Diarreia Flashcards

1
Q

Qual a definição de diarreia?

A

A diarreia é um sintoma/sinal caracterizado por dois componentes principais: aumento no número de evacuações (mais de três vezes ao dia) e diminui- ção da consistência. Um terceiro componente, o peso (mais de 200 g/dia), pode ser considerado, porém, é de difícil avaliação na clínica diária.

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2
Q

Quais são os principais eventos da fisiologia do intestino que poderão estar alterados em um paciente com diarreia?

A
  • absorção dos líquidos
  • osmolaridade da luz intestinal
  • mucosa intestinal
  • sistema nervoso entérico
  • flora intestinal
  • motilidade intestinal

Pode-se deduzir, das informações acima, que o adequado funcionamento do intestino dependerá do equilíbrio da função dos diferentes tipos de células epiteliais de sua mucosa, da microbiota presente em sua luz, da integridade da mucosa, do conteúdo in- traluminal, das células imunocompetentes e da sua neuromusculatura.

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3
Q

Qual alteração ocorre na absorção de liquido?

A

O aporte de líquidos para o intestino corresponde a aproximadamente 10 L/dia, provenientes de fontes variadas, como: ingesta, saliva, suco gástrico, secreções bilio- pancreáticas e o próprio suco entérico. A maior parte é absorvida no jejuno, junto com os nutrientes, de forma que apenas cerca de 1 a 1,5 L de líquidos chega ao cólon. Destes, 10%, ou 100 a 150 mL, serão eliminados com as fezes. Uma redução de apenas 1% na capacidade de absorção será suficiente para causar diarreia.

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4
Q

Qual alteração pode ocorrer na Osmolaridade da luz intestinal?

A

a direção do fluxo passivo de um líquido entre compartimen- tos contíguos que se comunicam é determinada pela osmolaridade dos conteúdos desses compar- timentos, e acontece sempre daquele de menor osmolaridade para o de maior osmolaridade, de forma a manter o equilíbrio entre os dois am- bientes. Caso se saia das experiências da física, em que são utilizados ambientes inertes, para a fisiologia dos seres vivos, essa dinâmica pode sofrer interferências de fatores fisiológicos que complementam a transferência passiva, transfe- rindo líquidos ou sólidos de forma ativa, manten- do, no entanto, a finalidade de equilíbrio entre os meios. Esse mecanismo fica evidente nos casos de diarreia provocados pela ingestão de açúcares não absorvíveis, como manitol, lactulose etc.

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5
Q

Qual alteração pode ocorrer na mucosa intestinal?

A

desde o esfíncter inferior do esôfago até o ânus, o trato gastrointestinal é revestido por uma única camada contínua de células que servem como limite entre os meios externo e interno do corpo humano. Sua fun- ção de barreira é imprescindível para a manu- tenção da saúde, uma vez que está em contato permanente com microrganismos próprios da microbiota intestinal e com inúmeros agentes ambientais ingeridos. Sua integridade funcio- nal é fundamental para evitar que esses agen- tes atravessem a barreira epitelial, evitando o início ou a perpetuação de processos inflama- tórios mucosos. Características físicas, como a exiguidade do espaço intercelular, e funcionais, como a secreção de imunoglobulinas, muco, defensinas, e outros produtos antimicrobianos, mantêm o equilíbrio dessa relação.3 A diarreia poderá decorrer da alteração dessa estrutura por processos inflamatórios agudos ou crônicos.

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6
Q

Qual alteração pode ocorrer no Sistema nervoso entérico?

A

Esta quase autônoma porção do sistema nervoso é composta pelo plexo mientérico e pelas camadas neuronais da mucosa e submucosa. Sua função é mediada por neuro- transmissores como peptídio intestinal vasoativo (VIP), somatostatina, norepinefrina, neuropep- tídio Y, serotonina, acetilcolina e outros, regu- lando a função do músculo liso, o transporte de íons através da mucosa e os processos absortivo e secretor, além de funções endócrinas, da mo- dulação do sistema imune e do controle do flu- xo sanguíneo local.4 Portanto, alterações na sua estrutura anatômica, assim como deficiência ou hipersecreção de substâncias exócrinas ou endó- crinas, inibidoras ou estimuladoras de suas fun- ções, poderão provocar sintomas diarreicos.

