pag 10-19 Flashcards
A defesa dos direitos - primeira fase
Numa primeira fase vigorou um sistema de autodefesa ou autotutela de direitos, portanto uma tutela privada de direitos, ou seja, aquele que sentia o seu direito ofendido tinha de se defender pelos seus próprios meios (“fazer justiça com as próprias mãos”). Neste tipo de sistema quem prevalece é o mais forte e não o justo, conduzindo ao problema da desproporção e da injustiça
A defesa dos direitos - segunda fase
Assim, dadas as lacunas deste sistema assistiu-se a uma evolução para um sistema de tutela pública de direito, em que são órgãos de poder público que resolve os litígios. Assim, quem sente os seus direitos lesados deve dirigir-se aos poderes públicos e pedir tutela. Por conseguinte, o sistema de autotutela e de autodefesa de direitos ficou reservado a situações excecionais.
primeiro instrumento de defesa de direitos: ACTIO
– a ação – o jurista clássico Celsus apresentou a seguinte definição: a ação não é mais do que o direito de perseguir judicialmente o que é devido a alguém;
- modernamente, oferece-se a seguinte: instrumento jurídico que permite a uma pessoa obter a tutela de um direito previamente reconhecido (no ius civile) pelo ordenamento jurídico ou, então, a tutela de uma situação de facto que o magistrado considerou digna de proteção no seu Edictum (ius praetorium)
Classificação das ações-9
Actio civilis
Actio honoraria
Ação Real (actio in rem)
Ação Pessoal (actio in personam)
Ação de boa-fé – actio bonae fidei
Ação de direito estrito – actio stricti iuris
Ação direta – actio directa
Ação útil - actio utilis
Actio contraria – ação contrária
Actio civilis
é uma classificação baseada na fonte da tutela jurídica materializada pela actio;
era outorgada (concedida) pelo ius civile (estava contemplada no costume, na lei, etc., ou seja,
nas suas fontes);
Actio honoraria
era concebida pelos magistrados na sua função de administrar a justiça para tutelar situações que o ius civile não contemplava ou contemplava de modo demasiado restrito;
- dentro da actio honoraria podemos distinguir duas espécies de ações:
– as actiones praetorea (ações concebidas pelos pretores)
– as actiones aediliciae (ações concebidas pelos edis curuis, que tinham o poder de fiscalizar os mercados de roma,
concebendo importantes açoes nos contratos de compra e venda, evitando as situações de compradores lesados);
Ação Real (actio in rem)
As actiones in rem protegem direitos reais, i.e., direitos sobre coisas (conferindo ao seu titular um poder direto e imediato sobre uma coisa), assim como faculdades que derivam de relações familiares e direitos sucessórios.
-o mais típico direito real é o de propriedade;
– a ação real afirma de modo categórico e absoluto o direito que protege, uma vez que se trada de direitos absolutos (direito que pode ser invocado contra toda e qualquer pessoa) e, por isso, as ações reais podiam ser instauradas/ dirigidas contra toda e qualquer pessoa que lesasse o direito de proteger;
Ação Real (actio in rem) - exemplos
- Reivindicatio: permite a proprietário recuperar a posse de uma res que lhe pertence, instaurando esta actio contra qualquer pessoa que o prive da coisa;
- Hereditatis petitio: permite ao herdeiro reclamar os bens
hereditários, instaurando esta actio contra qualquer pessoa que ocupasse ou se apoderasse desses bens
Ação Pessoal (actio in personam)
a ação pessoal protegia direitos relativos, isto é, que apenas podem ser invocados contra quem assumiu uma obrigação/dever, pelo que só a pessoa sobre quem cai esse dever pode ser demandado através de uma actio in personam;
Direitos reais
são direitos sobre coisas. Tratam-se de direitos absolutos, i.e., podem ser invocados contra qualquer pessoa, e a sua satisfação não depende da cooperação de terceiros. Corresponde a uma obrigação universal e negativa, um non facere.
Direitos pessoais ou de crédito
são direitos relativos, cuja satisfação depende da cooperação do devedor. A obrigação correspondente a estes direitos pode ter conteúdo positivo (dever de realizar um determinado ato) ou negativo (dever de abstenção de um determinado ato).
ação pessoal vs ação real
Esta é uma distinção baseada no direito subjetivo tutelado pela actio, sendo, por isso, um poder ou faculdade reconhecido pelo ordenamento jurídico aos particulares.
Ação de boa-fé – actio bonae fidei
os contratos de boa-fé produziam obrigações/ deveres cujo conteúdo não está precisamente determinado pelo acordo das partes; este concretiza-se consoante as circunstancias do caso concreto, atendendo ao que é exigível a uma pessoa leal/ correta/ honesta e fiel à palavra que deu, sendo, por isso, um contrato onde as partes tem de se comportar como alguém correto;
- Ações de boa-fé protegiam os contratos de boa-fé;
nestas ações o juiz devia concretizar tudo aquilo a que o demandado estava obrigado à luz da boa-fé e, para isso, devia atender às circunstâncias do caso concreto e concluir os valores da lealdade e honestidade;
por isso, diz-se que o juiz devia atender mais ao que se quis dizer do que ao foi dito;
Ação de direito estrito – actio stricti iuris
os contratos de direito estrito geravam obrigações cujo conteúdo estava precisamente definido e que tinha de ser rigorosamente observado;
- Ações de direito estrito tutelavam/ protegiam os contratos de direito estrito;
-nestas ações o juiz devia apenas conhecer a existência ou inexistência de obrigação; o juiz devia ignorar quaisquer outras circunstâncias que rodeassem o surgimento da obrigação, como, por exemplo, o dolo (engano; quando alguém maldosamente celebrou o contrato porque foi enganado), o medo (situação em que alguém celebrou contrato porque foi ameaçada), um pacto de não pedir ou uma eventual compensação de créditos
Ação direta – actio directa
é a ação pessoal que emerge de um contrato e que
serve para tutelar obrigações nascidas desse contrato.
