A nova geopolítica das nações Flashcards

1
Q
  1. O FATO E A TEORIA:
A

1.1. o foco da análise e a sua tese central:
No início do século XXI, o sistema moderno de “estados-economias nacionais” alcançou sua máxima extensão e universalidade, globalizando a competição político-econômica das nações, e permitindo, desta forma, um novo ciclo de crescimento da economia internacional.
1.2. As premissas teóricas:
Existe uma teoria e algumas generalizações históricas, acerca da formação, expansão e mudanças do sistema mundial que se formou no século XVI, e se consolidou nos séculos XVII e XVIII, a partir da Europa. Teses principais:
i) O atual “sistema político mundial” foi uma criação do poder, do poder conquistador de alguns estados territoriais europeus, que definiram suas fronteiras nacionais no mesmo momento em que se expandiram -
simultaneamente - para fora da Europa, e se transformaram em impérios globais.
ii) o “sistema econômico mundial” que também se constituiu, neste mesmo período, foi um subproduto da expansão competitiva e conquistadora de algumas economias nacionais européias que se internacionalizaram junto com seus respectivos “estados-economias“, que se transformaram, imediatamente, em impérios coloniais.
iii) duas características distinguem a originalidade e explicam a força vitoriosa destes poderes europeus: primeiro, a maneira como os estados territoriais criaram, e se articularam, com suas economias nacionais, produzindo uma “máquina de acumulação” de
poder e riqueza, absolutamente nova e explosiva - os “estados-economias nacionais”; e segundo, a maneira em que estes “estados-economias nacionais” nasceram, em conjunto, e numa situação de permanente competição e guerra, entre si, e com os poderes imperiais, de fora da Europa.
iv) as guerras se transformaram na
atividade principal dos primeiros poderes territoriais europeus, e depois seguiram sendo a
atividade básica dos estados nacionais. E, com isso, as guerras acabaram cumprindo na Europa, um papel contraditório, atuando, simultaneamente, como uma força destrutiva e integradora, e promovendo uma espécie de “integração destrutiva”, de territórios e regiões que só passaram a fazer parte de uma mesma unidade, ou de um mesmo sistema político, depois da Guerra dos 30 anos, e da Paz de Westfália, em 1648, e das Guerras do Norte, no início do século XVIII.
v) dentro desse novo sistema político, todos os seus estados estavam obrigados a se expandir, para poder sobreviver. É neste sentido que se pode dizer que, desde a formação mais incipiente do novo sistema, suas
unidades competidoras tinham que se propor, em última instância, à conquista de um poder cada vez mais global.
vi) mas, essa tendência à centralização e à monopolização do poder e da riqueza, que nasce
da competição dentro do sistema mundial nunca se realizou plenamente. E não se realizou, porque as mesmas forças que atuam na direção do poder global,
atuam, também, na direção do fortalecimento do poder e dos capitais nacionais. Para ser mais preciso: a vitória e a constituição de um império mundial seria a vitória de algum estado nacional específico.
vii) Essa contradição do sistema mundial, impediu o nascimento de um império global, mas não impediu a oligopolização precoce do controle do poder e da propriedade da riqueza, nas mãos de um um pequeno grupo de estados que se transformaram nas Grandes
Potências, com capacidade de imposição da sua soberania e do seu poder muito além de suas fronteiras nacionais.
viii) os estados e seus capitais nacionais nem sempre andaram juntos nas suas competições econômicas e político-militares, mas na hora da escassez de recursos essenciais aos estados e aos capitais privados, sua aliança nacional se estreitou até o limite do enfrentamento conjunto das guerras.
ix) Até o fim do século XVIII, o “sistema político mundial” se restringia aos estados europeus e seus impérios, aos quais se agregaram no século XIX, os estados americanos, e depois, no século XX, os novos estados africanos e asiáticos. Algo diferente aconteceu com
o “sistema econômico mundial” que sempre incluiu as economias coloniais dentro da divisão internacional do trabalho definida pelas necessidades das metrópoles.
x)Foi só no final do século XX, que o sistema mundial universalizou, definitivamente, a grande invenção dos europeus que foram os seus “estados-economias nacionais”. Mas com isto, também, o sistema mundial se fragmentou, dando origem a várias estruturas políticas e
econômicas regionais, e a multiplicação das lutas pela liderança ou hegemonia dentro destes subsistemas.
xi) qualquer discussão sobre o futuro do atual sistema
mundial, e sobre as perspectivas dos seus estados ou “potências emergentes”, deve partir de três convicções preliminares:
- no “universo em expansão” dos “estados-economias
nacionais”, não há possibilidade lógica de uma “paz perpétua”, nem tampouco de mercados equilibrados e estáveis;
- não existe a possibilidade de que as Grandes Potências possam praticar, de forma permanente, uma política só voltada para a preservação do status quo,
isto é, elas serão sempre expansionistas, mesmo quando já tenham conquistado e se mantenham no topo das hierarquias de poder e riqueza do sistema mundial;
- por isto, o líder ou hegemon, é sempre desestabilizador da sua própria situação hegemônica, porque, “quem não sobe, permanentemente, cai”, dentro deste sistema mundial;
- não existe a menor possibilidade de que a liderança da expansão econômica do capitalismo, saia - alguma vez - das mãos dos “estados-economias nacionais” expansivos e conquistadores.

