Propedêutica em uroginecologia Flashcards
Anamnese
- Realizar história clínica e exame físico cuidadosos é fundamental
- Além do interrogatório dos sinais e sintomas urinários, devemos questionar antecedentes pessoais de cirurgias abdominais e pélvicos, doenças neurológicas (doenças cerebrovasculares, polineuropatias, demência), tabagismo, etilismo, uso de medicações (atentar para diuréticos, antidepressivos e sedativos).
- Os antecedentes obstétricos também são de suma importância, devendo-se tomar conhecimento dos tipos de parto, tempo expulsivo prolongado, peso do RN, lacerações de trajeto ou se foram realizadas suturas localmente.
Sintomas urinários
- Incontinência urinária aos esforços (IUE): queixa de perda involuntária de urina aos esforços, que podem ser grandes (pulos, polichinelos, exercício físico intenso, tossir e espirrar), moderados (correr, trotar, dar risadas e descer a escada) e pequenos (mudança de decúbito ou posição, caminhar rápido em superfície plana).
Atenção: a perda urinária aos esforços é proporcional ao aumento da pressão intra-abdominal e não ao nível de cansaço físico que a paciente fica após realizar os exercícios. - Incontinência urinária por urgência (urge-incontinência): queixa de perda urinária involuntária associada à urgência miccional
- Incontinência urinária postural: é uma perda urinária involuntária ao mínimo esforço, ou seja, mudança de decúbito
- Enurese noturna: queixa de perda urinária involuntária que ocorre durante o sono
- Incontinência urinária mista: queixa de perda involuntária da urina associada tanto à urgência miccional, quanto ao esforço físico, tosse ou espirro.
- Incontinência urinária insensível ou perda urinária insensível: toda perda involuntária não notada pela paciente, apenas após perceber roupas molhadas.
- Sintomas de armazenamento:
–> Aumento da frequência urinária diurna: queixa de micção ocorre com mais frequência durante a vigília do que anteriormente considerado habitual pela mulher
–> Noctúria: queixa da interrupção do sono principal uma ou mais vezes pela necessidade de urinar
–> Urgência: desejo súbito e repentino de urinar que não pode ser postergado, caso contrário há perda urinária
–> Síndrome da bexiga hiperativa: é uma urgência miccional, usualmente acompanhada de aumento da frequência miccional e noctúria, com ou sem incontinência de urgência, na ausência de ITUs ou outra doença
- Sintomas sensoriais:
–> Aumento da sensibilidade vesical: queixa de que o desejo de urinar durante o enchimento vesical ocorre de forma mais precoce ou mais persistente do que vinha sentindo previamente.
–> Redução da sensibilidade vesical: desejo de urinar ocorre mais tardiamente, apesar da consciência que a bexiga está enchendo
–> Ausência de sensibilidade vesical: queixa de ausência de sensação de enchimento vesical e de desejo de urinar.
- Sintomas de esvaziamento (miccionais e pós-miccionais):
–> Hesitação: queixa de retardo para iniciar a micção
–> Esforço para urinar: necessidade de realizar esforço desproporcional ao considerado normal para urinar. Mudanças posicionais para possibilitar esvaziamento adequado também pode ser relatado.
–> Sensação de esvaziamento vesical incompleto: sensação de não esvaziamento completo da bexiga após micção
–> Perda urinária pós-miccional: queixa de passagem adicional de urina após completar a micção
–> Disúria: queixa de queimação ou desconforto durante a micção
–> Retenção urinária: inabilidade de urinar mesmo com esforço persistente
–> Outros sintomas de esvaziamento ou obstrutivos: gotejamento pós-miccional, enfraquecimento do jato urinário, fluxo urinário entrecortado
Exame físico
- A avaliação física deve conter exame ginecológico geral (inclusive mamas e palpação abdominal), peso corporal e IMC, além da avaliação do assoalho pélvico.