É uma ação concedida às pessoas e nas circunstâncias para que foi criada (ação pensada para aquelas situações/ circunstâncias);
Ação útil - actio utilis
era concedida a pessoas ou em circunstâncias diferentes
daquelas para que foi pensado/ para que foi criada; por outras palavras, é uma extensão de uma ação previamente criada para outras pessoas ou para outras circunstâncias.
No fundo são ações do pretor para tutelar situações que o ius civile não previa;
Actio contraria – ação contrária
– a ação contrária servia para a outra parte desse contrato exigir a indeminização de danos ou o pagamento de despesas que, eventualmente, surgissem no decurso do contrato;
tratava-se eventuais e que não faziam parte da estrutura
necessária do contrato; por isso, para exigir o seu cumprimento era concedida a actio contraria
(importante nos contratos bilaterais imperfeitos);
Sistema Processual Romano
As ações (actiones) eram concedidas no âmbito de um sistema processual, ou seja, um sistema das várias ações e as fases pelas quais passava.
Dois sistemas processuais:
1- Sistema da ordem judicial privada – ordo iudiciorum privatorum
2- Sistema da cognição extraordinária – cognitio extra ordinem
Sistema da ordem judicial privada – ordo iudiciorum privatorum
- Este sistema marcou a época arcaica e clássica.
- Este revela que a administração da justiça não tinha sido assumida como tarefa exclusiva do estado.
- Este sistema abrangeu dois processos que foram também cronologicamente seguidos: o processo das ações da lei (legis actiones) e o processo das fórmulas (agere per formulas).
– Ambos decorriam em 2 fases: a primeira era a fase in
iure (era presidida por um magistrado - processo influenciado pelas magistraturas - o pretor, que ouvia as alegações das partes e, em seguida, concedia ou recusava ao demandante uma actio) e a segunda a fase era a apud iudicem (era presidida por um juiz – o iudex – que era um particular – privado – escolhido pelas partes ou nomeado pelo magistrado; o iudex emitia uma sentença – sententia – na qual condenava ou absolvia o demandado conforme se provassem ou não os factos alegados pelo demandante e pelo demandado);
Sistema da cognição extraordinária – cognitio extra ordinem
- Este sistema surge no principado (época) para processos especiais, ou seja, só para alguns processos específicos. Contudo, gradualmente, tornou-se o sistema processual geral suplantando (derrubando) o sistema anterior.
- Neste processo as fases processuais do sistema anterior desaparecem, pelo que todo o processo é agora presidido e controlado por um magistrado que é funcionário estatal e, portanto, conclui-se que a administração é uma tarefa exclusiva do governo.
Especial referência ao processo das fórmulas
o processo das Agere per formulas (processo das fórmulas) foi oficialmente introduzido pela lex aebutia formulis (130 a.C.).
- Este era aplicado especialmente nos litígios entre peregrinos e peregrinos e cidadãos romanos.
- O sistema processual das fórmulas tinha uma solenidade/ formalidade fundamental: a fórmula. Esta era um documento escrito que fixava os termos do litígio e designava o juiz (privado) a quem era ordenado que condenasse ou absolvesse o demandado (contra quem foi dirigida a ação) consoante se provassem os factos alegados pelo demandante (quem dirige) ou não se provassem esses factos. As fórmulas eram escritas pelo magistrado.
Fórmulas
-
Partes ordinárias:
Intentio - A parte da fórmula onde se apresentava a pretensão do demandante;
Condemnatio - A parte da fórmula em que o magistrado incumbia o juiz de condenar ou absolver o demandado conforme se provasse ou não o conteúdo da intentio; -
Parte extraordinária:
Exceptio - Eram partes que podiam surgir da fórmula
processual a pedido ou do demandante ou do demandado; A exceptio continha factos alegados pelo demandado que não negam a pretensão do demandante, mas se forem provados vão paralisar a ação.
- (defesa ou objeção que um réu poderia apresentar em resposta a uma alegação. Era uma maneira pela qual o réu poderia se opor ou se defender contra uma ação legal.)
Proteção jurídica extra-processual
Nem sempre a atividade da administração da justiça a cargo dos magistrados, especialmente do pretor, se traduzia na concessão de uma actio no seio do sistema processual.
– Por vezes, o magistrado intervinha para proteger direitos e posições jurídicas fora do sistema processual, com diversas configurações. Esta justifica-se pela tentativa de facilitar o normal funcionamento do processo ordinário, de impor a paz durante o processo ou até de evitar um litígio.