Direito Penal Flashcards

1
Q

Vertentes do principio da legalidade

A

O princípio da legalidade (art. 1º, CP e 29º, CRP) assume diversas vertentes:
- Exigência de lei escrita (reserva de lei)
- Exigência de lei certa (tipicidade e proibição de normas penais em branco)
- Exigência de lei estrita (proibição de analogia in malem partem)
- Exigência de lei prévia (proibição de retroatividade in malem partem)

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2
Q

Fundamentos externos do principio da legalidade

A

Fundamentos externos, ou seja, ligados à conceção fundamental do Estado, dentro dos quais se encontram:
Princípio liberal
Princípio democrático e da separação de poderes

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3
Q

Fundamentos internos do principio da legalidade

A

Fundamentos internos, isto é, de natureza especificamente jurídico-penal, nomeadamente a ideia de prevenção geral e o princípio da culpa, sendo que não se pode esperar que a norma cumpra a sua função motivadora do comportamento da generalidade dos cidadãos se estes não puderem saber, através de lei anterior, estrita e certa por onde passa a fronteira que separa os comportamentos criminalmente puníveis dos não puníveis. Também não seria legitimo censurar alguém por ter acuado de certa maneira se uma lei com aquelas características não considerasse o comportamento respetivo como crime.

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4
Q

Reserva de lei

A

O fundamento do princípio da legalidade impõe que as normas penais que ampliem a incriminação ao afetarem a segurança e as liberdades individuais, sejam aprovadas pelo Parlamento ou pelo Governo, desde que com autorização legislativa, face ao art. 165º/1, al. b) e c) da CRP.

O art. 165º/1, al.c), apenas se refere à definição de crimes, penas e medidas de segurança e respetivos pressupostos (normas penais positivas), pelo que surge a questão de saber se existem outras normas abrangidas pela reserva de lei.

A reserva de lei abrange, segundo a professora MFP:
Normas penais positivas: ou seja, a criação de penas, crimes, mas também circunstâncias agravantes.
Descriminalização
Causas de justificação de direito excecional: causas de justificação que abrem uma exceção, de modo que a sua previsão afeta expectativas gerais e diminui a liberdade e a segurança dos cidadãos. Exemplo: o legislador alargar as situações em que as escutas telefónicas são permitidas.
Regime geral das contraordenações

Não estão abrangidas as causas de justificação de direito geral, sendo que estas consagram um princípio geral da ordem jurídica, sendo por isso de direito geral. Não é necessário reserva de lei, na medida em que o legislador está apenas a corporizar direitos latentes no ordenamento jurídico. Exemplo: legítima defesa

Relativamente às circunstâncias atenuantes, é desnecessária a reserva de lei, sendo que a sua atipicidade resulta do art. 72º do CP.

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5
Q

Exigência da lei certa

A

Segundo o principio da determinação das normas penais incriminadoras, todos os pressupostos da incriminação e da responsabilidade penal têm de estar descritos na lei, não sendo admitidas as leis penais em branco. Este conteúdo das normas penais implica que estas sejam descrições de tipos, ou seja, determinações do conteúdo de certas imagens sociais relativamente concretas de comportamentos humanos que prefigurem com exatidão o âmbito do proibido e a respetiva consequência.

Importa, portanto, que a descrição da matéria proibida e de todos os outros requisitos de que depende em concreto uma punição seja levada ate um ponto em que se tornem objetivamente determináveis os comportamentos proibidos e sancionado e consequentemente que se torne objetivamente motivável e dirigível a conduta dos cidadãos.

O mesmo principio justifica a existência dos tipos legais de crime, surgindo o conceito de tipicidade. Deste modo, nenhum comportamento humano pode ser considerado criminoso se não corresponder a um tipo legal de crime, descrito com precisão por um preceito legal.

É de notar que é inevitável que a formulação dos tipos legais não consiga renunciar à utilização de conceitos indeterminados e clausulas gerais e de formulas gerais de valor. Contudo, é indispensável que a sua utilização não obste à determinabilidade objetiva das condutas proibidas e demais requisitos da punibilidade requeridos. Ou seja, a exigência de lei certa vincula o legislador, exigindo-lhe que seja o mais exato e preciso possível dentro do âmbito de inexatidão que a linguagem permite.
Ou seja, tem que ser claro para o destinatário da norma se pode ou não realizar determinado comportamento e tem que ser claro para o julgador qual é o parâmetro através do qual vai avaliar se o cidadão cometeu um lícito ou um ilícito.

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6
Q

normas penais em branco

A

um dos problemas associados à exigência de lei certa é o das normas penais em branco.

Quando falamos em normas penais em branco, estamos a referir-nos a situações de cisão entre a norma de comportamento e a norma de sanção, sendo que a norma está em branco em relação ao comportamento, ou seja, não define completamente qual é o comportamento sujeito à sanção. Não define porque remete parte dessa definição para outra instância normativa, ou, não remetendo, é outra instância normativa que se arroga dessa competência.

Uma decorrência da reserva de lei é a proibição de normas penais em branco, no entanto, importa determinar em que medida é que uma norma penal em branco viola o principio da reserva de lei, sendo que a remissão de uma norma para outras não é em si mesma obstáculo ao respeito da legalidade, mas sim o grau de esvaziamento do conteúdo percetivo e a atribuição da competência para definir o comportamento proibido a leis hierarquicamente inferiores ou até aos atos administrativos.

Há situações em que o núcleo do comportamento proibido pela norma depende totalmente da norma para a qual se remete, não sendo previsível para os destinatários o que deles se espera sem essa norma.
Por outro lado, há casos em que a remissão é puramente para um critério técnico, não estando o objeto da norma remissiva dependente do conteúdo concreto desse critério.

Assim, a distinção entre normas remissivas que violam a reserva de lei e as que são compatíveis com ela depende, sobretudo, de saber se a função da norma penal é estabelecer ou não material e diretamente a fronteira entre o proibido e o permitido.

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7
Q

Acórdão nº 427/95: caso dos aditivos alimentares

A

Neste Acordão, o TC determinou que:
Para que a norma incriminadora seja válida, o que é necessário é que ela contenha o critério de ilicitude, ou seja, é preciso que só através dela se consiga compreender a fronteira entre o licito e o ilícito.
A missão da norma complementadora é a de concretizar tecnicamente o critério material de ilicitude, que já se encontra na norma incriminadora de forma suficientemente orientadora do comportamento dos cidadãos.

O TC concluiu que a norma incriminadora que, definindo o núcleo do ilícito como a inclusão de aditivos num produto alimentar e que remete para uma outra norma que fixava quais os aditivos permitidos, não violava a reserva de lei, porque a proibição estava contida na primeira norma, enquanto proibição de aditivos, e a segunda apenas excluía certas substancias do âmbito da proibição. Ou seja, a descrição feita ela portaria dos aditivos admissíveis era apenas uma concretização do critério legal, através da enumeração de substâncias que são insuscetíveis de afetar a pureza dos produtos, apesar de constituirem aditivos alimentares.

Assim, neste caso, considerou-se como critério decisivo, para a verificação da conformidade constitucional da norma penal remissiva, o caráter inovador ou meramente concretizador da norma complementar.

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8
Q

bem jurídico

A

Regente: condições sociais ou individuais constitucionalmente relevantes para o desenvolvimento das pessoas ou para a continuidade da sociedade democrática.

JFD: expressão de um interesse, da pessoa ou da comunidade, na manutenção ou integridade de um certo estado, objeto ou bem em si mesmo socialmente relevante e por isso juridicamente reconhecido como valioso.

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9
Q

Teoria do bem juridico

A

A teoria do bem jurídico diz-nos que o Estado só pode criar crimes para proteger bens jurídicos.
Se a função do direito penal de tutela subsidiária dos bens jurídico-penais se revela jurídico-constitucionalmente credenciada em qualquer regime democrático e pluralista, então tal deve ter como consequência a de que toda a norma incriminatória na base da qual não seja suscetível de se divisar um bem jurídico-penal claramente definido é nula, por ser materialmente inconstitucional.
Assim, puras violações morais não conformam a lesão de um bem jurídico e não podem, assim, integrar o conceito material de crime.

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10
Q

Basta que haja um bem jurídico?