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2
Q
  1. O PODER GLOBAL DOS ESTADOS UNIDOS:
A

2.1. Expansão, hegemonia e projeto imperial
Os Estados Unidos foram o primeiro estado nacional que se formou fora da Europa. Mas sua conquista e colonização foi uma obra do expansionismo europeu, assim como sua guerra de independência foi uma “guerra europeia”. E seu nascimento foi – ao mesmo
tempo – o primeiro passo do processo de universalização do sistema político interestatal, inventado pelos europeus.
2.2. O limite do império
No fim da Guerra Fria, não houve um “acordo de paz”, nem havia outra potência com capacidade de negociar ou limitar o poder unilateral dos Estados Unidos. Foi assim que, depois do fim da União Soviética e da
Guerra Fria, e no auge da globalização financeira, o mundo experimentou na década de 90, pela primeira vez na história, a possibilidade real de um império global.
Só no início do século XXI, em particular depois dos atentados de 11 de setembro de 2001, é que o projeto imperial americano ficou mais transparente. Depois de 2001, a nova administração Bush (filho) mudou a retórica da política externa americana e voltou a usar a linguagem militarista, defendendo o direito unilateral
dos Estados Unidos de fazer intervenções militares preventivas, em nome da sua “guerra global ao terrorismo”. . Mas mesmo nos seus momentos mais belicistas, a administração Bush não abandonou o discurso a favor do liberalismo econômico, nem as pressões concretas, para obter a abertura e desregulação de todos os mercados nacionais.
Ninguém mais acredita na possibilidade de uma
“vitória definitiva” na “guerra global” ao terrorismo, na forma em que vem sendo conduzida pelos Estados Unidos, desde 2001. Nem acredita que se possa parar, interromper ou desacelerar a “asiatificação” da economia mundial. E não existe, neste momento, mais
nenhum projeto “ético”, ou ideologia capaz de mobilizar a opinião pública mundial, legitimar as intervenções americanas, ou agregar as principais potências. A utopia da globalização se converteu num lugar comum, e perdeu sua capacidade de convencimento, a
social-democracia padece de anemia profunda e o nacionalismo está reaparecendo por todos os lados. E não existe, dentro dos Estados Unidos, neste momento, nenhuma alternativa política, suficientemente poderosa, com um projeto claro de mudança da sua atual estratégia internacional. Enquanto isso, estamos assistindo um retorno do sistema mundial à “geopolítica das nações” e à competição mercantilista entre as suas economias nacionais, com repercussões em todos os os cantos do mundo.

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3
Q
  1. A VOLTA DAS NAÇÕES
A

