Teoria Geral do Direito Civil II Flashcards

Estudo para o exame - Professor Doutor Mota Pinto

1
Q

falta a matéria do início até aqui só

A
How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
2
Q

5.1. A prescrição e a caducidade: a nossa lei segue um critério formal de distinção das duas figuras, afirmando que …

298º/n2

A

quando um direito deva ser exercido durante um certo prazo, se aplicam as regras da caducidade, salvo se a lei se referir expressamente à prescrição (298/n2)

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
3
Q

Quanto ao regime jurídico: quais são as diferenças entre estas figuras?

330º; 333º; 328ª; 331º; 300º; 303º; 318 e 323º; 323

A
  • Caducidade: · admitem-se estipulações contratuais (330º); é apreciada oficiosamente pelo tribunal (333º); em princípio, não comporta causas de suspensão nem de interrupção (328º); só é impedida, em princípio, pela prática do ato (331º)
  • Prescrição: · é inderrogável (300º); tem de ser invocada, não podendo o tribunal supri-la, de ofício (303º); suspende -se e interrompe-se nos casos previstos na lei (arts. 318 e 323); interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer ato que exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito, tendo-se igualmente, por interrompida 5 dias depois de requerida a citação ou notificação, se estas não tiverem sido feitas por causa não imputável ao requerente (323).
How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
4
Q

Para além disso, quanto aos fins também existem diferenças. Quais?

A
  • A caducidade assenta apenas na segurança e certeza do direito, o que explica que possa ser oficiosamente apreciada pelo tribunal e que não possa ser interrompida por circunstâncias distintas da prática do ato.
  • Já a prescrição, apesar de também estar associada a uma ponderação de justiça e de certeza do direito, funda-se essencialmente na conveniência e na oportunidade, presumindo-se uma renúncia ao direito em causa a partir da inércia negligente por parte do seu titular no seu exercício.
How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
5
Q

Quais são os prazos de prescrição?

309º; 312º; 316º; 317º

A

O prazo ordinário de prescrição é de 20 anos (309º). Mas a lei prevê prazos mais curtos para as prescrições presuntivas (312º) - que podem ser de 6 meses (316º) ou de 2 anos (317º).
As prescrições presuntivas, por serem fundadas numa presunção de cumprimento podem, ao contrário do regime geral da prescrição, ser ilididas por confissão do devedor.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
6
Q

**Defina negócio jurídico.

A

Negócios jurídicos são atos jurídicos constituídos por uma ou mais declarações de vontade, dirigidas à realização de certos efeitos práticos, com a intenção de os alcançar sob tutela do direito, determinando o ordenamento jurídico a produção dos efeitos conformes à intenção menifestada pelo declarante ou declarantes.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
7
Q

Qual é o elemento constitutivo do negócio jurídico?

A

É este **comportamento declarativo **pelo que, em caso de discordância entre ele e a vontade real dos sujeitos, permanece o primeiro.
No entanto, por norma, esta coincidência é verificada, permitindo aos sujeitos o autogoverno da sua esfera jurídica.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
8
Q

Relação entre a vontade exteriorizada e os efeitos jurídicos do negócio

Existem 3 teorias que procuram determinar a relação existente entre a vontade exteriorizada na declaração negocial e os efeitos jurídicos do negócio:

Comece por falar da (i) teoria dos efeitos jurídicos.

A

(1) Teoria dos efeitos jurídicos: Defendida por Savigny. Determina que os efeitos jurídicos produzidos por determinação legal são *completamente correspondentes *ao conteúdo da vontade das partes. Até mesmo os efeitos decorrentes das normas supletivas resultam da sua vontade tácita.

No entanto, se assim fosse:

  • Só os juristas totalmente informados acerca do ordenamento jurídico poderiam celebrar negócios jurídicos.*Tal não se verifica na realidade, sendo comum que as partes não tenham conhecimento completo sobre os efeitos decorrentes por lei das suas declarações de vontade.
  • Para além disso, as normas supletivas só são desaplicadas quando é manifestada uma vontade real nesse sentido, não bastando provar-se que as partes não pensaram ou até provavelmente não teriam querido aquele regime, pelo que nem sempre os seus efeitos são produzidos em concordância com a vontade das partes.
How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
9
Q

Fale agora da (ii) teoria dos efeitos práticos:

A

Esta doutrina determina que a (i) teoria dos efeitos jurídicos não é realista, uma vez que a declaração de vontade das partes tem em vista meros resultados práticos lícitos , aos quais, depois, a lei faz corresponder os efeitos jurídicos concordantes.

Mas esta teoria também não é aceitável:
* Não permite a distinção entre negócios jurídicos e meros compromissos ou convenções celebrados ao abrigo de outros ordenamentos normativos.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
10
Q

Por último, fale da (iii) Teoria dos efeitos prático-jurídicos:

A

Determina que as partes de um negócio jurídico visam realizar os resultados práticos ou materiais pretendidos pela via jurídica.
À vontade de concretização dos efeitos práticos, junta-se a vontade de que estes sejam juridicamente vinculativos. Neste âmbito não é necessário que as partes tenham um conhecimento completo e exato dos efeitos jurídicos correspondentes à sua vontade de resultados práticos , mas apenas que distingam os traços fundamentais do negócio em causa.
Assim, esta teoria permite-nos distinguir os negócios jurídicos (vs.):
* Os negócios de pura obsequiosidade: combinações da vida social com as quais não se pretende desencadear efeitos jurídicos. Em caso de dúvida nesta diferenciação cabe à parte interessada o ónus da prova da existência de um negócio jurídico.
* Meros acordos ou gentlemen’s agreements: apesar de incidirem sobre a mesma matéria, estão excecionalmente desprovidos da intenção de produção desses efeitos (ex.: empréstimo de honra ou disposição de bens p/ depois da morte). Aqui, em caso de dúvida, cabe ao interessado demonstrar a inexistência da intenção negocial.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
11
Q

Elementos dos negócios jurídicos

Corre uma tradicional classificação tripartida dos elementos dos negócios jurídicos.
Dividem-se em: elementos essenciais (essentialia negotii); elementos naturais** (naturalia negotii) e **elementos acidentais (accidentalia negotii).

Descreva os primeiros.

A

Elementos essenciais (essentialia negotii): Rigorosamente, deviam ser aqueles sem os quais o negócio não chegaria a constituir-se: a declaração, os sujeitos e o conteúdo.
No entanto, os negócios jurídicos só desempenham a sua função se forem válidos, pelo que se deve considerar ainda como elementos essenciais os seus requisitos gerais de validade:
* Capacidade das partes (e a legitimidade quando a sua falta implicar a invalidade e não a mera eficácia)
* Declaração de vontade sem anomalias
* Idoneidade do objeto

Para além disso pode ainda falar-se dos elementos essenciais de cada negócio típico ou nominado: i.e., as claúsulas que distinguem determinado tipo negocial dos restantes.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
12
Q

E os elementos naturais?

A

Os elementos naturais (naturalia negotii): são os efeitos negociais decorrentes de normas supletivas, ou seja, que se **concretizam sem necessidade de configuração de uma cláusula nesse sentido **(a menos que as partes se oponham).

Ius dispositivum é abundante nas relações obrigacionais mas o mesmo não se revela nos negócios familiares pessoais (regulado primordialmente pelo ius cogens).

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
13
Q

Por fim, o que são os elementos acidentais?

A

Os elementos acidentais (accidentalia negotii): são cláusulas acessórias dos negócios jurídicos. Trata-se das estipulações que não caraterizam o tipo negocial em causa, sendo introduzidas pelas partes para que se produzam os efeitos por elas pretendidas. Ex.: cláusulas de juros.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
14
Q

Classificações dos negócios jurídicos:

O CC contém uma regulamentação geral do negócio jurídico, abrangendo assim duas modalidades: os negócios jurídicos unilaterais e contratos (ou negócios jurídicos bilaterais).
No que consistem os primeiros?

457º CC;

A

Os negócios jurídicos unilaterais (sujeitos ao princípio da tipicidade (457ºCC), compreendem apenas uma declaração de vontade ou várias declarações paralelas, formando um só grupo.
A sua eficácia não depende da concordância de outrem. Por conseguinte, os negócios unilaterais:
* Ou só afetam diretamente uma pessoa que os pratica (abandono de automóvel)
* Ou afetam outra pessoa, mas atribuindo-lhe uma faculdade ou uma posição favorável (procuração, testamento, etc…)
* Ou, se afetarem outrem desfavoravelmente, pressupõem um poder especial conferido por um contrato ou pela lei (declarações de resolução, revogação,…)

Os negócios unilaterais dividem-se ainda em:
1. Negócios unilaterais recetícios: a declaração só é eficaz quando conhecida por outra pessoa;
2. Negócios unilaterais não recetícios: basta a emissão da declaração, sem ser necessário comunicá-la a quem quer que seja (ex.: testamento).

Neste plano, discute-se a natureza (recetícia ou não) das renúncias à prescrição (302º) e a direitos reais limitados e da confirmação dos negócios anuláveis (288º). Ao qual a resposta mais adequada parece ser a de estarmos perante negócios** não recetícios** dado que a solução a esta questão não deve ser influenciada pela circunstãncia de ser necessário o conhecimento da declaração para o destinatário dos seus efeitos a poder invocar, não havendo aqui qualquer interesse que legitime a exigência da comunicação. Para além disso, as renúncias unilaterais só produzem efeitos na esfera jurídica de terceiros reflexamente.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
15
Q

E os segundos (negócios jurídicos bilaterais ou contratos)?

A

Nos contratos ou negócios jurídicos bilaterais, existem duas ou mais declarações de vontades opostas, mas convergentes e, portanto, tendentes ao mesmo resultado (ex.: compra e venda).
Por sua vez, os contratos podem ser:
* Unilaterais: quando geram obrigações apenas para uma das partes (ex.: doação)
* Bilaterais ou sinalagmáticos: quando geram obrigações para ambas as partes, ligadas por um nexo de causalidade (ex.: compra e venda).

Esta distinção é relevante porque a exceção de não cumprimento do contrato se aplica apenas aos contratos bilaterais (428ºCC).
Há ainda quem refira a categoria dos:
* Contratos bilaterais imperfeitos: que têm início com obrigações apenas para uma das partes, cujo cumprimento faz surgir, posteriormente, deveres para as restantes (ex.: mandato ou depósito).

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
16
Q

2. Classificações dos negócios jurídicos:

Negócios entre vivos VS. negócios mortis causa.
Defina os primeiros:

A

Os negócios entre vivos produzem efeitos em vida das partes, pelo que são relevantes para o comércio jurídico.
Aqui pertencem quase todos os negócios jurídicos e na sua disciplina tem grande importância (por força dos interesses gerais do comércio jurídico) a* tutela das expetativas da parte que se encontra em face da declaração negocial*.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
17
Q

Negócios entre vivos VS. Negócios mortis causa.
Defina os últimos:

(2031º e 2179º CC); (2028/nº1 e 2 do CC); (2179º CC); (946ºCC); (2028ºCC); (946/n2º CC); (1700/n1 CC); (1700/n1/b) do CC), (1704º CC); (1705º CC); (1755º/n2 CC); (1700º/n1/a) do CC); (2182 CC).

A

Os negócios mortis causa produzem efeitos apenas após a morte da respetiva parte ou de uma delas, pelo que a sua disciplina não necessita de tutelar o tráfico jurídico, masapenas os interesses do declarante.
São negócios fora do comércio jurídico, no sentido de que, na sua regulamentação, os interesses do declarante devem prevalecer sobre o interesse na proteção da confiança do destinatário dos efeitos respetivos.
O testamento é um negócio mortis causa (2031º e 2179º CC), não podendo os herdeiros e legatários renunciar ou dispor da sucessão em vida do testador (2028/nº1 e 2 do CC). É um ato livremente revogável pelo testador (2179º CC).
As doações por morte são proibidas por lei (946ºCC), assim como qualquer pacto sucessório(2028ºCC). No entanto, se tiverem sido cumpridas as formalidades dos testamentos, estas doações convertem-se em disposições testamentárias (946/n2º CC), constituindo, portanto, negócios mortis causa.
——————————— ‘’ ——————————-

No entanto note-se que a regra da proibição dos pactos sucessórios comporta exceções - o CC considera lícitas certas disposições por morte feitas em convenção antenupcial. Tais convenções podem ser (fundamentalmente) de 2 tipos:
* Instituição contratual de herdeiro ou legatário em favor dos esposados (feitas pelo outro esposado ou terceiro (1700/n1 do CC). São negócios híbridos ou mistos dado que os bens só são transferidos após a morte do disponente (caraterística dos negócios mortis causa), mas este não pode revogar o pacto após a aceitação ou prejudicar o beneficiário através de atos gratuitos de disposição (efeitos inter vivos)
* Instituição contratual de herdeiro ou legatário em favor de terceiros, feita por qualquer dos esposados (1700/n1/b) do CC), nas quais se o terceiro não intervém como aceitante, têm um valor meramente testamentário (1704º CC), pelo que são mortis causa. Já se o terceiro intervier como aceitante, a disposição não é revogável, constituindo um** negócio híbrido** (1705º CC)
* As doações por morte para casamento: que são doações feitas a um dos esposados ou a ambos em vista do seu casamento (1755º/n2 CC), integram os pactos sucessórios admitidos pelo 1700º/n1/a) do CC, pelo que estão sujeitas ao regime desses pactos, tratando-se igualmente de negócios híbridos, que comportam uma exceção à regra do 2182º CC.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
18
Q

1. Classificação dos negócios jurídicos:

Negócios formais ou solenes VS. Negócios consensuais ou não solenes
Defina os primeiros:

(875º CC); (220º CC);

A

Os negócios formais ou solenes são realizados no cumprimento de determinados formalismos previstos na lei, devendo a declaração negocial realizar-se através de certo comportamento declarativo, nomeadamente através de documento autêntico ou particular (ex.: artigo 875º CC), sob pena de nulidade (220º CC).
Nota: Não basta a exigência de declaração expressa para que estejamos perante este negócio.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
19
Q

1. Classificação dos negócios jurídicos:

Negócios formais ou solenes VS. Negócios consensuais ou não solenes
Defina os últimos:

219º CC.

A

Os negócios não solenes ou consensuais (se se tratar de um contrato) podem ser celebrados através de qualquer meio declarativo apto a exteriorizar a vontade negocial.

Tradicionalmente, o formalismo era exigido para quase todos os negócios mas com o passar do tempo, passou a considerar-se como elemento primordial a vontade das partes e não a forma (que passou a ser exigido apenas relativamente a certos atos jurídicos).
Assim, atualmente vigora o princípio da liberdade declarativa, liberdade de forma ou consensualidade - de acordo com o qual a validade da declaração negocial só depende da observância de forma especial quando a lei o exige (219º CC).

Note-se que a renúncia a certos direitos (como o de preferência) e a remissão de créditos não são negócios jurídicos formais.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
20
Q

1. Classificação dos negócios jurídicos

Negócios reais VS Negócios consensuais (este último, visto anteriormente)
Defina os primeiros:

(1185º, 1129º e 1142 do CC); (830º CC).

A

Nos negócios jurídicos reais exige-se, além das declarações de vontade das partes (formalizadas ou não), a prática anterior ou simultânea de um certo ato material.
Assim ocorre com o depósito, comodato, mútuo e o penhor - considerando que o ato material da entrega é um elemento da estrutura destes negócios (1185º, 1129º e 1142 do CC).
Hoje, esta figura parece não desempenhar nenhuma função útil uma vez que nenhum interesse digno de tutela se parece opor a que se reconheça ao mutuário, p.e., o direito de exigir a entrega do objeto para dele se servir, restituindo-o posteriormente.

A doutrina entende que um contrato de mútuo nulo por falta de entrega da coisa, se converte num contrato-promessa de mútuo - o que, em virtude do princípio da execução específica dos contratos-promessa (830º CC) leva a que o mutuário possa obter a entrega da coisa. Ainda assim, mesmo esta conversão parece desnecessária - devendo o contrato considerar-se perfeito apenas com o acordo das partes se não se provar que estas o quiseram como real. Se, pelo contrário, se provar que o quiseram, pode operar a conversão em contrato-promessa, que não será suscetível de execução específica.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
21
Q

Negócios obrigacionais VS. Negócios reais VS. Negócios Familiares VS. Negócios sucessórios.

O critério desta classificação diz respeito à natureza da relação jurídica constituída, modificada ou extinta pelo negócio.
A sua importância resulta da diversa extensão reconhecida à liberdade contratual(Art. 405o do CC) em cada uma das categorias.

A

No domínio dos negócios obrigacionais, vigora o* princípio da liberdade contratual*, quase inconfinadamente:
* Quanto aos contratos: abrangendo a liberdade de fixação do conteúdo dos contratos típicos, de celebração de contratos diferentes dos previstos na lei e de inclusão de quaisquer cláusulas;
* Quanto aos negócios unilaterais, vigora o princípio da tipicidade.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
22
Q

Negócios obrigacionais VS. Negócios reais VS. Negócios Familiares VS. Negócios sucessórios.

1306º;

O critério desta classificação diz respeito à natureza da relação jurídica constituída, modificada ou extinta pelo negócio.
A sua importância resulta da diversa extensão reconhecida à liberdade contratual (Art. 405o do CC) em cada uma das categorias.

A

Já nos negócios reais, quanto aos seus efeitos (1) , o princípio da liberdade contratual sofre considerável limitação, derivada do princípio da tipicidade (1306º CC). Assim, só podem constituir-se direitos reais típicos, embora essa constituição possa resultar de um negócio inominado ou atípico.

(1) - E não de acordo com a distinção negócios consensuais/ negócios reais - que são quanto à constituição.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
23
Q

Negócios obrigacionais VS. Negócios reais VS. Negócios Familiares VS. Negócios sucessórios.

1698º CC; 1699 e 1714º CC.

O critério desta classificação diz respeito à natureza da relação jurídica constituída, modificada ou extinta pelo negócio.
A sua importância resulta da diversa extensão reconhecida à liberdade contratual(Art. 405o do CC) em cada uma das categorias.

A

Relativamente aos negócios familiares e pessoais: a liberdade contratual está praticamente excluída, podendo apenas os interessados celebrar ou deixar de celebrar o negócio, mas não podendo fixar-lhe livremente o conteúdo, nem podendo celebrar contratos diferentes dos previstos na lei.
No tocante aos* negócios familiares patrimoniais* (convenções antenupciais), existe, com alguma largueza, liberdade de convenção (Art. 1698o do CC), sofrendo embora restrições (Arts. 1699o e 1714o do CC

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
24
Q

Negócios obrigacionais VS. Negócios reais VS. Negócios Familiares VS. Negócios sucessórios.

O critério desta classificação diz respeito à natureza da relação jurídica constituída, modificada ou extinta pelo negócio.
A sua importância resulta da diversa extensão reconhecida à liberdade contratual(Art. 405o do CC) em cada uma das categorias.

A

Quanto aos negócios sucessórios: este princípio sofre importantes restrições, algumas resultantes das normas imperativas do direito das sucessões.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
25
Q

Negócios patrimoniais VS Negócios pessoais

O critério distintivo é o da natureza da relação jurídica a que o negócio se refere. A importância da distinção revela-se também quanto à amplitude do princípio da liberdade contratual.

A

Os negócios pessoais são negócios fora do comércio jurídico, i.e., cuja disciplina, quanto a problemas como o da interpretação do negócio jurídico e o da falta ou dos vícios da vontade, não tem que atender às expetativas dos declaratórios e aos interesses gerais da contratação - do tráfico jurídico -mas apenas à vontade real, psicológica do declarante.

Atende-se à vontade real, psicológica do declarante.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
26
Q

Negócios patrimoniais VS Negócios pessoais

O critério distintivo é o da natureza da relação jurídica a que o negócio se refere. A importância da distinção revela-se também quanto à amplitude do princípio da liberdade contratual.

A

Na disciplina dos negócios patrimoniais (dos negócios do comércio jurídico), há que proteger a confiança do declaratório e os interesses do comércio jurídico, pelo que se atende à vontade declarada, e não à vontade psicológica.

Atende-se à vontade declarada e não à real/psicológica.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
27
Q

Negócios abstratos VS. negócios causais:

O critério desta classificação é o da relevância, para os efeitos do negócio, da sua função económica ou social típica ou da relação jurídica que constituiu a sua causa.

A

Negócios abstratos podem destinar-se a uma multiplicidade de funções, pelo que não relevam a sua finalidade ou a relação jurídica que os causou.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
28
Q

Negócios abstratos VS. negócios causais:

O critério desta classificação é o da relevância, para os efeitos do negócio, da sua função económica ou social típica ou da relação jurídica que constituiu a sua causa.

A

Negócios causais são a maioria dos negócios jurídicos, uma vez que o seu conteúdo não é independente da sua causa, estando associadoss a uma finalidade económica ou social típica.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
29
Q

Negócios onerosos VS Negócios gratuitos:

Esta distinção tem como critério o conteúdo e finalidade do negócio.

A

Os negócios onerosos pressupõem atribuições patrimoniais de ambas as partes, estabelecendo-se um nexo de correspetividade entre as referidas atribuições patrimoniais, já que cada um considera que a sua atribuição é retribuída pela contraparte. Note-se que aqui não releva o valor objetivo das atribuições, mas apenas a avaliação das partes ou a vontade das partes, uma vez que estas podem saber que as prestações não têm valor igual, pretendendo fazer ou receber uma liberalidade. Neste sentido, pode dizer-se que as partes estão de acordo em que a vantagem que cada uma visa obter é contrabalançada por um sacrifício que está numa relação de estrita causalidade com aquela vantagem.
As partes consideram as duas prestações ligadas reciprocamente pelo vínculo da causalidade jurídica.

Contratos onerosos dividem-se em comutativos e aleatórios. E ainda em negócios parciários.
Ex.: compra e venda; arrendamento, etc.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
30
Q

Negócios onerosos VS Negócios gratuitos:

Esta distinção tem como critério o conteúdo e finalidade do negócio.

A

Os negócios gratuitos caraterizam-se pela intervenção de uma intenção liberal. Uma parte tem a intenção de efetuar, sem contrapartida, uma prestação patrimonial a favor de outra. A outra parte procede com a consciência e a vontade de receber essa vantagem sem um sacrifício correspondente.

Ex.: Doação; mandato; depósito, etc…

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
31
Q

Considerações sobre os negócios onerosos e negócios gratuitos:
negócio misto (negotium mixtum cum donatione); e contratos unilaterais onerosos

1145º; 1146º CC.

A

Conhecemos casos típicos de negócios onerosos (ex.: compra e venda e arrendamento) e casos típicos de negócios gratuitos (ex.: mandato ou depósito).

Porém, por vezes, as partes celebram um contrato misto, recorrendo a um tipo de negócio oneroso, mas fixando o seu conteúdo com intenção liberal (negotium mixtium cum donatione) - em que as partes obtêm p.e. através de uma compra e venda por um preço baixo e intenção de liberalidade, resultados idênticos aos visados com a doação.
Para além disso, certas figuras como a assunção de dívidas ou a cessão de créditos, são suscetíveis de assumir várias formas concretas consoante o negócio que esteja na sua base e, portanto, de ser gratuitas ou onerosas.

Por fim, note-se que é possível a existência de contratos unilaterais onerosos (1145º). Nestes, a correspetividade estabelece-se (não entre duas obrigações mas) entre duas atribuições patrimoniais que consistem numa prestação contemporânea da formação do negócio (a entrega de uma uma em dinheiro para ser utilizada) e numa obrigação (a de restituir o capital e pagar os juros).

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
32
Q

Contratos aleatórios VS. Contratos comutativos:

1245º CC;1246º CC e 1247º CC.

Trata-se de uma subdivisão a estebelcer dentro dos contratos onerosos.

A

Nos contratos aleatórios, as partes submetem-se ao risco de ganhar ou perder, só uma podendo vencer.
Pode haver:
* Uma só prestação: como tal, o autor depende de um facto incerto (ex.: apostas)
* Uma prestação certa e outra, de maior valor,incerta (p.e.: seguro de incêndio)
* Duas prestações certas na sua existência, sendo uma delas incerta no seu quantum (ex.: seguro de vida)

Dois exemplos de contratos aleatórios são o jogo e a aposta, que se podem distinguir de acordo com vários critérios: (este não é o mais defendido pela doutrina)
* No jogo os participantes praticam determinada atividade visando a diversão ou o lucro, estando em causa uma incerteza objetiva.
* Na aposta (que, ao contrário do jogo, pode ter relevância jurídica) visa esclarecer uma divergência de opiniões sobre certo assunto, estando em causa uma incerteza subjetiva.

———————————-‘’—————————————-
No entanto, o critério de distinção mais defendido pela doutrina é o da participação ou não das partes no acontecimento de que depende o prémio:
* Ao contrário do que acontece na aposta, no jogo são as próprias partes que criam a possibilidade de um ganho ou de uma perda, independentemnete de o resultado final estar associado à sua habilidade ou apenas à sorte.

NOTA: os contratos de jogo e aposta são inválidos - não constituindo fonte de obrigações civis) apenas constituindo fonte de obrigações naturais se forem lícitos (1245º).
Não obstante, são válidas e produtivas de obrigações civis as competições desportivas e as restantes hipóteses previstas em legislação especial (1246 e 1247º CC)

———————-‘’—————-
É comutativo o contrato quando os contraentes conhecem quando da assinatura suas respectivas prestações.

Ex.: Jogo; apostas; seguro de incêndios; seguro de vida.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
33
Q

Negócios Parciários:

São outra subespécie dos negócios onerosos.

A

Os negócios parciários caraterizam-se pelo facto de uma das partes prometer certa prestação em troca de uma participação nos frutos que a contraparte obtenha por força da mesma.
Ex.: contrato de consignação ou estimatório, em que uma das partes envia à outra determinadas unidades de uma mercadoria para que esta as venda, obtendo uma participação nos lucros e a obrigação de restituição das unidades não vendidas.

Ex. contrato de consignação ou estimatório.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
34
Q

Negócios de mera administração VS. Negócios de disposição:

É uma distinção relevante dado que, por vezes, a lei restringe os poderes de gestão patrimonial dos administradores de bens alheios, próprios ou próprios e alheios de mera administração.

A

Primeiro, temos de ter em atenção que quando a lei restringe os poderes de certas pessoas aos atos de ordinária administração torna-se necessário conhecer o respetivo conceito.
Para determinar o sentido e a extensão do conceito de “atos de mera administração” importa ter presente a razão de ser dos preceitos legais que, em várias sedes, limitam os poderes de atuação jurídica de certas pessoas à mera administração. Quando a lei não esclarece, através de uma definição quais os tipos de atos que integram uma dada categoria, é uma consideração teleológica que nos deve guiar, tendo-se em conta a importância patrimonial e os riscos em apreço:
* Quando limita os poderes de administradores de bens alheios: a lei reconhece que a falta de interesse pessoal do administrador pode levá-lo a correr riscos que não correria se os bens fossem próprios. Além disso, certos atos, que impliquem a perda ou modificação profunda de certos bens de uma pessoa, não devem ser decididos senão por ela própria.
* Quando restringe os poderes de uma pessoa sobre o seu próprio património (inabilitações): visa impedir que as pessoas que padeçam de deficiências mentais, físicas ou de caráter concluam negócios prejudiciais aos seus interesses em momentos de insuficiente lucidez, experiência ou autodomínio.

———————————–’’—————————————
Ora, esta consideração conduz-nos à conclusão de que os atos de mera administração são correspondentes a uma gestão comedida e prudente, tendente à manutenção (evitar a sua deteriorização e destruição) e normal desenvolvimento do património, afastando-se atuações de risco.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
35
Q

Negócios de mera administração VS. Negócios de disposição:

É uma distinção relevante dado que, por vezes, a lei restringe os poderes de gestão patrimonial dos administradores de bens alheios, próprios ou próprios e alheios de mera administração.

A

Ao invés, os atos de disposição são os que, dizendo respeito à gestão do património administrado, afetam, a sua substância, alteram a forma ou composição do capital administrado, atingem o fundo, a raiz, o casco dos bens. São atos que ultrapassam aqueles parâmetros de atuação correspondente a uma gestão de prudência e comedimento, sem riscos.

—————————————-‘’———————————-
–> A doutrina tem admitido que os meros administradores possam celebrar negócios tendentes à frutificação anómala do património, desde que sejam suportados apenas pelos rendimentos proveninentes do mesmo, bem como ao seu melhoramneto através de meras obras, e não de aquisições de bens.

! Existem três pontos importantes de notar:
* Os próprios atos de conservação e frutificação normal só são atos de administração ordinária se não forem financiados através da alienação de partes do capital administrado, mas através do rendimento, eventualmente, acumulado;
* Nem todas as alienações são atos de disposição: só o sendo as alienações dos frutos do património ou as que se integrem nas finalidades assinaldas à mera administração;
* Por fim, rigorosamente, as doações não são atos de administração nem de disposição, pois não são atos de gestão de um património, daí que não possam ser realizadas pelo mero administrador mesmo com consentimento das entidades competentes para autorizarem os atos de disposição que interessam ao património.

—————————————-‘’———————————-
Por último, quanto ao modo como são praticados os atos de disposição que interessa ao património do administrado, importa dizer que
* Nos casos de administração legal de bens alheios; de bens próprios e alheios ou até de bens próprios, a lei provê através de disposições inseridas nos mesmos institutos em que se inserem as normas que impõem o regime da mera administração
* Nos casos em que os poderes do administrador de bens alheios advêm da vontade do administrado e não seja possível obter poderes especiais do constituinte, parece poderem praticar-se atos de disposição com autoridade judicial.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
36
Q

Elementos essenciais do negócio jurídico: capacidade e legitimidade:

Defina capacidade e legetimidade:

A

Capacidade: divide-se em:
* Capacidade negocial de gozo ou jurídica: traduz-se na suscetibilidade de se ser titular de direitos e obrigações derivadas de negócios jurídicos.
* Capacidade negocial de exercício: corresponde à idoneidade para se atuar juridicamente por atividade própria, i.e., sem necessidade de ser recorrer aos institutos da prepresentação e da assistência.

—————————————-‘’———————————-
Por outro lado, a legitimidade é a relação entre o sujeito e o conteúdo do ato, cuja falta impede que o sujeito possa desencadear os efeitos jurídicos em causa.

A capacidade negocial de gozo e de exercício, a legitimidade e a idoneidade do objeto negocial são requisitos de validade de um negócio jurídico, levando as primeiras à sua invalidade e a última à sua nulidade.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
37
Q

O que é uma declaração negocial?

257º; 247º

A

Pelo contrário, a declaração negocial (217º e ss) não constitui um pressuposto, mas um verdadeiro elemento do negócio jurídico, cuja falta conduz à sua inexistência material.

Declaração de vontade negocial é o comportamento que cria a aparência de exteriorização de um certo conteúdo de vontade negocial, caraterizando depois, a vontade negocial como a intenção de realizar certos efeitos práticos com o intuito de que sejam juridicamente tutelados e vinculantes. Dá-se, assim, um conceito objetivista de declaração negocial, levando a que a sua nota essencial consista, não num elemento interior (uma vontade real, efetiva, psicológica), mas num elemento exterior (o comportamento declarativo).
O comportamento externo, em que se traduz a declaração, manifesta normalmente uma vontade, formada sem anomalias e coincidente com o sentido exteriormente captado daquele comportamento. Com efeito, a declaração pretende ser o instrumento de exteriorização da vontade psicológica do declarante, é essa a sua função. O conceito de declaração negocial pode realçar o seu aspeto subjetivista (vontade manifestada, manifestação de vontade) ou o aspeto objetivista (comportamento objetivo, aparência de vontade, ato social).
Neste sentido, note-se que os problemas decisivos para o efeito de determinar o conceito de declaração negocial são:
* O da divergência entre a vontade e a declaração;
* O dos vícios da vontade;
* O da interpretação da declaração negocial, entre outros.

Tais problemas têm subjacente um conflito entre os interesses do declarante, por um lado, e os do declaratário e do comércio jurídico, por outro. Ora, atualmente, estas normas visam proteger, acima dos interesses do declarante, as expectativas do declaratário e a segurança do comércio jurídico, pelo que a vontade aparente subsiste sobre a vontade efetiva.
Na verdade, uma conceção voluntarística não consegue explicar como é que, por exemplo, um negócio celebrado por um sujeito incapaz de querer e entender é válido, se a incapacidade não era conhecida ou cognoscível (Art. 257o do CC) ou a mera anulabilidade, e não a nulidade, do negócio em que haja uma divergência entre as vontades aparente e psicológica do sujeito (Art. 247o do CC).
Soluções como estas vertidas no nosso CC, demonstram que a essência do negócio não está numa intenção psicológica nem num meio de a exteriorizar, mas num comportamento objetivo, exterior, social, algo que, todavia, não se confunde com um formalismo ritual próprio das fases mais primitivas da evolução jurídica, especialmente porque está, na maioria das vezes, associado a um elemento subjetivo, uma vez que coincide com a vontade efetiva das partes. Para além disso, esta vontade real não deixa de ser tida em conta pelo legislador, que a faz triunfar em certas soluções (por exemplo: Art. 246o do CC), nas quais se considera excessivo o sacrifício da situação do declarante ou não há necessidade de tutela da confiança do declaratário.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
38
Q

Referência aos atos jurídicos de natureza não negocial

295º CC;

A

O legislador deixou a cargo da doutrina a determinação dos âmbitos de compreensão e de extensão
dos negócios jurídicos, determinando apenas que se aplique o regime geral do negócio jurídico aos atos não negociais “na medida em que a analogia das situações o justifique” (Art. 295o do CC). Podemos concluir, então, que não se aplicarão aquelas normas, sempre que não haja uma verdadeira analogia das situações.
* I. Atos pessoais(perfilhação, adoção, etc.): Uma solução que se poderá considerar abrangida no conteúdo útil desta norma é a não aplicação aos atos jurídicos pessoais de quaisquer normas da doutrina geral do negócio jurídico, inspiradas pela tutela da confiança dos declaratários e dos interesses gerais do tráfico, pelo que nestes casos não é necessário que a contraparte conhecesse ou tivesse possibilidade de conhecer a causa de invalidade do ato (por exemplo: erro) para que esta seja invocada, a menos que uma lei especial determine o contrário. Em suma, podemos dizer que aos atos pessoais, e mesmo que a lei o não diga expressamente, não se aplicam as disposições inspiradas pela tutela da confiança dos declaratários e da segurança e celeridade do comércio jurídico;
* II. Simples atos jurídicos: Os quase negócios jurídicos ou atos jurídicos quase negociais traduzem-se na manifestação de uma vontade e existe quase sempre uma consciência e até uma intenção de relevância jurídica da vontade exteriorizada, pelo que se aplica, em regra, o regime geral dos negócios jurídicos. As operações jurídicas, atos materiais ou atos reais traduzem-se na efetivação de um resultado material ou factual a que a lei liga determinados efeitos jurídicos; desencadeiam, por força da lei, a produção desses efeitos, embora normalmente ou, pelo menos, frequentemente estes não sejam visados. Nao se exige para a produção dos respetivos efeitos a capacidade nem se aplicam, em geral, os preceitos sobre vícios da vontade, interpretação, receção de declarações, representação. Por fim, ainda que estas sejam as soluções mais comuns, é necessário averiguar até que ponto existe ou falta a analogia de situações, relativamente aos vários tipos legais de atos jurídicos não negociais, ou se existe regulamentação especial sobre algum dos pontos referidos.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
39
Q

Elementos constitutivos normais da declaração negocial

A

Numa declaração negocial podem distinguir-se os seguintes elementos: a declaração propriamente dita (elemento externo), que consiste no comportamento declarativo; e a vontade (elemento interno), que consiste no querer, na realidade volitiva que normalmente existirá e coincidirá com o sentido objetivo da declaração. Ora, o elemento interno pode decompor-se analiticamente em três subelementos:
I. Vontade de ação: Consiste na voluntariedade (consciência e intenção) do comportamento declarativo. Com efeito, pode faltar a vontade de ação, por exemplo, se uma pessoa, por ato reflexo ou distraidamente, sem se aperceber do facto, faz um gesto e este objetivamente aparece como uma declaração negocial (por exemplo: aceitação de uma proposta). É igualmente o caso da coação ou violência absoluta (coação física).

II. Vontade da declaração/vontade da relevância negocial da ação: Ocorre quando o próprio declarante atribui ao seu comportamento querido o significado de uma declaração negocial. Este subelemento só está presente, se o declarante tiver a consciência e a vontade de que o seu comportamento tenha significado negocial vinculativo. Com efeito, pode faltar a vontade da declaração se, por exemplo, uma pessoa, julgando subscrever uma simples ficha de assinatura para o arquivo de um banco, assina uma declaração negocial.
III. Vontade negocial/vontade do conteúdo da declaração ou intenção do resultado: Consiste na vontade de celebrar um negócio jurídico de conteúdo coincidente com o significado exterior da declaração. A vontade negocial encontrar-se-á desviada se o declarante atribuir à sua declaração um sentido diverso daquele que é captado exteriormente. Por exemplo, uma pessoa que quer comprar a Quinta do Mosteiro e declara querer comprar a Quinta da Capela, por julgar erradamente que a Quinta do Mosteiro se chama Quinta da Capela.

———————————————–’’’————————————————-
Em suma, constatámos poder verificar-se uma falta de vontade de ação, uma falta de vontade de
declaração e um desvio na vontade negocial. Em todos estes casos surge um dissídio entre a vontade e a declaração.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
40
Q

Declaração negocial expressa e declaração negocial tácita

405; 217 e 219; 236º; 217.

A

A autonomia privada é visível nos negócios jurídicos, uma vez que vigora o princípio da liberdade
negocial quanto ao seu conteúdo
(Art. 405o do CC) e o princípio da liberdade declarativa quanto à sua forma (Arts. 217o e 219o do CC).

———————————————–’’’————————————————-

No entanto, por vezes, a lei exige que a declaração negocial seja expressa ou tácita.
De acordo com a teoria subjetivista, adotada pelo legislador no Art. 217o do CC, a declaração é:
* expressa quando é feita por meios diretos, frontais e imediatos, nomeadamente por palavras ou por escrito;
* tácita: a declaração cujo conteúdo direto se infere de um outro facto. Este facto concludente deve ser inequívoco, bastando para isso que haja uma grande probabilidade de aferição do conteúdo da declaração, e não que este seja forçoso. Para além disso, na linha do Art. 236o do CC, é suficiente que a concludência seja deduzível do comportamento do declarante, não sendo necessário que o seu autor tenha consciência desse significado implícito.
Acresce que mesmo os negócios formais podem ser realizados mediante declarações tácitas, desde que os factos concludentes assumam a forma legal exigida (Art. 217o do CC).

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
41
Q

O silêncio como meio declarativo

218º CC; 932/n2; 1054º; 1163º; 268/n3º CC;
Art. 29º do DL nº143/2001.

A

De acordo com o Art. 218o do CC, o silêncio de um sujeito não vale como declaração negocial, a não ser que esse valor lhe seja atribuído por lei, convenção ou uso. A atribuição ao silêncio do valor de consenso negocial não é, como regra geral, razoável.
Ora, casos em que a lei atribui ao silêncio a natureza de facto concludente, no sentido da aceitação da proposta negocial, são, por exemplo, os dos Arts. 923o, no2, 1054o e 1163o do CC. Em certos casos, a lei fixa ou concede aos particulares a faculdade de fixar prazos para a prática dos atos, findos os quais se verifica um efeito que poderia também ter lugar por negócio jurídico – é o caso do prazo para ratificar o negócio representativo, previsto no Art. 268o, no3 do CC. Com efeito, note-se que se o valor da declaração negocial é atribuído ao silêncio por uma anterior convenção das partes, pode dizer-se que estamos perante uma declaração expressa.
Neste sentido, entendemos que se trata da solução mais razoável, já que o silêncio é, em si mesmo, insignificativo e quem cala pode comportar-se desse modo pelas mais diversas causas, pelo que deve considerar-se irrelevante um comportamento omissivo. De outro modo, ao enviar a outrem uma proposta de contrato estaria a criar-se-lhe um ónus de responder, a fim de evitar a conclusão do negócio, o que viola a ideia de autonomia das pessoas. Por outro lado, a inconveniência de tal regime poderia ainda detetar-se se tivermos em conta que poderiam captar-se aceitações negociais a outrem, através do silêncio, aproveitando-se os excessivos afazeres, a distração, a negligência, em suma, quaisquer circunstâncias que tornassem difícil ou impossível responder.
Do mesmo modo, afasta-se a ideia de que o silêncio vale como declaração negocial quando o silenciante podia e devia falar. Acresce que, se alguém tinha o dever de falar, não deve concluir-se do seu silêncio um certo sentido negocial, mas apenas a verificação de um incumprimento do dever de falar, suscetível de fazer incorrer o silenciante na obrigação de reparar os danos causados a outrem pela frustração da confiança deste em receber uma resposta (interesse contratual negativo ou dano da confiança).
Por outro lado, o legislador é omisso quanto ao envio de bens que não tenham sido encomendados, acompanhado de um pedido de pagamento. No entanto, pelo menos quando o destinatário é um consumidor, isto é, os bens não se enquadram na sua atividade profissional, esta venda forçada é proibida pelo Art. 29o, no1 do DL no143/2001.

———————————————–’’’————————————————-

Assim, a ausência de reposta do destinatário não vale como consentimento, não ficando ele obrigado à devolução ou pagamento dos bens ou serviços, podendo até conservá-los a título gratuito. Já se devolver a mercadoria, tem direito a ser reembolsado das despesas decorrentes do reenvio num prazo de 30 dias (Art. 29o do DL no143/2001).

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
42
Q

Declaração negocial presumida VS. Declaração negocial ficta:

350º CC; Arts. 926o, 2225o, 2315o, no1 e 2 e o 2316o, no3; 50º; 923º/n2; 1054º CC; 350/n2 CC.

A

A declaração negocial presumida ocorre quando a lei atribui a determinado comportamento o significado de exprimir uma vontade negocial, em cento sentido, podendo ilidir-se tal presunção mediante prova em contrário - presunção juris tantum (Art. 350o do CC). A título de exemplo, os Arts. 926o, 2225o, 2315o, no1 e 2 e o 2316o, no3.
A declaração negocial ficta tem lugar sempre que se atribui a um comportamento um significado legal tipicizado, sem admissão de prova em contráriopresunção iuris et de iure (Art. 50o, no do CC). A título de exemplo, o Art. 923o, no2 ou 1054o do CC.
——-‘’—–
Por fim, note-se que o regime-regra é o das presunções legais poderem ser ilididas mediante prova em contrário, só deixando de ser assim quando a lei o proibir (Art. 350o, no2 do CC).

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
43
Q

Protesto e reserva

A

Emitido certo comportamento declarativo, pode o seu autor recear que lhe seja imputado, por interpretação, um certo sentido. Para o impedir, o declarante afirma abertamente não ser esse o seu intuito. A esta contradeclaração dá-se o nome de protesto.
O protesto tem o nome de reserva se o autor declarar que o seu comportamento não significa renúncia a um direito próprio, ou reconhecimento de um direito alheio. Por exemplo, o mutuante recebe certa importância, a título de juros, mas, julgando ter deito a receber mais, declara não prescindir do excedente.
É comum dizer-se que o protesto não é válido quando o comportamento declarativo só consente a interpretação contra a qual o declarante se quer acautelar. É o pensamento expresso no aforismo protestatio facto contraria nihil relevet (por exemplo, a declaração de não se querer ratificar um negócio, ao mesmo tempo que se utiliza ou consome a prestação dele derivada). Porém, a validade deste aforismo não tem um alcance absoluto.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
44
Q

Forma da declaração negocial

219º; 223º.

A

Entre nós, vigora o princípio da liberdade de forma (ou da consensualidade, no caso dos contratos – Art. 219o do CC), uma vez que o formalismo reduz a celeridade do comércio jurídico e pode levar a injustiças pela posterior desvinculação por vício de forma de uma das partes do negócio.
Não obstante, este princípio está sujeito a numerosas exceções, exigindo-se determinada forma para certos negócios, de modo a que os sujeitos possam refletir entre os momentos da decisão e a efetiva celebração, separando-se a fase pré-contratual dos termos negociais definitivos. Acresce que o formalismo possibilita a publicidade do ato, além de permitir uma formulação mais precisa e completa das vontades e, vem assim, garantir uma maior certeza acerca dos termos do negócio e da sua celebração, já que os documentos, por serem provas pré-constituídas, têm maior valor probatório do que as testemunhas.
Para além de poder ser imposto por lei (forma legal), o formalismo negocial pode resultar de uma combinação entre as partes (forma convencional – Art. 223o do CC). O problema da legitimidade da forma convencional é debatido na doutrina. O CC resolveu-o no sentido da admissibilidade e eficácia dos negócios determinativos da forma (Art. 223o do CC). Não obstante, não significa que os particulares possam afastar, por acordo, as normas legais que exigem requisitos formais para certos atos, pois trata-se de normas imperativas. Assim, as partes podem, apenas, exigir determinados requisitos para um ato, pertencente a um tipo negocial que a lei regula como não formal ou que sujeita a um formalismo menos solene.
O negócio dirigido à fixação de uma forma especial para um ulterior negócio não está sujeito a formalidades. Com efeito, não se exigindo no Art. 223o do CC, quaisquer requisitos formais para o pacto sobre a forma, aí previsto, este negócio cairá dentro do campo de aplicação do princípio geral do nosso direito: o princípio da liberdade de forma.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
45
Q

Âmbito da forma exigida

221º; 394º; 221/n1 e 2 CC;

A

De acordo com o Art. 221o do CC, a forma legalmente exigida para um ato é aplicável não só às suas cláusulas essenciais, mas também às acessórias, sejam anteriores ou contemporâneas à conclusão do negócio, sob pena de nulidade. Porém, a mesma já não se estende aos chamados pactos abolitivos ou extintivos.
Ainda que admissíveis, as exceções a esta regra não são muito frequentes, já que, para produzirem efeitos, as estipulações não formalizadas anteriores ou contemporâneas ao documento devem ser:

    1. Meramente acessórias, estando para além do seu conteúdo (Art. 394o do CC);
    1. Não devem ser abrangidas pela razão de ser da exigência da formalidade;
    1. Necessária a prova de que correspondem à vontade das partes (Art. 221o, no1 do CC);

Para que seja válida, é necessário que as condições acima referidas se verifiquem cumulativamente.

Da coordenação do Art. 221o do CC com o Art. 394o do CC resulta que as estipulações adicionais não formalizadas, anteriores ou contemporâneas do documento, não abrangidas pela razão determinante da forma, só produzirão efeitos, se tiver lugar a confissão ou forem provadas por documento, embora menos solene do que o exigido para o negócio.
Se as razões da determinação da formalidade não lhes forem aplicáveis, a forma legal é ainda dispensada nos pactos modificativos (adicionais ou contrários ao documento) e nos pactos extintivos ou abolitivos (Art. 221o, no2 do CC). Ainda que esta norma possa gerar algumas dúvidas, é certo que estará abrangido pela exigência de forma um pacto que altere ou agrave uma obrigação cuja constituição é legalmente sujeita a uma formalidade.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
46
Q

Consequências da inobservância da forma:

227ºCC; 364º; 334º; 289º; 223º; 473º; 220º;

A

Convém distinguir entre formalidades ad substantiam (nulidade) e formalidades ad probationem. As primeiras são insubstituíveis por outro género de prova, gerando a sua falta a nulidade do negócio, enquanto a falta das segundas pode ser suprida por outros meios de prova mais difíceis de conseguir.:

  • I. Inobservância da forma legal: A inobservância da forma legal gera nulidade, devendo os lesados ser indemnizados (Art. 227o do CC) e as partes devem restituir tudo aquilo que tenha sido prestado no âmbito do negócio viciado (Art. 289o do CC), em obediência ao princípio do enriquecimento sem causa (Art. 473o do CC). Esta prestação pode ser provada através de qualquer meio admitido pelo regime geral. Não obstante, em casos especiais, a lei pode determinar que a consequência desta inobservância é a mera anulabilidade (Art. 220o do CC), surgindo a questão de saber se certas formalidades não serão, então, ad probationem, isto é, supríveis por outros meios de prova mais difíceis de conseguir, como a confissão. Neste plano, o Art. 364o do CC determina que, em geral, estas são ad substantiam (insubstituíveis por outro género de provas), salvo nos casos em que seja claro que a finalidade do legislador ao exigir certo formalismo foi apenas a de obter uma prova segura acerca do ato em causa.

Por outro lado, existe ainda o problema de saber se a cláusula geral da boa fé ou do abuso do direito (Art. 334o CC) pode excluir a possibilidade de invocação da nulidade por vício de forma. Ou seja, é necessário saber se é admissível esta invocação por parte de quem atue em sentido contrário ao ético- jurídico. Ainda que alguns autores, como Larenz, defendessem a procedência da arguição da nulidade nestes termos, como modo de tutela da segurança do direito, a nossa doutrina e jurisprudência têm considerado que o intérprete pode afastar o Art. 289o do CC nos casos excecionalíssimos previstos no Art. 334o do CC, dada a sua natureza imperativa. Quando a solução com base no abuso do direito não se revelar adequada por a exigência legal de forma visar servir interesses públicos, o lesado poderá exigir o ressarcimento dos danos sofridos, com fundamento em responsabilidade pré-contratual.
* II. Inobservância da forma convencional: De acordo com o Art. 223o do CC, se as partes estipularam convencionalmente uma forma especial antes da conclusão do negócio, presume-se que a sua* inobservância leva à ineficácia,* a forma tem caráter constitutivo (presunção de essencialidade). Já se a forma foi convencionada após o negócio ou em simultâneo com a sua celebração (provando- se, neste último caso, que as partes se quiseram vincular desde logo), presume-se que as partes não o quiseram substituir, mas apenas consolidá-lo, tornando-o mais claro e seguro. Ainda assim, estas presunções são meramente juris tantum, já que, uma vez que é estabelecida pelas partes, as consequências da inobservância da forma convencional devem ser por elas decididas.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
47
Q

Perfeição da declaração negocial:

224º/n1 CC
224º/n2 e 3

A

A declaração negocial com um destinatário ganha eficácia logo que chegue ao seu poder ou é dele conhecida.

As declarações não receptícias tornam-se eficazes logo que a vontade se manifesta na forma adequada.
Desta doutrina, constante do Art. 224o, no1 do CC, decorre, para os contratos, ter a nossa lei optado pela doutrina da receção quanto ao momento da sua conclusão. Quer dizer: o contrato está perfeito quando a resposta, contendo a aceitação, chega à esfera de ação do proponente. Uma enfermidade, uma ausência transitória de casa ou do estabelecimento são riscos do destinatário e também é considerada eficaz a declaração que só por culpa do destinatário não foi por ele recebida (Art. 224o, no2 e 3 do CC).

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
48
Q

Interpretação e integração dos negócios jurídicos:

Interpretação.
Em que consiste o problema? Posições possíveis:

236º e ss; 246º CC.

A

O negócio jurídico postula uma interpretação. A interpretação dos negócios jurídicos visa fixar o sentido e alcance das declarações de vontade, de modo a evidenciar o conteúdo normativo que irá pautar a conduta das partes ou de terceiros.
Ora, a teoria da interpretação dos negócios ou hermenêutica negocial destina-se a fixar os princípios ou critérios interpretativos (Arts. 236o e ss. do CC), definindo qual o sentido negocial decisivo (objetivo ou subjetivo) e quais os elementos a considerar na busca desse sentido.
Para haver uma declaração a interpretar é necessário estarmos perante um ato ou conduta voluntária equiparável, uma ação ou omissão controláveis pela vontade. Note-se que a declaração não existe se o declarante, sem culpa, não estiver consciente da mesma ou estiver sob coação (Art. 246o do CC). Assim, entre nós, a ausência desta voluntariedade não corresponde a um mero erro da declaração, que tem como consequência a anulabilidade, mas à inexistência do ato.

A teoria da interpretação dos negócios jurídicos tem dado lugar à formulação de conceções opostas. Para as posições subjetivas o intérprete deve buscar, através de todos os meios adequados, a vontade real do declarante. Assim, o negócio valerá como foi querido pelo autor da declaração.
Já, para as posições objetivistas o intérprete não vai buscar a vontade efetiva do declarante, mas um sentido exteriorizado ou cognoscível através de certos elementos objetivos.O objeto da interpretação é a declaração como ato significante. É uma interpretação normativa e não uma interpretação psicológica. Não se dá relevo necessariamente à vontade real do declarante nem sequer necessariamente à vontade real do declaratário. Não estamos perante uma mera averiguação de factos, dado que a conclusão é valoração jurídica e critério normativo.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
49
Q

Interpretação: posição adotada
Doutrina geral
(teoria da impressão do destinatário)

236/n1 CC; 238/n2 CC; 237º CC; 224º n3.

A

Entre nós, aplica-se, para a generalidade dos negócios, a teoria da impressão do destinatário (doutrina objetivista). De acordo com esta teoria, a declaração deve valer com o sentido que um destinatário razoável (medianamente instruído, diligente e perspicaz), colocado na posição concreta do real declaratário, lhe atribuiria (Art. 236o, no1 do CC). Só assim é possível tutelar a legítima confiança dos destinatários na declaração e a segurança do comércio jurídico. Esta é a posição mais razoável e a mais justa.
Acresce, e por isso se justifica a sua aplicação mesmo quando o declarante não teve culpa de exteriorizar um sentido diverso da sua vontade real, ser a posição mais conveniente, por ser largamente mais favorável à facilidade, à rapidez e à segurança da vida jurídico-negocial.
Ainda assim, o sentido apreensível por um destinatário razoável só prevalece se for imputável ao declarante (Art. 236o, no1 do CC). Se não se verificar esta coincidência entre o sentido objetivo correspondente à impressão do destinatário e um dos sentidos ainda imputáveis ao declarante, a sanção parece ser a da nulidade do negócio jurídico.
Para além disso, sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é esta que deve valer, mesmo que a mesma seja oposta ao sentido objetivo e que a declaração seja ambígua ou inexata (Art. 238o, no2 do CC).
Quando a interpretação conduzir a um resultado duvidoso, deve prevalecer o sentido menos gravoso para o disponente no caso dos negócios gratuitos, e o que permitir um maior equilíbrio das prestações se se tratar de um negócio oneroso (Art. 237o do CC). Este é o único critério no CC, para a hipótese de nos deparar-nos com um resultado equívoco. Se a dúvida for insanável, a declaração é ineficaz, por aplicação, ao menos analógica, do Art. 224o, no3 do CC.

Quanto aos contratos de adesão, que devem ser interpretados de acordo com o sentido que lhes daria o contratante que se limitasse a aceitar as condições pré-ordenadas, quando colocado na posição do real aderente, deve prevalecer, na dúvida, o sentido mais favorável ao aceitante. Finalmente, se a dúvida for insanável, a declaração será ineficaz, por aplicação analógica do Art. 224o, no3 do CC.

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
50
Q

Interpretação: Posição adotada

Desvios

238/n1; 236; 220; 2187/n1 e 2; 2203.

A

A doutrina preferível, em tese geral, quanto ao problema da hermenêutica negocial, sofre desvios quanto a certos negócios.
I. Negócios solenes ou formais: Não se aplica a teoria da impressão do destinatário, optando-se por uma posição ainda mais objetivista, de acordo com a qual o sentido apreensível por um destinatário razoável só vale se tiver um mínimo de correspondência, mesmo que imperfeita, no texto do documento (Art. 238o, no1 do CC) – teoria da manifestação. Ainda que o legislador nada diga acerca da consequência da não verificação deste requisito, parece preferível a solução da nulidade do negócio, uma vez que está em causa um vício de forma (Art. 236o do CC), isto porque o sentido da declaração não está formalizado. Ora, a sanção correspondente ao vício da forma é a nulidade (Art. 220o do CC). Não obstante, admite-se que este sentido ausente do documento escrito possa prevalecer, desde que se verifique um duplo condicionalismo:
* corresponder à vontade real e concordante das partes;
* e não oposição a essa validade das razões determinantes da forma do negócio (por exemplo: a razão de tutelar a segurança do comércio jurídico parece constituir um obstáculo insuperável);

II. Disposições testamentárias: Deve optar-se por uma interpretação subjetivista, isto é, deve atender-se à vontade psicológica do testador, tendo-se como limite apenas o contexto do testamento (Art. 2187o, no1 do CC). Isto porque o testador não contrai um vínculo que crie, em terceiros, expectativas dignas de tutela, podendo modificar ou revogar o testamento até à data da sua morte. Para além disso, é comum o entendimento religioso, ou mesmo a conveniência social, de que a vontade dos falecidos deve ser cumprida. Na procura desta vontade, pode recorrer-se a provas estranhas aos termos do testamento (complementares ou extrínsecas) fundadas em qualquer meio de prova admitido pelo regime geral (Art. 2187o, no2 do CC). Para tal, é necessário que a vontade do testador assim obtida tenha um mínimo de correspondência, mesmo que imperfeita, no contexto (Art. 2187o, no2 do CC), isto é, que o testador tenha usado termos numa aceção pessoal, fora dos usos gerais da língua, mas tal seja percetível, ou porque ele usava frequentemente esses termos nessa aceção anómala, ou através da própria letra do testamento. Porém, o sentido subjetivo não valerá, em princípio, se o testador usou termos numa aceção extravagante que estava fora dos seus próprios hábitos de linguagem ou incorrem em erro na declaração (Art. 2203o do CC). O erro na declaração não pode ser corrigido por via interpretativa, de maneira a dar relevância à vontade real do testador, salvo se esta for indiciada pela letra do documento, só por si ou conjugada com algum dado objetivo irrecusável. De outro modo, provado, embora, o erro na declaração e a própria vontade real o testamento será nulo, dado que está em causa um vício de forma (Art. 236o do CC);

How well did you know this?
1
Not at all
2
3
4
5
Perfectly
51
Q

Integração:
Em que consiste?