A

Não é verdade que sempre que exista um bem jurídico digno de tutela penal deva existir uma intervenção penal correspondente. O conceito material de crime é essencialmente constituído pela noção de bem jurídico dotado de dignidade penal, mas a esta noção tem que acrescer ainda outro critério que torne a criminalização legítima: o critério da necessidade/carência de tutela penal.

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11
Q

vertentes do principio da necessidade

A
  • Subsidariedade: como o Direito Penal é a solução mais restritiva de direitos, liberdades e garantias, ele só pode intervir nos casos em que todos os outros meios de política social se revelem insuficientes ou inadequados.
  • Adequação: a criminalização de certos comportamentos não pode ser fator da prática de mais violações do que as que se revela suscetível de evitar, ou seja, a incriminação tem que produzir um efeito efetivo de proteção do bem jurídico e que não tenha custos que superem ou anulem os efeitos dessa proteção.
  • Proporcionalidade stricto sensu: tem que existir uma articulação entre o bem jurídico em causa e a pena.
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12
Q

juízos relevantes no âmbito do conceito material de crime

A

Juízo de merecimento: remete para a dignidade penal do bem jurídico, sendo que só os bens jurídicos dotados de dignidade penal devem gozar de tutela penal.

Juízo de necessidade: remete para a carência de tutela penal.

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13
Q

o que é a dignidade penal

A

juízo valorativo de ressonância ética de comportamento.

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14
Q

Teoria do Harm principle

A

Esta teoria, anglo-americana, vê no crime em sentido material a expressão de um princípio do dano (Harm principle). Este critério determina que apenas as condutas que prejudicam interesses alheios podem ser legitimamente castigadas.

Feinberg introduziu um principio complementar: o offense principle.

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15
Q

Teoria do offense principle

A

De acordo com este critério, os atos que não produzam um dano a interesses alheios podem ser penalmente proibidos se despertarem sentimentos indesejados noutras pessoas, desde que esses sentimentos sejam suficientemente intensos e dificilmente superáveis.

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16
Q

Caso do lenocínio

A

Art. 169º CP: proíbe que alguém profissionalmente ou a titulo lucrativo explore a atividade de prostituição de outra pessoa.

Qual o objetivo desta norma? Proteger quem se prostitui.
Quais são as dimensões dessa pessoa que podem estar em causa? A estar em causa alguma coisa tem que ser a proteção da pessoa que se prostitui face à sua liberdade e autodeterminação sexual. Temos que perceber se a incriminação protege ou não a liberdade sexual.

acordãos importantes: 2004, 2023

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17
Q

Acordão de 2004

A

Alguém insatisfeito com a sua condenação por lenocínio suscitou a inconstitucionalidade da norma. O TC analisou a questão e a relatora disse que a incriminação não era inconstitucional, porque o crime era de perigo abstrato. Os estudos empíricos europeus mostravam que a prostituição não era uma profissão livremente exercida, mas sim por falta de oportunidades de vida, pelo que o que o legislador estava a fazer era prevenir a exploração de pessoas em situações de carência económica ou social.
Se isso não se passar num caso concreto então há um mecanismo a “contraprova do perigo”, ou seja, o agente pode demonstrar no caso concreto que a forma como fazia o lenocínio não causava perigo à pessoa em questão.
O TC durante bastante tempo considerou que não havia qualquer problema e alguns dados estáticos reforçaram essa posição.

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18
Q

Acordão 2023

A

Tanto há casos em que o comportamento põe em causa a liberdade sexual da pessoa, como há casos em que tal não acontece, porque a pessoa aceita o lenocínio livremente, pelo que a norma incriminadora é inconstitucional, porque abrange ambos os casos.
O crime de lenocínio foi julgado insconstitucional num caso concreto e agora o TC tem que decidir qual das orientações está correta.

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19
Q

Se o lenocínio for realizado em condições que não põem em causa a liberdade sexual da pessoa que se prostitui, a incriminação continuará a ser legitima?

A

Acórdão de 2004: O TC veio dizer que sim, com base na ideia de crime de perigo abstrato e na legitimidade dos crimes de perigo abstrato. Veio dizer que apesar do tipo incriminador não fazer referência a uma situação concreta da pessoa que se prostitui (não exige uma ação idónea a colocar em perigo a sua liberdade sexual), o perigo é o fundamento da incriminação. O que levou o legislador a criar o crime foi o facto de o mundo da prostituição ser um mundo de exploração de necessidades sociais e económicas, o que torna legitima a incriminação.

Acordão de 2023: Esta linha vem dizer que se a norma é demasiado inclusiva e há comportamentos que são realizados e metem em risco a liberdade sexual, mas outros não, então a norma é inconstitucional e não tem verdadeiramente um bem jurídico. Há um principio implícito no bem jurídico no art. 18º/2 da CRP.

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20
Q

Questão do bem jurídico relativamente ao lenocínio

A

existir um bem jurídico tutelado seria o da liberdade e da autodeterminação sexual.

O acórdão do TC n.º 144/2004 refere que a opção do legislador em ter suprimido a expressão mencionada não significa que não se mantenha o objetivo de evitar que se verifiquem tais situações, porque estas, demonstram estudos empíricos, estão normalmente associadas ao fenómeno da prostituição. Porém, ser um elemento implícito ou constituir o objetivo (ratio) da norma não é o mesmo. No primeiro caso, o elemento tem de se provar, no segundo, presume-se a sua existência.

No acórdão de 2023, o TC considerou que não existia nenhum bem jurídico a tutelar, atendendo ao facto de que pode existir liberdade sexual e lenocínio simultaneamente, sem que a primeira seja violada.

A maioria da doutrina propugna pela inconstitucionalidade da norma em questão que se tornou numa norma que não tutela nenhum bem jurídico, tutelando, ao invés, bens de caráter transpessoal conotados com uma certa ideia de pudor e de moralidade, que escapam do âmbito de intervenção do Direito Penal.

JFD: Tendo o legislador ordinário eliminado a exigência típica de que o favorecimento da prostituição se ligasse “à exploração de situações de abandono ou necessidade económica” eliminou também a ligação do comportamento ao bem jurídico da liberdade e da autodeterminação sexual e tornou-se de duvidosa fidelidade ao principio do direito penal do bem jurídico. Só com a expressão que foi suprimida o facto se poderia referir ao bem jurídico da liberdade ou autodeterminação sexual da prostituta. Sem essa expressão, a ligação perdeu-se, surgindo a incriminação referida à tutela de meras situações todas pelo legislador como imorais. A incriminação tornou-se materialmente inconstitucional.

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21
Q

culpa

A

A doutrina penal entende que do princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, CRP) decorre o princípio da culpa. A ideia é de que como o direito penal tem as consequências mais gravosas, seria contrário à dignidade da pessoa humana impô-las quando a pessoa que cometeu o crime não tem culpa.

A culpa apresenta dois elementos:
Conhecimento/elemento cognitivo, ou seja, é preciso que a pessoa saiba ou deva saber que o comportamento que está a realizar é ilícito;
elemento volitivo, ou seja, é preciso que a pessoa possa escolher livremente entre o lícito e o ilícito, podendo não ter essa capacidade de escolha.
Assim, tenho que saber o que é o ilícito e tenho que poder não o realizar. (Exemplo: normalmente, as psicoses excluem a culpa). O direito penal tende a regular o que acontece aos inimputáveis.

Como os graus de culpa são variáveis, então as penas fixas estarão proibidas. Por isso é que no CP, relativamente às penas, encontramos sempre um intervalo entre o limite mínimo e o limite máximo: a moldura penal.

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22
Q

teorias relativas (prevenção)

A

Estas teorias também reconhecem que a pena se traduz num mal para quem a sofre, contudo, como elemento político-criminal destinado a atuar no mundo, a pena não pode bastar-se com essa característica, em si mesma destituída de sentido social-positivo. A pena tem que utilizar desse mal para alcançar a finalidade da política criminal, a prevenção criminal.

Neste âmbito há que distinguir entre prevenção geral e prevenção especial.

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23
Q

prevenção geral

A

estas teorias concebem a pena como instrumento político-criminal destinado a atuar sobre a generalidade dos membros da comunidade, afastando-os da prática de crimes através da ameaça penal estatuída pela lei, da realidade da sua aplicação e da efetividade da sua execução.