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7
Q

Qual alteração pode ocorrer na flora intestinal?

A

O intestino humano é o habitat de uma variada flora bacteriana, composta por mais de 500 espécies. O número de células bacterianas na luz intestinal corresponde a aproximadamente 10 vezes o total de células eucarióticas presentes no corpo humano. Habitualmente, há uma relação de simbiose, importante tanto para a saúde da mucosa como para a modulação do sistema imune. A troca de material genético entre microrganismos, assim como alterações na camada protetora de muco que reveste a mucosa intestinal, podem transformar bactérias comensais em patógenos, desencadeando quadros de enterites de intensi- dade variável. O uso de antibióticos pode afetar bactérias comensais e poupar possíveis bacté- rias patogênicas resistentes, também causando grandes transtornos. É possível, ainda, que mo- dificações nos mecanismos de defesa do trato alimentar proximal ao intestino possam propi- ciar sua colonização por bactérias patogênicas, alterando a flora intestinal de forma desfavo- rável ao organismo humano. Exemplo disso é a elevação do pH gástrico, tanto por atrofia da mucosa gástrica como pelo uso de medica- mentos que bloqueiam a secreção ácida, nota- damente os inibidores da bomba de prótons. Essa modificação no microambiente gástrico, considerado fator importante na eliminação de grande parte dos inúmeros microrganismos que ingerimos, favorecerá a colonização da cavidade gástrica e o supercrescimento bacteriano no in- testino, desde o duodeno.6 Observação condu- zida por Dial et al.7 sugere aumento substancial no risco de infecção adquirida na comunidade pelo Clostridium difficile em usuários desses me- dicamentos ácido-supressores.

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8
Q

Qual alteração pode ocorrer na motilidade intestinal?

A

apesar da crença dis- seminada de que os episódios de diarreia são consequência da aceleração do trânsito intes- tinal, isso não é comprovado cientificamente na maioria dos quadros diarreicos. Apenas em algumas situações específicas, como na diarreia funcional, nas diarreias causadas por doenças endócrinas (hipertiroidismo, síndrome car- cinoide, vipoma) e na síndrome do intestino irritável com diarreia,8 a aceleração do peris- taltismo intestinal tem papel proeminente na fisiopatologia dos quadros diarreicos.

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9
Q

Como a diarreia pode ser classificada?

A

As diarreias podem ser classificadas, basicamente, de duas maneiras: quanto ao tempo de evolução, em agudas e crônicas, e quanto à etiologia, em infecciosas e não infecciosas.

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10
Q

Diferencie a diarreia aguda da crônica:

A

A classificação quanto ao tempo é definida pela duração do sintoma, sendo con- sideradas diarreias agudas aquelas com duração de até 15 dias, e diarreias crônicas quando os sintomas duram mais de 30 dias. O intervalo entre 15 e 30 dias é considerado, por alguns, diarreia persistente, enquanto outros preferem classificar a diarreia que dura mais de 15 dias como crônica. Uma vez que o tempo é fator determinante das diarreias agudas e crônicas, toda diarreia crônica co- meça como um quadro de diarreia aguda, insidiosa ou exuberante, e, dependendo da regressão espontâ- nea ou da resposta a medidas terapêuticas utilizadas, poderá se prolongar até caracterizar uma diarreia crônica. O agente/fator etiológico será indicativo da maior ou menor probabilidade de evolução crônica.

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11
Q

Qual a etiologia da diarreia infecciosa viral?

A

inúmeros agentes virais podem de- sencadear quadros diarreicos. Há, no entan- to, um grupo que tem predileção pelo tubo digestivo. São transmitidos por água contaminada ou de uma pessoa para outra, estan- do associados a surtos epidêmicos. Os mais prevalentes são o rotavírus e o norovírus. A fisiopatologia das alterações intestinais ainda é mal compreendida, porém, sugere-se um possível efeito de proteína viral como entero- toxina. Outro agente viral, o citomegalovírus, consiste também em uma infecção prevalente em todo o mundo, a qual é usualmente sinto- mática apenas em indivíduos imunocompro- metidos. As diarreias virais manifestam-se em um contexto de gastroenterite aguda, com fezes aquosas, tendo como característica im- portante a presença de vômitos, com duração habitualmente curta (máximo de 72 horas). A infecção pelo citomegalovírus pode se apre- sentar, no entanto, como forma persistente (entre 15 e 30 dias) e disentérica.

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12
Q

Qual a etiologia da diarreia infecciosa bacteriana?

A

São a segunda causa mais frequente das diarreias agudas, após os vírus. As caracte- rísticas individuais das mais prevalentes são:

  • Campylobacter: bactéria Gram-negativa, em espiral, que pode se apresentar sob a forma cocoide quando em ambiente hostil. A espécie mais frequentemente associada a gastroenterites é o Campylobacter jejuni, seguida pelo Campylobacter coli. Os fatores de risco mais importantes são a ingestão de água e alimentos (aves domésticas) conta- minados. Nos países em desenvolvimento, o contato com animais é outro fator de ris- co importante. A enterite secundária à in- fecção pelo Campylobacter tem período de incubação de 2 a 5 dias e é, quase sempre, autolimitada, raramente exigindo aborda- gem terapêutica específica. Manifesta-se por febre, dores abdominais em cólica e diarreia, com duração habitual do quadro diarreico de 2 a 3 dias. A dor abdominal pode se prolongar por mais alguns dias. O aspecto das fezes varia de aquoso a sangui- nolento, dependendo da intensidade da infecção e do tempo de enfermidade. Uma característica importante é a possibilidade de desencadear a síndrome de Guillain- Barré, o que acontece em 1 de cada 1.000 indivíduos infectados.
  • Clostridium difficile: bactéria Gram- positiva, responsável por 15 a 20% dos ca- sos de diarreia secundária ao uso de anti- bióticos e de praticamente todos os casos de colite pseudomembranosa. Inicialmente considerado microrganismo habitualmente presente no intestino de indivíduos saudá- veis. Em estudo sobre sua prevalência nes- sa população, entretanto, foi demonstrado em menos de 3% desses indivíduos.10 É ingerida na forma de esporos e, se encon- tra microbiota alterada pelo uso de anti- bióticos ou outros fatores, converte-se na forma vegetativa. Produz toxinas (A e B) que provocam aumento da permeabilidade intestinal e destruição das células epiteliais colônicas. Manifesta-se sob a forma de diarreia aquosa em indivíduos com história de uso recente de antibióticos (3 ou mais dias). Pode ser grave o suficiente para por em risco a vida do paciente.
  • Clostridium perfringens: bactéria Gram- positiva, anaeróbica, geralmente em forma de esporos. É abundante no meio ambiente, ocorrendo com frequência no intestino hu- mano. Transmitida, geralmente, por alimen- tos contaminados, como carnes e maioneses. Bloqueia a absorção de água através de ente- rotoxinas, provocando diarreia aquosa.
  • Escherichia coli: bastonete Gram-negativo, não formador de esporos, flagelado. Em re- lação às manifestações abordadas neste ca- pítulo, interessa a E. coli diarreiogênica, que inclui cinco diferentes sorotipos com carac- terísticas patogênicas individuais: enteroin- vasiva (EIEC), enterotoxigênica (ETEC), enteroagregante (EAEC), enteropatogêni- ca (EPEC) e entero-hemorrágica (EHEC). É transmitida por alimentos e água conta- minados com fezes humanas ou de animais, raramente podendo ocorrer transmissão pessoa a pessoa. Atuam por meio da pro- dução de enterotoxinas, que estimulam a secreção de cloro e reduzem a absorção de sódio, e de citotoxinas, que agridem o epitélio intestinal, alterando sua estrutura. As características da diarreia dependem do sorotipo. A diarreia aquosa está associada à infecção pelos sorotipos EPEC, ETEC e EAEC, ao passo que os sorotipos EIEC e EHEC causam disenteria. A EHEC pro- duz a toxina Shiga, que pode causar compli- cações sistêmicas graves, incluindo síndro- me hemolítico-urêmica.
  • Salmonella: bastonete Gram-negativo, transmitido por ovos, aves domésticas, lei- te e outros alimentos contaminados. A S. typhimurium está intimamente relacionada com gastroenterites, enquanto a S. typhi está mais relacionada a efeitos sistêmicos tóxicos (febre tifoide). Produz enteroto- xinas que estimulam secreção de cloro, e invadem a mucosa, ativando eventos in- flamatórios. Manifesta-se inicialmente por diarreia aquosa, seguida de diarreia sangui- nolenta. Na infecção pela S. typhi, a diarreia é o evento menos importante, uma vez que os eventos sistêmicos são proeminentes e podem ser graves.
  • Shigella: bastonete Gram-negativo, transmi- tido por via fecal-oral e por meio de alimen- tos e água contaminados. Produz enteroto- xina potente, além de penetrar nas células colônicas, provocando degeneração do epi- télio e inflamação da lâmina própria, o que resulta em descamação e ulceração. Os sin- tomas surgem após um período de incubação de um a dois dias. A fase inicial, de enterite, manifesta-se por diarreia aquosa, seguida por colite, com diarreia mucossanguinolenta.
  • Staphylococcus: coco Gram-positivo. A diar- reia causada por esse microrganismo está relacionada à contaminação de alimentos e produção de toxina termoestável, cuja inges- tão causa diarreia e vômitos. Os sintomas surgem 2 a 8 horas após a ingestão e tendem a regredir espontaneamente em até 48 horas. As fezes apresentam aspecto aquoso.
  • Vibrio cholerae: bacilo Gram-negativo, com flagelo polar, transmitido principalmente por água contaminada. Provoca diarreia por meio de uma potente toxina que estimula o AMP cíclico, ocasionando a redução da ab- sorção de sódio e a secreção de cloreto. A diarreia secundária a essa infecção é aquosa, extremamente volumosa e coloca a vida do paciente em risco por desidratação.
  • Yersinia enterocolitica: bacilo Gram- negativo. Responsável por quadros de diar-reia aguda, linfadenite mesentérica, ileíte terminal e pseudoapendicite. Transmitido por leite cru, água e alimentos contamina- dos, vegetais crus e de animais para pesso- as. A diarreia é usualmente aquosa, porém, pode ser sanguinolenta nos casos severos. Os vômitos podem estar presentes em 10% a 40% dos casos.
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13
Q