- Exame da vulva:
–> Inspeção deve ser cautelosa, prestar atenção em massas, alterações anatômicas e atrofia genital (fusão dos pequenos lábios) - Compartimento apical (colo uterino e cúpula vaginal):
–> O espéculo deve ser introduzido de forma habitual para inspeção do colo e cúpula. Pede-se para paciente realizar manobra de Valsalva para classificação de distopias desse compartimento - Parede vaginal anterior:
–> Para sua avaliação, utiliza-se uma válvula vaginal ou o espéculo afastando a parede posterior. Na inspeção estática, avalia-se presença de lesões uretrais como divertículos, cistos de Skene (ocorre por inflamação com obstrução do ducto da glândula de Skene), entre outros. Na inspeção dinâmica, pede-se que a paciente faça Valsalva para avaliar hipermobilidade uretral, perdas urinárias e prolapsos da parede vaginal anterior. No exame uroginecológico, também é importante realizar o teste de perda urinária por esforço:
Normalmente é feito com a bexiga contendo apenas o volume residual pós-miccional, pois permite avaliar a severidade da incontinência por esforços (se não há perda de urina após esforço com o volume residual, há mínimas chances de a paciente apresentar IUE grave) - Compartimento posterior:
–> Usa-se válvula vaginal ou o espéculo reparando a parede anterior. Avaliar anatomia, lesões e cicatrizes cirúrgicas. Solicitar que a paciente realize Valsalva para classificar o prolapso de parede vaginal posterior - Avaliação da contração da musculatura do assoalho pélvico:
–> Última etapa do exame preconizado pela FEBRASGO, nele se procede ao toque vaginal para avaliar a capacidade de contração da musculatura do assoalho pélvico. - Outras ferramentas clínicas como o questionário de qualidade de vida ou score de sintomas e diário miccional também podem ser empregados durante a propedêutica, a fim de obter um parâmetro comparativo para avaliar o benefício das terapêuticas utilizadas.
Exames complementares
- Urina tipo I e urocultura: SEMPRE AFASTAR ITUs em pacientes com queixas uroginecológicas. Procede-se a solicitação de PU + urocultura em mulheres que apresentam sintomas compatíveis com ITU. A indicação de antibioticoterapia é guiada pelo antibiograma e não pela presença de leucocitúria ou nitrito positivo. Isso só não é válido para pacientes gestantes ou que serão submetidas a procedimentos urológicos invasivos, em que há indicação de antibioticoterapia para bacteriúrias assintomáticas.
- Avaliação do volume residual pós-miccional: pode ser realizada pelo USG de vias urinárias ou por meio de cateterização vesical em mulheres com sintomas sugestivos de disfunção miccional
- Exames de imagem (TC, RNM de pelve): não são solicitados de rotina, apenas na vigência de dúvida diagnóstica ou avaliação de hematúrias (urotomografia e cistoscopia na suspeita de carcinoma de bexiga).
- Avaliação urodinâmica: não requerida de forma rotineira. Solicitada APENAS APÓS A FALHA NA TENTATIVA DE TRATAMENTO CONSERVADOR. Solicitar antes da cirurgia para correção de IUE, nas seguintes situações:
–> Incontinência mista com predomínio de urgência ou incontinência urinária na qual o componente da incontinência não tenha ficado claro
–> Sintomas sugestivos de disfunção miccional (hiperatividade do detrusor, deficiência esfincteriana intrínseca)
–> Prolapso anterior ou apical
–> Cirurgia prévia para IUE
Fluxograma da mulher com incontinência urinária
1º passo: anamnese + exame físico, AFASTAR INFECÇÃO DO TRATO URINÁRIO, considerar diário miccional e estudo do resíduo pós-miccional (USG de bexiga e vias urinárias ou cateterismo vesical).
Se estiverem alterados, proceder ao tratamento específico.
Caso normais, prosseguir ao próximo passo do fluxograma de atendimento:
2º passo: introduzir tratamento de primeira linha para incontinência (mudanças no estilo de vida / retreinamento da musculatura do assoalho pélvico para IUE e bexiga hiperativa / retreinamento vesical para bexiga hiperativa, associado ou não à cinesioterapia / tratamento medicamentoso). Outras modalidades incluem eletroestimulação, dispositivos vaginais ou uretrais.
–> Tratamento medicamentoso
1. Nos casos de hiperatividade vesical, apresentando sinais e sintomas de urgência ou componente misto com ou sem incontinência, o tratamento de primeira linha envolve retreinamento vesical comportamental e fisioterapia associados a algumas medicações anticolinérgicas, dentre as quais destaca-se a oxibutinina de absorção lenta. Existe ainda a possibilidade de associar beta-3-agonista adrenérgico (mirabegron) que otimiza o efeito terapêutico. O beta-3-adrenérgico em monoterapia também é recomendado às pacientes com contraindicação ao uso de anticolinérgicos (p.ex., portadoras de glaucoma, ou idosos com sinais e sintomas sugestivos de síndrome demencial).
A segunda linha de medicamentos para bexiga hiperativa envolve antidepressivos tricíclicos (imipramina, amitriptilina)
- Sintomas de perda urinária aos esforços beneficiam-se com fisioterapia do assoalho pélvico, associada ou não com medicamentos como os inibidores da recaptação de noradrenalina e serotonina (IRNS - duloxetina)
Se houve melhora e paciente está satisfeita –> alta
Se não houve melhora –> progredir no fluxograma
3º passo: caso a mulher não melhorou ou está insatisfeita com os resultados, solicitar estudo urodinâmico para orientar tratamento específico.