2. Princípios e sistemas do processo penal Flashcards
Do que se trata o Princípio da presunção da inocência ou do estado de inocência ou da situação jurídica de inocência ou da não culpabilidade (art. 50, LVII, CF)? Ele tem previsão constitucional? e quais suas consequências?
Expressamente previsto na Constituição Federal de 1988 no art. 5o, inciso LVII, é princípio por meio do qual se entende que ninguém será considerado culpado
até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Em outros termos, no Processo Penal, todo acusado é presumido inocente até a eventual sentença condenatória transitar em julgado. Em verdade, como aponta Eugênio PaceIli de Oliveira (OLIVEIRA, 2008, p. 35-36), é preferível o uso da expressão situação jurídica de inocência, porque a inocência não é presumida, ela já existe desde o nascimento do indivíduo, persistindo até o trânsito em julgado da sentença condenatória.
O princípio em comento provoca importantes consequências no estudo do Processo Penal. As principais delas são as seguintes:
1. O ônus da prova, em regra, cabe à acusação:
2. Excepcionalidade das prisões cautelares:
3. Toda medida constritiva de direitos individuais, na verdade, só pode serdecretada excepcionalmente:
O que é Princípio da igualdade processual ou da paridade das armas - par conditio (art. 5, caput, CF)?
Trata-se de princípio que decorre do mandamento de que todos são iguais perante a lei encontrado no art. 50, caput, da Constituição Federal, devidamente adaptado ao Processo Penal. Desse modo, por força do princípio em comento, as partes devem ter, em juízo, as mesmas oportunidades de fazer valer suas razões e ser tratadas igualitariamente, na medida de suas igualdades, e desigualmente, na proporção de suas desigualdades.
Este princípio é requisito indispensável para a efetivação do sistema acusatório no país. Ademais, pode ser apontada como consequência direta do princípio a regra
de que, no Processo Penal, o réu não pode se defender sozinho (a não ser que ele próprio seja advogado), consoante disposto no art. 263 do CPP, pois não teria
condições técnicas para tanto, ao contrário do seu oponente, o autor da ação penal (Ministério Público ou querelante representado por procurador).
Lembrar da Doutrina Brady (sonegação de provas pela acusação)
A revelação à defesa de “prova favorável ao acusado” (Brady material) é requerida dos promotores mesmo que negue a culpa do réu, que reduza a sentença a ser imposta a um condenado ou que ponha em dúvida a credibilidade de uma testemunha. O princípio constitucional do devido processo legal compele o Ministério Público a revelar para os réus as provas produzidas pelos agentes estatais de investigação que sejam especialmente relevantes para as suas defesas. Nesse paradigmático caso, a Suprema Corte anulou a pena de morte imposta a um réu condenado por um crime de homicídio de primeiro grau, porque reconheceu que o Promotor de Justiça violou o seu direito constitucional ao devido processo legal quando não atendeu totalmente a um pedido da defesa de acesso a determinadas provas e deixou de revelar a existência de um depoimento extrajudicial de um corréu, no qual ele admitia ter sido o responsável direto por matar a vítima durante a execução de um roubo praticado pelos dois acusados. Na ocasião, a Suprema Corte assentou que “a supressão por parte do Ministério Público de prova favorável ao acusado, mediante solicitação, viola o devido processo legal quando a prova é material, seja à culpa, seja à pena, independentemente de boa fé ou má fé do Ministério Público”[6].
Lembrar também de:
Aplica-se a teoria da perda de uma chance probatória na hipótese em que, injustificadamente, a acusação deixa de produzir prova que poderia comprovar a tese defensiva ou colocar o réu a salvo de quaisquer dúvidas em relação à versão acusatória.
STJ. 6ª Turma. HC 829.723-PR, Rel. Min. Teodoro Silva Santos, julgado em 12/12/2023 (Info 17 – Edição Extraordinária).
O que é o Princípio da ampla defesa (art. 5,LV, CF)?
Por força desse princípio, encontrado no art. 5., LV, da Constituição Federal, entende-se que o réu tem direito a um amplo arsenal de instrumentos de defesa como forma de compensar sua enorme hipossuficiência e fragilidade em relação ao Estado, que atua no Processo Penal por meio de diversos órgãos (Polícia Judiciária, Ministério Público e juiz), de forma especializada e com acesso a dados restritos.