A

Os critérios de integração dos negócios jurídicos visam determinar o modo como devem ser regulamentadas as questões não previstas pelas partes aquando da celebração do negócio jurídico.

52
Q

Termos em que pode admitir-se a integração:

239º; 334º.

A

O critério a utilizar-se para o efeito de realizar a integração dos negócios jurídicos lacunosos é enunciado no Art. 239o do CC. Ressalva-se a hipótese de existir disposição especial, como será o caso sempre haja disposição supletiva aplicável, diretamente ou por analogia.
Na falta de disposição supletiva que possa aplicar-se, atender-se-á à vontade hipotética das partes, procurando determinar o que estas quereriam se tivessem regulado o ponto omisso (Art. 239o do CC). Assim, ao contrário do que determinava o Código de Seabra, há que atender a cada caso individualmente, já que o negócio jurídico é lex privata das partes.
A integração, para além das normas supletivas, é necessária nos casos em que o contrato não está completamente tipicizado ou se afasta dos tipificados em pontos que a regulamentação legal se não adapte ao contrato.
Não obstante, esta vontade hipotética, e mesmo as normas supletivas, devem ser afastadas, pelo juiz, se contrariarem a boa fé (Art. 334o do CC).
Note-se que, em caso de divergência entre a norma supletiva e a vontade hipotética das partes, prevalece a primeira, já que o seu objetivo é precisamente o de se aproveitar o seu silêncio para se estabelecer um regime mais conforme aos interesses gerais da sociedade.
Por fim, a integração negocial tem limites. Deve atender-se à regulamentação concretamente estipulada e devemos situar-nos no círculo por ela delimitado, isto é, considerar que um contraente honesto e razoável admitiria como exigido pelo contrato. A integração não pode conduzir a uma ampliação do objeto negocial que foi pretendido pelas partes.

53
Q

Divergência entre a vontade e a declaração:

O problema em geral:
Formas possíveis de divergência:

A

Normalmente, o autor da declaração negocial autodetermina os efeitos jurídicos da mesma, uma vez que o seu elemento interno (vontade) e externo (declaração propriamente dita) coincidem.
Porém, pode verificar-se uma divergência entre esses dois elementos da declaração negocial e, assim, à relação normal de concordância substitui-se uma relação patológica. Neste sentido, estamos perante um vício na formulação da vontade, que pode ser intencional ou não intencional.
Estamos perante uma divergência intencional quando a declaração é emitida pelo declarante com um sentido objetivo diverso da sua vontade real, de forma voluntária, isto é, de forma consciente e livre. A divergência intencional pode consubstanciar-se em:
* Simulação: O declarante emite uma declaração não coincidente com a sua vontade real, através de um conluio com o declaratário, visando enganar terceiros. Assim ocorre, por exemplo, com a venda fantástica, na qual o devedor finge vender um prédio a um comprador fictício com a sua conivência, a fim de prejudicar os seus credores;
* Reserva mental: O declarante visa enganar o declaratário, que não tem conhecimento da divergência entre a vontade real daquele e a declaração;
* Declarações não sérias: O declarante emite uma declaração não coincidente com a sua vontade real, mas sem intuito de enganar qualquer pessoa e, como tal, está convencido de que o declaratário se apercebe do conteúdo não sério da declaração. Assim ocorre, por exemplo, em numerosas declarações publicitárias;

————————————-‘’——————————-

Estamos perante uma divergência não intencional quando o declarante não se apercebe do dissídio, ou é irresistivelmente forçado a originá-lo. Esta pode consistir em:
* Erro-obstáculo ou na declaração: O declarante não tem consciência da falta de coincidência entre a sua vontade real e a declaração, tratando-se de um mero lapso ou equívoco;
* Falta de consciência da declaração: O declarante emite uma declaração, sem sequer ter a consciência (a vontade) de fazer uma declaração negocial, podendo até faltar completamente a vontade de agir;
* Coação física ou violência absoluta: O declarante é forçado a dizer ou escrever o que não quer, não através de uma ameaça, mas por força do emprego de uma força física irresistível ou que o instrumentalize e leva a adotar o comportamento;

54
Q

O problema da divergência entre a vontade e a declaração como problema autónomo: o substrato teleológico do problema

A

Existindo uma divergência entre a vontade real e o sentido objetivo da declaração, podem levantar- se dois problemas:
* problema da interpretação ou da relevância positiva da vontade real, que consiste em saber se o negócio jurídico em causa poderá valer com o sentido correspondente à vontade real do declarante;
* se aderirmos às teorias objetivistas da interpretação, surge o problema autónomo ou da relevância negativa da divergência entre a vontade e a declaração, ou seja, de saber se esta deverá ser considerada inválida.

Para determinarmos a solução mais razoável do problema da divergência entre a vontade e a declaração, isto é, para solucionarmos o problema de iure condendo, é necessário conhecer o seu substrato teleológico, isto é, os interesses em causa.
* Por um lado, a autonomia da vontade e o interesse do declarante apontam para a sua não vinculação ao sentido objetivo da declaração e, portanto, para a invalidade do negócio.
* Por outro lado, a autodeterminação implica uma autorresponsabilidade, o que, associado à tutela da confiança e aos interesses do declaratário que desconhecia a divergência, sugere a validade do negócio.
* Para além disso, há que atender aos interesses privados dos terceiros titulares de direitos que derivem ou sejam adquiridos relativamente ao declarante ou ao declaratário.
* Finalmente, são relevantes os interesses gerais do comércio jurídico, que apontam para a validade do negócio e para a produção dos efeitos objetivos da declaração, em nome da segurança, fluência e celeridade da contratação e da tutela da posição do declaratário que agiu de boa-fé.

55
Q

Teorias que visam resolver o problema da divergência entre a vontade e a declaração:

A

I. Teoria da vontade: Sustenta a invalidade do negócio, desde que se verifique uma divergência entre a vontade e a declaração, sem necessidade de mais requisitos;

II. Teoria da culpa in contrahendo: Defende a invalidade do negócio, bem como a obrigação de o declarante indemnizar o declaratário, desde que o declarante tenha incorrido em dolo ou culpa e o declaratário tenha agido de boa-fé. Esta indemnização tem o intuito de repor a situação em que o declaratário estaria se não tivesse celebrado o negócio em causa, cobrindo, assim, o interesse contratual negativo (também designado interesse da confiança);

III. Teoria da responsabilidade: Assenta na mesma ideia da teoria anterior, mas, em caso de dolo ou culpa do declarante e de boa-fé do declaratário, o negócio deve ser válido, em nome da proteção da confiança. Assim, esta foi a primeira teoria a considerar legítimo que um declarante responda pela aparência exterior da sua vontade;

IV. Teoria da declaração: Para os seus defensores, releva a declaração, e não a vontade do declarante. Por sua vez, esta teoria compreende diversas modalidades:
* Modalidade primitiva e extrema: Esta modalidade parte de uma perspetiva formalista, considerando-se que, se a forma ritual foi observada, devem produzir-se os seus efeitos, mesmo que não sejam queridos;
* !!!! Modalidades modernas e atenuadas !!!!!: De acordo com a doutrina da confiança, a divergência só produzirá a invalidade do negócio se tiver sido conhecida ou cognoscível do declaratário. Já a doutrina da aparência eficaz defende a invalidade também para a hipótese de o declaratário não se ter apercebido do dissídio, mas ter compreendido um terceiro sentido da declaração;

56
Q

O problema da divergência entre a vontade e a declaração, apreciado de iure codendo. Discussão de teorias propostas:

A

O problema da divergência entre a vontade e a declaração não consiste em determinar um princípio que se aplique, de forma idêntica, às várias modalidades da divergência. Ainda que permitam formular uma diretriz para a solução da divergência entre a vontade real e a declaração propriamente dita, não é possível uma opção rígida por apenas uma das teorias apresentadas, já que tal se consubstanciaria num regresso ao conceitualismo. Assim, devem aplicar-se soluções distintas para as várias modalidades de divergência.
Por fim, pode proclamar-se a opção pelas modernas modalidades da doutrina da declaração, mais precisamente pela teoria da confiança, com a limitação correspondente à doutrina da aparência eficaz. É a solução mais justa e mais conforme aos interesses gerais do tráfico. Há que dar relevo predominante, se declarante e declaratário não passíveis de juízo de censura, ao pensamento da proteção da confiança e aos interesses do tráfico.

57
Q

1.5. O problema da divergência entre a vontade e a declaração, apreciado de iure condito

244º a 247º do CC.

A

Como não é razoável um critério uniforme ou rígido para a resolução do problema em causa, devem aplicar-se as soluções previstas pelo direito positivo, previstas nos Arts. 244o a 247o do CC e que apontam
para uma posição declarativista.

58
Q

A simulação. Conceitos, elementos e importância prática:

240/n1.

A

De acordo com o Art. 240o, no1 do CC, em correspondência com a orientação da doutrina tradicional, estamos perante um negócio simulado:
* sempre que a divergência entre a vontade e a declaração é intencional;
* quando exista um acordo simulatório entre o declarante e o declaratário (não exclui a possibilidade de existência de simulação nos negócios unilaterais);
* e, ainda, o intuito de enganar terceiros.

Não obstante, o Dr. Orlando de Carvalho define o instituto nos seguintes termos: simular, juridicamente, significa apresentar alguma coisa que não é. A simulação negocial consiste em aparentar um negócio que não existe, quer sob as roupagens do ato simulado se oculte um negócio diferente quer não se oculte coisa nenhuma.

59
Q

Modalidades da simulação

241(n2

A
  • Simulação inocente e simulação fraudulenta: A simulação é inocente se houve o mero intuito de enganar terceiros, sem os prejudicar (animus decipiendi); e é fraudulenta, se houve o intuito de prejudicar terceiros ilicitamente ou de contornar qualquer norma da lei (animus nocendi);
    Um exemplo de simulação inocente é a doação simulada com fins de ostentação (a simulação inocente é rara), enquanto a simulação fraudulenta pode tratar-se de uma venda fantástica (a simulação fraudulenta é mais comum).
  • Simulação absoluta e simulação relativa: Na simulação absoluta, as partes fingem celebrar um negócio jurídico e na realidade não querem nenhum negócio jurídico. Na simulação relativa, as partes fingem celebrar um certo negócio jurídico e na realidade querem um outro negócio jurídico de tipo ou conteúdo diverso, isto é, por detrás do negócio simulado (ou aparente, fictício ou ostensivo) há um negócio dissimulado (ou real, latente ou oculto). A distinção entre simulação absoluta e simulação relativa tem a importância derivada de estar última gerar um problema solucionado pelo Art. 241o, no2 do CC;
60
Q

Efeitos da simulação absoluta

240/n2;287/n2; 286; 242/n2; 1290

A

A simulação importa a nulidade do negócio simulado (Art. 240o, no2 do CC). Não há que tomar em conta quaisquer expetativas do declaratário, pois este interveio no pactum simulationis. Assim, só os interesses de terceiros de boa fé, que tenham confiado na validade do negócio simulado, exigem ponderação, mas o tratamento daqueles interesses não exige mais do que a inoponibilidade, em relação aos seus titulares, da nulidade e não vai ao ponto de reclamar para a situação a forma menos grave de invalidade: a anulabilidade.
Esta pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal e é invocável, por via de ação ou via de exceção (Art. 287o, no2 do CC), por qualquer interessado (Art. 286o do CC), incluindo os próprios simuladores, mesmo que a simulação seja fraudulenta (Art. 242o, no2 do CC).
Geralmente, ainda que não exista um prazo de caducidade para a ação de anulação, os seus efeitos, nomeadamente a entrega de coisa alienada, podem ser precludidos pelos da usucapião. No entanto, como o simulado adquirente é um possuidor em nome alheio (possuidor precário), no caso da simulação não há lugar a usucapião, a menos que o título da posse se encontre invertido (Art. 1290o do CC).

61
Q

Modalidades da simulação relativa

953 e 2196º; 1180º

A

A simulação relativa manifesta-se em espécies diversas consoante o elemento do negócio dissimulado a que se refere: simulação subjetiva ou dos sujeitos e simulação objetiva ou sobre o conteúdo do negócio.
No primeiro caso (simulação subjetiva), são simulados os próprios sujeitos ou apenas um deles. É o que se verifica com a interposição fictícia de pessoas: A, pretendendo dar um prédio a B, finge doar a C para este posteriormente doar a B, intervindo um conluio entre os três – por exemplo, para contornar uma norma legal que proíba a doação de A a B (Arts. 953o e 2196o do CC). Pode, igualmente, a simulação consistir na supressão de um sujeito real: fez-se uma venda de A a B e outra de B a C, mas para pagar apenas uma sisa, três sujeitos concordam em documentar na escritura pública apenas uma venda de A a C. No entanto, a interposição fictícia de pessoas não deve confundir-se com a interposição real. Na primeira, há um conluio entre os dois sujeitos reais da operação e o interposto – o testa de ferro. Na segunda, o interposto atua em nome próprio, mas no interesse e por conta de outrem, por força de um acordo entre ele e um só dos sujeitos. Nesta hipótese, não existe um conluio entre os três sujeitos, não estamos perante uma simulação, mas um mandato sem representação (Art. 1180o do CC). Em suma, para haver simulação, é necessária a existência de um conluio entre os três sujeitos.
No segundo caso (simulação objetiva), podemos estar perante uma simulação sobre a natureza do negócio: se o negócio ostensivo ou simulado de uma alteração do tipo negocial correspondente ao negócio dissimulado ou oculto, por exemplo, finge-se uma venda e quer-se uma doação ou vice-versa. Ou perante uma simulação de valor: incide sobre o quantum de prestações estipuladas entre as partes, é fundamentalmente o caso da simulação de preço na compra e venda, fingindo-se um preço superior ou inferior ao preço real.

62
Q

Efeitos da simulação relativa

Art. 241o, no1 do CC; Art. 241o, no2 do CC; 241o, no2 do CC, 238,
39º LGT

A

O negócio simulado está ferido de nulidade, tal como na simulação absoluta. No entanto, no caso da simulação relativa surge o problema de saber o que ocorre ao negócio dissimulado. De acordo com a doutrina geral da simulação relativa, será objeto do tratamento jurídico que lhe caberia se tivesse sido concluído sem dissimulação (Art. 241o, no1 do CC). Ou seja, o negócio simulado pode ser plenamente válido e eficaz ou poderá ser inválido, consoante as consequências que teriam lugar se tivesse sido abertamente concluído.
Não obstante, no caso da simulação de negócios formais, o negócio dissimulado será nulo por vício de forma se os requisitos de forma, legalmente exigidos para o mesmo, não forem cumpridos no negócio simulado, mesmo que se tenham observado as formalidades exigidas para o negócio aparente (Art. 241o, no2 do CC). Por conseguinte, o negócio oculto será válido se as partes elaborarem uma contradeclaração (escrito de reserva ou de ressalva) que integre o seu núcleo essencial e os requisitos formais exigidos para o negócio.
Neste plano surge a questão de saber o que ocorre se não for realizada tal contradeclaração, existindo apenas o documento onde se celebra o negócio simulado, cumprindo-se o formalismo exigido para o negócio oculto. O legislador procurou responder a esta questão através do Art. 241o, no2 do CC. No entanto, o entendimento desta disposição tem suscitado divergências. Ao contrário de Manuel de Andrade, a doutrina maioritária aponta para a nulidade, por vício de forma, se não existir uma contradeclaração com a forma legalmente exigida, ideia que parece estar de acordo com os elementos literal e histórico da norma. Também o elemento racional parece estar de acordo com esta doutrina, já que não é certo que a finalidade das normas, que exigem determinada forma para o negócio dissimulado, seja alcançada pela mera observância das suas solenidades.
Manuel de Andrade, considera que a razão de exigência de forma não abrange a causa da transmissão, admite a validade formal da venda ou da doação ocultas, apesar de apenas constarem do documento autêntico, respetivamente, a doação ou a venda aparentes.
Menezes Cordeiro, considera que será aplicável, por analogia, o disposto no Art. 238o do CC, tendo de haver um mínimo de correspondência do negócio dissimulado no texto do documento.A jurisprudência nacional parece, hoje, inclinar-se para o sentido menos exigente quanto à forma do negócio dissimulado.
Finalmente, de acordo com o Art. 39o da LGT, se da simulação resultar um prejuízo para o Fisco, será liquidado o imposto correspondente ao negócio real e não sobre o simulado. Não existe qualquer sanção de nulidade, como ocorreu até à publicação do Código da Sisa.
Há ainda que ter em conta as disposições que permitem ao Estado, às autarquias locais e demais pessoas coletivas de direito público, representados pelo MP, preferir na venda de imóveis e no trespasse de estabelecimentos, quando, por simulação de preço, o imposto devido tiver sido liquidado por valor inferior, desde que provem que o valor por que deveria ter sido liquidado excede, em pelo menos 30% ou 5000 € o valor sobre que incidiu.

63
Q

Arguição da simulação pelos próprios simuladores

Art. 242o, no1 do CC, Art. 394o, no2 do CC, Art. 351o do CC

A

A nulidade do negócio simulado pode ser arguida pelos próprios simuladores, mesmo que a simulação seja fraudulenta (Art. 242o, no1 do CC). No entanto, esta possibilidade sofre uma apreciável restrição indireta por força do Art. 394o, no2 do CC, onde se se estatui que é inadmissível a prova testemunhal do acordo simulatório e do negócio dissimulado, quando invocados pelos simuladores. Assim, a prova da simulação pelos simuladores é praticamente restringida à prova documental (contradeclarações ou outros documentos) e à confissão, pois não é admissível a prova por presunções (Art. 351o do CC), nem a testemunhal (Art. 394o, no2 do CC) e poucos ou nenhuns ensejos de utilização terão a prova pericial ou a prova por inspeção.

64
Q

A simulação e terceiros. Considerações gerais

A

Para efeitos de invocação da simulação, terceiros são as pessoas diferentes dos simuladores ou dos
seus herdeiros depois da morte do de cujus
, ou seja, são quaisquer pessoas, titulares de uma relação afetada, prática ou juridicamente, pelo negócio simulado.

