Choque Flashcards
Choque: conceito
É a expressão clínica da hipóxia celular, tecidual e orgânica.
É causado pela incapacidade do sistema circulatório de suprir as demandas celulares de oxigênio, por oferta inadequada de oxigênio (DO2) e/ou por demanda tecidual aumentada de oxigênio (VO2)
Choque: complicações
É uma emergência médica potencialmente ameaçadora à vida. Os efeitos da hipóxia tecidual são inicialmente reversíveis, mas rapidamente podem se tornar irreversíveis, resultando em falência orgânica, síndrome de disfunção de múltiplos órgãos e sistemas (SDMOS) e morte.
Choque: tipos
Distributivo, cardiogênico, hipovolêmico e obstrutivo.
Processo de utilização do oxigênio tecidual
- Difusão do oxigênio dos pulmões ao sangue.
- Ligação do oxigênio à hemoglobina.
- Transporte de oxigênio pelo débito cardíaco para periferia.
- Difusão de oxigênio para a mitocôndria.
Processo de utilização do oxigênio tecidual: Passo 1 - Difusão de O2 do pulmão ao sangue
O oxigênio (O2) atmosférico entra nos pulmões a partir da pressão negativa gerada pela inspiração. Posteriormente, o O2 alveolar se difunde para o sangue capilar pulmonar.
A quantidade de O2 que é transferida para o sangue depende da relação ventilação-perfusão e da concentração de oxigênio inspirado (FiO2).
Outros fatores importantes são a membrana alvéolo- capilar, a concentração de hemoglobina no sangue e sua afinidade pelo O2.
Processo de utilização do oxigênio tecidual: Passo 2 - Ligação de O2 à hemoglobina
98% do O2 é ligado à hemoglobina e 2% é dissolvido no plasma.
O principal carreador do O2 é a hemoglobina, que é um complexo proteico composto por quatro cadeias polipeptídicas (na maioria das vezes, duas cadeias alfa e duas beta), cada uma ligada a um grupo heme por ligações não covalentes.
Cada grupo heme possui um anel porfirínico ligado a um átomo de ferro em estado reduzido (ferroso ou Fe2+), ao qual o O2 se liga. Assim, cada molécula de hemoglobina consegue carregar quatro moléculas de oxigênio
Processo de utilização do oxigênio tecidual: Passo 2 - Ligação de O2 à hemoglobina part 2
A afinidade da hemoglobina pelo O2 aumenta na medida em que o complexo com a hemoglobina se satura.
Essa habilidade da hemoglobina de alterar sua afinidade pelo O2 a torna um carregador ideal. Nos capilares pulmonares, a ligação do oxigênio à hemoglobina é facilitada, enquanto nos capilares periféricos, a dissociação do O2 é promovida.
Algumas situações aumentam ou diminuem a afinidade da hemoglobina pelo oxigênio e influenciam esse processo
Processo de utilização do O2 tecidual - Passo 3: transporte de oxigênio pelo débito cardíaco para periferia
O transporte de O2 aos tecidos depende da quantidade presente no sangue e do débito cardíaco. O conteúdo de oxigênio no sangue (em mL de O2/dL de sangue) pode ser expresso, então, pela seguinte fórmula:
Conteúdo arterial de oxigênio = = (1,39 × Hb × Sat artO2) + 0,0031 × PaO2
(normal 16-22 mL/dL)
Conteúdo venoso de oxigênio = = (1,39 × Hb × Sat venO2) + 0,0031 × PvO2 (normal 12-17 mL/dL)
Processo de utilização do O2 tecidual - Passo 3: transporte de oxigênio pelo débito cardíaco para periferia
Os dois principais componentes do conteúdo de O2 no sangue são a quantidade de hemoglobina e sua saturação, já que o O2 dissolvido no plasma representa uma ínfima parcela do conteúdo total. Já o transporte de oxigênio aos tecidos depende do débito cardíaco (DC) do paciente. Portanto, a oferta de O2 (DO2) é dada pela seguinte fórmula:
Oferta de oxigênio (mL O2/min) = = CaO2 × DC × 10 (normal 700-1.400 mL/min)
Fica evidente a importância do débito cardíaco para o transporte de O2 para os tecidos. Quedas agudas da saturação ou anemias agudas podem ser compensadas por imediato aumento do débito cardíaco.
Processo de utilização do O2 tecidual: Passo 4 - Difusão do oxigênio para mitocôndria
O O2 posteriormente é transferido do sangue para a mitocôndria por um simples princípio de difusão, mas também por mecanismos de controle da microcirculação local que controlam o fluxo total, tempo de trânsito e recrutamento capilar.
Fatores autonômicos neurais e metabólicos regulam os esfíncteres arteriolares de tal forma a aumentar a densidade capilar. Órgãos com pouca reserva capilar apresentam-se em desvantagem durante a hipóxia.
Uma vez que o O2 chega à mitocôndria, ele deve funcionar como receptor final de elétrons provenientes do metabolismo aeróbico.