Este princípio divide-se em autodefesa e defesa técnica.
A autodefesa é a defesa promovida pessoalmente pelo próprio réu, sem assistência de procurador, geralmente durante o seu interrogatório judicial, sendo ela disponível, afinal de contas o acusado pode se calar ou até mesmo mentir, em conformidade com outro princípio constitucional expresso, o direito ao silêncio (direito ao silêncio só vale na segunda parte do interrogatório).
Entretanto, ressalte-se que a disponibilidade da autodefesa não autoriza que o réu minta ou se cale na primeira parte do interrogatório judicial (art. 187, § 1., do
CPP), referente às perguntas sobre a sua qualificação pessoal, o que é apenas permitido na segunda parte deste ato processual (art. 187, § 2., do CPP), no momento das perguntas sobre os fatos delitivos. Em se recusando a fornecer sua qualificação, o agente poderá praticar a contravenção penal prevista no art. 68 da Lei de Contravenções Penais (recusa de dados sobre própria identidade ou qualificação). De outro lado, se o réu atribui a si mesmo outra identidade, pode restar configurado o crime definido no art. 307 do Código Penal (falsa identidade). Este crime também estará
caracterizado se a conduta de atribuir-se falsa identidade for praticada perante autoridade policial, de acordo com a Súmula no 522 do STJ. Ademais, também não se permite que o réu, na segunda parte do interrogatório, formule imputação falsa a terceiros ou mesmo autoimputação falsa, sob pena inclusive de responsabilidade penal por seu ato, caracterizando-se o crime de denunciação caluniosa (art. 339 do Código Penal) ou até de autoacusação falsa (art. 341 do Código Penal).
A autodefesa distingue-se ainda em direito de audiência (direito de o réu ser ouvido no processo, o que ocorre geralmente durante o interrogatório judicial) e direito de presença (direito de o réu estar presente aos atos processuais, geralmente audiências, seja de forma direta, seja de forma indireta, o que ocorre por meio da videoconferência).
Nesse contexto, porém, é de se registrar que o STJ entende que a ausência do réu à audiência de oitiva de testemunhas não gera nulidade do feito se o seu defensor estava presente ao ato processual e não restou demonstrado qualquer prejuízo para ele (Informativo no 426). Nesse trilhar, o STF já teve a oportunidade de decidir que inexiste nulidade pela ausência do réu preso em audiência de oitiva de testemunha por meio de carta precatória se ele não manifestou expressamente intenção de participar
da audiência (RE no 602543 00/RS, Rel. Min. Cezar Peluso, julgado em 19.11.09).
Já a defesa técnica é aquela defesa promovida por um defensor técnico, bacharel em Direito, sendo ela indisponível, pois, em regra, o réu não pode se defender sozinho (art. 263, caput, do CPP) - apenas se ele for advogado é que poderá promover a sua própria defesa. A esse respeito, vale a pena destacar que, em havendo ausência do defensor técnico no .processo (por falecimento, negligência ou qualquer outro motivo), o magistrado, antes de nomear novo defensor, sempre deverá intimar o acusado para que, no prazo por ele determinado, possa constituir novo defensor. Esse direito de constituir o seu próprio defensor a qualquer tempo (art. 263, caput, do CPP) é assegurado ao réu ainda que ele seja revel, consoante entendimento do STJ (Informativo no 43o).
São consequências diretas do princípio da ampla defesa no Processo Penal:
- Apenas o réu tem direito à revisão criminal
- 0 juiz deve sempre fiscalizar a eficiência da defesa do réu
O que é o Princípio da plenitude da defesa?
Previsto no art. 50, inciso XXXVIII, alínea “a”, da Constituição Federal, é princípio aplicado especificamente para o Tribunal do júri. Trata-se de um plus, um reforço à ampla defesa, que é atribuída apenas para os acusados em geral, permitindo-se que o réu, no Tribunal do Júri, se utilize de todos os meios lícitos de defesa, ainda que não previstos expressamente pelo ordenamento jurídico.