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24
Q

distingue entre prevenção geral positiva e negativa

A

Prevenção geral positiva: pena concebida como forma de que o Estado se serve para manter e reforçar a confiança da comunidade na validade e na força de vigência das suas normas de tutela de bens jurídicos e, assim, no ordenamento jurídico-penal.

Prevenção geral negativa: pena concebida como forma estatalmente acolhida de intimidação das outras pessoas através do sofrimento que com ela se inflige ao delinquente e cujo receio as conduzirão a não cometerem factos puníveis.

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25
prevenção especial
a pena é vista como um instrumento de atuação preventiva sobre a pessoa do delinquente de modo a evitar que, no futuro, este cometa novos crimes.
26
distingue entre prevenção especial positiva e negativa
Prevenção especial positiva: a finalidade da pena traduz-se apenas na prevenção da reicindência, procurando-se criar as condições necessárias para que o delinquente possa, no futuro, continuar a viver a sua vida sem cometer crimes. Procura-se a reinserção social do delinquente. Prevenção geral negativa: a pena visa intimidar o delinquente até um ponto em que ele não repita no futuro a prática de crimes ou então procura neutralizar a perigosidade social do delinquente.
27
teorias absolutas (retribuição)
As teorias absolutas, sendo retrospetivas, determinam que as penas se aplicam pelo facto de ter existido crime, estando, portanto, ligadas essencialmente às doutrinas da retribuição. Para este grupo de teorias, a essência da pena criminal reside na retribuição ou compensação do mal do crime. A pena até pode assumir efeitos reflexos socialmente relevantes, no entanto, nenhum deles se identifica com a sua essência, nem se revela suscetível de a modificar. Assim, a medida concreta da pena com que dever ser punido um certo agente por um determinado facto não pode ser encontrada em função de outros pontos de vista que não sejam o da correspondência entre a pena e o facto.
28
criticas às teorias absolutas
Inadequação à legitimação, fundamentação e ao sentido da intervenção penal; Uma pena retributiva esgota o seu sentido no mal que faz sofrer ao delinquente como compensação do mal do crime, tratando-se de uma doutrina puramente social-negativa, que se revela contrária a qualquer tentativa de ressocialização do agente e de restauração da paz jurídica da comunidade afetada pelo crime;
29
Teorias de Roxin
Roxin defende que a pena serve exclusivamente finalidades de prevenção geral e especial. Para Roxin, a pena é pressuposto da pena e limite inultrapassável da sua medida, mas não é fundamento da mesma. A medida da pena pode ser fixada abaixo desse limite máximo, se tal se tornar necessário à luz de exigências de prevenção especial e a tanto não se opuserem as exigências mínimas de prevenção geral sob a forma das necessidades de tutela do ordenamento jurídico. Ou seja, o princípio da culpa é um limite da pena preventiva, mas não é um dos seus fundamentos, a pena não é retributiva. A teoria deste autor baseia-se em 3 momentos: Momento da criação da moldura penal Momento da condenação Momento da execução da pena A função preventiva geral exerce-se no primeiro e segundo momento, sendo que a lógica de Roxin é a de que quando o legislador cria normas de comportamento e lhes associa penas, está subjacente um efeito de prevenção geral. A prevenção especial é preponderante no momento da condenação, mas sobretudo no momento da execução, na medida em que é neste que o condenado vai ser convidado a participar num projeto de reintegração na sociedade.
30
Teoria de JFD
Para JFD, as penas só podem ter natureza preventiva e não retributiva. A finalidade visada pela pena há-de ser a da tutela necessária dos bens jurídico-penais no caso concreto. Tutela de bens jurídicos num sentido prospetivo, traduzido pela necessidade de tutela da confiança e das expectativas da comunidade na manutenção da vigência da norma violada, sendo por isso uma razoável forma de expressão afirmar como fim primário da pena o restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada pelo crime (prevenção geral positiva). Assim, para JFD a prevenção geral positiva é o fim primordial da pena. Para JFD, há uma medida ótima de tutela dos bens jurídicos que a pena se deve propor alcançar, medida que não pode ser excedida por considerações de qualquer tipo, nomeadamente por exigências de prevenção especial. Para além disso, há um limiar mínimo de defesa do ordenamento jurídico, abaixo do qual já não é comunitariamente suportável a fixação da pena sem se pôr em causa a sua função tutelar de bens jurídicos. Assim, é a prevenção geral positiva que fornece uma moldura de prevenção dentro de cujos limites devem e podem atuar considerações de prevenção especial. Tal como Roxin, JFD defende que a culpa não é fundamento da pena, mas constitui o seu pressuposto necessário e o seu limite inultrapassável. Ou seja, a função da culpa é a de estabelecer o máximo de pena ainda compatível com as exigências de preservação da dignidade da pessoa humana e de garantia do livre desenvolvimento da sua personalidade. Para este autor, toda a pena que responda de forma adequada às exigências preventivas e não exceda a medida da culpa é uma pena justa.
31
ideias essencias da teoria do JFD
Toda a pena serve finalidades exclusivas de prevenção, geral e especial. A pena concreta é limitada, no seu máximo inultrapassável, pela medida da culpa. Dentro deste limite máximo, ela é delimitada no interior de uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é o ponto ótimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico. Dentro desta moldura, a medida da pena é encontrada em função de exigências de prevenção especial, em regra positiva.
32
Teoria MFP
Para MFP, não faz sentido afirmar que a pena não deve ser retributiva, quando a primeira necessidade humana que a pena pública satisfaz e a da substituição psicológica da vingança privada. No entanto, a substituição psicológica da vingança privada que a pena assegura enquanto retribuição racionaliza-se através de dois princípios constitucionais: o princípio da culpa (art. 1º e 27º, CRP) e o princípio da necessidade da pena (art. 18º/2, CRP). Assim, a pena retributiva só é legítima se for necessária preventivamente. Para MFP, a culpa, para além de pressuposto e limite, é, então, também fundamento da pena. É a prevenção que vai funcionar como titulo restritivo da pena determinada em função da culpa. É de notar que, nesta teoria, prevalece sobretudo a prevenção especial positiva, na medida em que, para MFP, a prevenção geral positiva pode levar a uma instrumentalização do agente. Para chegar a esta conclusão sobre a culpa, a professora faz uma interpretação sistemática, atendendo aos arts. 71º e 72º do CP, sendo que o legislador penal prevê certas situações em que pode não haver lugar a aplicação de pena, por força da inexistência de culpa. Assim, não pode existir uma contradição sistemática dizendo que a culpa não é fundamento, face a essas normas. HM: esta é a teoria correta, na medida em que se não for a culpa a fundamentar a pena, não é possível diferenciar a pena de outras consequências jurídicas que não são penas, como por exemplo, medidas de segurança. É a função de censura da pena que a distingue e que evidencia a sua dimensão retributiva.
33
Momentos na teoria de MFP
1. Remete para o princípio da culpa, sendo que a moldura concreta da pena é definida em função da culpa. 2. Medida concreta da pena, definida em função das necessidades de prevenção geral e especial, com destaque para a prevenção especial positiva.
34
noção de culpa (MFP)
Capacidade de motivação pela norma e de analisar qual foi o espaço de liberdade que o agente teve para se motivar pela mesma e para agir ou não de acordo com o ordenamento jurídico.
35
Critério do sentido possível das palavras na interpretação do Direito Penal
Para encontrar o sentido da proibição da analogia, a doutrina penal maioritária, onde se encontram MFP e HM, atende ao critério do sentido possível das palavras. Este critério atende ao sentido do texto e não das palavras isoladamente consideradas, sendo que o sentido possível do texto, enquanto limite da interpretação permitida, é o sentido comunicacional perceptível do mesmo.
36
teorias da interpretação da lei penal (castanheira neves)
propõe 4 condições de validade como critério distintivo entre a interpretação proibida e permitida em Direito Penal: A condição legal: necessidade de o concreto juízo incriminatória ter fundamento efetivo numa norma penal positiva. A determinação dogmática dos tipos: necessidade de os tipos legais serem construídos pelo legislador de tal modo que seja possível apreender o núcleo axiológico-normativo. A adequação sistemática: exclui a incoerência sistemática, de modo a que a interpretação anotada para o caso possa ser generalizada relativamente a outros casos sem prejuízo para a coerência do sistema. Garantia institucional: deve haver uma garantia jurisprudencial da unidade do Direito que compete ao STJ. Assim, para Castanheira Neves, a interpretação permitida será não só aquela que caiba no sentido possível das palavras, mas também a que revele os valores jurídicos que a lei pretende atingir e seja compatível com outros valores do sistema e com a unidade do Direito definida pelas instâncias que a devem assegurar.
