ADPF 54 (voto Rel. MAurelio) Flashcards

1
Q

Qual foi o resultado do julgamento da ADPF 54?

A

O Plenário, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ADPF, a fim de declarar a inconstitucionalidade da interpretação segundo a qual a interrupção da gravidez de feto anencéfalo seria conduta tipificada nos artigos 124, 126 e 128, I e II, do CP

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2
Q

Qual é era o pleito da ADPF 54?

A

Reconhecimento o direito da gestante de submeter-se a “antecipação terapêutica de parto” na hipótese de gravidez de feto anencéfalo, previamente diagnosticada por profissional habilitado, sem estar compelida a apresentar autorização judicial ou qualquer outra forma de permissão do Estado

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3
Q

Na ADPF 54, pretendia-se a proclamação de inconstitucionalidade abstrata dos tipos penais (artigos 124, 126 e 128, I e II, do CP)?

A

Não. Pretendia apenas que os referidos enunciados fossem interpretados conforme a Constituição. Logo, o STF não examinou a descriminalização do aborto

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4
Q

Aborto é o mesmo que antecipação terapêutica de parto?

A

Não. Por isso é equivocado dizer que o STF autorizou o “aborto eugênico”, “eugenésico” ou “antecipação eugênica da gestação”, em razão do indiscutível viés ideológico e político impregnado na palavra eugenia

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5
Q

Quais foram os interesses confrontados na ADPF 54?

A

De um lado, os interesses legítimos da mulher em ver respeitada sua dignidade e, de outro, os interesses legítimos de parte da sociedade em desejar proteger todos os que a integrariam, independentemente da condição física ou viabilidade de sobrevivência

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6
Q

Quais foram os principais temas envolvidos na ADPF 54?

A

A laicidade do Estado, a dignidade humana, o usufruto da vida, a liberdade, a autodeterminação, a saúde e o reconhecimento pleno de direitos individuais, especificamente, os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres

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7
Q

A locução “sob a proteção de Deus”, constante no preâmbulo da Constituição, não seria norma jurídica?

A

Não. Logo, o Estado é neutro — não seria religioso, tampouco ateu

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8
Q

Como a laicidade do Estado se revela?

A

De modo dúplice: (a) salvaguarda as diversas confissões religiosas de intervenção abusiva estatal em questões internas; (b) protege o Estado de influências indevidas provenientes de dogmas, de modo a afastar a prejudicial confusão entre o poder secular (ligado ao mundo, à terra) e democrático e qualquer doutrina de fé, inclusive majoritária. As religiões não guiam o tratamento estatal dispensado a outros direitos fundamentais

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9
Q

Em razão da laicidade do Estado, é possível a oitiva de entidades ligadas a profissão de fé em audiências públicas no STF?

A

Sim. Na democracia não se exclui qualquer ator do âmbito de definição do sentido da Constituição. Todavia, os argumentos delas devem ser traduzidos em termos de razões públicas, ou seja, expostos de forma que a adesão a eles independesse de qualquer crença

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10
Q

O que é anencefalia?

A

É a malformação do tubo neural, a caracterizar-se pela ausência parcial do encéfalo e do crânio, resultante de defeito no fechamento do tubo neural durante o desenvolvimento embrionário

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11
Q

Quais são as semelhanças entre o anencéfalo e o morto cerebral?

A

Os dois não têm atividade cortical (não desfrutam de nenhuma função superior do sistema nervoso central “responsável pela consciência, cognição, vida relacional, comunicação, afetividade e emotividade”). O anencéfalo é um natimorto cerebral

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12
Q

Qual é a conseqüência de se tratar o anencéfalo como um natimorto cerebral?

A

O natimorto jamais se tornaria pessoa. Não se trata de vida em potencial, mas de morte em potencial

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13
Q

O conhecido caso da suposta portadora de anencefalia, que teria sobrevivido por um ano, oito meses e doze dias, modifica de algum modo o resultado da ADPF 54?

A

Não. O diagnóstico estava equivocado. Era “meroencefalia”, porquanto o feto possuiria partes do cérebro — cerebelo e pedaço do lóbulo temporal — que viabilizariam, embora precariamente, a vida extrauterina

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14
Q

Por que a interrupção da gestação de feto anencéfalo não é aborto eugênico?

A

Porque o anencéfalo não tem vida em potencial. O aborto eugênico pressuporia a potencial vida extrauterina de seres que discrepassem de padrões imoralmente eleitos

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15
Q

O precedente da ADPF 54 se aplica fetos com deficiência?