Segundo Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar, isso implica na “possibilidade não só da utilização de argumentos técnicos, mas também de natureza sentimental, social e até mesmo de política criminal, no intuito de convencer o corpo de jurados” (TÁVORA; ALENCAR, 2009, p. 675). Aliás, frise-se que o princípio
em tela decorre justamente do fato de que, no Tribunal do júri, prevalece a íntima convicção do jurado, o qual não necessita fundamentar sua decisão.
São consequências diretas deste princípio:
1. A atenção do juiz com a efetividade da defesa do réu é ainda maior
2. É possível a defesa apresentar nova tese na tréplica
3. Caso o réu precise de mais tempo nos debates, poderá pedi-lo sem que isso gere necessariamente igual direito ao Ministério Público.
O que é o Princípio da prevalência do interesse do réu ou favor rei, favor libertatis, in dubio pro reo, favor inocente (art. 50, LVII, CF)?
Havendo dúvida entre admitir-se o direito de punir do Estado ou reconhecer- -se o direito de liberdade do réu, deve-se privilegiar a situação deste último, por ser ele a parte hipossuficiente da relação jurídica estabelecida no Processo Penal. É princípio que decorre ontologicamente do princípio da presunção de inocência, daí porque é possível afirmar que ele também se encontra previsto no art. 5., inciso LVII, da Constituição Federal.
Contudo, de acordo com entendimento majoritário do Si]. esse princípio não tem aplicação nas fases de oferecimento da denúncia e na prolação da decisão de pronúncia do Tribunal do Júri, nas quais prevalece o princípio do in dubio pro societate, embora o próprio STJ, em outras oportunidades, tenha afirmado que tal brocardo não é acolhido no ordenamento jurídico brasileiro, em respeito ao princípio da presunção de inocência (ST], 6’ Turma, RHC no 40904/SC, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 21.11.2013, Die 09.12.2013). 0 STF também vinha acolhendo o posicionamento de que seria aplicável à pronúncia no júri o in dubio pro societate (Informativo n 898). Ocorre que, mais recentemente, em 26 de março de 2019, a Segunda Turma do Pretório Excelso decidiu que, nesta etapa processual, incide o princípio do in dubio
pro reo, por aplicação do princípio da presunção de inocência, inexistindo, em verdade, no Processo Penal brasileiro, em qualquer etapa de qualquer procedimento, o princípio do in dubio pro societate (STF, Segunda Turma, ARE 1067392).
Consequência direta deste princípio consiste no fato de que, em havendo dúvida na interpretação de um determinado artigo de lei processual penal, deve–se privilegiar a interpretação que beneficie a situação do réu.
O que é o Princípio do contraditório ou da bilateralidade da audiência (art. 50, LV, CF)?
Por força do princípio do contraditório, estampado no art. 5., LV, da Carta Magna Federal, ambas as partes (e não apenas o réu) têm o direito de se manifestar
sobre qualquer fato alegado ou prova produzida pela parte contrária, visando a manutenção do equilíbrio entre o direito de punir do Estado e o direito de liberdade do réu e o consequente estado de inocência, objetivo de todo Processo Penal justo.
Em regra, o princípio diz respeito apenas a fatos e provas. Entretanto, é possível ser aplicado também em matéria de direito, quando ela possibilitar a extinção do feito, a exemplo da abolitio criminis, que pode ensejar o decreto de extinção da punibilidade (artigos 2., caput, e io7, inciso Ill, do Código Penal).
Para que o contraditório possa se perfectibilizar no Processo Penal, é preciso necessariamente que sejam atendidos 3 (três) direitos das partes, são eles:
1. Direito de ser intimado sobre os fatos e provas.
2. Direito de se manifestar sobre os fatos e provas.
3. Direito de interferir efetivamente no pronunciamento do juiz.
O que é o Princípio do juiz natural (art. 50, LIII, CF)?
Em virtude deste princípio, consagrado no art. 50, inciso LIII, do Texto Constitucional, entende-se que, no Processo Penal, o julgador a atuar em um determinado feito deve ser aquele previamente escolhido por lei ou pela Constituição Federal. Veda-se com isso o Tribunal ou Juiz de Exceção, que seria aquele escolhido após a ocorrência de um crime e para determinado caso concreto.
Este princípio tem como principal finalidade garantir a participação no processo de um juiz imparcial. Porém, tal princípio não impede a criação de Varas novas e a consequente remessa dos autos a este novo juízo, pois, nessa hipótese, a medida é válida para toda a coletividade, não atingindo um réu em específico.
O que é o Princípio da publicidade (arts. 5., LX e XXXIII, e 93, IX, CF e art. 792, caput, CPP)?
É o princípio segundo o qual os atos processuais devem ser praticados publicamente, sem qualquer controle, permitindo-se o amplo acesso ao público, bem como os autos do processo penal estão disponíveis a todos. Trata-se de forma de fomentar o controle social dos atos processuais.
Esse princípio, porém, comporta exceções: nos termos do art. 5., inciso LX, da Constituição Federal, a lei poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem. No entanto, jamais o ato processual será praticado sem a presença do Ministério Público, assistente de acusação, se houver, e do defensor (embora seja possível excluir a pessoa do réu, como na hipótese prevista no art. 217 do CPP, em que o juiz poderá até determinar a retirada do réu da sala de audiência se perceber que a sua presença causa humilhação, temor, ou sério constrangimento à testemunha ou ao ofendido, de modo que prejudique a verdade do depoimento).
Em face da existência de tais exceções, a doutrina apresenta as seguintes espécies de publicidade: publicidade geral (é aquela que não comporta exceções, sendo o ato processual e os autos do feito acessíveis a todos) e publicidade específica (é aquela que, incidindo as exceções constitucionais alhures mencionadas, só permite o acesso ao ato processual e aos autos do feito por parte do Ministério Público, assistente de acusação, se houver, e defensor).
O que é o Princípio da vedação das provas ilícitas (art. 5, LVI, CF)?
Nos termos do art. 50, inciso LVI, da Constituição Federal, são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos.
O Código de Processo Penal, com o advento da Lei no 11.690/08, passou a disciplinar com pormenores a matéria. Assim, inicialmente, repetiu o mandamento
constitucional no art. 157, caput, estatuindo que são inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas. Complementando esta ideia, o art. 157, § 30, CPP, determina que preclusa a decisão de desentranhamento da prova declarada inadmissível, esta será inutilizada por decisão judicial, facultado às partes acompanhar o incidente. Registre-se, porém, que se a prova permanecer nos autos, mas ela não for utilizada pelo magistrado, de nenhuma forma, para a prolação da sentença, não haverá qualquer nulidade nesta decisão. Não obstante, caso o juiz venha a se utilizar de uma prova ilícita para proferir a sentença,
esta será nula (nulidade absoluta).
Em seguida, no mesmo dispositivo legal (art. 157, caput), o CPP define o que se entende por provas ilícitas: são aquelas que violam tanto normas constitucionais como legais.
Ressalte-se ainda que a doutrina considera a existência do gênero prova proibida ou vedada ou inadmissível, tendo como espécies a prova ilícita, violadora de regra de direito material (exemplo: confissão obtida mediante tortura; interceptação telefônica realizada sem autorização judicial), e a prova ilegítima, aquela obtida mediante violação de regra de direito processual (exemplo: laudo pericial confeccionado por apenas um perito não oficial). O CPP (e a própria Constituição Federal), porém, não acolhe essa distinção, tratando uma prova que viole norma constitucional ou legal sempre como prova ilícita.
O que é o Princípios da economia processual, celeridade processual e duração razoável do processo (art. 5., LXXVIII, CF)?
Segundo estes princípios, evidenciados no art. 5., inciso LXXVIII, da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 45/04, e encontrado
também no art. 62 da Lei no 9.099/95, incumbe ao Estado dar a resposta jurisdicional no menor tempo e custo possíveis.
São consequências destes princípios:
1. As prisões cautelares somente devem persistir por tempo razoável, enquanto presente a necessidade das mesmas (princípio da duração razoável das prisões cautelares).
2. Possibilidade de utilização de carta precatória itinerante (art. 355, § do CPP).
3. A suspensão do processo, havendo questão prejudicial, somente deve ser feita quando há caso de difícil solução, para que não se procrastine inutilmente o término da instrução (art. 93 do CPP).