37
teorias da interpretação da lei penal (MFP)
existem dois momentos importantes na atividade interpretativa em Direito Penal: Em 1º lugar, é necessário definir o sentido possível das palavras, ou seja, olhar para o texto legal em todo o seu conjunto, não analisando cada palavra isoladamente, e perceber, em termos de linguagem comum e daquilo que é o sentido comunicacional do texto, quais os tipos de comportamento que podem ser incriminados através do texto que nos é apresentado pelo legislador. Ou seja, numa primeira fase vamos verificar quais são os vários sentidos possíveis do texto legal, sendo que o sentido possível das palavras é o limite da interpretação da lei penal. Num segundo momento, é necessário atender à essência do proibido (elemento teleológico), sendo que o sentido possível do texto se delimita ainda pela adequação do mesmo à essência do proibido, de acordo com as valorações do sistema que a norma diretamente exprime ou pretende exprimir. Ou seja, temos que perceber se o caso em análise se relaciona com o comportamento que o legislador quis proibir e com o bem jurídico que este quis tutelar.
38
Proibição de analogia
O art. 1º/3 proíbe expressamente a analogia in malem partem, sendo que o fundamento desta proibição reside na exclusividade da competência do parlamento na formulação de normas incriminadoras (reserva de lei), sendo que se os tribunais pudessem recorrer à analogia, formulariam normas incriminadoras que deixariam de ser objeto de controlo democrático. É de notar que este artigo não proíbe expressamente a interpretação extensiva, pelo que esta não é necessariamente proibida ou permitida em Direito Penal, tudo dependendo da enunciação de outros critérios e de caso para caso.
39
Redução teleológica
A redução teleológica exclui do âmbito da lei casos que a sua letra abrangeria, por tais casos não deverem ser abrangidos pelos fins essenciais que a lei prossegue. A redução teleológica será incriminada quando essa exclusão de vasos se referir a normas que delimitem negativamente a tipicidade. A vinculação ao texto jurídico conduz a uma rejeição da redução teleológica incriminadora. Assim, o sentido da proibição da analogia abrange também o caso da redução teleológica.
40
principio da insignificância
Este princípio diz-nos que os tipos incriminadores quando incriminam comportamentos, incriminam comportamentos que tenham uma certa gravidade para o bem jurídico. Se podermos concluir que a lesão é pouco relevante ou significativa ela não estará compreendida no âmbito da incriminação.
41
principio da adequação social
Numa leitura mais moderna, associamos este princípio ao princípio da culpa e da necessidade. Este princípio diz-nos que os comportamentos que são socialmente aceites ou que correntemente não são entendidos como lesivos ou perigosos, também não cabem nos tipos incriminadores. Do ponto de vista do conceito material de crime a MFP defendia que não é possível incriminar comportamentos que sejam socialmente aceites, porque se eles não são percebidos como lesivos, não ha uma oportunidade de perceber que eles são ilícitos. Se ha uma prática usual na sociedade que não é mal vista, à partida ela está excluída dos tipos incriminadores. Exemplo: dar prendas a médicos e professores estaria dentro do espírito de adequação social (comportamento típico há umas décadas atrás)
42
concurso aparente
No caso do concurso aparente, apesar do concurso de tipos legais efetivamente preenchidos pelo comportamento global, conclui-se que o comportamento é dominado por um único sentido autónomo de ilicitude. O concurso aparente leva a que se aplique a pena do ilícito tipico dominante ao comportamento do agente.
43
concurso efetivo
No caso do concurso efetivo, previsto no art. 30º/1, os crimes em concurso são na verdade recondutiveis a uma pluralidade de sentidos sociais autónomos dos ilícitos típicos cometidos e, assim, a uma pluralidade de factos puníveis. O concurso efetivo pode ser: Heterogéneo: quando os crimes que compõem o comportamento global são diferentes. Homogéneo: quando ao comportamento global é concretamente aplicável apenas uma norma típica, mas esta foi violada mais do que uma vez pelo comportamento global. O concurso efetivo encontra o seu regime no art. 77º, que consagra a aplicação de uma pena única sob a forma de uma pena conjunta. Este regime assenta em diversas etapas: O juiz começa pela determinação da pena concreta de cada um dos crimes cometidos; Numa segunda fase, o juiz deve construir a moldura penal do concurso efetivo, que tem como limite máximo a soma das penas individualmente consideradas, que não pode ultrapassar os 25 anos de prisão ou 900 dias de multa. Por outro lado, tem como limite mínimo a pena concreta mais grave determinada. Por fim, através da consideração conjunta dos factos e da personalidade do agente, o juiz determinará a pena concreta a aplicar.
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Relações lógico-formais entre crimes (especialidade)
estamos perante uma relação lógico-formal de inclusão. Esta relação existe sempre que um dos tipos legais, a lei especial, integra todos os elementos de um outro tipo legal, a lei geral, e só dele se distingue, porque contem um qualquer elemento adicional. Lei especial afasta lei geral. Este tipo de relação existe entre qualquer tipo fundamental (lei geral) e o respetivo tipo agravado (lei especial). Exemplo: homicídio simples (LG) e qualificado (LE).
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Relações lógico-formais entre crimes (subsidiariedade)
estamos perante uma relação lógico-formal de sobreposição. Esta relação existe quando um tipo legal de crime deva ser aplicado somente de forma auxiliar ou subsidiária, se não existir outra norma legal em abstrato também aplicável, que comine pena mais grave. A subsidaridade pode ser: Expressa: existe quando o teor literal de um dos tipos legais restringe expressamente a sua aplicação à inexistência de um outro tipo legal que comine pena mais grave. Exemplo: violência doméstica (art. 152º/1) Implicita: refere-se aos casos em que, apesar do silêncio da lei, o legislador entendeu criar tipos legais abrangentes de factos que se representem ou como estádios evolutivos, antecipados ou intermédios de um crime consumado, ou como formas menos intensivas de agressão de um mesmo bem jurídico. Exemplo: sempre que um facto se verificar na forma consumada, não o vamos punir pela tentativa ou pela tentativa e consumação, mas apenas pela consumação.
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Unidade típica de ação
Neste âmbito, importa atender ao critério da unidade ou pluralidade de sentidos sociais de ilicitude do comportamento global. É a unidade ou pluralidade de sentidos de ilicitude típica, existente no comportamento global do agente submetido à cognição do tribunal, que decide em definitivo da unidade ou pluralidade de factos puníveis e, nesta aceção, de crimes. Se existe um único sentido social de ilicitude (e dá para reconduzir tudo ao mesmo comportamento), então há unidade típica de ação. Exemplo: dar 4 estalos a alguém. Esta figura está prevista para os casos em que o agente, por exemplo, mata a vítima com 10 facadas e que só uma delas é efetivamente mortal. Temos um único crime de homicídio e não varias tentativas. O mesmo na violação. Não se contam todos os atos sexuais contra a vítima como crimes diferentes. Não é por haver uma repetição de atos sexuais que passamos para um segundo ou terceiro crime. Se o tempo e o espaço forem o mesmo trata-se de um único crime de violação.
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concurso ideal
Há concurso ideal quando através de uma mesma ação se violam várias normas penais ou a mesma norma repetidas vezes (unidade de ação).
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consunção
A consunção existiria quando o conteúdo de um ilícito-típico inclui em regra a de outro facto, de tal forma que a condenação pelo ilícito-típico mais grave exprime ja suficientemente o desvalor de todo o comportamento. A consunção abrange dois grupos de casos: O dos factos tipicamente acompanhantes O dos factos posteriores não punidos A doutrina diverge quanto ao facto de saber se a consunção consubstancia um concurso efetivo ou um concurso aparente.
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Critério do crime instrumental/crime-meio
Este critério de determinação de concurso aparente abrange todos os casos de relacionamento entre um ilícito puramente instrumental (crime-meio) e o crime-fim correspondente. Por outras palavras, aqueles casos em que um ilícito singular surge, perante o ilícito principal, unicamente como meio de o realizar e nesta realização esgota o seu sentido e os seus efeitos. Assim, uma valoração autónoma e integral do crime-meio representaria uma violação da proibição da dupla-valoração, pelo que se impõe a conclusão da existência de um concurso aparente. Exemplo: relação entre uma falsificação de escrito utilizada unicamente como meio de burlar alguém (JFD).