A

Não! O anencéfalo não tem vida em potencial. Nasce morto. É diferente do deficiente, que sobreviverá, ainda que com deficiência grave, fora do útero

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16
Q

Por que não se aplica aos anencéfalos os preceitos da CF e Convenção sobre Direitos da Criança das Nações Unidas que garantem o direito à vida da criança?

A

Porque o anencéfalo é um natimorto cerebral. Logo, não originará uma criança e, posteriormente, um adolescente

17
Q

Quando se diagnostica a anencefalia?

A

Na 12ª semana de gestação, por meio de ultrassonografia

18
Q

É possível se invocar da possibilidade de doação de órgão dos anencéfalos como fundamento para se vedar a interrupção da gravidez?

A

Não, sob pena de se coisificar a mulher e ferir a sua dignidade. A mulher é um fim em si mesma, e não um instrumento para geração de órgãos e posterior doação (perspectiva utilitarista). Doação é ato voluntário, jamais imposto

19
Q

É possível se invocar o direito à vida dos anencéfalos?

A

Não! Há uma antítese. O anencéfalo é um natimorto cerebral, absolutamente inviável, logo não é titular do direito à vida seja intra seja extrauterina

20
Q

No julgamento da ADPF 54, houve ponderação entre o direito à vida do anencéfalo e os direitos da mulher?

A

Não. O conflito é aparente. Em contraposição aos direitos da mulher, não se encontra o direito à vida ou à dignidade humana de quem estivesse por vir. O anencéfalo é juridicamente morto

21
Q

A interrupção de gestação de feto anencefálico é crime?

A

Não. A conduta é atípica. Não é crime contra vida, porque o anencéfalo é um natimorto cerebral, logo não possui vida

22
Q

De acordo com o STF, sob o ângulo biológico, o que pressupõe o início da vida?

A

Não só a fecundação do óvulo pelo espermatozoide, como também a viabilidade, que como regra se daria com a nidação (ADI 3510/DF). Todavia, o anencéfalo, após a nidação, também não possui viabilidade

23
Q

Quando a CF se reporta a “direitos da pessoa humana” e a “direitos e garantias individuais” como cláusulas pétreas, a quem está se referindo?

A

Ao indivíduo-pessoa, destinatário dos direitos fundamentais. Antes da nidação, não há. No caso de anencéfalo, não há

24
Q

O direito à vida é absoluto?

A

Não. Na CF admite-se a pena de morte em caso de guerra declarada. No CP admite-se o aborto ético ou humanitário como causa excludente de ilicitude. O direito à vida admite gradações (ADI 3510/DF)

25
Q

Há algum exemplo no CP de que o direito à vida admite gradações?

A

Sim. A pena cominada ao crime de homicídio é superior àquela de aborto provocado pela gestante. Logo, protege-se mais a vida à medida que ocorresse seu desenvolvimento

26
Q

O embrião é “pessoa humana”?

A

Não. O embrião é “ser humano”, ser vivo. Mas não é pessoa, sujeito de direitos e deveres, a caracterizar o estatuto constitucional da pessoa humana

27
Q

Ainda que se concebesse a existência de direito à vida de fetos anencefálicos, poderia se admitir que a tutela conferida a ele fosse menos intensa do que a deferida às pessoas e aos fetos em geral?

A

Sim. Porque aqueles não se igualariam a estes. No mais, se a proteção ao feto saudável já é passível de ponderação em relação aos direitos da mulher (aborto terapêutico), com maior razão o é em relação àqueles eventualmente atribuídos ao anencéfalo

28
Q

Quais danos pode sofrer a mulher gestante de um feto anencéfalo?

A

Pode conduzir a um quadro psíquico devastador, com sentimentos mórbidos de dor, angústia, impotência, luto e desespero, tendo em conta a certeza do óbito. Compeli-las a prosseguir na gestação poderia se classificar como tortura, porquanto a colocaria em espécie de cárcere privado de seu próprio corpo, desprovida do mínimo essencial de autodeterminação e liberdade

29
Q

Eventual direito à vida do feto anencéfalo, acaso existisse, cederia, em juízo de ponderação, em prol de quais direitos?

A

Aos direitos à dignidade da pessoa humana, à liberdade no campo sexual, à autodeterminação, à autonomia, à privacidade, à integridade física, psicológica e moral e à saúde (CF, artigos 1º, III, 5º, caput e II, III e X, e 6º, caput), além do reconhecimento pleno dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres