Prevenção do tromboembolismo na fibrilação atrial Flashcards

1
Q

INTRODUÇÃO

A

A fibrilação atrial (FA) é a arritmia cardíaca sustentada mais frequente na prática clínica e nas salas de emergência. A prevalência aumenta significativamente com a idade, sendo maior no sexo masculino. Estima-se que cerca de 20-25% dos indivíduos entre a 7ª e a 8ª década de vida serão mais acometidos por FA nos próximos anos.

A maior expectativa de vida da população mundial e a presença de fatores de risco como hipertensão arterial sistêmica, diabete melito, sobrepeso, obesidade, tabagismo, sedentarismo, excesso de consumo de álcool e síndrome da apneia obstrutiva do sono aumentam a probabilidade de desenvolvimento de FA. Além desses fatores, doença arterial coronariana, insuficiência cardíaca, cardiopatias estruturais, doenças orovalvares e doenças inflamatórias contribuem de forma significativa na etiopatogenia e incidência de FA.

A formação de trombos intracavitários e a disfunção ventricular são complicações frequentes, aumentando assim o número de hospitalizações e a mortalidade. A principal complicação tromboembólica no paciente portador de FA é o acidente vascular encefálico (AVE). Cerca de 20-30% dos AVE de origem isquêmica e 10% dos AVE criptogênicos (de origem indeterminada) têm como etiologia a FA. Portanto, o risco de AVE independe da forma de apresentação da arritmia, podendo ser paroxística, persistente ou permanente. Além disso, cerca de 30% dos pacientes podem cursar com a forma assintomática ou subclínica, sendo o AVE a primeira manifestação da doença.

O uso de anticoagulantes orais tem se mostrado o principal tratamento para a redução de complicações tromboembólicas. Entretanto, torna-se necessária a estratificação de risco dessa população para a seleção dos pacientes elegíveis à prevenção com terapia anticoagulante. Vale a pena ressaltar que antiplaquetários, isoladamente, não são indicados para a prevenção de AVE em pacientes com FA.

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2
Q

ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO DE EVENTOS TROMBOEMBÓLICOS

A

Sociedade Europeia de Cardiologia (ESC) recomenda, desde 2012, o escore CHA2DS2-VASc para estimar o risco de fenômenos tromboembólicos no paciente com FA. Alguns fatores que compõem o escore são bem conhecidos e oriundos do escore CHADS2.

No escore CHA2DS2-VASc foram incluídos os fatores de risco: idade entre 65-74 anos, presença de doença vascular aterosclerótica e sexo feminino (Tabela 1).
Pelas diretrizes atuais, o escore CHA2DS2-VASc deve ser utilizado para estratificação do risco de eventos tromboembólicos em todos os portadores de FA como recomendação classe I e nível de evidência A. Como previamente ressaltado, o uso isolado de ácido acetilsalicílico (AAS) está contraindicado para prevenção do AVE e eventos tromboembólicos nessa população.

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3
Q

AVALIAÇÃO DO RISCO DE SANGRAMENTO

A

O risco de sangramento deve ser avaliado por meio do escore HAS-BLED (Hypertension, abnormal renal/liver function, stroke, bleeding history or predisposition, labile INR, elderly > 65 years old, drug/alcohol concomitantly), descrito na Tabela 2.
As variáveis utilizadas para o cálculo de risco de eventos tromboembólicos e sangramento são semelhantes, assim o HAS-BLED auxilia na identificação daqueles com maior potencial de sangramento.

Escore de HASBLED igual ou superior a 3 indica alto risco de sangramento e, portanto, um alerta para a identificação de fatores que possam ser modificados, como hipertensão não controlada, uso concomitante de anti-inflamatórios e ou antiagregantes plaquetários, uso abusivo de bebidas alcoólicas a fim de minimizar o risco de complicações hemorrágicas.

O guia prático de utilização dos DOAC da ESC, publicado em 2018, reforça a recomendação quanto ao controle desses fatores de risco modificáveis.

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4
Q

TERAPIA ANTICOAGULANTE

A

Os antagonistas da vitamina K são eficazes na prevenção de eventos tromboembólicos, mas apresentam uma série de limitações que dificultam seu uso na prática clínica diária, tais como:

Janela terapêutica estreita.

Início de ação lento e meia-vida longa.
Farmacocinética e farmacodinâmicas variáveis.
Interações com alimentos e fármacos.
Necessidade de monitoramento regular.
Grande variabilidade individual de nível sérico.
O advento dos novos fármacos anticoagulantes com inibidores diretos da trombina (dabigatrana) e inibidores do fator Xa (rivaroxabana, apixabana e edoxabana) trouxe novas perspectivas para abordagem do indivíduo portador de FA. Na última década, quatro grandes ensaios randomizados avaliaram a eficácia e a segurança desses fármacos, comparando-os à terapia-padrão com varfarina. O primeiro ensaio clínico foi apresentado em 2010 e avaliou o etexilato de dabigatrana, fármaco que se liga, após a conversão no princípio ativo, de maneira direta e reversível à trombina ativada (fator IIa), inibindo a conversão do fibrinogênio em fibrina, fazendo uma inibição dupla desta. A seguir três outros ensaios clínicos foram publicados com os inibidores diretos do fator X ativado (FXa): rivaroxabana, apixabana e edoxabana. A inibição do fator FXa proporciona um controle na formação de fibrina, levando a uma redução importante da atividade da trombina.

Foram quatro estudos de não inferioridade que demonstraram que os anticoagulantes de ação direta (DOAC) não são inferiores à varfarina. Apenas a dabigatrana, na dose de 150 mg, demonstrou superioridade em relação à varfarina na redução de AVE isquêmico. Os quatro anticoagulantes de ação direta apresentam melhor perfil de segurança por redução de sangramento maior e hemorragia intracraniana, incorporando de forma definitiva os DOAC ao cenário da prevenção de eventos embólicos do indivíduo com FA.

Os DOAC apresentam uma série de vantagens e benefícios quando comparados à varfarina.

Rápido início de ação (2-4 horas).
Meia-vida curta (12-18 horas).
Não necessitam de monitorização.
Baixo potencial de interação medicamentosa.
Sem interação com alimentos.
Menor risco de sangramento.

**A posologia para rivaroxabana e edoxabana é 1 vez ao dia; **para dabigatrana e apixabana, 2 vezes ao dia. Não há necessidade de acompanhamento com exames laboratoriais para mensuração do nível de anticoagulação; entretanto, por apresentarem diferentes taxas de eliminação renal – dabigatrana (80%), edoxabana (50%), rivaroxabana (33%) e apixabana (27%) –, necessitam de avaliação da função renal para escolha e ajuste de dose, caso necessário.

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5
Q

Contraindicação DOAC

A

Os DOAC não são isentos de interações medicamentosas, e essa avaliação deve ser feita de forma criteriosa a fim de minimizar riscos de complicações hemorrágicas ou tromboembólicas, respeitando as recomendações de cada fabricante oriundas dos ensaios clínicos randomizados. Estão contraindicados nos pacientes que utilizam:

Antifúngicos (cetoconazol, itraconazol, posaconazol, voriconazol).
Antirretrovirais (ritonavir, lopinavir).
Rifampicina.
Na Tabela 3, estão descritas as características farmacocinéticas e farmacodinâmicas dos DOAC.

Conforme recomendação das diretrizes mais recentes das Sociedades Europeia e Americana de cardiologia, os DOAC são os fármacos de eleição para o tratamento do paciente com FA, não sendo mais recomendada a utilização do termo “FA não valvar”. Não estão indicados nos pacientes com FA por estenose mitral moderada a grave e portadores de próteses metálicas. Nesses pacientes a terapia recomendada continua sendo a varfarina.

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6
Q

A escolha do DOAC, bem como a dose apropriada, deve ser individualizada após análise de fatores clínicos, laboratoriais, risco de sangramento, interações medicamentosas e perfil de aderência.