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momento da prática do facto
Nos termos do art. 3º, “o facto considera-se praticado no momento em que o agente atuou, ou no caso de omissão, deveria ter atuado, independentemente do momento em que o resultado típico se tenha produzido. É de notar que esta regra vale para todos os comparticipantes no facto criminoso.
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leis intermédias
Estas leis são leis que entraram em vigor posteriormente ao momento da prática do facto, mas que já não vigoram ao tempo da apreciação judicial deste. O princípio da aplicação da lei mais favorável vale também em relação ás leis intermédias. Esta situação é coberta tanto pelo art. 29º/4 2ª parte CRP, como pelo art. 2º/4, 1ª parte. HM: estamos perante um caso em que o princípio da igualdade acaba por se impor, fundamentando autonomamente a aplicação retroativa da lei intermédia.
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Conversão de crime público em semi-publico
O crime semi-publico é um crime para cujo procedimento é necessária a queixa da pessoa com legitimidade para a exercer (por norma o ofendido ou seu representante legal ou sucessor). A dimensão normativa dos preceitos que alteram o direito de queixa não é estritamente penal, a norma do direito de queixa não é inequivocamente lei penal no sentido dos arts. 2º/4 do CP e 29º/4 da CRP. A retroatividade in melius não abrange as alterações do direito de queixa, na medida em que este principio se baseia na igualdade da aplicação da pena e na sua necessidade. A despublicização de crimes pode ter um fim de mera proteção da vítima ou então pode revelar um desinteresse do Estado pela iniciativa processual, devido a razões de política criminal. Para a Professora MFP, não há uma verdadeira sucessão de leis penais. Esta solução decorre, não dos artigos 2º/4 e 29º/4, mas sim dos princípios mencionados, como o vitimológico e do estado de direito democrático. Assim, nestes casos (em ambos os fins) há uma única solução: a atribuição de oportunidade de exercício do direito de queixa, que decorre dos princípios da igualdade e da necessidade da pena, bem como a proteção da confiança emanada do Estado de Direito democrático. Assim, justifica-se a aplicação da lei nova e a proteção do exercício do direito de queixa, não existindo automaticamente lugar ao arquivamento. Tal como defendido pela professora MFP, inicia-se a contagem do prazo para a apresentação de queixa a partir da entrada em vigor da lei nova. Se o direito de queixa não for exercido arquiva-se o procedimento criminal. Para Taipa de Carvalho, não estamos perante uma verdadeira sucessão de leis, mas sendo uma norma processual penal material, está sujeita ao principio da legalidade e ao corolário da proibição da retroatividade e da retroatividade in mellius. ## Footnote Nota: se passar de privado para público ou semi-público, a lei nova não pode ter aplicação imediata se não tiver sido deduzida queixa anteriormente, pelo que se aplica a lei antiga. Nota: ser necessário queixa é mais exigente. Logo, é mais favorável para o arguido.
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Alteração de prazos prescricionais
A prescrição traduz-se na extinção da responsabilidade criminal pelo decurso do tempo, a contar desde o momento da prática do facto. A partir do momento da prática do facto, começa a correr o prazo da prescrição. Findo esse prazo, a responsabilidade extingue-se, e o arguido já não pode ser punido criminalmente. Enquanto não haja transito em julgado, a questão da prescrição é sempre relevante. A extensão do prazo prescricional não afeta realmente um direito subjetivo dos autores dos crimes, mas revelam uma alteração da necessidade de punir e uma intensificação da dignidade punitiva comparativamente com a vigente no momento da prática do crime. Mas a aplicação imediata do prazo prescricional revelaria a punição de um crime praticado no passado, o que enfraqueceria a limitação que o direito outrora criou, não assegurando a autolimitação própria do Estado de Direito – e o Estado tem de vincular o direito ao princípio da confiança, daí que se proíba a retroatividade. Normalmente, entende-se que a prescrição é processual-material. Tem relevância material, relevância substantiva, penal, porque influi diretamente na situação de responsabilidade do agente, logo, à questão da prescrição podem aplicar-se as regras gerais do 29.º/4 CRP e 1o e 2.º CP – uma lei posterior não pode ter como efeito o ressuscitar de uma responsabilidade penal que já se extinguiu. Ou seja, todas as normas que dizem respeito a prazos, prescrição etc. são normas processuais penais materiais, pq tem uma conexão com a responsabilidade do arguido, pelo que não se incluem na regra do art. 5º do CPP. As normas processuais materiais estão sujeitas á proibição de retroatividade, pelo que se aplica a lei do MPF, sendo que a lei posterior só se aplica se for de conteúdo mais favorável.
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Princípio da proibição da aplicação retroativa da lei penal desfavorável
No direito penal vigora a regra da proibição da retroatividade in malem partem, ou seja, contra o agente, conforme resulta do art. 29º/4 da CRP. Esta proibição tem diversos fundamentos: Razões gerais: relacionam-se com a segurança jurídica e com o princípio do Estado de Direito, sendo que a possibilidade de uma conduta ser retroativamente incriminada destruiria a garantia das expectativas dos cidadãos quanto ao que é proibido. Razões especificamente penais: remetem para a prevenção geral e o princípio da culpa, sendo que a possibilidade de uma conduta ser retroativamente incriminada contradiria uma responsabilidade penal baseada na livre determinação do agente pela norma jurídica.
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Princípio da aplicação retroativa da lei penal mais favorável
Este princípio resulta dos arts. 29º/4 da CRP e 2º/4 do CP, sendo de notar que a retroatividade in mellius é um princípio, com fundamentos próprios e não apenas uma exceção à proibição da retroatividade.
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Fundamentos da retroatividade in mellius:
* Principio da necessidade da pena: as punições só se justificam na medida do estritamente necessário para punir um certo comportamento. * Principio da igualdade: se a lei penal posterior suprimir uma norma incriminada, seria injusto que agentes que praticaram factos idênticos recebam um tratamento radicalmente diferente, conforme tais factos sejam perpetrados antes ou depois da revogação da norma ou até mesmo por simples atrasos no julgamento.
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descriminalização
Estes casos surgem quando uma lei posterior à prática do facto deixa de considerar este como crime. O CP contempla estas situações no art. 2º/2, sendo que a aplicação da lei mais favorável se impõe, mesmo nos casos em que a sentença condenatória já transitou em julgado. Isto sucede porque se a conceção do legislador se alterou ao ponto de descriminalizar um dado comportamento, não faz qualquer sentido, a nível politico-criminal, manter os efeitos de uma conceção ultrapassada. Note-se que o art. 2º/2 também se aplica a casos de desqualificação.
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Problema conversão de crime em contraordenação
O problema que se coloca é o de saber o que acontece quando o legislador converte um crime numa contraordenação, ou seja, saber se nesses casos houve uma alteração do regime punitivo, nos termos do art. 2º/4, ou, por outro lado, um fenómeno de descriminalização, à luz do art. 2º/2.
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Conversão de crime em contraordenação (taipa de carvalho)
o facto deixa de ter relevância jurídica, não podendo ser objeto de punição penal, nem contraordenacional, atendendo à autonomia material do direito contraordenacional face ao direito penal. Existindo uma descriminalização, o facto não pode ser punido criminalmente, mas também não pode ser sancionado a titulo contraordenacional, dado que o momento da sua prática não existia ainda uma norma legal que para ele cominasse uma coima. Solução de Taipa de Carvalho: criação de um regime transitório em que o legislador determine que os crime praticados ao abrigo da LA continuam a ser abrangidos pela LN.
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Conversão de crime em contraordenação (HM + JFD + maioria da doutrina:)