Processo de utilização do O2 tecidual: Passo 4 - Difusão do oxigênio para mitocôndria
Mesmo após entrar na mitocôndria, diversos mecanismos em determinadas patologias promovem a má utilização do oxigênio no metabolismo, levando a uma utilização glicolítica anaeróbica da glicose e hiperlactatemia para geração de ATP, apesar da presença de O2.
O consumo de oxigênio (VO2) é definido pela equação de Fick:
Consumo de oxigênio (mL O2/min) = (CaO2 – – CvO2) × DC × 10 (normal 180-280 mL/min)
Processo de utilização do O2 tecidual: Passo 4 - Difusão do oxigênio para mitocôndria
Choque: diagnóstico
Choque: manifestação clínica
Pele: pele fria e úmida, cianose, palidez, livedo, tempo de enchimento capilar prolongado.
Rim: débito urinário < 0,5 mL/kg/h.
Sistema nervoso central: estado mental alterado, que inclui torpor, desorientação e confusão.
Respiratório: dispneia, uso de musculatura respiratória acessória.
Cardiovascular: hipotensão, taquicardia, hiperlactatemia. Hepática: encefalopatia, aumento de bilirrubinas.
Hematológica: sangramentos, petéquias, alargamento de RNI.
Choque: Existem três janelas de perfusão tecidual, que identificam os danos que o choque causou no organismo
Choque: diagnóstico - critérios laboratoriais
A hiperlactatemia está tipicamente presente, indicando metabolismo anormal de oxigênio celular. O nível normal de lactato no sangue é de aproximadamente 1 mmol/L (ou 9 mg/dL), e o nível é aumentado (> 2 mmol/L ou >18 mg/dL) no choque.
Devemos lembrar também que o lactato pode aumentar em situações não relacionadas à hipóxia, como disfunção hepática e uso de algumas medicações (como metformina e linezolida).
Choque: diagnóstico
Diagnóstico: ≥ 4 critérios
Choque: diagnóstico - USG point-of- cafe
A avaliação de derrame pericárdico, a medição do tamanho e da função dos ventrículos esquerdo e direito, a avaliação da variação respiratória da veia cava inferior, o cálculo da integral da velocidade aórtica pela via de saída do ventrículo esquerdo, o exame abdominal e torácico com avaliação da aorta e de pneumotórax.
Protocolo RUSH part 1
Protocolo rush part 2
Choque hipovolêmico: mecanismo de ação
Acontece pela redução do volume intravascular (pré-carga reduzida) que, por sua vez, reduz o DC.
O choque hipovolêmico pode ser dividido em duas categorias: hemorrágico e não hemorrágico.
Choque hipovolêmico: tipos
Hemorrágico: existem várias causas de choque hemorrágico, sendo o mais comum o trauma, seguido por hemorragia varicosa e úlcera péptica. Causas menos comuns incluem hemorragia perioperatória, aneurisma aórtico abdominal roto e iatrogênico.
Não hemorrágico: volume intravascular reduzido por perda de fluidos que não sejam sangue. A depleção de volume pela perda de sódio e água pode ocorrer a partir de vários sítios anatômicos, como perdas gastrointestinais, perdas de pele e perdas renais.
Choque cardiogênico: mecanismo de ação
É causado por patologias cardíacas que levem à falência da bomba e à redução do débito cardíaco (DC).
Choque cardiogênico: tipos - cardiomiopatia
Causas de cardiomiopatia induzindo choque incluem infarto do miocárdio envolvendo mais de 40% do miocárdio do ventrículo esquerdo, infarto do miocárdio de qualquer tamanho se for acompanhado por isquemia extensa e grave devido a doença coronariana multiarterial, infarto agudo do ventrículo direito, exacerbação da insuficiência cardíaca em pacientes com cardiomiopatia dilatada grave subjacente, miocárdio atordoado após parada cardíaca, isquemia prolongada ou circulação extracorpórea, depressão miocárdica por choque séptico ou neurogênico avançado e miocardite.
Choque cardiogênico: tipos - Arrítmica
Tanto as taquiarritmias atriais e ventriculares quanto as bradiarritmias podem induzir hipotensão. Quando o DC é gravemente comprometido por distúrbios significativos do ritmo (p. ex., taquicardia ventricular sustentada, bloqueio atrioventricular total), os pacientes podem apresentar choque cardiogênico.
Choque cardiogênico: tipos - mecânico
Insuficiência valvar aórtica ou mitral grave, defeitos valvares agudos, como a ruptura de um músculo papilar ou de cordoalhas tendíneas, dissecção retrógrada da aorta ascendente, ruptura aguda do septo interventricular, mixomas atriais e ruptura do aneurisma da parede livre ventricular são causas de choque cardiogênico.