A

A escolha do DOAC, bem como a dose apropriada, deve ser individualizada após análise de fatores clínicos, laboratoriais, risco de sangramento, interações medicamentosas e perfil de aderência.

A dose recomendada para dabigatrana é 150 mg 2 vezes ao dia e 110 mg 2 vezes ao dia para paciente com clearance de creatinina entre 30-49 mL/min e/ou idade superior a 80 anos.

A posologia da rivaroxabana é de 20 mg 1 vez ao dia, sendo a dose de 15 mg indicada quando ClCr entre 30-49 mL/min. A ingestão deve ser realizada junto à refeição, com a finalidade de garantir a máxima eficácia do efeito anticoagulante.
Para edoxabana, a recomendação é de 60 mg 1 vez ao dia e ajuste para 30 mg quando ClCr entre 30-49 mL/min ou peso corpóreo ≤ 60 kg ou uso concomitante de inibidor potente da glicoproteína P (ciclosporina, eritromicina, cetoconazol).
Em relação à apixabana, a dose é 5 mg 2 vezes ao dia. Na presença de pelo menos dois dos seguintes fatores: idade ≥ 80 anos, peso < 60 kg e nível sérico de creatinina ≥ 1,5 mg/dL, ajustar a dose para 2,5 mg 2 vezes ao dia.

Os anticoagulantes diretos não foram avaliados em pacientes com clearance renal < 30 mL/min, assim como nos pacientes em hemodiálise. Nesses pacientes a varfarina é o fármaco recomendando, entretanto nos pacientes com doença renal crônica estágio IV que apresentam clearance entre 15-30 mL/min os inibidores do fator Xa (apixabana, edoxabana e rivaroxabana) na dose reduzida podem ser utilizados com cautela como segunda opção terapêutica.

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7
Q

ACOMPANHAMENTO DO PACIENTE EM USO DE ANTICOAGULAÇÃO

A

Avaliação clínica e laboratorial
A cada consulta é recomendada uma avaliação clínica e laboratorial, pesquisa de episódios de sangramento, eventos adversos e aderência à medicação a fim de garantir maior efetividade da terapia anticoagulante e menor risco de complicações. Os pacientes portadores de FA, especialmente os idosos com comorbidades associadas, apresentam maior risco de câncer e geralmente utilizam maior número de fármacos, condições que aumentam o risco de interações medicamentosas e complicações hemorrágicas. Além disso, o idoso tem declínio da função renal, maior grau de fragilidade e risco de queda.

O risco de queda não é contraindicação para a terapia anticoagulante, mas sim um alerta para o diagnóstico de fatores intrínsecos relacionados à queda, como: alterações visuais, hipotensão ortostática, distúrbios de equilíbrio e marcha, declínio cognitivo e inatividade física; adoção de medidas corretivas para minimizar os riscos de complicações.

Na avaliação laboratorial devem constar exames para diagnóstico precoce de anemia por perdas ocultas de sangue, função renal e hepática.

Aderência ao tratamento
Os DOAC apresentam meia-vida curta, sendo de extrema relevância a orientação em relação à aderência. Esta deve ser minuciosamente discutida com o paciente e familiares no momento de iniciar a terapia anticoagulante e a cada consulta subsequente. É importante a discussão com o paciente e familiares sobre os objetivos da terapia, o risco de AVE, custo do tratamento em longo prazo, a importância do uso correto e de forma contínua, bem como os riscos inerentes à terapia. Essa simples abordagem permite uma conscientização sobre a doença e a importância da participação do paciente e de seus familiares no tratamento, aumentando a aderência em longo prazo.