discordam da posição do professor Taipa de Carvalho, com base em vários argumentos: Problema de compatibilidade com o espirito legislativo: normalmente, quando o legislador converte um crime em contraordenação o seu objetivo não é deixar de punir os comportamentos que eram crime, mas sim puni-los de forma mais branda. (HM) O objeto da proibição é um comportamento humano essencialmente idêntico na previsão das duas normas o que assegura a unidade de facto e a continuidade normativa. Assim, não há qualquer afetação da previsibilidade pela punição do direito mais favorável, dado que no momento da prática do facto não existiam motivos para que o agente pudesse esperar ficar impune. Solução da doutrina maioritária: estamos no âmbito do art. 2º/4, pelo que os factos praticados ao abrigo da lei antiga passam a ser punidos como contraordenação.
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Conversão de contraordenação em crime
Nestes casos não se pode aplicar a LN face ao princípio da proibição da retroatividade incriminadora. Existindo uma sucessão de leis em sentido amplo (doutrina maioritária), aplica-se a lei mais favorável, à luz do art. 2º/4, ou seja, a LA (contraordenação).
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problema das leis inconstitucionais
Outro problema sobre a aplicação da lei penal no tempo é o da sucessão de leis em que a lei mais favorável, que deveria ser aplicável, vem a ser declarada inconstitucional.
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Leis inconstitucionais (HM + Rui Pereira)
HM + Rui Pereira: a lei penal inconstitucional é inválida e, por isso, não pode produzir quaisquer efeitos, não podendo ser aplicada, nos termos do art. 204º. Tal como previsto no art. 282º, a declaração de inconstitucionalidade produz efeitos desde a entrada em vigor da norma declarada inconstitucional e determina a repristinação das normas que ela haja revogado. Assim, deixa de existir qualquer sucessão de leis no tempo. Ou seja, se a norma inconstitucional é nula, isso significa que ela nunca revogou a anterior, pelo que esta esteve sempre em vigor. No entanto, nestes casos pode ter havido um erro sobre a licitude do facto, se o agente agiu durante a vigência da norma inconstitucional. Contudo, esta situação apenas se verifica se cumpridos 3 requisitos: Quando o agente conhece a existência da LN Quando não sabe que ela é inconstitucional Quando atua na sua vigência Para estes autores, aplica-se sempre a lei antiga, mas se estiverem preenchidos aqueles pressupostos, e atendendo ao art. 17º do CP, exclui-se a culpa do agente (porque a falta de consciência da ilicitude não é censurável) e este não é punido.
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Leis inconstitucionais (MFP)
discorda da posição anterior, dado que essa recorre a uma verificação fictícia do erro sobre a ilicitude e a um mero expediente de recurso ao art. 17º para deixar de punir o agente pela pena mais severa. Para MFP aplica-se sempre a lei penal inconstitucional mais favorável, através de uma dupla analogia com os arts. 29º/4 2ª parte e 282º/3 2ª parte. Um dos seus argumentos remete para a vinculação do Estado de Direito democrático às normas que cria, que, num contexto de segurança e igualdade, devem impor a aplicação da norma mais favorável ainda que inconstitucional. Não deve correr por conta dos cidadãos os inconvenientes da deficiente produção legislativa.
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Conversão de perigo abstrato em concreto:
nestes casos a LA dispensava a prova efetiva do perigo para o bem jurídico e a LN requer essa prova. HM: Se se aplicasse a LN, a punição estaria dependente de um requisito adicional que não era exigido no momento da prática do facto, colocando-se um problema de violação das expectativas dos cidadãos. Assim, não se aplica a LN, porque não estava em vigor no momento da prática do facto. Também não se aplica a LA, porque não nos podemos basear em critérios da LN para fazer uma seleção de casos ao abrigo da LA. Para além disso, não se aplica a LA face ao argumento do dolo, sendo que se aplicássemos a LA ao agente, estaríamos a censurá-lo por um dolo que não era dolo ao abrigo da LA. Assim, aplica-se o art. 2º/2 (há uma descriminalização). MFP: só se pode aplicar a LN se estiverem preenchidos 2 requisitos: Prova do crime concreto Lei nova mais favorável ao agente Taipa de Carvalho: aplica-se a lei mais favorável, à luz do art. 2º/4
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Conversão de perigo concreto em abstrato:
a LA requeria a prova efetiva do perigo para bens jurídicos e a LN dispensa essa prova. Esta conversão envolve uma ampliação da responsabilidade, no entanto os comportamentos do crime de perigo concreto estão incluídos, por maioria de razão, no novo conjunto de factos, pelo que existe uma continuidade normativo-típica, aplicando-se a lei mais favorável, nos termos do art. 2º/4.
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Crime permanente/duradouro
O melhor exemplo de crime permanente é o sequestro, sendo que neste âmbito surge um problema: quando o agente prendeu a pessoa estava em vigor a lei antiga, quando liberta a vitima já está em vigor uma lei nova que pune de forma mais grave o sequestro. Temos duas leis em vigor no momento da prática do facto. Os pressupostos do sequestro verificam-se integralmente ao abrigo da vigência das duas leis. Temos duas hipóteses: aplicar a lei antiga porque é mais favorável (parece não se harmonizar com o princípio da retroatividade da lei mais favorável) ou aplicar a lei nova porque é a que está em vigor no momento da prática do facto e é a concepção legislativa mais recente. HM: aplica-se a lei nova. Se o facto é tudo, não devemos dar mais importância ao inicio do mesmo.
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Leis temporárias
As leis temporárias são aquelas que são criadas pelo legislador para um tempo determinado, sendo importante distinguir entre leis temporárias em sentido estrito e leis de emergência.
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As leis temporárias em sentido estrito:
instituídas para um prazo determinado, ou seja, são leis que criminalizam certa conduta, mas prefixando um período temporal para a sua vigência.
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As leis de emergência:
criadas em função de um evento transitório, como por exemplo um estado de calamidade. A retroatividade in mellius não abrange as leis temporárias, nos termos do art. 2º/3. A razão que justifica o afastamento da aplicação da lei mais favorável reside em que a modificação legal se operou em função não de uma alteração da conceção legislativa, mas unicamente de uma alteração das circunstâncias fácticas que deram base à lei. Ou seja, o caráter temporário resulta de uma situação de emergência/excecionalidade, não sendo uma livre opção do legislador. É de notar que nada impede que, no âmbito da mesma situação de excecionalidade, haja uma alteração da conceção legislativa, surgindo uma sucessão de leis temporárias. Neste caso, nada impede a aplicação retroativa da lei temporária de conteúdo mais favorável, mantendo-se as regras gerais do art. 2º.
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Art. 2º/2 vs 2º/4
Art. 2º/2: aplica-se quando não há sucessão de leis penais, ou seja, casos de descriminalização e desqualificação. Art. 2º/4: aplica-se quando há sucessão de leis penais. Para saber se há sucessão de leis penais, atende-se ao conteúdo normativo de ambas as leis, sendo que há sucessão quando há unidade do pressuposto normativo.
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Crime continuado
MFP: pode-se aplicar a LN, mesmo se for mais grave, se esta for anterior ao crime mais grave punido na continuação. O único caso em que se desfaz a continuação é nas situações em que a LN não vem apenas agravar a moldura penal, mas introduzir uma nova qualificante, sendo que nesses casos se pune nos termos do art. 77º e não 79º. HM: distingue entre duas situações Lei nova mais favorável: aplica-se sempre. Lei nova mais desfavorável: tem que se verificar se o facto foi praticado ao abrigo da LN ou da LA. Se foi ao abrigo da LN, aplica-se esta. Se foi ao abrigo da LA, não podemos aplicar a lei nova, face à proibição de retroatividade. Assim, para HM, só se aplica a LA se o facto foi praticado na sua vigência e se a LN for mais desfavorável.
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Problema de alteração do ilícito incriminador
O art. 2º/2 abrange tanto a descriminalização, como a desqualificação. A LN retira determinada qualificante presente na LA e introduz uma nova. Não se pode aplicar a LN, dado que a qualificante que esta introduz não está em vigor no momento da prática do facto. Por outro lado, não se pode aplicar o art. 2º/4, na medida em que não há uma continuidade normativo típica. Assim, o agente é punido pelo crime simples e não pelo qualificado.
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Tipos de elementos introduzidos pela lei nova
Elementos especificadores: a LN introduz um elemento novo, mas meramente especificando um conceito que já estava lógica e necessariamente implícito na LA. Não há despenalização ou desqualificação, mas sim uma continuidade normativo-típica, pelo que estamos no âmbito do art. 2º/4. Elementos especializadores: a LN introduz um elemento no tipo legal de crime que não estava implícito no conceito geral da LA. Há uma descriminalização ou desqualificação dos comportamentos abrangidos pela LA, pelo que estamos no âmbito do art. 2º/2.
