresceu o parágrafo único ao art. 68, para prever que as microempresas e as empresas de pequeno porte farão jus a prazos 20% superiores àqueles regularmente concedidos às demais empresas). Basta formular o pedido de recuperação judicial que já se torna possível o parcelamento.

Essa forma de parcelamento é aplicada à totalidade dos débitos do empresário ou da sociedade empresária constituídos ou não, inscritos ou não em Dívida Ativa da União, mesmo que discutidos judicialmente em ação proposta pelo sujeito passivo ou em fase de execução fiscal já ajuizada, ressalvados exclusivamente os débitos incluídos em parcelamentos regidos por outras leis.

Enfim, atualmente não há mais saída: para que devedor obtenha a concessão da recuperação judicial terá que obedecer ao comando do art. 57 da LRE.

92
Q

O que ocorre com os protestos contra o devedor no caso de concessão da recuperação judicial?

A

Resumo

  • Como há novação, devem ser levantados. Contudo, a novação se dá sob condição resolutiva, de modo que, convolando-se a recuperação em falência, permite-se a restauração do protesto.

Livro

Uma vez concedida a recuperação, dispõe o art. 59 da LRE que “o plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores ao pedido, e obriga o devedor e todos os credores a ele sujeitos, sem prejuízo das garantias, observado o disposto no § 1.º do art. 50 desta Lei”. Sobre essa regra, confira-se o seguinte julgado STJ:

Recuperação judicial. Homologação. Dívidas Compreendidas no plano. Novação. Inscrição em cadastro de inadimplentes. <strong>Protestos. Baixa, sob condição resolutiva.</strong> Cumprimento das obrigações previstas no plano de recuperação. 1. Diferentemente do regime existente sob a vigência do DL 7.661/1945, cujo art. 148 previa expressamente que a concordata não produzia novação, a primeira parte do art. 59 da Lei n.º 11.101/2005 estabelece que o plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores ao pedido. 2. A novação induz a extinção da relação jurídica anterior, substituída por uma nova, não sendo mais possível falar em inadimplência do devedor com base na dívida extinta. 3. Todavia, a novação operada pelo plano de recuperação fica sujeita a uma condição resolutiva, na medida em que o art. 61 da Lei 11.101/2005 dispõe que o descumprimento de qualquer obrigação prevista no plano acarretará a convolação da recuperação em falência, com o que os credores terão reconstituídos seus direitos e garantias nas condições originalmente contratadas, deduzidos os valores eventualmente pagos e ressalvados os atos validamente praticados no âmbito da recuperação judicial. 4. Diante disso, uma vez homologado o plano de recuperação judicial, os órgãos competentes devem ser oficiados a providenciar a baixa dos protestos e a retirada, dos cadastros de inadimplentes, do nome da recuperanda e dos seus sócios, por débitos sujeitos ao referido plano, <strong>com a ressalva expressa de que essa providência será adotada sob a condição resolutiva de a devedora cumprir todas as obrigações previstas no acordo de recuperação. </strong> 5. Recurso especial provido (REsp 1.260.301/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, j. 14.08.2012, DJe 21.08.2012).

Ademais, segundo o § 1.º desse mesmo dispositivo, “a decisão judicial que conceder a recuperação judicial constituirá título executivo judicial, nos termos do art. 584, inciso III, do caput da Lei n.º 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil”.

93
Q

No caso de alienação do estabelecimento como forma de cumprir o plano de recuperação judicial, o adquirente assumirá o débito trabalhista a ele referente?

A

Resumo

  • Na venda de filiais ou unidades produtivas isoladas do devedor, desde que essa venda esteja prevista no plano aprovado pela assembleia, o arrematante não assumirá qualquer ônus ou débito, nem mesmo de natureza tributária ou trabalhista.

Livro

Por fim, vale destacar que é comum que no plano de recuperação judicial apresentado aos credores o devedor proponha, como meio de recuperação, a alienação de ativos ou mesmo de filiais. Nesse caso, muitos potenciais interessados poderiam desistir do negócio com medo de assumir, como sucessor, débitos antigos (por exemplo, dívidas trabalhistas dos antigos funcionários de uma determinada filial ou dívidas tributárias de um imóvel etc.).

Pensando nisso, conforme já mencionamos, a LRE estabeleceu, no art. 60, uma regra muito interessante, mas também muito polêmica: na venda de filiais ou unidades produtivas isoladas do devedor, desde que essa venda esteja prevista no plano aprovado pela assembleia, o arrematante (a venda será feita em hasta pública: leilão, pregão ou propostas fechadas) não assumirá qualquer ônus ou débito. O parágrafo único do art. 60 é muito claro: o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária. Sobre esse dispositivo legal, foi aprovado o Enunciado 47 da I Jornada de Direito Comercial do CJF: “Nas alienações realizadas nos termos do art. 60 da Lei 11.101/2005, não há sucessão do adquirente nas dívidas do devedor, inclusive nas de natureza tributária, trabalhista e decorrentes de acidentes de trabalho”.