Interação medicamentosa
Apesar de os DOAC terem menor interação medicamentosa quando comparados à varfarina, alguns cuidados devem ser adotados quando associados a fármacos que utilizam a via do citocromo P450 e CYP3A4. As recomendações vigentes do guia prático de anticoagulação da ESC baseiam-se no perfil de farmacocinética dos anticoagulantes diretos. O conhecimento sobre o efeito nos níveis plasmáticos e clínicos dos DOAC está se expandindo, de modo que novas informações podem modificar as recomendações existentes. Algumas recomendações:

Fluconazol: sem informação de potencial interação.
Anti-inflamatórios: possível risco de interação com apixabana por aumento da concentração plasmática.
Antiácidos: redução da concentração plasmática entre 12-30% com a dabigatrana.
Carbamazepina, fenobarbital e fenitoína: reduzem a concentração plasmática dos DOAC.
Imunossupressores (ciclosporina e tracolimus): aumentam a concentração plasmática dos inibidores do fator Xa; não recomendada a associação com dabigatrana.
No Quadro 1 estão listadas as recomendações para acompanhamento do paciente em uso de DOAC.

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8
Q

*** Anticoagulação na cardioversão elétrica

A

Cardioversão elétrica
Todos os pacientes que se apresentam na sala de emergência ou ambulatório com quadro de FA devem receber terapia anticoagulante com heparina de baixo peso ou heparina não fracionada ou DOAC antes da reversão da FA.

Àqueles que apresentam duração da FA maior que 48 horas ou tempo indeterminado de início da anticoagulação, é recomendada a estratégia de cardioversão guiada com ecocardiograma transesofágico (ETE) antes da cardioversão elétrica (CVE). Na ausência de trombo no átrio esquerdo ao ETE, a cardioversão elétrica pode ser realizada.
Nos pacientes que já estavam em uso de anticoagulação com DOAC ou varfarina, o tratamento anticoagulante deve ser mantido, avaliada a aderência do DOAC e realizada CVE precedida por ecocardiograma transesofágico. Na ausência de ecocardiograma transesofágico ou impossibilidade de sua realização, a CVE pode ser realizada, desde que se confirme a aderência aos DOAC por mais de 3-4 semanas e no caso da varfarina o controle adequado do INR entre 2-3.

Nesse cenário, a anticoagulação deve ser mantida por 30 dias em razão do atordoamento atrial após a reversão, a fim de reduzir complicações tromboembólicas. Após esse período a indicação é de uso contínuo nos pacientes com escore de CHA2DS2-VASc ≥ 2 para o sexo masculino e CHA2DS2-VASc ≥ 3 para o sexo feminino. Para o paciente masculino com CHA2DS2-VASc 1 e CHA2DS2-VASc 2 para sexo feminino, a recomendação de terapia anticoagulante tem nível de evidência classe IIA.

**Nos pacientes em que forem identificados trombos pelo ecocardiograma transesofágico a anticoagulação deve ser mantida por 4-6 semanas, sendo necessário após esse período repetir o ecocardiograma transesofágico antes da CVE.

A anticoagulação dos pacientes com flutter atrial submetidos a CVE deve seguir o mesmo protocolo empregado na FA.

O fluxo de atendimento dos pacientes com FA que serão submetidos a reversão da arritmia está apresentado na Figura 1**

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9
Q

Antiacoagulação x Sangramento(LEVE,MODERADO E GRAVE)

A

Os DOAC têm excelente perfil de segurança quando comparados à varfarina. Apresentam menores taxas de sangramento intracerebral, de sangramento ameaçador à vida e de sangramentos graves. A dabigatrana (dose de 150 mg) e a rivaroxabana apresentaram maior incidência de sangramentos digestivos sem, no entanto, serem considerados sangramentos graves.

Na vigência de qualquer tipo de sangramento com DOAC deve-se suspender o seu uso e avaliar se a posologia está correta. A meia-vida curta desses fármacos favorece o controle do sangramento com a suspensão do uso. A investigação da causa e do sítio do sangramento deve ser realizada, pois pode auxiliar, em alguns casos, o diagnóstico de uma doença subjacente.

De forma prática, o sangramento é classificado como: leve, moderado ou grave.