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Situação plurilocalizada
Situações em que há uma pluralidade de ordenamentos jurídicos relacionados com a prática do facto.
76
Princípio da territorialidade (art. 4º):
este princípio assenta em dois tipos de fundamentos, uns de ordem material, o princípio da necessidade da pena e a prevenção geral positiva, e outros de ordem processual, sendo que a investigação é mais eficaz no local onde o facto foi praticado.
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Princípio do pavilhão (art. 4º al. b)):
são também território português os navios e as aeronaves portuguesas.
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Princípio da ubiquidade (art. 7º):
praticar um facto em território português é ter tatuado, dever ter tatuado ou ter sido produzido o resultado típico em território português. Este artigo consagra, assim, um critério bilateral alternativo, segundo o qual basta que um dos elementos essenciais do tipo objetivo (ação e resultado) se tenha verificado em território português para que a lei penal portuguesa se possa aplicar. Caso o facto não tenha sido praticado em território português, nos termos dos arts. 4º e 7º, há que analisar as conexões de validade espacial presentes no art. 5º.
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Princípios do art. 5º
Al. a): princípio da defesa dos interesses nacionais Al. b): princípio da nacionalidade ativa e passiva, cujo fundamento é o dever de fidelidade do agente à lei penal portuguesa e um vinculo ativo de cidadania à lei penal portuguesa. Al. c): princípio da universalidade Al. d): extensão do princípio da universalidade Al. e): princípio da nacionalidade ativa ou passiva No âmbito desta alínea, pergunta-se se é exigida uma punibilidade em abstrato ou em concreto. MFP: a melhor interpretação impõe que a lei penal portuguesa seja aplicável somente nos casos em que o facto seja em concreto punível no pais estrangeiro, ou seja, tem que se ver em concreto se o agente seria punido no estrangeiro. Al. f): princípio da administração supletiva da justiça penal Al. g): extensão do princípio da nacionalidade a pessoas coletivas com sede em território português. ## Footnote Nota: a aferição das conexões de validade espacial tem que ser feita em harmonia com o art. 3º, ou seja, avaliam-se em relação ao momento da prática do facto.
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Imunidades do PR
As imunidades do PR baseiam-se na proteção da representatividade democrática, quando o PR é diretamente eleito, como no caso português. O art. 130º da CRP exclui totalmente da prossecução penal os crimes estranhos ao exercício de funções durante o mandato, suspendendo durante esse tempo a efetivação da responsabilidade penal. No que se refere aos crimes praticados no exercício de funções, não existe qualquer espécie de imunidade, estando o julgamento a cargo do STJ e implicando a condenação a destituição do cargo e o impedimento da reeleição. O problema surge em determinar o que se deve entender por crimes praticados no exercício de funções. A conexão com o exercício de funções deve ser entendida num sentido material, abrangendo tanto o exercício de atividades próprias das funções como outras ações ou omissões que tenham o exercício das funções como causa ou atividade. Exemplo: um homicídio para ocultar um erro político ou um facto da vida privada que poria em causa a posição do PR não deixaria de ser entendido como um crime cometido no exercício de funções.
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Imunidade dos deputados e do PM e membros do Governo
As imunidades dos deputados encontram-se reguladas no art. 157º (regime de irresponsabilidade absoluta). Os deputados não respondem criminalmente pelos votos e opiniões que emitirem no exercício das suas funções. No que se refere ao PM e aos membros do Governo, a CRP prevê no art. 196º um regime semelhante ao dos Deputados no que se refere à efetivação da responsabilidade criminal.
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Imunidades diplomáticas
As imunidades diplomáticas têm as suas razões históricas na defesa da soberania dos Estados e na proteção da representação dos Estados fora do seu território, na proteção das relações diplomáticas necessárias à boa articulação entre Estados soberanos nas suas relações internacionais. Ou seja, o que está em causa é a proteção da soberania do Estado. A imunidade traduz-se na não sujeição dos agentes diplomáticos ao poder judicial do Estado onde exercem funções. A primeira fonte jurídico-positiva de Direito internacional destas imunidades relativamente aos diplomatas é a Convenção de Viena. A Convenção De Viena consagra a inviolabilidade da pessoa do agente diplomático, membros da família que com ele vivam e pessoal técnico e administrativo da missão. No entanto esta imunidade não é absoluta, na medida em que o Estado acreditaste pode renunciar à imunidade de jurisdição dos seus representantes e outros beneficiários. Por outro lado, os familiares e membros do pessoal técnico e administrativo da missão não gozarão da imunidade penal se forem portugueses ou tiverem residência permanente em Portugal (art. 37º/2). Também se os próprios agentes diplomáticos tiverem nacionalidade portuguesa ou residência permanente em Portugal, existe apenas uma imunidade relativa estritamente aos atos oficiais praticados no exercício da sua missão.
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Estado acreditante vs Estado acreditador
Acreditante: Estado que envia a missão diplomática. Acreditador: Estado que recebe e acredita a missão.
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No caso de o Estado acreditante não renunciar qual é a solução para o Estado acreditador face à responsabilidade criminal de uma pessoa abrangida pela imunidade diplomática?
A solução é expulsar o agente diplomático e declará-lo persona non grata, nos termos do art. 9º
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Imunidades diplomáticas ratione personae vs ratione materiae
Ratione personae: as imunidades ratione personae, ou imunidades pessoais, são as imunidades inerentes à função ou cargo desempenhado por determinado indivíduo. Estas imunidades protegem esses indivíduos, com funções representativas do Estado no exterior, de constrangimentos ao exercício das suas funções, isentando-os de responsabilidade criminal perante a jurisdição penal dos outros Estados. Estas imunidades protegem os agentes pelos atos que praticam, sejam esses atos o resultado do exercício das suas funções oficiais, atos privados ou atos que configuram crimes de direito internacional. Apenas um grupo restrito de agentes beneficia destas imunidades, nomeadamente, Chefes de Estado, Primeiro-Ministro, Ministros dos Negócios Estrangeiros e Agentes Diplomáticos acreditados junto do Estado estrangeiro. Ratione materiae: as imunidades ratione materiae, ou imunidades funcionais, protegem os funcionários de um Estado de serem sujeitos à jurisdição penal de outros Estados por atos praticados no exercício das suas funções. Os atos praticados pelo funcionário são, assim, atribuídos ao Estado representado e não à sua pessoa. Em regra, a eventual responsabilidade criminal do funcionário substitui-se por eventual responsabilidade internacional do Estado que representa. Contudo, estas imunidades cessam quando atos praticados pelo funcionário configuram crimes de Direito Internacional, isto porque os factos que integram esses crimes nunca podem constituir atos imputáveis aos Estados.
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Extradição
Extradição é o facto pelo qual um Estado remete um indivíduo que se refugiou no seu território a um outro Estado para que ele aí seja julgado pelos respetivos tribunais, ou, quando já tenha aí sido julgado, para cumprir a pena que lhe foi aplicada.
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Distinção entre fins de procedimento criminal e fins de cumprimento de pena
Procedimento criminal: visa a entrega de um cidadão que está em Portugal para ser julgado. Cumprimento de pena: pressupõe a entrega da pessoa para cumprir a pena à qual já foi julgado.
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Âmbito de aplicação da extradição
O âmbito de aplicação da extradição obtém-se por via de uma delimitação negativa, sendo que aplicamos a lei da extradição quando não está verificado o âmbito da lei do mandado de detenção europeu. Ou seja, aplica-se quando não estamos a lidar com países da UE.
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Estados partes na extradição
Estado requerente: o que pede a extradição. Estado requerido: o que recebe o pedido e decide se o executa ou não.
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Tipos de extradição
Ativa (art. 69º): é Portugal a pedir que um determinado país aceite o seu pedido de extradição. Passiva (art. 31º): o Estado requerente é um estado estrangeiro e o Estado requerido é Portugal, ou seja, Portugal vai decidir se extraditamos ou não a pessoa.