65
Q

Arguição da simulação por terceiros interessados na nulidade do negócio simulado

Art. 286o, ressalvado no Art. 242o, no1 do CC), Art. 242o, no2 do CC, Art. 605o do CC, Art. 242o, no2 do CC

A

A nulidade do negócio simulado pode, como todas as nulidades, ser invocada por qualquer interessado e declarada ex officio pelo tribunal (Art. 286o, ressalvado no Art. 242o, no1 do CC).
Após a morte do autor da sucessão, os herdeiros legitimários, como quaisquer outros herdeiros, podem arguir a nulidade dos atos simulados praticados pelo de cujus. Advém que os herdeiros intervêm como sucessores do simulador e não como terceiros, isto é, com as mesmas restrições que os simuladores conhecem em vida, salvo quando se trate de herdeiros legitimários que têm em vista defender as suas legítimas, neste caso o herdeiro legitimário intervém na qualidade de terceiro e não de sucessor do simulador.
No entanto, suscitam-se dificuldades quanto à impugnação dos atos pelos herdeiros legitimários, para proteger a sua expetativa, em vida do próprio hereditando. Porém, essas dificuldades são resolvidas pelo Art. 242o, no2 do CC que estabeleceu a doutrina segundo a qual os herdeiros forçosos podem agir em vida do autor da sucessão contra os negócios por ele simuladamente feitos com o intuito de os prejudicar. Ora, a disposição referida não deve ser aplicada por analogia à hipótese de o ato simulado, embora sendo fonte de graves prejuízos, não ter sido praticado com o intuito de lesar os herdeiros legitimários.
Também a Fazenda Nacional e os preferentes podem invocar a nulidade dos atos simulados que lhes tenham causado prejuízo
, como simulações de preço.
Finalmente, os credores podem invocar a nulidade dos atos praticados pelo devedor, anteriores ou posteriores à constituição do crédito, bastando para isso que esteja em causa o seu interesse (Art. 605o do CC). Esta posição do atual legislador contraria a doutrina tradicional, que defendia ser necessário que o ato a anular produzisse ou agravasse a insolvência do devedor.

66
Q

Arguição da simulação contra terceiros interessados na validade do negócio jurídico

Art. 243o do CC, Art. 291o do CC,

A

O Art. 243o do CC consagra a regra da inoponibilidade da simulação a terceiros de boa fé, quer derivem os seus direitos de um ato oneroso, quer os derivem de um ato gratuito. Tal solução continua a ser excecional no nosso direito. No regime geral, as nulidades são inoponíveis a terceiros de boa fé sempre que se verifiquem os requisitos previstos no Art. 291o do CC. No entanto, por razões de justiça e de segurança, no caso da simulação, esta inoponibilidade não depende desses requisitos (Art. 243o do CC).
Ainda que os elementos histórico, teleológico e até sistemático possam pôr em causa esta interpretação, a norma em causa parece determinar que a natureza especial da inoponibilidade da simulação a terceiros de boa fé se aplica apenas às situações em que a nulidade é arguida pelos simuladores ou por quem ocupe a sua posição (os herdeiros, desde logo, salvo quando intervenham como terceiros). Além da letra da lei, parece fazer sentido que a proteção de terceiros seja facilitada quando é quem criou intencionalmente a situação que invoca a nulidade. Assim, nos restantes casos, quando a nulidade for invocada por terceiros, parece que a proteção do terceiro adquirente só deverá aplicar-se de acordo com o regime geral postulado no Art. 291o do CC.
Neste âmbito surge a questão de saber se estão em causa quaisquer terceiros, mesmo aqueles que com a nulidade consigam um lucro, ou apenas aqueles que tenham sido prejudicados pela invalidação. Ora, ainda que o elemento literal e o elemento histórico apontem para a primeira hipótese, os elementos racional e teleológico parecem fazer priveligiar a segunda. Não há dúvida que, dado o fim do Art. 243o do CC (proteger a confiança dos terceiros), a solução mais acertada é a que se limita a impedir a realização de certos prejuízos, e não a originar vantagens. Só será diferente nos casos em que exista disposição especial em contrário.
Finalmente, estará de boa fé o terceiro que ignore a simulação no momento da constituição dos direitos, mesmo que aquela fosse cognoscível (Art. 243o, no2 do CC). Para além disso, considera-se de má fé o terceiro que tenha adquirido o seu direito depois do registo da ação de simulação (Art. 243o, no3 do CC).

67
Q

Conflitos de interesses entre terceiros interessados na nulidade e terceiros interessados na validade do negócio jurídico

Art. 243o do CC

A

Se não se entender que Art. 243o do CC é apenas aplicável à arguição da nulidade pelos simuladores, podem surgir conflitos entre terceiros que pretendam invocá-la e terceiros interessados na validade do negócio. Assim ocorre com conflitos entre credores do simulado alienante e credores do simulado adquirente (parecem prevalecer os interesses dos segundos), ou entre os subadquirentes do simulado alienante e os subadquirentes do simulado adquirente (parece prevalecer a venda mais antiga).

68
Q

Prova da simulação

(Arts. 394o, no2 e 351o do CC).

A

A prova do acordo simulatório e do negócio dissimulado por terceiros é livre, podendo ser feita por qualquer dos meios admitidos na lei, salvo no caso dos simuladores, aos quais não é admissível o recurso à prova testemunhal e às presunções judiciais (Arts. 394o, no2 e 351o do CC).

69
Q

Outras figuras de divergêcncia intencional

Reserva mental

244º; 334º.

A

reserva mental sempre que é emitida uma declaração contrária à vontade real com o intuito de enganar o declaratário (Art. 244o do CC). A reserva mental pode ser inocente ou fraudulenta, conhecida ou desconhecida, absoluta ou relativa e, ainda, unilateral ou bilateral. Note-se que estaremos também perante uma reserva mental se alguém emitir conscientemente uma declaração com vários sentidos e a outra parte compreender com um significado distinto daquele que lhe é atribuído pelo declarante.
Por razões de justiça e de segurança, a reserva não prejudica a validade da declaração, a menos que seja conhecida do declaratário. Quando a mesma é conhecida do declaratário o negócio torna-se nulo, uma vez que não existe uma confiança digna de tutela. Ainda assim, no caso de existirem dois declaratários, aquele que não conheça a reserva pode invocar a sua irrelevância, mantendo-se a validade do negócio.
Desta forma, não basta para a relevância da reserva a sua cognoscibilidade, sendo necessário o seu efetivo conhecimento. No entanto, há quem defenda que a simples cognoscibilidade do vício deveria fundamentar a nulidade do negócio nos casos de reserva inocente, isto é, quando o declarante enganar o declaratário com o objetivo de atribuir uma vantagem ao declaratário. Ainda que esta solução não esteja prevista no nosso ordenamento jurídico, é possível chegar-se a ela mediante a aplicação da cláusula do abuso do direito (Art. 334o do CC), já que poderá considerar-se de má-fé o declaratário que tenha conhecimento de que a declaração foi emitida com reserva mental para trazer uma vantagem ao declaratário.

70
Q

Declaração não séria

245/n1 e 2

A

Na declaração não séria, a divergência entre a vontade e a declaração é intencional, mas não visa enganar ninguém, já que o declarante espera que o declaratário se aperceba da falta de seriedade.
Quanto às suas modalidades, consideram-se as seguintes: declarações jocosas, cénicas, didáticas, publicitárias, etc. Note-se que, ainda que tenha uma finalidade trocista, a “graça malévola” constitui uma reserva mental, e não uma declaração não séria, já que é realizada na expectativa de que o declaratário se deixe enganar.
As declarações não sérias não produzem qualquer efeito (Art. 245o, no1 do CC), salvo nos casos em que o declaratário tem razões para aceitar a sua seriedade, caso em que deve ser indemnizado, em sede de responsabilidade pré-negocial, pelo prejuízo que sofrer (Art. 245o, no2 do CC).

71
Q

Divergência não intencional:
Coação física ou coação absoluta
ou ablativa/moral/relativa

A

Na coação física ou absoluta, o coagido não tem qualquer liberdade de ação, enquanto na coação moral ou relativa a sua liberdade é limitada, mas não excluída (o sujeito pode optar por outro comportamento, como sofrer o mal ou combatê-lo).
Ora, como nos casos de coação física ou absoluta o declarante é reduzido à condição de puro autómato, a mesma conduz à ineficácia da declaração negocial, sem qualquer dever de indemnização. Discute-se, ainda, se estamos perante um caso de nulidade ou de inexistência, parecendo mais correta a última.

72
Q

Falta de consciência da declaração

246º CC

A

Neste caso, falta a vontade de ação ou falta a vontade ou, pelo menos, a consciência da declaração.
Estas hipóteses são abrangidas pelo Art. 246o do CC, estatuindo-se que o negócio não produz qualquer efeito, mesmo que a falta de consciência da declaração não seja conhecida ou cognoscível pelo declaratário.
Ora, trata-se de um caso de nulidade, salvo na hipótese de falta de vontade de ação, em que parece estar-se perante um caso de inexistência da declaração. Com efeito, quando falta a vontade de ação não há um comportamento humano consciente, voluntário, finalista, há um comportamento inconsciente, involuntário, reflexo ou, na hipótese de coação física, absolutamente forçado, embora exteriormente pareça estarmos perante uma declaração.
Ainda assim, se o declarante for culpado desta falta de consciência, deverá indemnizar o declaratário, em sede de responsabilidade pré-negocial (Art. 246o do CC).
Assim, considera-se que não basta a imputabilidade da declaração. Se bastasse, restaria ao declarante, em caso de falta de consciência, a anulabilidade com fundamento em erro-obstáculo.

73
Q

Erro na transmissão da declaração:

247º CC; 334º CC; 236/n2; 248; 249.

A

No erro-obstáculo, o errante tem um comportamento declarativo, sendo a divergência inconsciente, já que resulta de um erro sobre o conteúdo da declaração. Pode tratar-se de um erro mecânico ou ortográfico, que se traduz numa falta de vontade de ação, ou num erro de juízo (atribuição às palavras de um significado diverso do seu sentido objetivo), que conduz a um desvio na vontade negocial. Assim, não se confunde com as declarações sob o nome de outrem, onde não há qualquer comportamento declarativo, resultando a divergência entre a vontade e a declaração de uma falsificação de identidade.
——–’’————
De acordo com o regime geral, o erro na declaração conduz à sua anulabilidade, desde que o declaratário conhecesse ou não devesse ignorar a essencialidade do elemento errado para o declarante (Art. 247o do CC). Há quem considere que esta opção do legislador é excessivamente gravosa para a confiança do declaratário e para a segurança do tráfico jurídico, devendo exigir-se, para a anulabilidade, que o declaratário conhecesse ou tivesse como conhecer o erro, já que só nesse caso a sua confiança deixaria de ser digna de tutela. Note-se, no entanto, que nos casos em que a aplicação do Art. 247o do CC lese com extrema injustiça os interesses do declaratário, a sua aplicação pode ser afastada pela cláusula geral do abuso do direito (Art. 334o do CC).
—————–’’—————————-
Para além desta opção, o legislador consagra um regime especial:
* Se o declaratário se apercebeu da divergência e conheceu a vontade real do declarante, o negócio valerá de acordo com a vontade real (Art. 236o, no2 do CC);
* Se o declaratário conheceu, ou devia ter conhecido, o erro, continua a aplicar-se o regime da anulabilidade;
* Se o declaratário aceitar o negócio como o declarante queria, deixa de se aplicar a anulabilidade fundada em erro (Art. 248o do CC);
* Um erro ostensivo de escrita ou de cálculo leva apenas à retificação da declaração, e não à anulabilidade (Art. 249o do CC);
* Se o declaratário entendeu um terceiro sentido, que não coincide nem com o declarado nem com o querido pelo declarante, o negócio deve ser anulado sem os requisitos do Art. 247o do CC, pois não faria sentido fazê-lo valer com um sentido em que nenhuma das partes confiou. Esta solução resulta da teoria da aparência eficaz, aplicada como corretivo da teoria da confiança;

74
Q

Erro na transmissão da declaração:

250; 247º

A

O erro na transmissão da declaração, encontra-se previsto no Art. 250o do CC, e é disciplinado nos mesmos termos do erro-obstáculo, desencadeando a anulabilidade nos termos do Art. 247o do CC. Estabelece-se, porém, uma exceção a este regime geral no no2 do Art. 250 do CC, admitindo-se a anulação do negócio jurídico sem que seja necessário a verificação de qualquer outro requisito, se o intermediário emitir intencionalmente (com dolo, portanto) uma declaração diversa da vontade do declarante.

75
Q

Vícios da vontade: Conceito

A

Os vícios da vontade são perturbações do seu processo formativo, que levam a que esta coincida com a declaração, mas tenha sido determinada por motivos anómalos e por isso considerados ilegítimos pelo legislador. De acordo com Manuel de Andrade, a vontade não se formou de um modo julgado normal e são.

76
Q

Enumeração dos vícios da vontade a que o nosso direito atribui em geral relevância autónoma

257; 282

A
  • Erro-vício,
  • dolo,
  • coação moral,
  • incapacidade acidental (Art. 257o do CC)
  • estado de necessidade (Art. 282o do CC).
77
Q

O regime da lesão dos vícios redibitórios do novo CC

905; 913; 1035; 907; 914; 908; 910; 915

A

I. Lesão (usura): A lesão consiste num grave desequilíbrio entre as prestações nos contratos onerosos comutativos e, durante a vigência do Código de Seabra, só implicava a anulabilidade quando envolvesse erro, dolo ou coação, cumpridos certos requisitos. Atualmente, a lesão designa-se usura, e leva à anulabilidade ou modificação do negócio de acordo com juízos de equidade, sempre que tal desequilíbrio resultar da exploração de necessidade, inexperiência, ligeireza, dependência, estado mental ou fraqueza de caráter de outrem. Ora, à luz da legislação agora vigente, a lesão enquanto negócio usurário passou a estar diretamente relacionada com os vícios da vontade, já que está associada à adulteração do seu modo de sã formação. Acresce que está em causa uma certa liberdade de apreciação judicial, tanto no que respeita à avaliação da situação do lesado, como no que se relaciona com a exploração da mesma;
II. Vícios redibitórios: O vício redibitório traduz-se num defeito oculto da coisa objeto da relação jurídica em causa e não está consagrado no nosso CC como fundamento autónomo da invalidade, sendo apenas referida essa hipótese em certos regimes especiais, como os da venda de coisas oneradas ou defeituosas e dos vícios da coisa locada (Arts. 905o, 913o e 1035o do CC). Nestes casos, a anulabilidade do negócio está sujeita a um prazo especial de caducidade, depende da verificação dos requisitos legais de relevância do erro ou do dolo e deve ser sanada pelo vendedor (Arts. 907o e 914o do CC), que incorre ainda na obrigação de indemnizar o lesado (Arts. 908o a 910o e 915o do CC). Para além disso, em caso de erro ou dolo acidentais, concede-se uma ação de redução do preço. Finalmente, existem leis especiais relativos a vícios redibitórios em certos contratos;

78
Q

Qualificação da invalidade proveniente de erro-vício, dolo, coação ou incapacidade acidental

251; 252; 254; 256; 257; 287; 288; 437º.

A

O erro-vício (Arts. 251o e 252o do CC), dolo (Art. 254o do CC), coação moral (Art. 256o do CC) e incapacidade acidental (Art. 257o do CC) conduzem à anulabilidade do negócio jurídico. A anulabilidade só pode ser invocada, por via de ação ou de exceção, pelo errante, pelo enganado, pelo coato ou pelo incapaz, transmitindo-se aos seus herdeiros e podendo ser sanada (Arts. 287o e 288o do CC). Para além disso, pode ser arguida a todo o tempo se o negócio não estiver cumprido, ou dentro do ano subsequente à cessação do vício nos restantes casos (Art. 287o, no1 do CC).

No caso de erro sobre os motivos que recaia sobre as circunstâncias que constituem a base negocial (Art. 252o, no2 do CC), surge a questão de saber se, em vez da anulabilidade, não se deveria conceder ao lesado a faculdade de resolução, como ocorre em caso de alteração superveniente das circunstâncias (Art. 437o do CC). O curso aponta para a anulabilidade, já que o erro incide sobre situações anteriores ou contemporâneas ao negócio, viciando-o logo desde a sua formação. Assim, a remissão realizada no Art. 252o, no2 do CC para o Art. 437o do CC parece dizer apenas respeito aos requisitos necesários para a relevância do erro.

79
Q

O erro como vício da vontade: Noção

A

O erro-vício constitui uma representação inexata ou a ignorância de uma certa circunstância de facto ou de direito, determinante para a decisão de realização do negócio. Assim, se estivesse esclarecido, o declarante não o teria efetuado, ou tê-lo-ia realizado noutros termos.

80
Q

Confronto com figuras próximas

437º.

A

O erro na declaração ou erro-obstáculo traduz-se numa divergência entre a vontade e a declaração (erro na formulação, e não na formação da vontade), não se confundindo com o erro-vício, no qual a divergência ocorre entre a vontade real e uma vontade hipotética (a que se teria tido se a representação tivesse sido exata).
Por fim, note-se que uma figura próxima do erro é a pressuposição que se pode caracterizar como a convicção por parte do declarante de que certa circunstância se verificará no futuro ou de que se manterá um certo estado de coisas – a alteração anormal das circunstâncias pressupostas constitui, nos termos Art. 437o do CC, fundamento da resolução ou modificação do contrato, quando a manutenção do conteúdo contratual contrarie a boa-fé e não esteja coberta pelos riscos do próprio contrato. Em suma, a pressuposição refere-se ao futuro (faltará quando houver uma alteração superveniente de circunstâncias) e o erro refere-se ao presente ou ao passado: o erro consiste na ignorância ou falsa representação, relativa a circunstâncias passadas ou presentes, isto é, à situação existente no momento da celebração do negócio; a pressuposição consiste na representação inexata de um acontecimento ou realidade futura que se não vêm a verificar (quando falha, trata-se de uma imprevisão).

81
Q

Modalidades de erros

252º.

A
  • Erro sobre a pessoa do declaratário: Pode incidir sobre a sua identidade ou sobre as suas qualidades;
  • Erro sobre o objeto do negócio: Incide sobre o objeto mediato (identidade ou qualidades), ou sobre o objeto imediato (natureza do negócio);
  • Erro sobre os motivos não referentes à pessoa do declaratário nem ao objeto do negócio (Art. 252o do CC): Pode incidir sobre a causa ou sobre terceiros (por exemplo: A arrenda uma casa porque julga erradamente ter sido colocado como funcionário público na localidade em causa);
82
Q

O problema da exclusão prévia da anulação por erro

A

Ainda que esta opção não seja pacífica, a anulação por erro parece poder ser excluída por acordo contratual prévio relativo à deteção do erro. Na verdade, estamos perante matéria de caráter dispositivo, que não se vê razão para subtrair à disponibilidade das partes. Aliás, atente-se que, se numa compra e venda a prestação de garantia pelas qualidades de coisa pode ser contratualmente excluída, então não pode ser considerado um erro sobre as qualidades do objeto do lado do comprador.

83
Q

Condições gerais de relevância do erro-vício como motivo de anulabilidade

251; 252; 292; .