É verdade que alguns juízes trabalhistas não entendem dessa forma, e muitas vezes reconhecem a ocorrência de sucessão trabalhista nesses casos, mas a jurisprudência do STJ exclui a sucessão trabalhista, e ainda afirma que a competência para decidir qualquer questão sobre eventual efeito da venda de filial ou unidade produtiva isolada feita com base no art. 60, parágrafo único da LRE é do juízo da recuperação judicial, e não da Justiça do Trabalho: “a jurisprudência desta Casa tem reiteradamente reconhecido a configuração de conflito nas hipóteses em que juízos distintos divergem acerca da existência de sucessão nas dívidas e obrigações da recuperanda pela arrematante, nos casos de alienação judicial de unidade produtiva (art. 60, parágrafo único, c/c art. 141, § 1.º, da Lei n.o 11.101/2005), inclusive declarando a competência do Juízo da recuperação judicial, haja vista ser este o mais habilitado para verificar a extensão e a higidez da alienação, além do evidente prejuízo decorrente do desenvolvimento simultâneo da atividade jurisdicional, sobre o mesmo tema, pelos juízos suscitados” (CC 152.841/SP).

Por fim, vale ainda mencionar o Enunciado 104 das Jornadas de Direito Comercial do CJF: “não haverá sucessão do adquirente de ativos em relação a penalidades pecuniárias aplicadas ao devedor com base na Lei 12.846/2013 (Lei Anticorrupção), quando a alienação ocorrer com fundamento no art. 60 da Lei 11.101/2005”.

94
Q

Em que hipóteses o administrador da empresa, na recuperação judicial, deve ser destituído?

A

Art. 64. Durante o procedimento de recuperação judicial, o devedor ou seus administradores serão mantidos na condução da atividade empresarial, sob fiscalização do Comitê, se houver, e do administrador judicial, salvo se qualquer deles:

I – houver sido condenado em sentença penal transitada em julgado por crime cometido em recuperação judicial ou falência anteriores ou por crime contra o patrimônio, a economia popular ou a ordem econômica previstos na legislação vigente;

II – houver indícios veementes de ter cometido crime previsto nesta Lei;

III – houver agido com dolo, simulação ou fraude contra os interesses de seus credores;

IV – houver praticado qualquer das seguintes condutas:

a) efetuar gastos pessoais manifestamente excessivos em relação a sua situação patrimonial;
b) efetuar despesas injustificáveis por sua natureza ou vulto, em relação ao capital ou gênero do negócio, ao movimento das operações e a outras circunstâncias análogas;
c) descapitalizar injustificadamente a empresa ou realizar operações prejudiciais ao seu funcionamento regular;
d) simular ou omitir créditos ao apresentar a relação de que trata o inciso III do caput do art. 51 desta Lei, sem relevante razão de direito ou amparo de decisão judicial;

V – negar-se a prestar informações solicitadas pelo administrador judicial ou pelos demais membros do Comitê;

VI – tiver seu afastamento previsto no plano de recuperação judicial.

Parágrafo único. Verificada qualquer das hipóteses do caput deste artigo, o juiz destituirá o administrador, que será substituído na forma prevista nos atos constitutivos do devedor ou do plano de recuperação judicial.

95
Q

Qual é o prazo de duração do processo de recuperação judicial, a partir da aprovação do plano? Podem restar dívidas após o esgotamento desse prazo?

A

O objetivo do processo de recuperação judicial é propiciar ao devedor as condições necessárias à superação de sua crise econômico-financeira. As medidas propostas no plano, pois, devem ser levadas a cabo para que surtam os efeitos esperados e permitam que a empresa continue em atividade. Sendo assim, estabelece o art. 63 da LRE que, “cumpridas as obrigações vencidas no prazo previsto no caput do art. 61 desta Lei, o juiz decretará por sentença o encerramento da recuperação judicial (…)”. Por sua vez, o art. 61, já examinado, prevê que a recuperação judicial deve durar até o cumprimento das obrigações previstas no plano que tiverem vencimento no período de até dois anos após a concessão da recuperação pelo juiz. Cumpridas essas obrigações, não deve mais ter continuidade o processo de recuperação, uma vez que as circunstâncias indicam que o devedor já superou a crise ou que ele, no mínimo, caminha seguramente no sentido de superá-la.

[…]

Ressalte-se, entretanto, que o fim do prazo mencionado no art. 61 da LRE não significa, necessariamente, que a partir de então o descumprimento das obrigações constantes do plano não surtirão qualquer efeito. Segundo o art. 62 da LRE, “após o período previsto no art. 61 desta Lei, no caso de descumprimento de qualquer obrigação prevista no plano de recuperação judicial, qualquer credor poderá requerer a execução específica ou a falência com base no art. 94 desta Lei”. Assim, ainda que o processo de recuperação judicial venha a ser extinto por sentença, nos termos do art. 63, poderão os credores, caso alguma obrigação do plano seja descumprida, requerer a decretação da falência do devedor, fundamentando seu pedido no art. 94, III, alínea g, da LRE.