Qual a etiologia da diarreia infecciosa por fungo?

A

Candida albicans: fungo comensal, presen- te habitualmente no trato gastrointestinal. Torna-se patogênico em situações especí- ficas que envolvem imunodepressão, uso de corticosteroides e uso de antibióticos. Possivelmente causa diarreia por inibição da lactase. Produz enzima proteolítica que de- grada a mucina. A diarreia secundária a essa infecção é aquosa e, às vezes, explosiva.

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14
Q

Qual a etiologia da diarreia infecciosa por protozoários?

A

Cryptosporidium: transmitido por meio da ingestão de oocistos presentes em água e alimentos contaminados, podendo ser trans- mitido também de uma pessoa para outra e de um animal para uma pessoa. Tem ação predominantemente secretora, mas pode se associar a atrofia vilositária e infiltrado in- flamatório da lâmina própria. Desencadeia diarreia aquosa, que pode ser prolongada.

  • Giardia lamblia: protozoário flagelado, bi- nucleado, é um dos parasitas intestinais mais comuns em todo o mundo. Sua trans- missão ocorre a partir da ingestão de cistos em água contaminada, podendo ser trans- mitido de uma pessoa para outra em lugares com más condições de higiene. A patogê- nese ainda não é completamente entendida, mas sabe-se que pode provocar destruição da borda em escova das células epiteliais, assim como induzir resposta imune do hos- pedeiro. Infestações maciças podem resul- tar em má absorção, tanto pelas lesões da mucosa como, em algumas situações, pelo impedimento mecânico da absorção de nu- trientes provocada pelo revestimento da mucosa em decorrência da enorme quanti- dade do protozoário. A apresentação clíni- ca varia de ausência de sintomas a diarreia aquosa. Pode se tornar crônica, causando má absorção e perda de peso.
  • Entamoeba histolytica: espécie patogêni- ca do gênero Entamoeba, é transmitida por meio da ingestão de cistos maduros a partir de água, alimentos ou mãos contaminadas. Produz enzimas proteolíticas que provocam ulcerações, hemorragia e, até mesmo, per- furação. A infestação por esse protozoário pode não ter qualquer manifestação clíni- ca aparente, mas pode se manifestar como quadro de amebíase invasiva intestinal, com colite disentérica, apendicite, megacólon tó- xico e ameboma, e extraintestinal (peritonite, abscesso hepático e outras).
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15
Q

Qual a etiologia da diarreia infecciosa por Nematoide?

A

Nematoide:
- Strongyloides stercoralis: a infestação por esse helminto acontece por meio da penetração de larvas filariformes através da pele. Em situa- ções especiais, como constipação intestinal, alterações da motilidade intestinal e molés- tia diverticular dos cólons, a permanência da larva rabditiforme por tempo prolongado no intestino pode favorecer sua evolução para larvas filariformes, iniciando um ciclo de infestação interna, a autoinfecção. Essa con- dição pode estar exacerbada em indivíduos imunocomprometidos, o que pode ocasionar hiperinfecção, quadro clínico grave, frequen- temente fatal.

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16
Q

Quais são as principais enfermidades diarreias não infecciosas de origem intestinal?

A

Síndrome do intestino irritável:
Ativação e aumento do número dos mastócitos na mucosa intestinal, alterando a motilidade e sensibilidade intestinais. Pode ser secundária a algumas das infecções bacterianas ou parasitária dos intestinos já listadas. Características clássicas: Distensão e dor abdominal. Evacuações de fezes amolecidas, com frequência aumentada em relação ao normal e com urgên- cia. Muco nas fezes.

Retocolite ulcerativa inespecífica:
Doença Th-2-imunomediada (IL-4, IL-13), decor- rente de alteração da relação sistema imune/ microbiota intestinal. Características clássicas: Dores abdominais em cólica, diarreia mucossangui- nolenta, tenesmo. Podem ocorrer manifestações extraintestinais (artrites, colangite esclerosante, eri- tema nodoso, pioderma gangrenoso, uveíte, irite).

Doença de Crohn:
Doença Th1-imunomediada (IL-12, interferon alfa, TNF), decorrente de alteração da relação sistema imune/microbiota intestinal.11 Infiltrado inflamatório transmural, ulceração. Características especificas: Diarreia mucossanguinolenta. Manifestações oculares (prurido, hiperemia, fotofobia, lacrimeja- mento, dor etc.), mucocutâneas (eritema nodoso, pioderma gangrenoso, ulcerações aftoides), mus- culoesqueléticas (artrites, osteoporose), pulmo- nares (bronquiolite, bronquiectasia, asma).

Doença celíaca:
Aumento da permeabilidade intestinal – trans- porte da gliadina através da mucosa – ativação imune tipo Th1, com consequente dano da mucosa, evoluindo para atrofia.
características clássicas: Pode ser assintomática. Distensão abdominal, anemia, perda de peso. Dermatite herpetiforme. Outras doenças autoimunes. Esteatorreia.