A

Os requisitos gerais de relevância do erro são a essencialidade e a propriedade:
* I. Essencialidade: Só é relevante o erro essencial, isto é, aquele que levou o errante a concluir o negócio, e não apenas nos termos em que foi celebrado (Arts. 251o e 252o do CC). O erro foi causa da celebração do negócio e não apenas dos seus termos. O erro é essencial se:
1. sem ele, se não celebraria qualquer negócio
2. ou se celebraria um negócio com outro objeto
3. ou de outro tipo
4. ou com outra pessoa

Pelo contrário, o erro incidental não releva no plano da validade, uma vez que o errante iria sempre contratar, embora noutras condições, devendo apenas fazer-se valer o negócio nos termos em que teria sido concluído sem o erro
Em face do CC, desde já notar que o erro indiferente, isto é, um erro tal que, mesmo sem ele, o negócio teria sido concluído nos precisos termos em que o foi, não tem qualquer relevância.
Assim, deverá ter lugar a anulabilidade quando se não possa ajuizar desses termos com segurança, ou, pelo menos, com bastante probabilidade e, ainda, quando se prove que a outra parte os não teria acolhido (Art. 292o do CC);

  • II. Propriedade: O erro é próprio quando incide sobre uma circunstância que não seja a verificação de um elemento legal da validade do negócio, como requisitos de forma, pressupostos da licitude do objeto ou a capacidade do errante. Nestes casos, a invalidade não se funda no erro, mas no requisito cuja frustração vicia o negócio;

——————’’———————–

  • III. Escusabilidade: Durante a vigência do Código de Seabra, considerava-se ser necessária a ausência de culpa do errante para a anulabilidade do negócio. No entanto, Manuel de Andrade discordava desta posição, por permitir que erros grosseiros não anulassem o negócio, sendo a situação do contraente não enganado tida em conta por só ser possível a anulação mediante certos requisitos. O atual CC não formula qualquer exigência neste plano, pelo que a escusabilidade não é condição de relevância do erro. Em caso de erro culposo, à anulabilidade acresce a responsabilidade pré-negocial do errante, que deverá assim indemnizar o lesado. Uma vez que a anulação só é permitida quando não há qualquer confiança do declaratário digna de proteção (Arts. 251o e 252o do CC), poderia pensar-se que a referida responsabilidade nunca teria lugar. No entanto, tal só ocorreria assim se a lei exigisse o conhecimento ou a cognoscibilidade do erro pela contraparte como fundamento da anulação, o que não se verifica;
  • IV. Individualidade ou singularidade: Durante a vigência do Código de Seabra, alguns autores exigiam que o erro fosse singular ou individual, isto é, que fosse exclusivamente do errante, e não de toda a gente em geral. No entanto, esta posição parece não fazer sentido, é mais justificado que o errante possa invocar o erro como fundamento da anulação se este for geral. Assim, este não é um requisito previsto no atual CC português;
84
Q

Condições especiais de relevância do erro-vício como motivo de anulabilidade

252/n1; 405; 437 a 439; 247; 251.

A

Existem ainda certos requisitos especiais, que variam consoante a modalidade do erro-vício:
* I. Erro sobre os motivos: Inserem-se nesta categoria os casos em que o erro não se refere à pessoa do declaratário nem ao objeto do negócio. Trata-se de uma noção definida por via negativa, que corresponde ao erro da causa e abrange o erro da pessoa de terceiro. Nos casos deste tipo, o Art. 252o, no1 do CC conduz à anulação apenas se existir uma cláusula, expressa ou tácita, no sentido de a validade do negócio ficar dependente da existência da circunstância sobre que versou o erro, resolução que já resultaria do princípio da autonomia da vontade (Art. 405o do CC).
Se o erro incidir sobre as circunstâncias que constituem a base negocial, haverá lugar à anulabilidade, nos termos em que, nos Arts. 437o a 439o do CC, se dispõe acerca da resolução por alteração das circunstâncias vigentes no momento em que o negócio foi concluído: desde que a exigência das obrigações assumidas afete gravemente os princípios da boa fé e não esteja coberta pelos riscos do próprio contrato, não se exigirá, portanto, uma cláusula de condicionamento. Considera-se que o erro incidiu sobre a base negocial sempre que a não verificação da pressuposição tem relevância, nomeadamente quando o erro de uma das partes leva a que a outra aufira rendimentos especiais por haver um falso entendimento acerca da existência e extensão dos seus direitos;

  • II. Erro sobre o objeto do negócio: Está previsto na hipótese de erro sobre a identidade (na medida em que seja um erro-vício e não um erro na declaração), quer na do erro sobre as qualidades. O negócio é anulável nos termos no Art. 247o do CC, isto é, **desde que o declaratário conhecesse ou devesse conhecer a essencialidade, para o declarante, do elemento sobre que incidiu o erro*.
  • III. Erro sobre a pessoa do declaratário: Abrange, igualmente, o erro sobre a identidade e o erro sobre as qualidades. Está também previsto no Art. 251o do CC, cabendo-lhe o regime em que o negócio é anulável nos termos do Art. 247o do CC;
85
Q

Aplicação da coisa a fim diferente do declarado, erro e vinculação negocial

437

A

Em certos casos, a jurisprudência considerou existir um erro sobre a base do negócio quando, num contrato de compra e venda, o comprador declara dar determinado destino à coisa, acabando depois por lhe dar outro.** No entanto, não estamos perante um erro, mesmo que tal destino tenha sido decisivo para a celebração do contrato por parte do vendedor, uma vez que não se desconhece ou elabora uma falsa representação da realidade, *apenas ocorre uma falha na previsão.
*Só haverá erro se o vendedor atribuir à declaração do comprador um sentido, julgando que a coisa terá determinado destino que este nunca pretendeu
.
Assim, trata-se de um problema complexo, cuja solução convoca diversos institutos.
* Por um lado, se o comprador agir com o intuito de enganar o vendedor, estaremos perante dolo.
* Por outro lado, é necessária a interpretação do contrato, de modo a aferir-se se o destino declarado constitui uma obrigação do comprador, que, nesse caso, incorrerá em não cumprimento.

A via mais fácil de proteger o vendedor é a inclusão de uma cláusula resolutiva, que lhe permita reaver a coisa no caso de o comprador não lhe dar o destino acordado.
Na falta desta estipulação, é necessário averiguar se está em causa uma alteração da base do negócio, que levaria à sua resolução ou modificação (Art. 437o do CC).

–> Finalmente, há que considerar que, ao celebrarem um negócio, as partes não se vinculam apenas às obrigações nele previstas, expressa e tacitamente, mas também a todas aquelas que dele emerjam de acordo com a boa fé e o fim do contrato.

86
Q

O dolo: conceito

253/n1 CC

A

A noção de dolo consta do Art. 253o, no1 do CC. Incorre em dolo quem empregue uma sugestão ou artifício com a intenção ou consciência de induzir ou manter em erro o autor da declaração (dolo positivo ou comissivo), ou quem dissimule o erro do declarante (dolo negativo, omissivo ou de consciência).

87
Q

Modalidades

253/n2; 227/n1; 254/n2.

A
  • I. Dolo positivo e negativo: Importa referir que o dolo negativo, não existe em todos os casos de silencio perante o erro em que versa o declarante. A omissão de esclarecimento só constitui dolo negativo quando existia um dever de elucidar por força de lei, do contrato ou das conceções do comércio jurídico (Art. 253o, no2 do CC). Para além disso, é necessário atender ao tipo negocial e à boa fé, por exemplo: uma relação de confiança pode fundamentar o dever de esclarecer, que não existirá nos negócios especulativos, dado o risco que envolvem. Por fim, note-se que são aqui, também, relevantes os ditames da boa fé, a que se refere o Art. 227o, no1 do CC, cuja observância pode impor o cumprimento de deveres de informação e de esclarecimento;
  • II. Dolus bonus e dolus malus: Só é relevante, como fundamento de anulabilidade e responsabilidade, o dolus malus. O primeiro reconduz-se às sugestões ou artifícios considerados legítimos por serem usuais e normais no comércio jurídico, não sendo relevante como fundamento de anulabilidade e de responsabilidade;
  • III. Dolo inocente e dolo fraudulento: No primeiro há um mero intuito enganatório, enquanto no segundo há a finalidade ou a consciência de prejudicar. A distinção não tem interesse prático, em ambos os casos se verificando os mesmos efeitos;
  • IV. Dolo proveniente do declaratário e dolo proveniente de terceiro: A distinção tem grande importância, pois** para a relevância o dolo de terceiro, são exigidas certas condições suplementares** que devem acrescer às do dolo do declaratário e o seu efeito é mais restrito. Existirá, não apenas dolo de terceiro, mas também dolo do declaratário, se este for cúmplice daquele ou conhecer (ou mesmo, em certos casos, apenas dever conhecer) a atuação de terceiros (Art. 254o, no2 do CC);
  • V. Dolo essencial ou determinante e dolo incidental: No** dolo essencial, o enganado foi induzido pelo dolo a concluir o negócio em si mesmo e não apenas nos termos em que foi concluído, isto é, sem dolo não se teria concluído qualquer negócio. No dolo incidental,** o enganado apenas foi influenciado quanto aos termos do negócio, pois sempre contrataria, embora noutras condições. A importância da distinção está em que o dolo incidental não conduz, necessariamente, à anulação;
88
Q

Condições de relevância do dolo como motivo de anulação

253ºn2; 254 nº1; 254/n2.

A

O dolo conduz à anulabilidade do negócio, bem como à responsabilidade pré-negocial do declaratário (deceptor) pelo dano na confiança provocado ao declarante (deceptus), que deve ser colocado na situação em que se encontraria se o negócio não tivesse sido celebrado (e não na situação em que estaria se os factos fingidos fossem verdadeiros).
——————’’—————–

Para que o dolo do declaratário conduza à anulação, é necessário:
* Que se trate de dolus malus (Art. 253o, no2 do CC);
* Que seja essencial (Art. 254o, no1 do CC);
* Que o deceptor tenha a intenção ou consciência de induzir ou manter em erro;

Assim, não é necessário que o dolo seja unilateral, podendo ser bilateral ou recíproco (Art. 254o, no1 do CC).
no caso do dolo de terceiro, devem verificar-se os mesmos requisitos, podendo ocorrer diversas situações, previstas no Art. 254o, no2 do CC:
* Se o declaratário conheceu ou lhe foi cognoscível o dolo, também ele incorrerá neste vício, sendo o negócio totalmente anulável;
* Se o declaratário não conheceu nem devia conhecer o dolo, é apenas anulável a cláusula (se existir) que atribua ao terceiro deceptor algum direito;

89
Q

Fundamento jurídico da anulabilidade por dolo

A

A anulabilidade por dolo não visa reparar o prejuízo sofrido pelo enganado, o que ocorre mediante o instituto da responsabilidade, mas consiste em repor a vontade do deceptus.

90
Q

Confronto entre as condições de relevância do dolo e as do erro

252º.

A

As condições de relevância do erro sobre os motivos são mais exigentes do que as do dolo, uma vez que no segundo não se exige o reconhecimento da essencialidade do motivo (Art. 252o do CC).
Já as condições previstas para o dolo e para erro sobre a pessoa do declaratário ou sobre o objeto do negócio são igualmente apertadas.

Para além disso, enquanto o erro pode desencadear a responsabilida de por parte do errante, o dolo implica sempre a responsabilidade do deceptor.
Acresce que, se o erro for conhecido antes do dolo, a anulabilidade do segundo subsistirá,** mesmo que a que resulte do primeiro seja sanada**.
Assim, o errante está mais protegido no caso do dolo do que no caso do erro simples.

91
Q

Negócio em que o dolo não tem relevância

1631/b) e 1636.

A

No casamento, o dolo não tem relevância específica em relação ao erro (Arts. 1631o, b) e 1636o do CC).

92
Q

A coação: conceito

225º/n1 e 3

A

O conceito de coação consiste na perturbação da vontade pelo medo resultante da ameaça ilícita de um dano, realizada por outrem com o fim de obter do sujeito uma declaração (Art. 255o, no1 do CC).
Só há um vício da vontade quando estamos perante coação moral (ou relativa ou compulsiva), isto é, quando a liberdade do coato não é totalmente excluída, uma vez que este tem possibilidade de escolha, embora a submissão à ameaça seja a mais normal.
Só estamos perante coação física (ou absoluta ou ablativa) quando a liberdade do coato é totalmente excluída.
Para além disso, não basta um simples medo ou receio. A lei exclui, desde logo, o chamado temor reverencial (Art. 255o, no3 do CC). Torna-se necessário que este provenha de uma ameaça ilícita, que vise extorquir a declaração negocial.

93
Q

Coação: modalidades

246º e 256º

A
  • I. Coação física (absoluta) e coação moral (relativa): A coação física, absoluta ou ablativa reduz o coagido à situação de mero instrumento ou autómato. A coação moral ou relativa ou compulsiva reduz a liberdade do coagido, mas não a elimina, sendo o coagido ameaçado de um mal se não emitir a declaração. A liberdade do coato é cerceada, mas não excluída, na coação moral, pois existe sempre uma opção entre padecer o mal cominado ou expor-se à sua consumação e celebrar o negócio.
    A primeira (física) dá lugar à inexistência do negócio (Art. 246o do CC). A segunda (moral) à mera anulabilidade (Art. 256o do CC);
  • II. Coação principal e coação incidental: A distinção põe-se nos termos expostos do dolo e do erro e o seu interesse é idêntico;
  • III. Coação dirigida à pessoa ou à honra ou à fazenda do declarante ou de terceiro: No regime geral da coação, não há qualquer diferença de tratamento, consoante o bem ameaçado pela cominação ou a pessoa diretamente visada. A lei, ao contrário de outras legislações, omitiu qualquer restrição quanto à natureza do vínculo existente entre o coagido e o terceiro, a quem a ameaça se refere, por considerar arbitrária qualquer especificação;
  • IV. Coação exercida pelo declaratário e coação exercida por terceiro: A lei estabelece uma ligeira diferença entre as condições de relevância da coação, como motivo de anulabilidade, num e noutro caso;
94
Q

Condições de relevância da coação como motivo de anulabilidade

256 e 227º; 255/n3;; 256.

A
  • A coação moral conduz à anulabilidade do negócio e à responsabilidade pré-negocial do coator (Arts. 256o e 227o do CC).
    Verifica-se a anulabilidade e não a nulidade mesmo que o coato tenha procedido com reserva mental, ao admitir a declaração.
  • A coação exercida pelo outro contraente só produz a anulabilidade se for essencial (a coação incidental só tem esta consequência nos termos do dolo incidental) e se for realizada com a intenção de extorsão da declaração, pelo que não há coação se um senhorio vender o prédio para se ver livre da ameaça levada a cabo pelo arrendatário com o intuito de baixar a renda. Acresce que a ameaça tem de ser ilícita, o que pode resultar da ilegitimidade dos meios empregues (por exemplo: agressão) ou da ilegitimidade da prossecução do fim em causa (por exemplo: ameaça do exercício extrajudicial de um direito). Note-se, no entanto, que a ameaça do exercício normal de um direito para conseguir a satisfação de outro direito existente não constitui coação (Art. 255o, no3 do CC).
  • Já a coação exercida por terceiro origina a anulabilidade e a responsabilidade pré-negocial se o mal em causa for grave e o receio da sua consumação for justificado (Art. 256o do CC).
    Deste modo, ao contrário do dolo de terceiro, o negócio aqui é totalmente anulável, independentemente da existência ou não de uma cláusula contratual a seu favor e do conhecimento do vício por parte do declaratário (que nesse caso não será indemnizado). Esta diferença nos regimes justifica-se pelo coagido não poder invocar qualquer outro vício que não a coação, enquanto o deceptus pode sempre invocar o erro simples.
95
Q

A coação moral e o simples temor reverencial

255/n3 CC

A

O temor reverencial, isto é, o medo de incorrer no desagrado de outrem, a quem se deve respeito ou gratidão, não constitui coação nem qualquer outro vício da vontade (Art. 255o, no3 do CC).

96
Q

O estado de necessidade e outras situações como vícios da vontade negocial: Conceito

A

O estado de necessidade consiste na celebração de um negócio impulsionado pelo medo, com vista à superação de uma situação de perigo. O estado de necessidade pode ser provocado por um facto natural ou por um facto humano.

97
Q

Confronto com a coação

256; 280º.

A

A confusão só pode surgir quando o estado de necessidade for ocasionado por um facto humano.
Neste caso, estaremos perante a figura do estado de necessidade quando a situação de perigo não for criada com o desígnio de extorquir um negócio (falta de intenção de coagir).
Poderão igualmente surgir dúvidas se, criado o perigo por um facto natural ou humano, o contraente que acode o necessitado tinha o dever jurídico (legal ou contratual), ou, mesmo, apenas um operativo dever moral de auxílio e, no entanto, não presta o auxílio a que estava obrigado, a não ser depois de exigir uma retribuição a que não tinha direito. Não há dúvida de que a situação de perigo em que se encontra o necessitado é causalmente imputável à recusa de atuação daquele, neste sentido, pode dizer-se provocada, partir da omissão do agir, com o intuito de extorquir o negócio.
Não há qualquer diferença entre os pressupostos desta hipótese e os da coação.
Tais hipóteses (aquelas em que havia obrigação de socorrer o necessitado) são, todavia, objeto de um tratamento mais drástico e mais justo, do que seriam se as qualificássemos, pura e simplesmente, como de coação. Com efeito, à coação moral corresponde a anulabilidade (Art. 256o do CC) e os negócios referidos (coação quando há dever de assistência) devem ter-se por nulos, com fundamento em contrariedade à lei ou ofensa dos bons costumes (Art. 280o do CC).
Na verdade, a exigência de remuneração viola a norma que impunha a prestação daquele auxílio noutras condições ou, pelo menos, deve ter-se como ofensiva dos bons costumes.

98
Q

Valor dos negócios jurídicos realizados em estado de necessidade

282º e 283º.

A

Os negócios realizados em estado de necessidade são subsumíveis na hipótese do Art. 282o do CC, onde se estatui a anulabilidade dos chamados negócios usurários.
Para que estes negócios sejam anuláveis exige-se, em conformidade com a fisionomia do instituto, a verificação de requisitos objetivos (benefícios excessivos ou injustificados) e requisitos subjetivos (exploração de uma situação de necessidade, inexperiência, ligeireza, dependência, estado mental ou fraqueza de caráter de outrem).
Assim, devem verificar-se requisitos objetivos: benefícios excessivos ou injustificados:
* Tem de haver uma desproporção clara entre as prestações. Só haverá benefícios excessivos ou injustificados quando, segundo todas as circunstâncias, a desproporção ultrapassa os limites do que pode ter alguma justificação. O legislador recusou-se a estabelecer uma relação de valor determinado. Apesar da superação do critério da laesio enormis do direito comum e do nosso antigo direito, o critério do dobro do valor será um limiar a partir de cuja ultrapassagem se deve averiguar a existência das demais circunstâncias objetivas e dos requisitos subjetivos da usura.