96
Q

Em que hipóteses há a convolação da recuperação judicial em falência?

A

Resumo

  • Se houver descumprimento do plano de recuperação judicial dentre dos 2 anos a que se refere a LRE.
  • “por deliberação da assembleia geral de credores, na forma do art. 42 desta Lei; II – pela não apresentação, pelo devedor, do plano de recuperação no prazo do art. 53 desta Lei; III – quando houver sido rejeitado o plano de recuperação, nos termos do § 4.º do art. 56 desta Lei; IV – por descumprimento de qualquer obrigação assumida no plano de recuperação, na forma do § 1.º do art. 61 desta Lei”.
  • Pode o devedor ter a sua falência decretada em função de requerimento de credor não sujeito aos efeitos da recuperação, por qualquer dos fundamentos previstos nos incisos I, II e III do art. 94 da LRE.

Livro

No tópico anterior, analisamos a situação em que o devedor cumpriu regularmente as obrigações constantes do seu plano de recuperação no período de até dois anos após a sua concessão, caso em que o juiz deverá encerrar o processo por sentença, continuando o devedor a exercer normalmente as suas atividades. Pode ocorrer, todavia, de o devedor não conseguir cumprir as obrigações que assumiu no plano dentro desse prazo de dois anos após a sua concessão, hipótese em que a LRE prevê, em seu art. 61, § 1.º, a convolação da recuperação judicial em falência: “durante o período estabelecido no caput deste artigo, o descumprimento de qualquer obrigação prevista no plano acarretará a convolação da recuperação em falência, nos termos do art. 73 desta Lei”. Perceba-se que a convolação da recuperação em falência só tem lugar quando o descumprimento se dá dentro do prazo de dois anos após a concessão da recuperação. Se o descumprimento de alguma obrigação do plano ocorrer após esse prazo, não será o caso de convolar a recuperação em falência, mas de o credor interessado executar a dívida ou requerer a falência do devedor com base no art. 94, III, alínea g, da LRE.

Mas não é apenas o descumprimento de obrigação assumida no plano que enseja a convolação do processo de recuperação em processo falimentar. Com efeito, as hipóteses em que tal medida deve ser adotada pelo juiz estão previstas no art. 73 da LRE, segundo o qual “o juiz decretará a falência durante o processo de recuperação judicial: I – por deliberação da assembleia geral de credores, na forma do art. 42 desta Lei; II – pela não apresentação, pelo devedor, do plano de recuperação no prazo do art. 53 desta Lei; III – quando houver sido rejeitado o plano de recuperação, nos termos do § 4.º do art. 56 desta Lei; IV – por descumprimento de qualquer obrigação assumida no plano de recuperação, na forma do § 1.º do art. 61 desta Lei”.

[…]

Finalizando o presente tópico, destaque-se que a falência do devedor também pode ser decretada durante o processo de recuperação judicial sem que decorra, necessariamente, de uma das situações descritas no art. 73 da LRE. De fato, o parágrafo único desse dispositivo estabelece que, além das hipóteses de convolação da recuperação em falência nele previstas, pode o devedor ter a sua falência decretada em função de requerimento de credor não sujeito aos efeitos da recuperação. Assim, os titulares de crédito decorrente de adiantamento a contrato de câmbio (art. 86, II), de alienação fiduciária, de arrendamento mercantil (leasing), de compra e venda de imóvel com cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade e de compra e venda com reserva de domínio (art. 49, § 3.º), que não se submetem aos efeitos da recuperação, conforme já examinado, podem requerer a falência do devedor em recuperação por qualquer dos fundamentos previstos nos incisos I, II e III do art. 94 da LRE. Nesse caso, frise-se, não se trata de convolação da recuperação judicial em falência, mas de simples decretação da falência, em virtude da ocorrência de uma de suas causas ensejadoras.

97
Q

No caso de decretação da falência, os créditos relativos às obrigações contraídas pelo devedor no período de recuperação judicial obterão que classificação na falência?

A

Art. 67. Os créditos decorrentes de obrigações contraídas pelo devedor durante a recuperação judicial, inclusive aqueles relativos a despesas com fornecedores de bens ou serviços e contratos de mútuo, serão considerados extraconcursais, em caso de decretação de falência, respeitada, no que couber, a ordem estabelecida no art. 83 desta Lei.

Parágrafo único. Os créditos quirografários sujeitos à recuperação judicial pertencentes a fornecedores de bens ou serviços que continuarem a provê-los normalmente após o pedido de recuperação judicial terão privilégio geral de recebimento em caso de decretação de falência, no limite do valor dos bens ou serviços fornecidos durante o período da recuperação.