Quanto a este princípio, é criada pela doutrina a regra dos três critérios básicos, que procura delimitar a duração razoável com maior rigor. Os três critérios são os seguintes: a) a complexidade do caso; b) a atividade processual do interessado (imputado); c) a conduta das autoridades judiciárias.
O que é o Princípio constitucional geral do devido processo penal - devido processo legal ou due process of law?
O princípio do devido processo legal vem insculpido no art. 50, LIV, da Carta Magna Federal, segundo o qual “Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.
Divide-se em dois aspectos:
1. Aspecto material ou substancial: liga-se ao Direito Penal, fazendo valer os princípios penais, a exemplo da máxima de que ninguém deve ser processado senão por crime previsto e definido em lei. Coincide com o princípio da razoabilidade:
2. Aspecto processual ou procedimental: liga-se “ao procedimento e à ampla possibilidade de o réu produzir provas, apresentar alegações, demonstrar, enfim, ao juiz a sua inocência, bem como o de o órgão acusatório, representando a sociedade, convencer o magistrado, pelos meios legais, da validade da sua pretensão punitiva” (NUCCI, 2008, p. 96).
Princípios implícitos: O que é o Princípio de que ninguém está obrigado a produzir prova contra si mesmo ou da não autoincriminação (nemo tenetur se detegere)?
Trata-se de princípio constitucional implícito que decorre dos seguintes princípios constitucionais expressos: presunção de inocência (art. 50, LVII, CF); ampla defesa (art. 50, LV, CF); direito ao silêncio (art. 50, LXIII, CF). Não obstante, é princípio que se encontra expressamente previsto no art. 80 do Pacto de São José da Costa Rica, de 22 de novembro de 1969, incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro pelo Decreto no 678, de 6 de novembro de 1992, e que tem status supralegal, conforme entendimento do STF exarado nos julgamentos do RE no 466.343/SP e HC no 87.585/TO (Informativo no 531).
Por força deste princípio é que a doutrina e a jurisprudência do STF e do STj majoritárias vêm considerando que o acusado não está obrigado a participar de atividades probatórias que impliquem em intervenções corporais, como realização de exames de DNA, grafotécnico ou de bafômetro - este último frequentemente utilizado para a constatação do crime de embriaguez ao volante previsto no art. 306 da Lei no 9.503/97 (Código de Trânsito Brasileiro) -, embora haja posições minoritárias em sentido contrário, a exemplo de Eugênio PaceIli de Oliveira (2008, p. 336-342) e Américo Bedê júnior e Gustavo Senna (2009, p- 40-47).
Nesse cenário, faz-se imprescindível esclarecer que o que se procura vedar a partir do princípio em comento é apenas e tão somente o comportamento proativo do agente no fornecimento da prova. Em outras palavras, o comportamento passivo do indivíduo na confecção da prova não ensejaria qualquer tipo de ilicitude. Adotando esta concepção, o STF, em julgado paradigmático envolvendo a atriz mexicana Glória Trevi, permitiu a realização de exame de DNA com a utilização do material biológico da placenta retirada da atriz para a investigação de crime de estupro supostamente praticado contra ela pelo delegado da polícia federal na
carceragem desta polícia, que teria resultado em sua gravidez; ao final da investigação criminal, comprovou-se que não houve o crime de estupro (RCL no 2.040/ DF - Informativo no 257). 0 STJ, por sua vez, vem admitindo que a produção de prova por meio de exame de DNA sem o consentimento do investigado é permitida se o material biológico já está fora de seu corpo e foi abandonado. Com efeito, entende-se que o material genético obtido a partir de utensílios descartados pelo
investigado (a exemplo de um copo ou de um cigarro jogado no lixo) não é recolhido de forma clandestina, pois, uma vez que deixou de fazer parte do corpo dele,
tornou-se objeto público. O que não se permite, portanto, é o recolhimento do material genético à força, mediante constrangimento moral ou físico.
O que é o Princípio da iniciativa das partes ou da ação ou da demanda (ne procedat judex ex officio) e princípio consequencial da correlação entre acusação e sentença?