17
Q

Quais são as principais enfermidades diarreias não infecciosas de origem extraintestinal?

A
  • Diabete melito
  • Hipertiroidismo
  • Insuficiência pancreática
18
Q

Como é feito o diagnóstico clínico da diarreia aguda aguda?

A

Como em todo exercício diagnóstico em medici- na, os primeiros passos serão uma boa história clínica e o exame físico. Na avaliação de um paciente com diarreia algumas questões são importantes na coleta dos dados da história:

  • tempo de evolução
  • característica física das evacuações
  • presença de outros sintomas
  • dados epidemiológicos
  • antecedentes patológicos pessoais
  • antecedentes patológicos familiares
19
Q

Como é avaliado o tempo de evolução na coleta de dados para diagnóstico clínico da diarreia?

A

Tempo de evolução:
como enfatizado anterior- mente, uma evolução maior que 15 ou 30 dias, caracterizando quadros persistentes ou crôni- cos, mudará a abordagem diagnóstica, uma vez que esses casos necessitam de uma investigação complementar mais ampla, diferentemente dos quadros de diarreia aguda.
- Diarreias tóxicas: surgem entre 4 e 24 horas após a ingestão do alimento contaminado por toxinas de bactérias como Staphylococcus au- reus, Clostridium perfringens e Bacillus cereus, e tendem a regredir logo após a eliminação da toxina, entre 1 e 2 dias após seu início.
- Diarreia infecciosas: ocorrem 48 horas ou mais após a contaminação. São mais fre- quentemente secundárias a infecções virais, porém, podem ser causadas por bactérias ou protozoários. A duração das diarreias virais não costuma ser maior que 3 a 4 dias, ao pas- so que as bacterianas podem evoluir por até 7 dias. Quadros diarreicos que duram mais de 1 semana devem levantar a suspeita de infec- ção por protozoários.
- Diarreias funcionais: ao contrário das diar- reias orgânicas, as funcionais apresentam características como duração maior que três meses (Roma III), ausência de sintomas ou sinais de alarme como perda de peso signi- ficativa, são intermitentes e não costumam acontecer durante a noite.

20
Q

Como é avaliado as características físicas das evacuações na coleta de dados para diagnóstico clínico da diarreia aguda?

A

Características físicas das evacuações:
con- sistência, presença de sangue ou muco, volu- me, número, presença de gordura – diarreias secundárias a doenças do delgado costumam sem aquosas e volumosas, apresentando ris- co maior de desidratação. Ao contrário, nas diarreias secundárias a colites as fezes são de pequeno volume e podem apresentar muco ou sangue, o que será sugestivo de infecção por microrganismo com potencial invasivo (Campylobacter, E. coli, Shigella e V. parahe- molyticus). Presença de gordura nas fezes su- gere doença disabsortiva.

21
Q

Como é avaliado a presença de outros sintomas na coleta de dados para diagnóstico clínico da diarreia aguda?

A

Presença de outros sintomas:
febre, náusea, vômitos, dor abdominal – a febre é sugestiva de doença infecciosa, mais frequentemen- te viral. Já a presença de vômitos deve ser- vir de alerta para a maior probabilidade de desidratação, uma vez que aumenta a perda de líquidos, ao mesmo tempo que prejudica a reposição oral. Além disso, vômitos sem diar- reia ou com diarreia mínima são sugestivos de etiologia viral. A presença de dor abdominal torna pouco provável o diagnóstico de diar- reia funcional.

22
Q

Como é avaliado os dados epidemiológicos na coleta de dados para diagnóstico clínico da diarreia aguda?