98
Q

As microempresas e empresas de pequeno porte podem se submeter a plano de recuperação judicial ordinário, ou são obrigadas a submeter-se ao plano especial, disciplinado do art. 70 a 72 da LRE?

A

Resumo

  • É uma faculdade colocada à disposição dos microempresários e dos empresários de pequeno porte.

Livro

É preciso destacar que, pela leitura do art. 70, § 1.º, da LRE, parece-nos que a submissão ao plano de recuperação especial é uma faculdade colocada à disposição dos microempresários e dos empresários de pequeno porte. De fato, eis o teor da norma em comento: “as microempresas e as empresas de pequeno porte, conforme definidas em lei, poderão apresentar plano especial de recuperação judicial, desde que afirmem sua intenção de fazê-lo na petição inicial de que trata o art. 51 desta Lei”. Cabe aos devedores enquadrados como ME ou EPP, pois, optar pelo plano especial da lei, mencionando essa opção em sua petição inicial. O uso do termo “poderão”, em nossa opinião, não deixa dúvidas quanto à interpretação da regra: trata-se, indubitavelmente, de uma faculdade.

99
Q

Quais deverão ser as condições do plano especial de recuperação judicial?

A

Conforme o art. 71 da LRE, “o plano especial de recuperação judicial será apresentado no prazo previsto no art. 53 desta Lei e limitar-se-á às seguintes condições: I – abrangerá todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos, excetuados os decorrentes de repasse de recursos oficiais, os fiscais e os previstos nos §§ 3.º e 4.º do art. 49; II – preverá parcelamento em até 36 (trinta e seis) parcelas mensais, iguais e sucessivas, acrescidas de juros equivalentes à taxa Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – SELIC, podendo conter ainda a proposta de abatimento do valor das dívidas; III – preverá o pagamento da 1.º (primeira) parcela no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, contado da distribuição do pedido de recuperação judicial; IV – estabelecerá a necessidade de autorização do juiz, após ouvido o administrador judicial e o Comitê de Credores, para o devedor aumentar despesas ou contratar empregados”.

100
Q

Os créditos trabalhistas submetem-se ao plano especial de recuperação judicial?

A

Resumo

  • Hoje, o que a lei diz é que ““todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos, excetuados os decorrentes de repasse de recursos oficiais, os fiscais e os previstos nos §§ 3.º e 4.º do art. 49”.

Livro

De acordo com a redação original do inciso I do art. 71, apenas os créditos quirografários podiam ser abrangidos pelo plano especial das MEs e EPPs em crise, com as mesmas exceções do plano normal dos demais devedores, relativas aos créditos previstos no art. 49, §§ 3.º e 4.º, da LRE. Portanto, os créditos trabalhistas, fiscais, com garantia real, com privilégio especial ou geral etc. não se submetiam aos efeitos do plano especial de recuperação dos microempresários e dos empresários de pequeno porte. Ocorre que essa regra foi alterada, e atualmente o plano especial abrange “todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos, excetuados os decorrentes de repasse de recursos oficiais, os fiscais e os previstos nos §§ 3.º e 4.º do art. 49”.

Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos.

§ 3º Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação respectiva, não se permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4º do art. 6º desta Lei, a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial.

§ 4º Não se sujeitará aos efeitos da recuperação judicial a importância a que se refere o inciso II do art. 86 desta Lei.

Art. 86. Proceder-se-á à restituição em dinheiro:

II – da importância entregue ao devedor, em moeda corrente nacional, decorrente de adiantamento a contrato de câmbio para exportação, na forma do art. 75, §§ 3º e 4º , da Lei nº 4.728, de 14 de julho de 1965, desde que o prazo total da operação, inclusive eventuais prorrogações, não exceda o previsto nas normas específicas da autoridade competente;

101
Q

De quem é a competência para aprovar o plano especial de recuperação judicial?

A

Resumo

  • Não é competência da assembleia geral dos credores, mas do próprio juiz.

Livro

Além de todas as especificidades do plano especial descritas no art. 71 da LRE e acima analisadas, há uma outra característica relevante a ser destacada: o art. 72 prevê que a aprovação do plano especial apresentados pelas MEs e EPPs devedoras, ao contrário do que ocorre no processo de recuperação normal dos demais devedores, não é competência da assembleia geral dos credores, mas do próprio juiz. Eis o que diz a regra em questão: “caso o devedor de que trata o art. 70 desta Lei opte pelo pedido de recuperação judicial com base no plano especial disciplinado nesta Seção, não será convocada assembleia geral de credores para deliberar sobre o plano, e o juiz concederá a recuperação judicial se atendidas as demais exigências desta Lei”.

Da mesma forma, é ao juiz que competem a rejeição do plano especial e a consequente decretação da falência do micro ou pequeno devedor. Com efeito, dispõe o art. 72, parágrafo único, que “o juiz também julgará improcedente o pedido de recuperação judicial e decretará a falência do devedor se houver objeções, nos termos do art. 55, de credores titulares de mais da metade de qualquer uma das classes de créditos previstos no art. 83, computados na forma do art. 45, todos desta Lei”.