Janela do protocolo de RUSH
Resumo sobre os tipos de choques e seus mecanismos
Perfis hemodinâmicos dos mecanismos de choque
Perfis hemodinâmico dos mecanismos de choque part 2
Choque distributivo: mecanismo de ação
É caracterizado por vasodilatação periférica grave com queda da resistência vascular sistêmica.
Choque distributivo: séptico
A sepse é definida como resposta desregulada do hospedeiro à infecção, resultando em disfunção orgânica com risco de morte. Choque séptico é sepse com necessidade de terapia vasopressora e presença de níveis elevados de lactato (> 2 mmol/L ou > 18 mg/dL), apesar da ressuscitação volêmica adequada.
É o tipo mais comum de choque distributivo e tem mortalidade estimada em 30 a 50%.
Choque distributivo: neurogênico
Ocorre geralmente em vítimas de traumatismo cranioencefálico grave e lesão da medula espinhal, sobretudo se esta for acima de T6, levando à interrupção das vias autonômicas, com diminuição da resistência vascular e alteração do tônus vagal.
Choque distributivo: anafilático
Aanafilaxia está associada a mecanismos imunológicos (IgE mediado – alimento, inseto, látex – ou não IgE mediado – omalizumab, infliximab) e não imunológicos (exercício, frio, radiocontraste), todos levando à degranulação de mastócitos e/ou basófilos. Pode acometer diversos sistemas (cardiovascular, respiratório, pele, trato gastrointestinal e sistema nervoso central), no entanto, o choque e a obstrução de via aérea são as principais causas de morte.
Choque distributivo: por cianeto e por monóxido de carbono
Choque por disfunção mitocondrial.
No primeiro caso, o paciente possui O2, mas não consegue utilizá-lo por bloqueio da fosforilação oxidativa pelo cianeto.
No segundo caso, além desse mecanismo, o monóxido de carbono tem muita afinidade pela hemoglobina, dificultando sua ligação ao oxigênio.
Choques distributivo: por etiologia endocrinologicas
Crise addisoniana (insuficiência adrenal devido à deficiência mineralocorticoide) e coma mixedematoso podem estar associados à hipotensão e a estados de choque. Em estados de deficiência mineralocorticoide, a vasodilatação pode ocorrer devido ao tônus vascular alterado e à hipovolemia mediada pela deficiência de aldosterona.
Os doentes com tireotoxicose podem desenvolver insuficiência cardíaca de alto débito e, com a progressão da doença, esses pacientes podem desenvolver disfunção sistólica do ventrículo esquerdo ou taquiarritmias, levando à hipotensão.
Choque obstrutivo: mecanismo de ação
É causado principalmente por causas extracardíacas que culminam em insuficiência cardíaca.
Choque obstrutivo: tipo vascular pulmonar
A maioria dos casos de choque obstrutivo é devido a insuficiência ventricular direita decorrente de tromboembolismo pulmonar hemodinamicamente significativo (TEP) ou hipertensão pulmonar grave (HP).
Nesses casos, o ventrículo direito falha, porque é incapaz de gerar pressão suficiente para superar a alta resistência vascular pulmonar. Se o paciente não apresenta disfunção de VD, o choque não pode ser explicado pelo TEP e outras causas devem ser pesquisadas.
Em pacientes com hipertensão pulmonar preexistente e disfunção do VD, isquemia, sobrecarga de volume ou hipoxemia devem ser evitadas, pois esses insultos podem resultar em disfunção ventricular direita crônica agudizada, resultando em colapso cardiovascular.
Choque obstrutivo: tipos - mecânica
Apresentação clínica similar ao choque hipovolêmico, pois o distúrbio fisiológico primário é uma diminuição da pré-carga, em vez da falha da bomba (p. ex., redução do retorno venoso ao átrio direito ou enchimento inadequado do ventrículo direito).
Causas mecânicas de obstrução de choque incluem: pneumotórax hipertensivo, pericardite constritiva e cardiomiopatia restritiva.
Algorítmico diagnóstico do tipo de choque
Drogas vasoativas sem função vasoconstritoras que podem ser adm pelo acesso periférico
Dobutamina, nitroglicerina e nitroprussiato de sódio
Manejo geral do choque
Otimização da pré-carga
A ressuscitação volêmica pode melhorar o fluxo sanguíneo microvascular e aumentar o débito cardíaco, sendo uma parte essencial do tratamento da maioria dos tipos de choque.
Otimização da pré-carga: cristaloide
Há dois tipos básicos de cristaloides – a solução salina clássica (solução fisiológica) e as soluções balanceadas (Ringer lactato, PlasmaLyte).
Para ressuscitações volêmicas de até 2 L, as soluções balanceadas falharam em mostrar superioridade em relação à solução salina clássica. Entretanto, para ressuscitações volêmicas agressivas (> 2 L), é plausível dar preferência para soluções balanceadas, porém com baixo nível de evidência.
De maneira geral, devemos considerar a quantidade de volume a ser administrada, eletrólitos e função renal do paciente e os principais efeitos adversos de cada solução, a fim de escolher a melhor opção para cada caso.