Resumindo: neste início do século XXI, a crise expansiva do império americano está reacendendo a competição entre as nações e, em todos os lados, o que se observa é uma diminuição da capacidade de intervenção unilateral dos Estados Unidos, com o aumento dos graus de incerteza e de liberdade de ação das velhas e novas potências, em cada um dos
“tabuleiros regionais” do sistema mundial:
i) Começando pelo Oriente Médio, que se transformou no epicentro da conjuntura internacional, e no principal símbolo das limitações atuais do projeto imperial americano. E o efeito paradoxal da ação norte-americana, que provocou uma reviravolta na correlação de poder regional, ao fortalecer o eixo de poder xiita, liderado pelo Irã, que se transformou no grande desafiante da hegemonia norte-americana no
Oriente Médio. Os Estados Unidos seguirão tendo grande influência no Oriente Médio, mas perderam sua posição arbitral, e daqui para frente terão que conviver com a presença ativa da Rússia, da China e de outros países com interesses nos recursos energéticos do Oriente Médio. E, sobretudo, com o desafio e a competição hegemônica com o Irã, dentro da própria região.
ii) Na Europa, a situação é menos conflitiva, mas é indisfarçável o aumento da resistência ao unilateralismo norte-americano, e ao poder militar da OTAN. Aumentou o tamanho da União Européia e a extensão da OTAN, mas a Europa vive, neste momento, uma situação
de paralisia estratégica e decisória. Está cada vez mais dividida entre os projetos europeus de seus membros mais importantes, a França, a Grã Bretanha e a Alemanha.
iii) Na América Latina, o cenário é um pouco diferente, porque até hoje, a América foi o único continente do sistema mundial, onde nunca existiu uma disputa hegemônica entre os seus próprios estados nacionais. Primeiro, ela foi colônia, e em seguida, “fronteira de expansão” ou “periferia” da economia européia, mas depois da sua independência, esteve sempre sob a égide anglo-saxônica: da Grã Bretanha e dos Estados Unidos. Por outro lado, nestes quase dois séculos de
vida independente, as lutas políticas e territoriais abaixo do Rio Grande, nunca atingiram a intensidade, nem tiveram os mesmos efeitos que na Europa. E tampouco se formou na América Latina um sistema integrado e competitivo, de estados e economias nacionais, como viria a ocorrer na Ásia, depois da sua descolonização. Como conseqüência, os estados latino-americanos nunca ocuparam posição importante nas grandes disputas geopolíticas do sistema mundial, e funcionou durante todo o século XIX, como uma espécie de laboratório de experimentação do “imperialismo de livre comércio”.
iv) A preocupação dos Estados Unidos com a África se restringe hoje, quase exclusivamente, à disputa das regiões petrolíferas e ao controle e repressão das forças islâmicas e dos grupos terroristas do Chifre da África. Nesse sentido, apesar dos gestos de boa vontade, tudo indica que a velha Europa não tem mais “fôlego”, e os Estados Unidos não tem mais “capacidade
instalada”, para cuidarem do projeto de “renascimento africano”, proposto pelo presidente Mandela, na década de 90. Assim, não é improvável que, neste vácuo, acabe surgindo uma luta hegemônica local, ou que a nova presença econômica massiva da China e da Índia
acabe se transformando num fator político importante, dentro da região.
v) Por fim, no leste asiático, o sistema regional de estados e economias nacionais, lembra, cada vez mais, o velho modelo europeu de acumulação de poder e riqueza, que está na origem do atual sistema mundial. É a região de maior dinamismo econômico, dentro do
sistema mundial, e, ao mesmo tempo, é onde está em curso a competição mais intensa e explícita, pela hegemonia regional.

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4
Q
  1. UMA NOVA GEOMETRIA ECONÔMICA:0
A