Trata-se de princípio extraído do sistema acusatório, que vige no Brasil e pode ser depurado dos artigos 129, inciso I (repetido pelo art. 257, inciso I, do CPP), e 5., inciso, LIX, da Constituição Federal, os quais garantem, respectivamente, a titularidade da ação penal pública por parte do Ministério Público e a possibilidade de oferecimento da ação penal privada subsidiária da pública, se a ação penal pública não for intentada pelo Parquet no prazo legal.
Nesses termos, entende-se que o princípio veda que o juiz deflagre a ação penal de ofício, exigindo-se para tanto a iniciativa do titular da ação. Por força do princípio em comento é que não se admite mais o processo judicialiforme, que consistia na possibilidade de início da ação penal, nas contravenções penais, por meio do auto de prisão em flagrante delito ou por portaria expedida
pelo delegado ou pelo magistrado, de ofício ou a requerimento do Ministério Público. A esse respeito, frise-se que o art. 531 do CPP, que contemplava essa possibilidade, foi alterado pela Lei no 11.719/08, que a extirpou desse dispositivo legal. Sendo assim, deve-se considerar que houve a revogação tácita do art. 26 do CPP, que tinha conteúdo idêntico àquele dispositivo legal alterado.
Consequência direta deste princípio é o surgimento de outro princípio, o da correlação (ou congruência ou relatividade ou reflexão) entre a acusação e a sentença, o qual implica na exigência de que o fato imputado ao réu, na peça inicial acusatória, guarde “perfeita correspondência com o fato reconhecido pelo juiz, na sentença, sob pena de grave violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa, consequentemente, ao devido processo legal” (NUCCI, 2008, p. 661).
Contudo, o princípio da iniciativa das partes comporta exceções, situações nas quais o magistrado pode conceder provimentos jurisdicionais de ofício. São elas:
1. Decisões referentes ao estado de liberdade do indivíduo
2. Procedimento da execução penal
O que é o Princípio do duplo grau de jurisdição?
É princípio que inicialmente decorre da própria estrutura do Poder judiciário traçada pela Constituição Federal, consistente na divisão do mesmo em instâncias
diversas, começando pelos magistrados singulares, passando pelos respectivos tribunais a que eles estão vinculados, pelo ST] e finalmente chegando ao
órgão de cúpula, o STF.
Decorre também da natural irresignação da parte com uma decisão que considera injusta, da necessidade de controle de todo e qualquer ato estatal, característica
marcante do Estado Democrático de Direito, e do fato de que, ao menos em tese, o juiz de primeiro grau ficaria psicologicamente mais pressionado a acertar na decisão, para evitar revisão por parte do Tribunal, enquanto que
este, por sua vez, é constituído por magistrados mais experientes, que melhor poderiam julgar a causa.
O que é o Princípio do juiz imparcial?
É princípio que decorre do princípio constitucional expresso do juiz natural, com a finalidade de complementá-lo, afinal de contas o magistrado pode atéestar previamente investido na jurisdição, mas mesmo assim não ser imparcial na sua atuação, motivo pelo qual o CPP prevê hipóteses de impedimento (arts. 252 e 253) e suspeição (art. 254) do julgador.
Desse modo, para que um juiz efetivamente atue no processo penal, além de estar investido na função jurisdicional do Estado, não deve ter “vínculos subjetivos com o processo de molde a lhe tirar a neutralidade necessária para conduzi-lo com isenção” (TÁVORA; ALENCAR, 2009, p. 46). No entanto, ressalte-se que a atuação neutra de um juiz não passa de um mito, pois ele, durante o julgamento, sempre é influenciado por seus valores pessoais. É por isso que a doutrina prefere utilizar a expressão “juiz imparcial”, no sentido de exigência de um dever de honestidade do magistrado, que deverá sempre cumprir “a Constituição, de maneira honesta, prolatando decisões suficientemente motivadas” (TÁVORA; ALENCAR, 2009, p. 46).
Ademais, frise-se que este princípio está consagrado expressamente no art. 80, 1, do Pacto de São José da Costa Rica (aprovado pelo Decreto no 678/92), válido
no Brasil como norma supralegal, conforme entendimento do STF exarado nos julgamentos do RE no 466.343/SP e HC no 87.585/TO (Informativo no 531).