102
Q

Quais são os requisitos para que a sociedade faça jus ao benefício da recuperação extrajudicial?

A

Resumo

  • (i) exercer atividade empresarial regularmente há mais de dois anos;
  • (ii) não ser falido ou, se tiver sido, já ter suas obrigações e responsabilidade declaradas extintas por sentença transitada em julgado;
  • (iii) não ter, há menos de cinco anos, obtido concessão de recuperação judicial ou de concordata – tratandose de ME ou EPP, não ter, há menos de cinco anos, obtido concessão de recuperação judicial com base no plano especial já examinado;
  • (iv) não ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio controlador, pessoa condenada por crime falimentar.
  • (v) “o devedor não poderá requerer a homologação de plano extrajudicial, se estiver pendente pedido de recuperação judicial ou se houver obtido recuperação judicial ou homologação de outro plano de recuperação extrajudicial há menos de 2 (dois) anos”.
  • O devedor pode negociar extrajudicialmente com seus credores um plano de recuperação, caso não preencha esses requisitos.

Livro

Da leitura do art. 161 da LRE, acima transcrito, percebe-se que para fazer jus ao benefício da recuperação extrajudicial o devedor em crise deverá preencher os mesmos requisitos exigíveis para a consecução da recuperação judicial, constantes do art. 48 e já examinados, quais sejam: (i) exercer atividade empresarial regularmente há mais de dois anos; (ii) não ser falido ou, se tiver sido, já ter suas obrigações e responsabilidade declaradas extintas por sentença transitada em julgado; (iii) não ter, há menos de cinco anos, obtido concessão de recuperação judicial ou de concordata – tratandose de ME ou EPP, não ter, há menos de cinco anos, obtido concessão de recuperação judicial com base no plano especial já examinado; (iv) não ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio controlador, pessoa condenada por crime falimentar.

Além desses requisitos gerais previstos no art. 48, há ainda outro, constante da norma do art. 161, § 3.º, da LRE: “o devedor não poderá requerer a homologação de plano extrajudicial, se estiver pendente pedido de recuperação judicial ou se houver obtido recuperação judicial ou homologação de outro plano de recuperação extrajudicial há menos de 2 (dois) anos”.

O preenchimento dos requisitos acima delineados, pois, permite que o devedor apresente plano de recuperação aos seus credores e posteriormente o submeta à homologação judicial. Nesse ponto, é importante destacar, não obstante seja óbvio, que o devedor só precisa preencher os requisitos ora em exame se realmente pretender a homologação do plano extrajudicial em juízo. Se, em contrapartida, pretende apenas negociar com os seus credores uma saída para a sua crise, sem nenhuma intermediação do Judiciário, o preenchimento de qualquer desses requisitos é irrelevante. Nesse sentido, prevê o art. 167 da LRE que “o disposto neste Capítulo não implica impossibilidade de realização de outras modalidades de acordo privado entre o devedor e seus credores”.

103
Q

Os créditos trabalhistas podem ser submetidos à recuperação extrajudicial?

A

Outra diferença entre a recuperação judicial e a extrajudicial está nos credores submetidos aos seus efeitos. A esta não se submetem, além dos credores previstos no art. 49, §§ 3.º e 4.º, da LRE – os quais, conforme já visto, também não se submetem aos efeitos da recuperação judicial –, os titulares de créditos fiscais, trabalhistas e acidentários. É o que dispõe o art. 161, § 1.º, da LRE: “não se aplica o disposto neste Capítulo a titulares de créditos de natureza tributária, derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidente de trabalho, assim como àqueles previstos nos arts. 49, § 3.º, e 86, inciso II do caput, desta Lei”.

Pode-se concluir, portanto, que os credores que podem estar abrangidos no plano de recuperação extrajudicial são os seguintes: (i) com garantia real; (ii) com privilégio especial; (iii) com privilégio geral; (iv) quirografários; e (v) subordinados.

104
Q

É obrigatória a homologação do plano de recuperação extrajudicial para que ele possa ser implementado?

A

Resumo

  • O pedido de homologação do plano é uma faculdade que a legislação confere ao devedor.
  • Se não houver homologação, o plano funcionará como uma renegociação de dívidas.
  • A homologação é interessante para obstar a desisência dos credores que assinaram o plano (Art. 161, § 5.º:“após a distribuição do pedido de homologação, os credores não poderão desistir da adesão ao plano, salvo com a anuência expressa dos demais signatários”).

Livro

Em regra, para obter a homologação do plano de recuperação extrajudicial pelo juiz, deverá o devedor requerê-la por meio de petição, na qual deverá, de imediato, comprovar o preenchimento dos requisitos acima apontados. Além do mais, em obediência ao disposto no art. 162 da LRE, caberá ao devedor “requerer a homologação em juízo do plano de recuperação extrajudicial, juntando sua justificativa e o documento que contenha seus termos e condições, com as assinaturas dos credores que a ele aderiram”.