A

Dados epidemiológicos:
contatos, viagens, uso de medicamentos, refeições em ambientes que não o domicílio, ingestão de alimentos crus, principalmente frutos do mar (ostras):
- História de contato com indivíduo portador de sintomas semelhantes há mais de 48 horas sugere doença infecciosa. Relatos de epide- mias na região de domicílio do paciente podem direcionar o diagnóstico.
- Aintensamobilizaçãopropiciadapelosmeios de transporte tem submetido cerca de 50 mi- lhões de indivíduos de países desenvolvidos aos riscos inerentes à falta de saneamento básico dos países em desenvolvimento. O consumo de água e alimentos contaminados com bactérias, vírus e parasitas geram mu- danças de planos de viagem por 40% deles, 20% ficam acamados por 1 a 2 dias, e cer- ca de 1% são hospitalizados.14 O consumo aumentado de bebidas alcoólicas durante o passeio pode adicionar mais fatores de risco, principalmente nos indivíduos do sexo mas- culino, uma vez que pode causar “desinibi- ção” dos hábitos alimentares ou a alteração da mucosa intestinal.13 Os agentes etiológi- cos mais frequentes da diarreia do viajante, como grupo, são as E. coli diarreiogênicas (E. coli enterotoxigênica, E. coli enteropatogêni- ca, E. coli êntero-hemorrágica, E. coli entero- agregante e E. coli enteroinvasiva). Viagens a países tropicais tornam os indivíduos mais suscetíveis de adquirir patologias específicas dessas regiões, como esquistossomose, ame-bíase, giardíase e outras helmintíases intes- tinais. A diarreia do viajante não exige, no entanto, o contato com agentes infecciosos ou toxinas para ser desencadeada. A ingestão de alimentos exóticos, totalmente fora dos padrões de alimentação do indivíduo, pode ter como consequência um quadro diarreico que tem como característica a curta duração (24 a 48 horas), com resolução espontânea.
- O hábito dos indivíduos de ambientes urbanos de frequentar restaurantes é fator im- portante no aumento dos casos de diarreia, seja pela “libação” alimentar no restauran-te, seja pela má conservação, pelo aprovei- tamento de restos de alimentos, pelas más condições de higiene do ambiente ou, ain- da, pelo excesso de temperos.
- Inúmeros medicamentos são associados a quadros diarreicos, com fisiopatologia que varia desde inibição da absorção de gordu- ras até o desencadeamento de colites mi- croscópica e pseudomembranosa (Quadro 25.2). Alguns medicamentos estão relacio- nados a diarreia em mais de 10 a 20% dos pacientes que os utilizam, outros o fazem ocasionalmente.

23
Q

Como é avaliado os antecedentes patológicos pessoais na coleta de dados para diagnóstico clínico da diarreia aguda?

A

Antecedentes patológicos pessoais:
alergias (gastroenterites eosinofílicas), diabete melito (neuropatia diabética), doenças pancreáticas (má absorção), intolerância à lactose (diarreia osmótica), hipertiroidismo (hiperperistaltis- mo), infecção pelo HIV (imunodepressão), cirurgias digestivas mutilantes, como colecto- mias, gastrectomias e ressecções do intestino delgado (diminuição da superfície absortiva).

24
Q

Como é avaliado os antecedentes patológicos familiares na coleta de dados para diagnóstico clínico da diarreia aguda?

A

Antecedentes patológicos familiares:
história de doenças neoplásicas, doença intestinal inflamató- ria ou doença celíaca na família devem servir de alerta para a possibilidade desses diagnósticos, de- pendendo dos demais dados clínicos apresentados.

25
Q

Quais são os principais dados a serem colhidos no exame físico do paciente com diarreia aguda?

A

A avaliação do nível de desidratação atra- vés do turgor da pele, da frequência cardíaca e da mensuração da pressão arterial em decúbito e sen- tado é o mais importante dado a ser colhido, uma vez que ditará a necessidade, ou não, da hidratação venosa. O exame do abdome avaliará distensão e sensibilidade abdominais. Quando for necessária a definição do agente etio- lógico da diarreia aguda, os exames recomendados serão direcionados para a(s) hipótese(s) levantadas com os dados clínicos. A abordagem diagnóstica da diarreia aguda aos agentes infecciosos será limitada, deixan- do a investigação das demais etiologias quando da abordagem do diagnóstico das diarreias crônicas.