No final dos anos 90, a economia mundial perdeu fôlego, anunciando uma desaceleração cíclica, para a primeira década do século XXI. Depois de 2001, entretanto, houve uma reversão das expectativas, e a economia retomou o seu crescimento de forma generalizada e contínua, com baixa inflação e sem maiores desequilíbrios nos balanços de pagamento.
Assim mesmo, chama atenção a coincidência temporal desta retomada econômica, com o retorno da “geopolítica das nações”, e com o aumento da
competição entre os estados e as economias nacionais.
Já dissemos, no início deste trabalho, que essa convergência entre a geopolítica e a acumulação do capita l, não é permanente, nem é universal. Há momentos históricos, e setores econômicos, em que seu distanciamento é maior, e outros em que a convergência é muito grande. Mas não há dúvida
que a geopolítica e a economia andam quase juntas, quando se trata da competição e da luta por recursos naturais escassos e estratégicos, tanto para os estados como para os capitais privados. E neste campo, a disputa mais violenta sempre se deu em torno do controle e monopolização das fontes energéticas indispensáveis ao funcionamento econômico do
sistema mundial, e de todas as suas economias nacionais, em particular a das suas Grandes
Potências.
4.1. Estados Unidos, China e Índia.
Como agora, de novo, a grande competição econômica, e a grande disputa geopolítica está
se dando em torno dos territórios e das regiões que dispõem dos excedentes energéticos para mover a nova “locomotiva” do crescimento mundial, puxada pelos Estados Unidos e a China, com efeitos imediatos sobre a Índia. Basta olhar para as duas pontas deste novo eixo – Ásia e EUA - e para suas necessidades energéticas atuais e futuras.Portanto, os Estados Unidos estão disputando com a China, com a Índia, todos os territórios com excedentes energéticos atuais ou potenciais. E esta competição está se transformando num novo triângulo econômico, complementar e competitivo, a um só tempo, que está cumprindo uma função organizadora e dinamizadora de várias regiões e economias nacionais, através de todo o
mundo, incluindo a América do Sul e a África.
4.2. Estados Unidos, China e América do Sul
Como em outros momentos da economia internacional,
agora de novo, as economias exportadoras sul-americanas estão acompanhando o ciclo expansivo da economia mundial, liderado pelos Estados Unidos e a China. Mas existe uma grande novidade, neste novo ciclo de crescimento sul-americano: o peso decisivo das exportações, importações e investimentos asiáticos no continente, em particular da China, que tem sido a grande responsável pelo aumento das exportações sul-americanas, de minérios, energia e grãos.
Mas, além do comércio, a China está ocupando um papel cada vez mais importante, dentro da região,
como investidor, competindo com as fontes tradicionais de capital de investimento na América do Sul.
Agora, do ponto de vista interno da economia sul-americana, os novos preços internacionais dos minérios e da energia, têm fortalecido a capacidade fiscal dos estados produtores, e estão servindo para financiar alguns projetos ambiciosos de integração física e
energética, dentro do próprio continente. De todos os pontos de vista, portanto, a China vem cumprindo um papel novo e fundamental na economia sul-americana. Os Estados Unidos seguem sendo a potência
hegemônica na América do Sul, e não é provável que os chineses se envolvam politicamente na região. Mas não há duvida que esta “bonança” internacional, liderada pelos Estados Unidos e pela China tem contribuído para o surgimento de um triângulo
econômico novo, que deve contribuir para o aprofundamento das relações materiais e políticas Sul-Sul, e para uma maior autonomia da política externa da América do Sul com relação aos seus centros tradicionais de poder econômico e político.
4.3. China, Índia e África.
Um verdadeiro “desembarque econômico”, liderado por empresas estatais que vem sendo seguidas, ainda
que em menor escala, pelo governo e pelos capitais privados indianos que estão fazendo um
movimento análogo de investimento massivo, e de aprofundamento das suas relações políticas, econômicas e culturais com a África.
Deste ponto de vista, todos os sinais estão apontando na mesma direção: a África SubSahariana está se transformando na grande fronteira de expansão econômica – e talvez, também, política e demográfica – da China e da Índia, nas primeiras décadas do século
XXI. Nesse sentido, está se formando um novo triângulo geoeconômico envolvendo a China, a Índia e a África Negra. Mas não é provável que os Estados Unidos abandonem suas posições na região, sobretudo na luta pela sua “segurança energética”. Mas não há nada que impeça que a África possa se transfomrar também num espaço provolegiado de negociação e fusão entre os interesses econômicos asiáticos e norte-americanos.

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5
Q
  1. VÁRIAS GEOMETRIAS POLÍTICAS:
A

A formação de um espaço econômico unificado por grandes fluxos comerciais e financeiros, entre a China, a Índia, o Brasil e a África do Sul, é um fato novo e muito importante, e pode vir a ser a base material de algumas parcerias setoriais, e localizadas, entre todos ou alguns destes quatro países. A construção de uma agenda comum, entre China, Índia, Brasil e África do Sul, deve partir do reconhecimento das diferenças existentes entre suas distintas inserções e interesses, dentro do sistema mundial. São quatro países que ocupam posição de destaque, nas suas respectivas regiões, devido ao tamanho de seu território, de sua população, e de sua economia. Mas esta semelhança esconde diferenças muito grandes de interesses, de
perspectivas estratégicas e de capacidade de implementação autônoma de decisões, no campo internacional.