O pedido de homologação do plano, nesse caso, é mera faculdade que a legislação confere ao devedor. Afinal, se ele conseguiu a concordância dos credores, que aderiram ao plano, a sua homologação judicial é apenas formalidade, não sendo condição imprescindível para a sua execução. Na verdade, nesse caso haveria uma renegociação das dívidas, e não propriamente uma “recuperação extrajudicial”.

Quando todos os credores cujos créditos são alcançados pelo plano (isto é, nele altera-se seu valor, vencimento, condições de pagamento, garantias etc.) aderiram a ele, a homologação judicial não é obrigatória para a sua implementação. Se o plano de recuperação extrajudicial ostenta a assinatura de todos os credores por ele atingidos, a homologação não é condição para os obrigar. Eles já se encontram obrigados nos termos do plano por força da adesão resultante de sua manifestação de vontade. O ato judicial não é necessário para que o crédito seja alterado em sua extensão ou condições.

Pode ocorrer, entretanto, de o devedor vislumbrar uma relevante utilidade no pedido de homologação. É que estes credores que aderiram previamente ao plano, assinando o documento que será juntado aos autos pelo devedor com sua petição inicial, em princípio não poderão mais desistir da referida adesão após a distribuição do pedido de homologação ao juízo competente. A desistência só será permitida se os demais credores que também aderiram expressamente concordarem. É o que estabelece o § 5.º do art. 161: “após a distribuição do pedido de homologação, os credores não poderão desistir da adesão ao plano, salvo com a anuência expressa dos demais signatários”.

Por conseguinte, se o devedor tiver motivos suficientes para suspeitar que algum dos credores que previamente aderiram ao plano pode dele desistir, o pedido de homologação possui uma utilidade prática incontestável, na medida em que proíbe, em princípio, esta eventual desistência.

105
Q

É necessária a concordância de todos os credores para que se aceita a homologação do plano de recuperação extrajudicial?

A

Destaque-se, todavia, que nem sempre será preciso que todos os credores submetidos ao plano consintam com ele. O art. 163 da LRE prevê situação excepcional em que “o devedor poderá, também, requerer a homologação de plano de recuperação extrajudicial que obriga a todos os credores por ele abrangidos, desde que assinado por credores que representem mais de 3/5 (três quintos) de todos os créditos de cada espécie por ele abrangidos”. Nesse caso, pois, o devedor é obrigado a fazer o pedido de homologação do plano se quiser obrigar os credores que a ele não aderiram ao seu cumprimento.

106
Q

Qual é a consequência do indeferimento da homologação de plano de recuperação extrajudicial?

A

Indeferido o pedido de homologação, a LRE não previu como consequência a decretação da falência do devedor, o que ocorre, por exemplo, quando o plano de recuperação judicial é rejeitado pela assembleia geral de credores. Assim, indeferido o pedido de homologação abrem-se duas alternativas ao devedor: (i) interpor recurso de apelação, conforme previsão do § 7.º do art. 164 da LRE (“da sentença cabe apelação sem efeito suspensivo”), ou (ii) apresentar novo pedido de homologação, desde que o indeferimento tenha decorrido em razão do descumprimento de formalidades e que as mesmas, então, tenham sido cumpridas.

Esta segunda alternativa está expressamente destacada no § 8.º do mesmo art. 164: “na hipótese de não homologação do plano o devedor poderá, cumpridas as formalidades, apresentar novo pedido de homologação de plano de recuperação extrajudicial”.

Obviamente que contra a sentença que defere o pedido de homologação também caberá a interposição de recurso de apelação, o qual será recebido, da mesma forma, sem efeito suspensivo. Ademais, prevê o § 6.º do art. 161 que “a sentença de homologação do plano de recuperação extrajudicial constituirá título executivo judicial, nos termos do art. 584, inciso III do caput, da Lei n.º 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil”.

107
Q

Cite algumas inovações da LRE quanto aos infrações relativas ao processo de falência e de recuperação judicial.

A

Resumo

  • Não se usa mais o termo “crimes falimentares”, já que é possível que ocorra infranção sem a decretação de falência.
  • Abolição de modalidade culposa.
  • Aumento das penas e todos os delitos condenando com pena de reclusão.
  • Contabilidade paralela como aumento de pena.
  • Revogação de procedimento especial. Segue agora rito sumário.
  • Abolição do inquérito judicial.

Livro

No que tange ao chamado “direito penal falimentar”, fugiria aos propósitos da presente obra descer a detalhes sobre os diversos crimes tipificados na LRE. Faremos, portanto, uma breve exposição das principais novidades trazidas pela nova legislação acerca dessa matéria.