Igualmente, devem verificar-se requisitos subjetivos, nomeadamente:
* a exploração de situações tipificadas, que não é excluída pelo facto de a iniciativa do negócio provir do lesado;
* uma situação de necessidade, inexperiência, ligeireza, dependência, estado mental ou fraqueza de caráter.

O prazo para requerer a anulabilidade começa a contar desde a cessação da situação de inferioridade. No entanto, a anulabilidade pode ser substituída pela modificação do negócio, segundo juízos de equidade, a requerimento de uma das partes (Art. 282o do CC).
——–’’—————

Por outro lado, se a pessoa que se aproveitou conscientemente da situação de necessidade tinha o dever de auxiliar o necessitado, o negócio será nulo (Arts. 282o e 283o do CC).

99
Q

A incapacidade acidental

257º CC.

A

A incapacidade acidental não está prevista no CC, junto das restantes incapacidades, mas com os vícios da vontade, uma vez que não se trata de uma situação permanente, mas de um mero desvio no processo de formação da vontade do indivíduo.
Esta conduz à anulabilidade, desde que se verifique um requisito:
* que a perturbação psíquica fosse conhecida ou notória por uma pessoa média, colocada na posição concreta do declaratário (Art. 257o do CC).

100
Q

A representação nos negócios jurídicos - conceito

1157

A

A representação traduz-se na prática de um ato jurídico em nome de outra pessoa, em cuja esfera
jurídica se produzirão os efeitos
. Estes poderes podem ser atribuídos pelo representado ao representante mediante:
* uma procuração (representação voluntária),
* pelos estatutos de uma pessoa coletiva (representação orgânica ou voluntária)
* ou pela lei (representação legal).

A representação não frustra o princípio da autonomia privada, já que assenta na vontade do representado se for voluntária, constituindo até um alargamento da sua autonomia.
Quanto às pessoas coletivas, a sua capacidade de agir deriva justamente da existência de órgãos que as possam representar.
Já na representação legal, os menores, interditos e certos inabilitados não têm capacidade de autodeterminação, isto é, foi exatamente a falta de autonomia privada que conduziu ao instituto da representação, e não o contrário.

Por outro lado, a representação não se confunde com o mandato, que é um contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar atos jurídicos por conta da outra pessoa, tratando-se de uma modalidade particular de prestação de serviços (Art. 1157o do CC). Assim, pode haver mandato sem representação, se o mandatário não agir por conta do mandante, mas em nome próprio; e representação sem mandato, se a procuração coexistir com este contrato;

101
Q

A representação nos negócios jurídicos - Espécies

A
  • I. Representação própria, direta ou imediata e representação imprópria, indireta ou mediata: Apenas na primeira (própria/direta/imediata) existe uma atuação em nome de outrem (contemplatio domini). Na segunda (imprópria/indireta/mediata) há uma mera representação de interesses, que não torna o representado parte no negócio;
  • II. Representação legal e representação voluntária: Na primeira (legal), o representante é indicado pela lei ou por decisão judicial, verificada certa situação, compreendendo, geralmente, poderes que permitem a representação em todos os assuntos pessoais ou patrimoniais do representado. Já na segunda (voluntária), os poderes do representante e a sua extensão dependem da vontade do representado, manifestada na procuração, que pode ser geral (abranger todos os atos patrimoniais de administração ordinária) ou especial (abranger apenas os atos nela referidos e os necessários à sua execução);
  • III. Representação ativa e representação passiva: A primeira (ativa) é a atuação em nome de outrem na emissão de declarações negociais, enquanto a segunda (passiva) traduz-se na receção de declarações em nome de outrem;
102
Q

Confronto com institutos afins: núncio; representação própria vs representação imprópria; contrato a favor de terceiros; declarações sob o nome de outrem:

263º; 268º; 247; 250º; 443/n2; 246º

A
  • I. Representação e núncio: O representante emite uma declaração em nome de outrem, carecendo de capacidade natural de entender e querer (Art. 263o do CC), enquanto o núncio apenas transmite a declaração de outrem, podendo até tratar-se de uma criança.
    Se o primeiro exceder os seus poderes, o negócio é ineficaz em relação ao representado (Art. 268o do CC).
    se o núncio transmitir a declaração de forma inexata, esta não deixará de vincular o dominus, a menos que se verifiquem os requisitos para a anulabilidade por erro na transmissão da declaração (o declaratário conhecesse ou não devesse ignorar a essencialidade, para o declarante, do elemento sobre que incidiu o erro - 247º e 250º);
  • II. Representação própria e representação imprópria: Na representação imprópria, não existe a contemplatio domini (atuação em nome de outrem), embora se atue no interesse ou por conta de outrem. Na representação própria, existe a contemplatio domini (atuação em nome de outrem);
  • III. Representação e colaboração técnica ou material nos negócios de outrem: Enquanto o representante realiza negócios jurídicos, os consultores técnicos realizam atos materiais, nomeadamente operações intelectuais;
  • IV. Representação e contrato a favor de terceiros: O representante não se torna titular de direitos ou obrigações face à contraparte do negócio, enquanto nos contratos a favor de terceiros se estabelecem vínculos jurídicos entre o promissário e o promitente, para além do direito adquirido pelo terceiro (Art. 443o, no2 do CC);
  • V. Representação e “declarações sob o nome de outrem”: O representante atua em nome de outra pessoa que não se confunde com ele, enquanto, na declaração sob o nome de outrem, o declarante assume o nome de outro sujeito, fazendo-se passar por ele. Neste caso, a declaração não produz efeitos relativamente ao verdadeiro titular do nome, por aplicação analógica do Art. 246o do CC, podendo apenas produzi-los em relação ao declarante aparente se este o desejar;
103
Q

Admissibilidade da representação

A

A representação própria é regulada pelo CC nos Arts. 258o e ss., enunciando-se alguns princípios
gerais, comuns à representação legal e à representação voluntária, isto é, àquela que promana do ato voluntário denominado procuração.
Quanto à representação legal, a sua admissibilidade e o seu domínio de aplicação resultam das disposições que consagram para o efeito de se suprir a incapacidade dos menores (Art. 124o do CC), dos interditos (Art. 139o do CC) e, eventualmente, a dos inabilitados (Art. 154o do CC).
Quanto à representação voluntária, é admitida nos Arts. 262o e ss. do CC. O mandato com representação (Art. 1178o do CC), no qual está coenvolvida uma procuração, é a fonte mais frequente da representação voluntária.

104
Q

Pressupostos da representação

258; 268/n1; 227; 261; 269; CC
artigo 23º n1 do DL nº178/86

A

Para que a representação exista, é necessário que o negócio seja realizado em nome do representado, de modo a que a contraparte saiba com quem negoceia. Para o cumprimento deste requisito não é necessária a identificação do seu nome, desde que o representado seja reconhecível, sendo que, em caso de dúvida, considera-se a negociação em nome próprio. Para além disso, é necessária a declaração de uma vontade própria do representante, seja no seu interesse (na representação voluntária, os poderes podem ser atribuídos no interesse do representante, mediante uma procuração in rem suam) ou no do representado.
Ainda assim, para que este instituto seja eficaz, é necessário que o representante atue dentro dos limites dos poderes que lhe foram conferidos (Art. 258o do CC), anterior (legitimação representativa originária) ou subsequentemente ao negócio mediante ratificação (legitimação representativa subsequente).
Assim, os atos praticados por um representante sem poderes são ineficazes em relação à pessoa em nome da qual se celebrou o negócio, a menos que haja uma ratificação (Art. 268o, no1 do CC), bem como ao próprio representante que, se tiver culpa, incorrerá em responsabilidade pré-negocial (Art. 227o do CC). Já no caso de o representante sem poderes desconhecer a sua falta de legitimidade, a contraparte pode optar pela indemnização pelo não cumprimento do contrato.
—————-‘’—————————

Deste modo, o terceiro que contratou com o representante sem poderes não é protegido pela atribuição de efeitos ao negócio, salvo nos casos em que o representado tenha conhecido e tolerado a atuação do representante, conivência que levou o terceiro a, de boa fé, considerar que a procuração necessária à realização do negócio existiu (procuração tolerada).
Mais sensível é a situação em que o terceiro considera que a conduta do representante foi tolerada pelo representado, por este ter tido oportunidade de a conhecer e impedir, embora tal não tenha ocorrido na realidade (procuração aparente). Nestes casos, é necessária uma ponderação casuística, averiguando-se a existência de razões ponderosas que justifiquem a confiança do terceiro de boa fé na legitimidade do representante (Art. 23o, no1 DL no178/86).
Note-se que o negócio consigo mesmo se consubstancia numa manifestação particular da representação sem poderes, estando ferido de anulabilidade (Art. 261o do CC). A razão de ser da proibição do negócio consigo mesmo é impedir, dada a colisão de interesses, um prejuízo para o representado ou para um dos representados.
Finalmente, estaremos perante um caso de abuso de representação sempre que o representante atua dentro dos limites formais dos poderes conferidos, mas fora dos fins da representação, aplicando-se as consequências previstas para a representação sem poderes (Art. 269o do CC).

105
Q

O objeto negocial: Noção de objeto do negócio jurídico

280º e ss.

A

Deve distinguir-se entre: o objeto imediato ou conteúdo – efeitos jurídicos a que o negócio tende – e o objeto mediato ou objeto stricto sensu – consiste no quid sobre que incidem os efeitos do negócio. Com efeito, os Arts. 280o e ss. do CC utilizam a expressão objeto negocial neste sentido complexivo, abrangendo quer o conteúdo ou efeitos do negócio, quer o objeto propriamente dito ou em sentido estrito.

106
Q

Exigências legais relativas ao objeto dos negócios jurídicos (Art. 280o do CC)

280; 400; 401/n3; 790 e 791;

A

Os requisitos do objeto negocial são formulados no Art. 280o do CC. Dele se infere serem condições de validade do negócio jurídico:
* a possibilidade física ou legal,
* a não contrariedade à lei (licitude),
* a determinabilidade,
* a não contrariedade à ordem pública
* e a conformidade com os bons costumes do objeto negocial.

I. Determinabilidade: O objeto negocial deve estar ou poder vir a ser individualmente concretizado através de um critério estabelecido no contrato ou na lei. Esta exigência refere-se, sobretudo, ao objeto mediato do negócio. Por falta deste requisito, devem considerar-se nulos os negócios cujo objeto não foi determinado nem é determinável. Nos contratos de crédito (Art. 400o do CC), a prestação pode ser determinada por uma das partes, por terceiro ou pelo tribunal, segundo juízos de equidade;
II. Possibilidade física: Significa que há qualidade impossibilidade material ou natural (derivada da natureza das coisas) do objeto do negócio. Refere-se ao objeto mediato e, portanto, a coisas ou prestações, por exemplo: o objeto é fisicamente impossível se se vender um prédio que já não existe por ter sido destruído num incêndio. O Art. 401o, no3 do CC permite concluir que só a impossibilidade objetiva (para toda a gente) invalida o negócio, e não a mera impossibilidade subjetiva, isto é, a que se verifica apenas em relação à pessoa do devedor, como por exemplo: terem-se esgotado as mercadorias no estabelecimento do vendedor. Mas é claro que bastará a impossibilidade subjetiva, tratando-se de uma prestação de facto não fungível, como por exemplo: um espetáculo. Com efeito, só falta um requisito de idoneidade do objeto se a impossibilidade é originária, isto é, contemporânea da celebração do negócio, nesta hipótese, depara-se-nos uma nulidade do negócio (Art. 280o do CC). Se a impossibilidade é superveniente, o que se nos depara é uma extinção da obrigação por impossibilidade do cumprimento (Art. 790o e 791o do CC);
III. Possibilidade legal e não contrariedade à lei (ilicitude): O Código atual distingue entre impossibilidade legal e contrariedade à lei (ilicitude) como sendo duas vicissitudes distintas que pode conhecer o objeto negocial. O objeto é legalmente impossível quando a lei ergue relativamente a ele um obstáculo tão insuperável quanto como o que as leis da natureza erguem sobre fenómenos fisicamente impossíveis. Por outro lado, será contrário à lei (ilícito) o objeto de um negócio, quando viola uma disposição da lei, isto é, quando a lei não permite uma combinação negocial com aqueles efeitos ou sobre aquele objeto mediato. Devem ser contrários à lei, não só os negócios que ofendem frontalmente a lei, mas também quando visam contornar uma proibição legal, tentando chegar a um resultado legalmente proibido por um caminho diverso do previsto na hipótese da prescrição (fraude à lei). São exemplos de impossibilidade legal do objeto as cessões de créditos e de posições contratuais emergentes de contratos inválidos, ou com um contrato-promessa relativo à futura celebração de um negócio jurídico que não pode ser validamente concluído;
IV. Não contrariedade à ordem pública e ausência da ofensa aos bons costumes: A ordem pública corresponde ao conjunto, variável no tempo, dos princípios fundamentais que, dada a sua relevância, prevalecem sobre a autonomia privada. Já os bons costumes abrangem o conjunto das regras éticas aceites pelas pessoas honestas, corretas e de boa fé, num dado lugar e num certo momento;

107
Q

Consequências da inobservância dos requisitos a que deve obedecer o objeto negocial

280º; 227º.

A

A infração de um dos requisitos do objeto negocial previstos no Art. 280o do CC implica a nulidade do negócio jurídico, independentemente de as partes conhecerem ou deverem conhecer o vício. Acresce que, se se verificarem os requisitos previstos no Art. 227o do CC, o culpado enfrentará a responsabilidade pré-
negocial.

108
Q

Elementos acidentais dos negócios jurídicos (cláusulas acessórias típicas ou gerais): Condição, natureza e importância da estipulação negocial

270º.

A

As noções de condição suspensiva e de condição resolutiva constam do Artigo 270º CC: subordinação
pelas partes a um acontecimento futuro e incerto
: ou a da produção dos efeitos do negócio jurídico (condição suspensiva) ou da resolução dos mesmos efeitos (condição resolutiva).

Quanto à natureza da estipulação condicional, trata-se de uma vontade hipotética, embora atual e efetiva, exteriorizada numa declaração única e incindível.
Por fim, quanto à razão de ser e importância prática da condição, representa uma superação da incerteza objetiva do futuro, através de um regulamento de interesses apto a, em qualquer hipótese, realizar a representação que os sujeitos têm do seu interesse. Numa especial modalidade (condição potestativa a parte creditoris) permite influir sobre o comportamento de outrem.

109
Q

Classificação das condições

2232º; 2233º; 271º; 2230º; 967º.

A
  • I. Condições suspensivas e condições resolutivas: Na primeira, a verificação do evento conduz à produção de efeitos do negócio, não tendo estes lugar de outro modo. Já na segunda, a ocorrência do acontecimento leva à destruição dos efeitos negociais;
  • II. Condições potestativas, casuais e mistas: O evento condicionante pode resultar da vontade de uma das partes (potestativa), ser natural ou provir de terceiros (casual) ou de ambos (misto – por exemplo, uma das partes casar, uma vez que não depende só da sua vontade). Por sua vez, as condições potestativas são arbitrárias se o evento resulta de um puro querer insignificante (por exemplo, dou-te x se quiseres ou se levantares a mão), e não arbitrárias se está em causa um facto sério ou grave (por exemplo, dou-te x se fores ao Brasil). Por outro lado, podem ser a parte creditoris ou a parte debitoris, conforme o evento condicionante constitua um ato do credor ou do devedor;
  • III. Condições possíveis, impossíveis e ilícitas: Sempre que o evento em causa não se puder realizar por ser física ou ilegalmente impossível ou contrário à lei, à ordem pública ou aos bons costumes, a condição respetiva terá a qualificação correspondente. Note-se, no entanto, que a condição respeitante a um facto ilícito será lícita se desincentivar à prática desse ato. Do mesmo modo, ainda que se refira a um facto lícito, a condição pode ser ilícita por força do seu nexo com o restante conteúdo do negócio, como ocorre com as condições restritivas da liberdade, isto é, aquelas que visem restringir a liberdade do sujeito (Arts. 2232o e 2233o do CC). De acordo com o regime geral, a aposição de uma condição ilícita ou de uma condição suspensiva impossível implicam a nulidade de todo o negócio, uma vez que se presume ser essa a vontade das partes (mesmo que assim não seja, nada as impede de celebrarem um novo negócio). Já a condição resolutiva impossível conduz à mera nulidade da cláusula condicional (Art. 271o do CC), operando-se como se o evento em causa nunca tivesse ocorrido. No caso das liberalidades (testamento – Art. 2230o CC - e doação – Art. 967o do CC), a condição impossível ou ilícita considera-se não escrita, mantendo-se a validade do negócio, a menos que, no caso da condição impossível, o disponente prefira a nulidade total. Para a condição ilícita, este regime é imperativo para se afastar a possibilidade de o beneficiário do negócio ser encorajado a praticar um ato ilícito pelo desejo de beneficiar da liberalidade;
  • IV. Condições positivas e negativas: Nas primeiras, o evento condicionante consiste na alteração de um estado de coisas anterior, enquanto nas segundas a condição traduz-se na não alteração de uma situação preexistente;
  • V. Condições perplexas e não perplexas: Nas primeiras, que são nulas, o evento condicionante é incompatível com o efeito jurídico querido (por exemplo: A doa um prédio a B, sob condição de o ter vendido primeiro a C);
110
Q

Termo: conceito

A

O termo é uma cláusula acessória típica pela qual a existência dos efeitos de um negócio são postas na dependência de um acontecimento futuro mas certo, de tal modo que os efeitos só começam ou se tornam exercitáveis a partir de certo momento (termo suspensivo ou inicial) ou começam desde logo, mas cessam a partir de certo momento (termo resolutivo ou final).

111
Q

Te

Termo: Modalidades

808º; 801º e ss.; 804º e ss.

A

I. Termo inicial/suspensivo/dilatório e termo final/resolutivo/peremptório: O termo suspensivo leva a que os efeitos do negócio só comecem ou se tornem exercitáveis a partir de certo momento. O termo resolutivo leva a que os efeitos, que se fazem sentir desde logo, cessem a partir de determinada altura;
II. Termo certo e incerto: O termo é certo quando se sabe antecipadamente o momento exato em que se verificará e incerto quando esse momento é desconhecido. O período de tempo que decorre entre a realização do negócio e a ocorrência do termo designa-se prazo;
III. Termo expresso/próprio e termo tácito/impróprio: O termo é expresso quando existe por vontade das partes, e impróprio quando existe por imposição legal;
IV. Termo essencial e não essencial: O termo essencial, que pode ser fixado no momento da celebração do negócio ou só posteriormente (Art. 808o do CC), leva a que, ultrapassada a data prevista pelas partes ou pela lei para a realização da prestação, esta passa a ser equiparada a uma prestação impossível (Arts. 801o e ss. do CC). Quando o término do prazo não implica a impossibilidade da prestação, mas apenas a constituição de mora do devedor, o termo é não essencial (Arts. 804o e ss. do CC);

112
Q

Capítulo III

Modo, encargo ou cláusula modal: conceito

963º; 2244º; 963º/n2; 2071º; 2276º CC

A

É uma cláusula acessória típica dos contratos de doações e liberalidades, através da qual o disponente
impõe ao beneficiário um encargo
, isto é, a obrigação de adotar certo comportamento em seu interesse, do disponente ou de terceiro (Arts. 963o e 2244o do CC).
O encargo não deve exceder os limites do valor da coisa ou do direito doado (Arts. 963o, no2 do CC no caso das doações, 2071o do CC no caso dos herdeiros e 2276o do CC no caso dos legatários).