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Motivos de recusa de extradição
Pode haver causas de recusa diferentes em função de se tratar de uma extradição ativa ou passiva. Art. 32º: só se aplica a casos de extradição passiva. Art. 69º: extradição ativa.
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Garantias na extradição
Art. 6º al. e) e f): a e) diz que o pedido é recusado quando o facto a que respeita for punida com pena de morte etc. a al. f) fala em pena ou medida de segurança com caráter perpetuo ou duração indefinida. Estas alíneas tem que ser conjugadas com o nº 2 e ser integradas à luz do art. 33º/4 (al. f) e 6 (al. e) da CRP. O nº 2 diz que essas alíneas não obstam à cooperação, sendo que mesmo que seja um caso de pena de morte ou prisão perpétua pode haver cooperação desde que al. a) b) c) e d). Acórdão 1/2001: falou sobre a extensão da garantia, ou seja, quando é que entendemos que o compromisso que o Estado formulou no pedido é vinculativo para entregarmos a pessoa mesmo havendo em tese o risco de estarmos perante uma das situações da al. e) ou f). Para a al. a) estar verificada tem que: - ser uma alteração em concreto, tem que ser vinculativa em termos jurídicos aos tribunais e tem que garantir o cumprimento do Estado de direito democrático e da separação de poderes. A al. b) do nº2: remete para questões menos graves que a al. a). O Estado requerente tem que oferecer garantias de que tal pena ou medida não será aplicada No mesmo Ac. o TC apreciou a possibilidade de haver uma diminuição das garantias quando se trate de um caso de prisão perpétua. Não é inconstitucional exigir garantias mais leves para os casos de prisão perpétua, porque tendo em conta as diferentes afetações dos bens jurídicos da al. a) das da al. b) podem ser menos exigentes, o que também é sugerido pelas próprias alíneas (na b) basta oferecer garantias). No art. 6º/3, explica-se como se afere a suficiência das garantias. A questão subjacente ao art. 6º e a de saber se é pena de morte ou prisão perpétua. Em principio não dá para extraditar, exceto quando sejam prestadas garantias: - Quando é pena de morte têm que ser juridicamente vinculativas (ex: alteração legislativa). Se for prisão perpétua as garantias podem ser menos exigentes (a ser apreciada nos termos do art. 6º). O que as garantias nos dizem é que naquele caso não vai ser aplicada a pena prevista.
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Como é que se afere a qualidade nacional para efeitos de extradição?
Através do critério presente no art. 32º/6.
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Partes no mandado de detenção europeu
EM de emissão: emite o mandado de detenção através da sua autoridade, que em Portugal é a Procuradoria Geral da República. EM de execução: recebe o mandado.
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Âmbito de aplicação do mandado de detenção europeu
O âmbito de aplicação do mandado de detenção europeu resulta do art. 2°/1 da lei do mandado de detenção europeu. Para além disso, o mandado apenas se aplica a Estados da UE.
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Mandado de detenção europeu: procedimento penal e cumprimento de pena
Nos termos do art. 2º/1: Para efeitos de procedimento criminal tem que estar em causa um crime punido com pelo menos uma pena de 1 ano. Para efeitos de cumprimento de pena, a pena tem que ser pelo menos de 4 meses (pena concreta ou resto da pena a cumprir? O limite dos 4 meses afere-se pela pena concreta que falta cumprir).
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Dispensa da dupla incriminação do facto no mandado de detenção europeu
O art. 2º/2 apresenta a regra que permite a dispensa da dupla incriminação do facto em causa. Temos um conjunto de certas condutas por referência às quais fica dispensado o controlo da dupla incriminação. Estando em causa uma destas alíneas, o EM de execução não tem sequer de ir controlar se existe em Portugal uma incriminação por aquele crime. Este artigo inclui outros requisitos: sujeita a dispensa de não incriminação a um controlo baseado nos limites das penas. “Só é possível quando estejam em causa infrações punidas com penas ou medidas de segurança com duração não inferior a 3 anos” Se o mandado estiver instruído com elementos que preencham estes requisitos, então o mandado pode ser analisado à luz da lei do mandado de detenção europeu. Caso não estejam preenchidos os requisitos, a lei pode ser aplicada, mas fica dependente do controlo da dupla incriminação, nos termos do art. 2º/3.
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Entrega de nacionais: extradição vs mandado de detenção europeu
Mandado: nada obsta a que Portugal entregue um cidadão a outro estado, seja para efeitos de procedimento ou cumprimento de pena. Esta é uma grande alteração ao art. 33º/3 da CRP, mas nos termos do 33º/5 esta é admitida. A nacionalidade ou residência da pessoa apenas constitui uma causa facultativa de recusa do mandato, que apenas se aplica a mandados para efeitos de cumprimento de pena e desde que haja um compromisso assumido de que Portugal cumprirá a pena cá. Extradição: só se extraditam cidadãos nacionais para efeitos de procedimento penal, nos termos do art. 32º/3. Ou seja, em regra, na extradição, não se podem extraditar nacionais. No mandado, em regra, pode-se extraditar nacionais.
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Conhece casos em que Portugal seja extraterritorialmente competente, mas este aplique à mesma a lei estrangeira?
Sim, os casos do art. 6º/2, que consagra uma restrição à aplicação da lei penal portuguesa menos favorável, de acordo com certos requisitos.
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Qual a Ratio legis do 6º/2? 
A restrição constante do art. 6º/2 resulta da conjugação da subsidariedade do exercício do poder punitivo do Estado português com os princípios da culpa, da igualdade, da necessidade da pena e da segurança jurídica.
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Pressuposto implícito da alínea b) do art 5º: Taipa de Carvalho vs resto da doutrina
Taipa de Carvalho: antes da alteração de 2007, o fundamento desta alínea era evitar a fraude à lei portuguesa, pelo que apenas se pode aplicar esta alínea quando o agente se desloca propositadamente ao estrangeiro para se subtrair à aplicação da lei portuguesa, Doutrina maioritária (MFP e JFD): atualmente, o fundamento desta alínea já não é o de evitar a fraude à lei portuguesa, mas sim um dever de fidelidade do agente à lei portuguesa e um vínculo ativo de cidadania, pelo que não é necessário o preenchimento do requisito da fraude à lei.
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Crimes de dano
Nos crimes de dano, a realização do tipo incriminador tem como consequência uma lesão efetiva do bem jurídico. Exemplo: homicídio, violação etc.
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Crimes de perigo
Nos crimes de perigo, em oposição aos crimes de dano, a realização do tipo não pressupõe a lesão, bastando-se com a mera colocação em perigo do bem jurídico. Crime de perigo abstrato: o perigo não é elemento do tipo, mas simplesmente motivo da proibição, ou seja, neste tipo de crimes são tipificados certos comportamentos em nome da sua perigosidade típica para um bem jurídico, mas sem que ela necessite de ser comprovada no caso concreto. A conduta do agente é punida independentemente de ter criado ou não um perigo efetivo para o bem jurídico. Crime de perigo concreto: o perigo faz parte do tipo, ou seja, o tipo só é preenchido quando o bem jurídico tenha sido efetivamente posto em perigo. Crime de perigo abstrato-concreto: o legislador descreve uma aptidão do comportamento do agente para causar uma certa perturbação no bem jurídico, sendo que o tipo incriminado exige apenas que a ação seja idónea a causar os resultados. Exemplo: stalking
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Crimes de mera atividade e crimes de resultado
Crime de mera atividade: o tipo incriminador preenche-se através da mera execução de determinado comportamento. Exemplo: violação de domicílio Crime de resultado: o tipo pressupõe a produção de um evento como consequência da atividade do agente. Exemplo: homicídio
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Crime permanente/duradouro
O crime é duradouro/permanente, em oposição a instantâneo, quando a consumação se prolonga no tempo, por vontade do autor. No crime permanente temos uma modalidade de unidade típica de ação (o próprio legislador determina que vários comportamentos são o mesmo crime). Exemplo: sequestro
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Princípio ne bis in idem (art. 29º/5, CRP)
O princípio non bis in idem ou ne bis in idem significa que ninguém pode ser julgado mais do que uma vez pela prática do mesmo crime. É de destacar a proibição de dupla valoração, na sua vertente material, ou seja, enquanto proibição de dupla punição pelo mesmo crime.