Inicialmente, deve-se destacar que a LRE não mais usa a expressão crime falimentar. A lei anterior utilizava essa expressão porque considerava que a sentença declaratória da falência era condição objetiva de punibilidade dos crimes nela tipificados. A LRE, por sua vez, em seu art. 180, previu o seguinte: “a sentença que decreta a falência, concede a recuperação judicial ou concede a recuperação extrajudicial de que trata o art. 163 desta Lei é condição objetiva de punibilidade das infrações penais descritas nesta Lei”. Portanto, como existe a possibilidade de alguém ser processado e condenado por crime descrito na LRE sem que tenha tido, necessariamente, a sua falência decretada, houve por bem o legislador não usar mais a expressão crime falimentar, já que, de fato, ela soaria estranha nos casos em que o criminoso não fosse falido.

Outro ponto relevante foi a abolição da modalidade culposa nos diversos crimes tipificados na lei, além do fato de que houve um aumento considerável nas penas. Veja-se, por exemplo, o caso do crime de fraude a credores, atualmente tipificado no art. 168 da LRE. Sua pena é de 3 a 6 anos de reclusão, mais multa. No regime da lei anterior, figura típica assemelhada estava prevista no art. 187, para o qual era prevista pena de reclusão de apenas 1 a 4 anos, sem a previsão de multa.

O exame mais abrangente da Lei, nesta parte penal, demonstra que houve um maior rigor no que diz respeito às penas, tanto que todos os delitos (com exceção apenas do art. 178), são apenados com reclusão, cuja extensão varia de 2 a 6 anos. Na lei anterior, havia dois crimes apenados com detenção e aqueles apenados com reclusão previam penas entre o mínimo de 1 ano e o máximo de 4 anos. Portanto, no que tange à pena a ser aplicada, a Lei atual optou por um rigor maior.

Outro ponto importante a ser destacado foi a previsão da contabilidade paralela (também conhecida como “caixa 2”) como causa específica de aumento de pena no crime de fraude a credores, conforme disposto no art. 168, § 2.º: “a pena é aumentada de 1/3 (um terço) até metade se o devedor manteve ou movimentou recursos ou valores paralelamente à contabilidade exigida pela legislação”.

Houve alteração também quanto ao rito processual dos crimes falimentares. Na lei anterior, era estabelecido um procedimento especial, disciplinado nos arts. 503 a 512 do Código de Processo Penal. Estes dispositivos, porém, foram revogados pelo art. 200 da LRE. O art. 185, por sua vez, previu que, “recebida a denúncia ou a queixa, observar-se-á o rito previsto nos arts. 531 a 540 do Decreto-lei n.º 3.689, de 3 de outubro de 1941 – Código de Processo Penal”, ou seja, o rito sumário.

No que se refere à prescrição, merece destaque o fato de que a LRE não mais previu prazos prescricionais específicos para os crimes falimentares, submetendo-os, então, às regras gerais sobre prescrição do Código Penal. Nesse sentido, dispôs o art. 182 da LRE que “a prescrição dos crimes previstos nesta Lei reger-se-á pelas disposições do Decreto–lei n.º 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, começando a correr do dia da decretação da falência, da concessão da recuperação judicial ou da homologação do plano de recuperação extrajudicial”.

Por fim, cumpre ressaltar que a LRE aboliu a figura esdrúxula do inquérito judicial para apuração dos crimes falimentares, disciplinado pela lei anterior. Agora, por força do art. 187 da LRE, “intimado da sentença que decreta a falência ou concede a recuperação judicial, o Ministério Público, verificando a ocorrência de qualquer crime previsto nesta Lei, promoverá imediatamente a competente ação penal ou, se entender necessário, requisitará a abertura de inquérito policial”.

108
Q

De que juízo é a competência para analise das infrações previstas na LRE?

A

Resumo

  • A competência é do juízo penal.
  • Porém, alguns Estados atribuem essa competência criminal ao juízo da falência, o que é aceito pelo tribunais superiores.

Livro

A LRE afirma em seu art. 184 que “Os crimes previstos nesta Lei são de ação penal pública incondicionada”. Além disso, afirma em seu art. 183 que “Compete ao juiz criminal da jurisdição onde tenha sido decretada a falência, concedida a recuperação judicial ou homologado o plano de recuperação extrajudicial, conhecer da ação penal pelos crimes previstos nesta Lei”. A lei falimentar anterior tinha regra semelhante (art. 109, § 2.º), apenas com a ressalva de que a denúncia era recebida pelo juiz da falência.

Ocorre que, em algumas unidades da federação, a legislação estadual, competente para definir a organização judiciária, estabeleceu a competência do próprio juízo falimentar (ou da recuperação judicial/extrajudicial) para processar e julgar os crimes previstos na LRE.

Ainda na vigência da legislação falimentar antiga, o STF considerou constitucionais as leis estaduais que estabeleceram a competência do juízo falimentar para o processamento e julgamentos dos crimes falimentares.

Observação: STJ segue o mesmo entendimento.

109
Q

Contra as decisões interlocutórias proferidas no curso de processo de falência ou de recuperação judicial cabe que tipo de recurso?