113
Q

capítulo IV

Cláusula penal: conceito

810º

A

A cláusula penal, que pode ser aposta aos contratos no momento da celebração ou posteriormente, permite às partes convencionar antecipadamente certa prestação, em regra uma quantia em dinheiro, que o devedor deverá realizar ao credor em caso de incumprimento ou cumprimento defeituoso da sua obrigação (cláusula penal compensatória) ou mora (cláusula penal moratória). Trata-se, então, de uma obrigação acessória à principal, pelo que se esta for nula aquela também o será (Art. 810o do CC).

114
Q

Espécies de cláusulas penais

810; 811/n2 e 3; 810/n1; princípio da liberdade contratual;

A

I. Cláusula de fixação antecipada da indemnização (Art. 810o, no1 do CC): Ao estipulá-la, as partes visam apenas liquidar antecipadamente o dano futuro, de modo a evitar os litígios, despesas e demoras inerentes a uma avaliação judicial da indemnização. Assim, o credor não poderá optar pela indemnização nos termos gerais em vez da prevista no negócio jurídico (Art. 811o, no2 e 3 do CC), já que tal seria frustrar a expectativa do devedor ao subscrever a cláusula. Por outro lado, o devedor só será obrigado a pagar a soma pré-estabelecida se existir um dano na esfera jurídica do credor que lhe seja imputável por dolo ou mera culpa. Esta cláusula comporta as mesmas vantagens e desvantagens para o credor e para o devedor, uma vez que ambos se submetem ao risco de o prejuízo efetivo ser consideravelmente menor ou maior do que a soma prevista;
II. Cláusula penal puramente compulsória: Tem uma finalidade meramente coercitiva, acrescendo à execução específica da prestação ou à indemnização pelo não cumprimento (não a substituindo, portanto). Assim, não se destina a reparar qualquer dano, mas apenas a pressionar o devedor ao cumprimento da obrigação principal. Note-se ainda que a legitimidade desta figura não decorre do Art. 810o, no1 do CC, mas do princípio da liberdade contratual;
III. Cláusula penal em sentido estrito: Distingue-se da cláusula de fixação antecipada da indemnização por visar compelir o devedor ao cumprimento, e da cláusula penal puramente compulsória por substituir a indemnização. Assim, em vez de reclamar a prestação devida a partir do momento do incumprimento, o credor passa a poder exigir uma outra, que substitui a primeira;

115
Q

Capítulo V

Cláusulas limitativas e de exclusão de responsabilidade civil: conceito

A

Cláusulas limitativas de responsabilidade são estipulações através das quais os contraentes, no
momento da celebração do contrato – ou posteriormente, desde que antes da verificação do facto gerador da responsabilidade – acordam em limitar, de alguma forma, a responsabilidade do devedor pelo não cumprimento, cumprimento defeituoso ou mora das obrigações assumidas. A limitação da responsabilidade verificar-se-á, quer condicionando-a a determinado grau de culpa, quer limitando-a no seu montante.

116
Q

Capítulo VI -

O problema da pressuposição ou da alteração das circunstâncias que fundaram a decisão de contratar: conceito

A

Sempre que uma pressuposição de um dos declarantes não se verifica por este não ter considerado a evolução do circunstancialismo ocorrida, estamos perante uma alteração das circunstâncias do negócio.
A pressuposição consiste na convicção, consciente ou subconsciente, da verificação futura de uma certa circunstância, determinante na celebração do contrato ou, pelo menos, nos termos em que foi concluído. As partes – ou apenas uma delas – tiveram como certa verificação de um dado acontecimento ou estado de coisas e, por isso, contrataram. Se lhes ocorresse a possibilidade de falhar tal circunstância pressuposta, não teriam contratado sem inserir no negócio uma cláusula correspondente (por exemplo: uma cláusula condicional). Daí que a pressuposição tenha já sido caraterizada como uma condição não desenvolvida ou não explicitada ou como reserva virtual.

117
Q

Critérios de relevância da alteração da base do negócio

A

Sempre que não exista nos contratos uma cláusula de hardship, que solucione previamente o
problema, surge a questão de saber em que condições é que a alteração das circunstâncias que fundaram a decisão de contratar deve conduzir à modificação ou resolução do negócio.
Inicialmente, o Código de Seabra nada dizia acerca desta questão, tendo-se formulado a teoria da imprevisão, de acordo com a qual os contratos celebrados em dado ambiente económico e social podem ser resolvidos ou modificados se esse ambiente se alterar radical e imprevisivelmente.
O CC foi sensível a esta exigência de justiça, que aponta no sentido de às partes ser facultada a possibilidade de operarem uma extinção ou modificação das suas vinculações em certos casos de não verificação da pressuposição. Com efeito, o Art. 437o, no1 do CC dispõe que “se as circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar tiverem sofrido uma alteração anormal, tem a parte lesada direito à resolução do contrato, ou à modificação dele segundo juízos de equidade, desde que a exigência das obrigações, por ela assumidas, afete gravemente os princípios da boa fé e não esteja coberta pelos riscos do próprio contrato”. Esta norma concede como solução para obviar a uma situação injusta, a possibilidade resolução ou modificação do contrato. Os pressupostos da aplicação dessa solução são definidos através das seguintes exigências: alteração anormal das circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar; manutenção do conteúdo contratual afetando gravemente os princípios da boa fé e não estando abrangida pela própria via do contrato. Neste sentido, a alteração das circunstâncias deve ser uma alteração anormal e com consequências tais que a exigência do cumprimento inalterado implicaria, cumulativamente, uma ofensa aos princípios da boa fé e a imposição de uma situação que não corresponderia aos riscos do próprio contrato. Importa referir que:
I. Desde logo, o fundamento da resolução ou modificação do contrato não se limita à excessiva onerosidade superveniente da prestação, mas estende-se a outros casos em que esse resultado igualmente se legitime;
II. Também não se pode considerar acolhida no CC a doutrina da pressuposição nos termos em que foi exposta por Windschied, que levaria à revogação do negócio sempre que a pressuposição fosse reconhecível para a outra parte. Tal solução facilitaria demasiado a extinção do contrato, com agravo para a segurança jurídica e a justiça;
III. A mesma apreciação negativa deve ser feita à doutrina da base negocial, de P. Oertmann: a eficácia dos negócios jurídicos está ligada à subsistência da sua base, entendendo-se por base negocial as representações de cada uma das partes sobre a existência de certas circunstâncias consideradas como basilares, desde que a outra parte as reconheça como importantes, sem as contradizer. Esta doutrina, que já representa um avanço em relação à de Windscheid, no sentido de uma maior estabilidade contratual, é ainda assim insatisfatória;
Manuel de Andrade considerava que a pressuposição deficiente só seria relevante quando conhecida
ou cognoscível pela outra parte no momento da conclusão do negócio, e desde que se provasse que esta aceitaria ou deveria aceitar de acordo com a boa fé a proposta de condicionar o contrato à verificação da circunstância pressuposta. A contraparte deveria aceitá-lo de boa fé se a alteração ocorrida transformar a ligação entre as partes numa “grosseira não relação” por o sentido da troca de prestações já não fazer sentido.
Assim, é necessária uma solução compromissória, que tutele as expetativas dos contraentes na conservação do contrato e tenha em conta que qualquer negócio jurídico envolve um risco expectável, mas que não ignore que as alterações sociais e humanas ocorridas medio tempore podem alterar radicalmente o conteúdo e a relevância do contrato.

118
Q

Consequências

A

Verificados os requisitos previstos no Art. 437o, no1 do CC, o lesado tem direito à resolução ou modificação do contrato segundo juízos de equidade. Ainda assim, a contraparte pode opor-se ao pedido de resolução, desde que aceite a referida modificação segundo juízos de equidade (Art. 437o, no2 do CC).
De acordo com a doutrina, este regime parece só ser aplicável aos contratos que ainda não foram completamente cumpridos. Ainda assim, Larenz entende que pode também ser aplicado cumprido o contrato, quando o seu fim só se realiza no futuro. Por exemplo, nos contratos translativos de propriedade, o fim do objeto alienado após a transferência do direito pode levar à colisão entre o regime do risco (Art. 796o, no1 do CC) e o disposto no Art. 437o, no1 do CC.

119
Q

Subtítulo IV

Ineficácia e invalidade dos negócios jurídicos
Ineficácia dos negócios jurídicos (lato sensu). Noção. Ineficácia stricto sensu e invalidade. Outras formas de ineficácia em sentido lato

A

Um negócio é ineficaz em sentido amplo quando não produz, no todo ou em parte, os efeitos que tenderia a produzir de acordo com as declarações das partes, por impedimento decorrente do ordenamento jurídico. Por sua vez, a ineficácia em sentido estrito provém de uma circunstância extrínseca que, em conjunto com o negócio, produz de efeitos jurídicos.
A ineficácia pode ocorrer por força de eventos posteriores à formação do negócio, dando origem a figuras como a resolução, revogação, caducidade ou denúncia.
Já a invalidade constitui apenas as ineficácias originadas pela falta ou irregularidade dos elementos internos do negócio e, portanto, por um vício contemporâneo à sua formação.

120
Q

Modalidades da ineficácia em sentido estrito

A

I. Ineficácia absoluta e relativa: A ineficácia absoluta atua automaticamente, erga omnes, podendo ser invocada por qualquer interessado. Já a ineficácia relativa admite que o negócio em causa produza os seus efeitos, salvo relativamente a certas pessoas, apenas podendo ser invocada por elas, uma vez que são titulares de um direito, interesse legítimo ou expectativa que de outra forma seriam prejudicados;
II. Ineficácia total e parcial: O vício pode impedir a produção de todos os efeitos (total) ou apenas de alguns efeitos negociais (parcial);

121
Q

Inexistência e invalidade (nulidade e anulabilidade) dos negócios jurídicos
Inexistência e invalidade

A

A inexistência é uma figura autónoma que resulta da não verificação do corpus do negócio jurídico que se pretendia celebrar, tendo consequências mais graves do que a nulidade e a anulabilidade, uma vez que estas pressupõem que o negócio exista, ainda que com algum defeito. Esta surgiu na doutrina francesa para os casos de casamento entre pessoas do mesmo sexo ou cujo consentimento não tinha sido prestado perante um funcionário do registo civil.
Alguns autores contestam a legitimidade desta figura, defendendo que todas as hipóteses deviam ser enquadradas na nulidade ou na inexistência material. Já Manuel de Andrade discordava, uma vez que existem casos em que nem certos efeitos secundários do negócio devem ocorrer (daí não se tratar de nulidade), ainda que exista a aparência da materialidade correspondente à noção do negócio em causa (pelo que não está em causa a inexistência material).
Assim, o nosso CC prevê várias hipóteses de inexistência jurídica no casamento (Art. 1628o CC), que podem ser invocadas por qualquer pessoa e a todo o tempo (Art. 1630o do CC). Diversamente dos casamentos anulados, estes não produzem qualquer efeito, nem sequer os de casamento putativo. Ainda assim, o diploma não é explícito quanto à admissibilidade da inexistência como categoria geral, ainda que esta pareça resultar dos Arts. 245o e 246o do CC, pelo menos nos casos de falta de vontade de ação ou de coação física.

122
Q

Nulidade e anulabilidade. Invalidades mistas

A

O negócio nulo não produz os efeitos a que tendia desde o início (ab initio), em virtude da falta ou
vício de um elemento interno ou formativo. Já nos negócios anuláveis, a falta ou vício de um elemento não impede a sua eficácia até que o tribunal julgue procedente uma ação de anulação, o que destrói retroativamente os seus efeitos. Esta diferença justifica-se porque no primeiro caso está em causa um interesse público preponderante, enquanto no segundo se tutelam interesses particulares.
Por vezes, a lei estabelece invalidades de caráter misto, de modo a que a solução seja mais adequada aos interesses em causa.

123
Q

** A invalidade e outras formas de cessação dos efeitos negociais (resolução, revogação, caducidade e denúncia)**

A

I. Resolução: Os contratos podem ser resolvidos, por força de lei ou por estipulação convencional (cláusula resolutiva - Art. 432o do CC), com base na frustração das legítimas expetativas de uma das partes provocada por um facto natural, social ou provocado pela contraparte e ocorrido após a celebração. Em geral, os seus efeitos inter partes são os mesmos da nulidade e da anulabilidade (Art. 433o do CC). No entanto, enquanto a invalidade opera automaticamente (nulidade) ou mediante ação judicial (anulabilidade), a resolução pode ocorrer através de declaração à contraparte (Art. 436o do CC). Para além disso, a resolução tem efeito retroativo inter partes à semelhança da invalidade, mas aqui com os requisitos de essa ser a vontade das partes, de tal não contrariar a sua finalidade e com a exceção dos contratos de execução continuada ou periódica. Finalmente, ao contrário da invalidade, nos contratos resolvidos preservam-se os direitos adquiridos por terceiro antes do registo da ação de resolução (Art. 435o do CC). Ainda assim, no caso de se verificar a condição resolutiva aposta ao contrato em causa, os atos de disposição dos bens ou direitos que são objeto do negócio praticados pelo credor condicional perdem eficácia, pelo que a retroatividade se verifica mesmo em relação a terceiros (Art. 274o do CC);
II. Revogação: Extingue os efeitos do negócio jurídico para o futuro (ex nunc), não opera, portanto, retroativamente. Pode ser levada a cabo por apenas uma das partes nos casos em que a lei o autorize, ou por comum acordo mediante um contrato extintivo ou abolitivo, que pode ter eficácia retroativa inter partes (Art. 406o, no1 do CC). Dependendo dos casos, esta faculdade é conferida pela lei ad libitum ou com base em determinados pressupostos;
III. Caducidade: Leva à extinção ex nunc de relações jurídicas duradouras de tipo obrigacional ou de atos de eficácia suspensa (por exemplo: testamento) por força do decurso de um prazo estipulado, da conquista do fim visado ou de qualquer outro evento superveniente ao qual a lei atribua este efeito extintivo;
IV. Denúncia: É a faculdade de um contratante fazer cessar a sua relação contratual ou obrigacional em sentido amplo, através de uma mera declaração. Nos contratos de duração por tempo indeterminado, esta é ad nutum ou ad libitum, não sendo necessária qualquer justificação, já que um vínculo demasiadamente duradouro comprometeria a liberdade dos sujeitos. Se assim não fosse, estes negócios estariam a contrariar a ordem pública, sendo nulos por força do Art. 280o do CC. Ainda assim, para se evitarem os perigos para a contraparte decorrentes de uma denúncia intempestiva, é necessário um pré-aviso, com antecedência variável de acordo com as circunstâncias do caso concreto;

124
Q

O problema da redução dos negócios jurídicos

A

Trata-se de saber se, no caso de o fundamento de invalidade se relacionar apenas com uma parte do conteúdo negocial, a restante deve manter-se válida, verificando-se uma redução do negócio, ou se este deve ser nulo ou anulável na totalidade.
De acordo com o critério da vontade hipotética ou conjetural das partes, deve averiguar-se aquilo que estas teriam querido se soubessem que o negócio continha cláusulas ilícitas, não podendo ser celebrado validamente na sua totalidade. Em caso de dúvida nesta avaliação casuística, a doutrina tradicional defende a redução, em nome do princípio pacta sunt servanda, enquanto outros autores defendem a invalidade total, já que os negócios exigem sempre uma base volitiva.
Em Portugal, o legislador determina que os negócios parcialmente nulos ou anuláveis devem ser reduzidos, a menos que um dos contraentes prove que o negócio não teria sido concluído sem a parte viciada (Art. 292o do CC). Assim, estabelece-se uma presunção de divisibilidade do negócio sob o ponto de vista da vontade das partes, bem como uma ideia de proporcionalidade entre o vício e a sanção (se a nulidade é parcial, a sanção deve afetar parcialmente o negócio).
Ainda assim, há casos nos quais a redução ocorre mesmo que se prove que a vontade hipotética das partes era no sentido oposto, nomeadamente quando a boa fé assim o imponha (Arts. 239o, 762o e 334o do CC). O mesmo se verifica quando a invalidade parcial resulta da infração de uma norma destinada a proteger uma parte contra a outra, já que só assim se prosseguirá o fim da prescrição violada (redução teleológica).
Já no caso dos contratos de adesão parcialmente nulos, o aderente pode optar pela sua manutenção, vigorando na parte afetada as normas supletivas aplicáveis. Se o aderente não usufruir desta faculdade ou se dela resultar um grave desequilíbrio de prestações, segue-se o regime geral, admitindo-se a prova de uma vontade hipotética contrária à redução.
Finalmente, também o consumidor tem o direito de optar pela manutenção de um contrato parcialmente inválido.

125
Q

O problema da conversão dos negócios jurídicos

A

Trata-se de saber se o negócio declarado nulo ou anulado não produzirá quaisquer efeitos ou se, os seus materiais podem ser utilizados para a reconstituição de um outro negócio cujo resultado final, embora mais precário, se aproxime do visado pelas partes com a celebração do contrato inválido (por exemplo: conversão da doação de um prédio na doação do respetivo valor).
No Art. 293o do CC, o legislador português segue a doutrina maioritária, admitindo a conversão, desde que o negócio inválido compreenda os requisitos materiais e formais (capacidade, objeto e vontade) necessários à validade do negócio sucedâneo. Para além disso, é necessária a prova de que que as partes teriam querido o negócio sucedâneo se se tivessem apercebido do vício do negócio principal, isto é, de que na falta de obtenção do resultado económico completo, teriam pretendido ao menos alcançá-lo parcialmente. Assim, as consequências económicas do negócio sucedâneo não podem exceder os efeitos visados com o negócio inválido. Há ainda quem defenda que o negócio sucedâneo deve dizer respeito ao mesmo objeto material que o principal, isto é, que a vontade hipotética das partes se deve inferir da finalidade do negócio primeiramente celebrado. No entanto, parece bastar a prova de uma vontade conjetural no sentido da conclusão do segundo negócio, mesmo que nada no seu conteuúo tenha sido acordado anteriormente. Se a boa fé o exigir, a conversão deverá ter lugar independentemente da vontade hipotética das partes (Arts. 239o e 334o do CC).

126
Q

A conversão e certas figuras próximas

A

I. A conversão e a validade do negócio dissimulado na simulação relativa: O negócio dissimulado é realmente querido, enquanto o negócio sucedâneo, na conversão, corresponde apenas à vontade hipotética das partes;
II. A conversão dos negócios nulos ou anuláveis e a chamada conversão formal dos negócios jurídicos: Na última, aproveita-se um documento, nulo para a finalidade com que foi escrito, como documento menos solene (por exemplo: uma escritura pública nula é aproveitada como documento particular);
III. A conversão e negócios jurídicos com vontade alternativa: Nos segundos, as partes preveem, aquando da celebração, a possibilidade da sua nulidade ou ineficácia, manifestando a vontade de, se assim for, valer outro negócio de conteúdo diverso;