26
Q

Como é feito o diagnóstico clínico da diarreia crônica?

A

Ao contrário da diar- reia aguda, a permanência dos sintomas por tanto tempo poderá exigir investigação cuidadosa de forma a identificar o agente etiológico, permitindo, as- sim, abordagem terapêutica específica.
A coleta dos dados da história e o exame físico, como descritos para a diarreia aguda, são essenciais. Poderão ser suficientes para orientar abordagem te- rapêutica empírica, sem a necessidade de qualquer exame complementar.

27
Q

Como é avaliado o aspecto das fezes na formulação das hipóteses diagnósticas para diarreia crônica?

A

O aspecto das fezes, por exemplo, poderá servir como guia na formulação das hipóteses diagnósticas:

Diarreia crônica sanguinolenta:
apesar de poder ser secundária a infecções bacterianas por Shigella, Salmonella, C. difficile, E. coli e outras, essa forma de apresentação está, mais provavelmente, rela- cionada à doença intestinal inflamatória.

Diarreia crônica não sanguinolenta:
pequena probabilidade de infecções bacterianas mais co- muns. A investigação deve ser direcionada para G. lamblia e C. difficile.

28
Q

Quais exames complementares podem ser utilizados na investigação da diarreia crônica?

A

Os exames complementares utilizados na inves- tigação da diarreia podem ser separados em dois grupos, os inespecíficos e os específicos. Os primei- ros têm como finalidade avaliar as alterações gerais decorrentes da diarreia, sugerir a possibilidade de doença infecciosa ou direcionar o diagnóstico para doença orgânica ou funcional:

Hemograma:
poderá sugerir infecção bac- teriana, quando há desvios à esquerda. Infecções crônicas podem cursar, no entan- to, apenas com neutrofilia, sem o desvio à esquerda. Algumas infecções podem se apre- sentar com neutropenia, como a salmonelose (febre tifoide), assim como as infecções por
E. coli, Yersinia e Campylobacter. A eosino- filia pode estar associada a enterites eosino- fílicas e a parasitoses como a estrongiloidía- se. Anemia poderá sugerir processo crônico ou sangramento oculto. Trombocitose em portadores de doença intestinal inflamatória (doença de Crohn e RCUI) serve de alerta para doença ativa e risco de complicações tromboembólicas.

Ureia e creatinina:
a avaliação da função renal no paciente com quadros de diarreia intensos é imprescindível, uma vez que a desidratação poderá causar insuficiência renal de intensidade variável e, se não tratada a tempo, irreversível.

Sódio e potássio séricos:
a secreção ativa ou passiva de líquidos para a luz intestinal deter- minada pela diarreia provoca desequilíbrios hidroeletrolíticos que exigem correção por via oral ou infusão venosa.

Albumina sérica:
diarreia crônica associada à má absorção pode provocar a queda dos níveis séricos dessa proteína calprotectina fe- cal – a calprotectina corresponde a 60% do conteúdo protéico citoplasmático dos poli- morfonucleares neutrófilos. Seus níveis plas- máticos aumentam 5 a 40 vezes na presença de processos infecciosos ou inflamatórios,19 com níveis ainda mais elevados nas fezes (6 vezes os níveis plasmáticos). Seus níveis fe- cais são determinados pela ELISA, com va- lor superior da normalidade de 50 mcg/g. É importante na distinção entre processos fun- cionais e processos inflamatórios, sugerindo a presença destes últimos quando acima de 100 mcg/g. Valores elevados indicam fortemente a presença de doença orgânica, porém, valo- res dentro da normalidade não determinam a presença de doença funcional, uma vez que doenças orgânicas nas quais não há ativação dos polimorfonucleares neutrófilos, como a doença celíaca e o carcinoma do cólon, po- dem ter resultados negativos.

Os exames específicos são direcionados pelas hipóteses diagnósticas aventadas durante a coleta dos dados da história e do exame físico.