A

De acordo com o art. 189 da LRE, “aplica-se a Lei n.o 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil, no que couber, aos procedimentos previstos nesta Lei”.

Como se sabe, o CPC/1973 foi revogado e substituído pelo novo CPC (Lei 13.105/2015). Atualmente, pois, onde está escrito CPC/1973 no art. 189 da LRE, deve-se ler novo CPC.

Sobre a aplicação do novo CPC aos processos de falência e recuperação judicial/ extrajudicial, duas observações importantes precisam ser feitas, uma sobre o cabimento de agravo de instrumento contra decisões interlocutórias e outra sobre a contagem dos prazos.

O novo CPC restringiu as hipóteses de cabimento do agravo de instrumento, listando os casos em que tal recurso é cabível no seu art. 1.015, o que gerou certa discussão sobre a recorribilidade de decisões interlocutórias proferidas nos processos de falência e recuperação judicial/extrajudicial, quando não previsto expressamente o cabimento de agravo.

O entendimento que vem prevalecendo na doutrina é o de que cabe agravo de instrumento nesses casos, por aplicação analógica do art. 1.015, parágrafo único do novo CPC, que assim dispõe: “também caberá agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação de sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário”. Nesse sentido, confira-se o enunciado 69 das Jornadas de Direito Processual Civil do CJF: “a hipótese do art. 1.015, parágrafo único, do CPC abrange os processos concursais, de falência e recuperação”.

Foi também nesse mesmo sentido que decidiu a Quarta Turma do STJ: “nas decisões interlocutórias sem previsão específica de recurso, incidirá o parágrafo único do art. 1.015 do CPC/2015, justamente porque, em razão das características próprias do processo falimentar e recuperacional, haverá tipificação com a ratio do dispositivo – falta de interesse/ utilidade de revisão da decisão apenas no momento do julgamento da apelação –, permitindo a impugnação imediata dos provimentos judiciais”.

110
Q

Os prazos da LRE devem ser contados em dias corridos ou em dias úteis?

A

Resumo

  • Depende da natureza da norma. Se for processual, em dias úteis; se for material, em dias corridos.
  • O prazo de 180 dias de suspensão das ações executivas e o de 60 dias para a apresentação do plano de recuperação judicial devem ser contados em dias corridos, segundo o STJ.

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Quanto à contagem dos prazos, sabe-se que o art. 219 do novo CPC determinou que “na contagem de prazo em dias, estabelecido por lei ou pelo juiz, computar-se-ão somente os dias úteis”. O parágrafo único desse dispositivo legal, porém, ressalvou que “o disposto neste artigo aplica-se somente aos prazos processuais”. Ora, como na LRE há normas de direito material e normas de direito processual, é preciso distingui-las com cuidado, aplicando-se a estas a contagem de prazos em dias úteis, e aplicando-se àquelas a contagem de prazos em dias corridos.

Assim, os prazos para a interposição de recursos previstos na LRE (art. 100, por exemplo), por serem processuais, devem ser contados em dias úteis, conforme o art. 219, caput do novo CPC. Em contrapartida, prazos como os de apresentação de relatórios ou prestação de contas pelo administrador judicial (art. 22, inciso II, alínea ‘e’ e art. 31, § 2.o, por exemplo), por não serem processuais, devem ser contados em dias corridos, conforme a ressalva do art. 219, parágrafo único do novo CPC.

Há situações, entretanto, nas quais é difícil afirmar com absoluta certeza se o prazo é processual ou material, como nos casos do prazo de suspensão das ações e execuções contra o devedor que pede recuperação judicial (stay period previsto no art. 6.o, § 4.o da LRE) ou do prazo de apresentação do plano de recuperação pelo devedor (art. 53 da LRE). Porém, como se trata de prazos longos e dada a necessidade de celeridade nos processos de falência e recuperação, recomenda-se que em regra a contagem seja feita em dias corridos, restringindo-se a contagem em dias úteis apenas para os casos óbvios de prazos estritamente processuais.

Foi exatamente esse o entendimento da Quarta Turma do STJ, a qual decidiu que “a forma de contagem do prazo – de 180 dias de suspensão das ações executivas e de 60 dias para a apresentação do plano de recuperação judicial – em dias corridos é a que melhor preserva a unidade lógica da recuperação judicial: alcançar, de forma célere, econômica e efetiva, o regime de crise empresarial, seja pelo soerguimento econômico do devedor e alívio dos sacrifícios do credor, na recuperação, seja pela liquidação dos ativos e satisfação dos credores, na falência” (REsp 1.699.528/MG).

A Terceira Turma do STJ seguiu o mesmo entendimento no julgamento do REsp 1.698.283-GO, decidindo que o prazo de 180 dias do stay period (art. 6.º, § 4.º, da Lei 11.101/2005) é de natureza material, e não processual, de modo que sua contagem deve ser feita em dias corridos, e não em dias úteis.