Sangramentos leves: devem ser manejados com medidas locais com compressão mecânica ou terapia térmica com gelo. A suspensão de uma dose ou interrupção temporária devem ser consideradas até controle do sangramento.

Sangramento moderado: interromper a anticoagulação e utilizar qualquer opção a seguir, de acordo com o tipo e a gravidade do sangramento:
Tratamento sintomático.
Intervenção cirúrgica.
Compressão mecânica.
Substituição de fluidos e suporte hemodinâmico.
Transfusão de produtos sanguíneos.
Carvão ativado oral (se a dose anterior ingerida dentro de 2 horas), no caso da dabigatrana.
Se a hemostasia não for alcançada com as estratégias descritas anteriormente, considerar a administração de 2-4 unidades de plasma fresco congelado.

Sangramento grave ou ameaçador de vida: pode-se utilizar qualquer uma das estratégias descritas acima com base na gravidade do sangramento. Outra opção terapêutica é o agente reversor da dabigatrana, idarucizumabe um anticorpo monoclonal que atua como antídoto específico da dabigatrana.
Se o DOAC em uso for a dabigatrana, a hemodiálise pode ser utilizada com o intuito de facilitar a eliminação da droga. O agente reversor é uma opção segura e eficaz para controle de sangramentos graves ou necessidade de cirurgia de urgência ou emergência. Para pacientes em fase aguda de AVE isquêmico e indicação de trombólise, o agente deve ser utilizado para permitir o tratamento trombolítico. A dose recomendada de idarucizumabe é 5 g (2 frascos de 2,5 g com intervalo de 5 minutos entre as doses). A reversão completa da ação da dabigatrana ocorre de forma imediata, e os efeitos se mantêm por 24 horas.
Para os inibidores do fator Xa, o agente reversor andexanet (proteína recombinante do fator Xa, sem atividade biológica) não está disponível para uso no Brasil, sendo recomendada nesses casos a suplementação com fatores de coagulação como complexo protrombínico (a dose preconizada é de 50 unidades/kg IV) em uma única administração.

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10
Q

Anticoagulação x DAC

A

A associação entre FA e doença arterial coronariana (DAC) é um cenário clínico comum, observado em cerca de 20-30% dos pacientes. O manuseio da terapia com anticoagulantes e antiagregantes plaquetários é complexo e está associado a altas morbidade e mortalidade. A prescrição de AAS ou um inibidor do receptor P2Y12 em conjunto com anticoagulante oral é conhecida como dupla terapia antitrombótica (DTA), enquanto a associação de AAS, um inibidor de P2Y12 e um anticoagulante denomina-se terapia tripla antitrombótica (TTA). A associação de agentes antitrombóticos aumenta o risco de sangramento de forma significativa, exigindo a seleção adequada de pacientes que realmente dela necessitam. É interessante a estratégia de abreviar sempre que possível a duração dessa combinação de fármacos.
Sabe-se que a DTA é necessária para evitar trombose do stent, mas não é suficiente para a prevenção de AVE. Por sua vez, a terapia anticoagulante é fundamental para a prevenção de AVE mas, isoladamente, pode não ser suficiente para evitar novos eventos coronarianos, a depender de cada paciente.

A recomendação atual se baseia na análise do risco de sangramento e risco isquêmico avaliados pelos escores atualmente mais utilizados, bem como pelo cenário clínico, ou seja, síndrome coronariana aguda (SCA) ou síndrome coronariana crônica (SCC) submetidos ou não à intervenção coronariana percutânea (ICP). A presença de comorbidades, o tipo de lesão coronariana, as características do procedimento, o tipo de stent são outros fatores a serem considerados no momento da decisão da estratégica terapêutica.

Metanálise publicada recentemente avaliou a segurança e a eficácia da DTA vs. TTA em pacientes com FA e SCA, com ou sem ICP. Foram incluídos os quatro últimos estudos clínicos que avaliaram o cenário clínico de FA e DAC (PIONEER AF-PCI, REDUAL PCI, AUGUSTUS e PCI ENTRUST-AF). As comparações de DTA vs. TTA demonstram que a dupla terapia reduz significativamente o risco de sangramento sem que haja aumento de trombose de stent e de infarto agudo do miocárdio.