i) China e Índia: têm territórios em disputa, guerrearam entre si nas últimas décadas, e são
potências atômicas. Tudo isto, são fatos,
expectativas e desdobramentos que caracterizam uma relação muito próxima de competição
territorial e bélica, em torno da supremacia no Sul e no Sudeste da Ásia, envolvendo
Estados Unidos, China e Índia. Além disto, como já vimos, China e Índia também
competem, neste momento, na Ásia Central, no Oriente Médio e na África, na luta para
assegurar sua “segurança energética”. A China investe hoje pesados recursos na
modernização de suas forças armadas e dos seus arsenais. Por outro lado, não é segredo para ninguém que a China ocupa hoje um lugar
central dentro do planejamento estratégico dos Estados Unidos, ocupando a posição do
adversário potencial necessário à organização e expansão do poder americano.
A Índia, por outro lado, ainda não tem características de uma potência expansiva, e se
comporta estrategicamente, como um estado que foi obrigado a se armar para proteger e
garantir sua segurança numa região de alta instabilidade, onde sustenta uma disputa
territorial e uma competição atômica com o seu vizinho, o Paquistão. Mas assim mesmo,
desenvolve e controla tecnologia militar de ponta, como no caso do seu sofisticado sistema
balístico, e do seu próprio arsenal atômico, e possui um dos exércitos mais bem treinados
de toda a Ásia.
ii) Brasil e África do Sul: compartem com a China e a Índia, o fato de serem os estados e as
economias mais importantes de suas respectivas regiões, responsáveis por uma parte
expressiva da população, do produto, e do comércio interno e externo da América do Sul e
da África. Mas não têm fronteiras entre si, não têm disputas territoriais com seus vizinhos,
não enfrentam ameaças internas ou externas à sua segurança e não são poderes militares
relevantes, principalmente, depois que a África do Sul abandonou o seu programa nuclear,
em 1991.
iii) A rota da “boa esperança”: A China e a Índia, depois dos anos 90, se projetaram dentro do sistema mundial
como potências econômicas e militares, têm claras pretensões hegemônicas nas suas
respectivas regiões, e ocupam hoje uma posição geopolítica global absolutamente
assimétrica com relação ao Brasil e à África do Sul. Apesar disto, o Brasil, a África do Sul
e a Índia - e mesmo a China, ainda que seja por pouco tempo mais – ainda ocupam a
posição comum dos “países ascendentes”, que sempre reinvindicam mudanças nas regras
de “gestão” do sistema mundial, e na sua distribuição hierárquica e desigual do poder e da
riqueza. Do ponto de vista econômico, entretanto, a nova geografia do comércio e
dos investimentos dentro da região Sul-Sul deve aprofundar os nexos materiais entre estes
quatro países e suas regiões, e desta perspectiva, a África do Sul se transformará num novo Cabo da Boa Esperança, entre as “Índias” e a América: as duas pontas do expansionismo
europeu que deu origem ao atual sistema mundial.

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6
Q
  1. UMA AGENDA SOCIAL CONVERGENTE
A

O primeiro ponto da agenda social comum da China, Índia, Brasil e África do Sul é
a multiplicação dos empregos e da renda da população, e isto é rigorosamente inviável sem
um crescimento econômico acelerado, no caso destes quatro países. Só com a expansão do
investimento público e privado, será possível aumentar as taxas de crescimento econômico,
e só com altas taxas de crescimento é possível um controle social e uma política ousada de
bloqueio do processo de polarização da riqueza, que acompanha, inevitavelmente, o desenvolvimento capitalista, quando fica entregue às suas forças de mercado. Neste sentido,
além do investimento público, são indispensáveis políticas ativas de redistribuição da
riqueza, através dos salários, mas, sobretudo, através do fornecimento barato de alimentos
de consumo popular, e da oferta de equipamentos e serviços públicos universais de saúde
pública, educação, saneamento, energia, transportes e comunicação. A única forma de
superar as políticas assistenciais de tipo transitório, transformando a distribuição e a
inclusão sociais numa conquista permanente e estrutural das sociedades civis.
Mas existe uma convergência muito importante entre estes países, a despeito das diferenças
de suas estratégias econômicas, que é a prioridade que vem sendo atribuída pelos seus
atuais governos, à promoção da inclusão e da eqüidade social. E neste sentido, se pode
dizer que existe uma agenda de preocupações sociais comuns, entre estes países, com o
combate a fome e a pobreza, e com a garantia da segurança alimentar, da saúde, do
emprego, da educação, dos diretos humanos e de proteção ao meio ambiente. Em todos estes campos, vem se consolidando uma agenda comum e uma
vontade política de cooperação intergovernamental, no campo científico e tecnológico. E
tem se ampliado o espaço de atuação das organizações não governamentais, presentes neste
quatro países.
Saltando para uma perspectiva mais ampla, também é possível reconhecer que, na virada do
século XXI, a nova geopolítica das nações tem trazido consigo uma grande mobilização
social e política, a favor de transformações sociais e igualitárias das sociedades mais
afetadas pelas mudanças do sistema mundial. Como já vimos, o mundo viveu uma era de
euforia liberal depois de 1990, mas agora parece que está em curso uma nova era de convergência entre os movimentos de autoproteção nacional que questionem o status quo
internacional, e os movimentos sociais que estão lutando contra a desigualdade, dentro de
cada um destes países e regiões.
Por isto, se esta
tendência se confirmar e se ampliar, não é impossível uma convergência entre as socidades
civis e os governos da China, da Índia, do Brasil e da África do Sul, para liderar um grande
projeto de redistribuição mais igualitária do poder e da riqueza oligopolizados pelas
Grandes Potências, dentro deste sistema mundial criado pelos europeus, exatamente no
momento em que conquistaram, submeteram e conectaram a Ásia, a África e a América, a
partir do século XVI.

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