O conceito recente de que é seguro utilizar a DTA no paciente com SCA é uma mudança de paradigma, tendo sido objeto de inúmeros estudos e publicações. Algumas considerações bem estabelecidas pelas recentes diretrizes que embasam a atual prática clínica estão descritas a seguir (Figura 3):

Os DOAC são os agentes de preferência para a maioria dos pacientes com FA não valvar e DAC.
As doses dos DOAC a serem utilizadas são as recomendadas para prevenção do AVE na FA, avaliado nos ensaios randomizados
Se o anticoagulante for a varfarina, o INR deve ser mantido entre 2-2,5.
Estabelecer três cenários de tratamento (fase aguda/hospitalar, primeiros 30 dias e após 1 ano).
O clopidogrel é o antiagregante plaquetário recomendado para associação com DOAC, independentemente de ser DTA ou TTA;
A utilização de ticagrelor ou prasugrel em dupla terapia com anticoagulante deve ser considerada com cautela à tripla terapia nos pacientes com alto risco de eventos isquêmicos pela baixa evidência científica.
A TTA deve ser utilizada pelo menor tempo possível, restringindo-se ao período de internação de 7-10 dias, podendo ser estendida para 30-90 dias se o risco isquêmico for elevado e o risco de sangramento, reduzido.
A DTA está indicada até 12 meses após a SCA ou abreviada para 3-6 meses se ICP eletiva.
Após 12 meses do evento isquêmico com ICP, recomenda-se a suspensão do antiagregante plaquetário, sendo mantido apenas o anticoagulante.
Terapia tripla clássica com varfarina, clopidogrel e aspirina deve ser rotineiramente evitada, podendo ser utilizada em casos específicos e bem selecionados.
A diretriz europeia de doença coronariana cronica, baseada em dados de fraca evidência científica, sugere a utilização da dose reduzida da rivaroxabana de 15 mg, 1 vez ao dia, ou de dabigatrana 110 mg, 2 vezes ao dia, em pacientes com alto risco de sangramento.

As evidências científicas dos estudos com DOAC no cenário do paciente com FA e DAC e as recomendações das recentes diretrizes abrem diversas possibilidades no desafio de tratar o paciente com FA. Essa decisão deve ser compartilhada com o paciente e discutida com colegas médicos em âmbito hospitalar.

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11
Q

OCLUSÃO DO APÊNDICE ATRIAL ESQUERDO

A

Outro recurso que podemos utilizar na prevenção do AVE no paciente com FA é a oclusão percutânea do apêndice atrial esquerdo (AAE). Essa opção se baseia no fato de que 90% dos trombos na FA se localizam dentro do AAE, particularmente nos pacientes com FA não valvar, ou, como descrito acima, sem valvopatia mitral de origem reumática e/ou próteses metálicas. Ensaios randomizados (PREVAIL, PROTECT-AF, EWOLUTION) já demonstraram que a oclusão completa do apêndice atrial esquerdo, por meio de um dispositivo implantável, é uma terapia alternativa para pacientes com FA que tenham alto risco embólico e contraindicação à terapia anticoagulante. Mais recentemente, o PRAGUE-17 comparou a estratégia de oclusão do AAE com anticoagulação com DOAC em pacientes de alto risco para eventos tromboembólicos e de sangramento, mas não com contraindicações à terapia anticoagulante. Esse estudo demonstrou não inferioridade da oclusão em relação ao DOAC para o desfecho composto de eventos embólicos, morte cardiovascular, sangramento significativo e complicações relacionados ao procedimento. Entretanto, a segurança do procedimento ainda é uma questão complexa, pois depende da experiência do operador e de melhorias na tecnologia do dispositivo.

A recente diretriz da ESC define a terapia por meio da oclusão do AAE com grau de recomendação II e nível de evidência B.

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